quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Apesar de tudo, valeu e continuará valendo a pena lutar contra o obscurantismo e autoritarismo. Por Afrânio Silva Jardim



Às vezes, bate na gente um certo desânimo. Somos tentados a pensar que as coisas devem ser assim mesmo e que a nossa “luta” é inglória, que as nossas aspirações de justiça social contrariam a “natureza das coisas”.


Afrânio Silva Jardim. Foto: Facebook/Divulgação
PUBLICADO NO EMPÓRIO DO DIREITO
POR AFRÂNIO SILVA JARDIM
Neste ano de 2020, deverei completar 70 anos de vida. Por isso, julgo oportuno ratificar uma importante reflexão que fiz quando estávamos apenas começando a conviver com todo este atual obscurantismo.
Vamos ao meu texto:
Às vezes, bate na gente um certo desânimo. Somos tentados a pensar que as coisas devem ser assim mesmo e que a nossa “luta” é inglória, que as nossas aspirações de justiça social contrariam a “natureza das coisas”.
Uma tarde chuvosa, longe dos amigos e dos familiares mais próximos, fomenta mesmo um certo pessimismo, uma certa nostalgia das “lutas” passadas e perdidas.
Por vezes, somos levados a fazer autocríticas. Somos levados a rever os acontecimentos do passado. Sentimos terrível saudade da nossa falecida filha Eliete, também uma “batalhadora” por justiça para os mais necessitados.
Ademais, bate um grande saudosismo daqueles dias de euforia, daqueles dias em que achávamos que a nossa geração iria transformar a nossa hipócrita sociedade.
Pode-se até chegar a uma terrível e dolorosa dúvida: será que a nossa vida valeu a pena?
Entretanto, “acordamos” e ficamos revigorados quando ouvimos as músicas de Leon Gieco, Victor Heredia, Pablo Milanés, Zé Geraldo e Chico Buarque, muitas delas cantadas pela saudosa Mercedes Sosa. Ficamos revigorados, ainda, quando nos lembramos do grande intelectual que foi Darci Ribeiro, cuja trajetória de vida pode ser sintetizada em seu pensamento abaixo:
“Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.”
Evidentemente, assim como Darci Ribeiro, não me considero um derrotado. Pessoalmente até me considero um vencedor, graças a várias circunstâncias e situação econômica privilegiada.
Entretanto, nossos mais relevantes “valores” estão longe de serem concretizados e vivemos em uma sociedade de pessoas raivosas e preconceituosas, conservadoras, sem vontade de adquirir cultura, enfim, uma sociedade de pessoas “infantilizadas” e acríticas.
Nada obstante, por circunstâncias várias e que não cabem ser elencadas, espelhado no exemplo de Darci Ribeiro e tantos outros, termino esta breve reflexão, asseverando:
1 – Que não desanimo, embora a idade tenha diminuído em mim o açodamento juvenil. Não abro mão das minhas utopias, malgrado já não tenha tantas condições de correr em sua direção, (Galeano). Não aceito os “fatos consumados” e acho que podemos, algum dia, no futuro, subverter os fatos.
2 – Que jamais abandonarei a “luta por justiça social”, pois não consigo achar natural que as pessoas tenham tantos sofrimentos em razão de sua pobreza.
Termino, dizendo: quando virem o meu caixão sendo levado para a sepultura, tenham certeza de que ali vai um eterno inconformado, um inadaptado a este modelo de sociedade, um humanista rebelde.
Espero ter deixado cair uma semente por este nosso caminho de vida percorrido …
Enfim, espero também que meus netos encontrem esta semente e a façam germinar. Não estarei aqui, mas gostaria de ter provas disso enquanto ainda estou presente…

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