quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Nikolas Ferreira: a manipulação política-hipócrita-farisáica do repertório bíblico. Artigo de João Cezar de Castro Rocha

 

Do ICL Notícias:

Nikolas Ferreira: a manipulação política do repertório bíblico

O fervoroso deputado parece conhecer o texto bíblico de outiva e não por meio dos olhos

A alegria vem pela manhã

Na avenida Paulista, na manifestação do dia 7 de setembro, Nikolas Ferreira ilustrou de forma exemplar a manipulação do repertório bíblico, a verdadeira base da estratégia dos defensores da Teologia do Domínio.

Como sempre, transcrevo a fala do deputado.

“Vocês não estão sozinhos. E que o choro pode durar uma noite, mas a alegria, ela vem pela manhã”.

(Pausa dramática para um breve passeio no trio elétrico. Na multidão, pessoas levantam as mãos para o céu, como se ouvissem uma pregação ou escutassem um louvor.)

“Bem-aventurados os que têm sede de justiça. Bem-aventurados os que choram, porque toda a lágrima um dia será secada pelo nosso Senhor. Eu não tenho dúvidas de que Deus continua com os olhos abertos para nossa Nação”.

Nessa fala, duas passagens muito conhecidas são deliberadamente deturpadas.

Vejamos.

Em primeiro lugar, o Salmo 30 ocupa o centro da cena. Como se sabe, a autoria é atribuída a Davi. O Salmo foi composto para a dedicação do templo, fato que só ocorreu após sua morte, durante o reinado de seu filho, Salomão. [1] A passagem maltratada pelo político assim se lê:

“Cantem louvores ao Senhor,

vocês que são os seus santos,

e deem graças ao seu santo nome.

Porque a sua ira dura só um momento,

mas o seu favor dura a vida inteira.

O choro pode durar uma noite,

mas a alegria vem pela manhã”. [2]

Na vida do fiel, o choro expressa o sofrimento de que ninguém escapa. Contudo, a manhã promete o alívio que será concedido pelo Senhor. Em última instância, trata-se de manter a serenidade em meio às tribulações, pois a fé, em si mesma, é sustento suficiente. Em nenhuma circunstância é razoável a interpretação sugerida por Nikolas Ferreira, que associa o Salmo ao contexto político brasileiro e, ainda mais concretamente, serve como instrumento para atacar o Ministro Alexandre de Moraes. Aqui, nessa hermenêutica oportunista, a “alegria”, alvorada radiosa, só será possível com o impechament do Ministro. A inadequação salta aos olhos.

(Seria uma caricatura se as consequências não fossem a proposta de ordem social teonomista.)

Não é tudo.

Você prestou atenção na forma como Nikolas Ferreira mencionou o Salmo? Reveja o vídeo. Pois é! Isso mesmo que você notou:

“(…) mas a alegria, ela vem pela manhã”

Como acabamos de ver, o trecho é um pouco diferente:

“(…) mas a alegria vem pela manhã”

Ora, por que o deputado adicionou uma curiosa vírgula e, sobretudo, o pronome pessoal “ela”? A resposta é surpreendente, mas muito reveladora. O deputado, dublê de pastor, adotou a lição presente no louvor “Todavia me alegrarei”, grande sucesso de Samuel Messias.

Você conhece o louvor?

Destaco a estrofe que remete ao Salmo 30:

“O choro dura uma noite, mas a alegria

Ela vem pela manhã

Eu creio, eu creio”

O fervoroso deputado parece conhecer o texto bíblico de outiva e não por meio dos olhos… Isto é, menos pela leitura meditada do que pela fruição coletiva do louvor. Contudo, há um tanto de cálculo nesse tropeço tão elementar. Para que se entenda o alvo, basta que se evoque um esclarecimento de grande alcance:

“De início, observo que nas últimas décadas ocorreu algo como um ecumenismo de base no que aqui foi chamado de setores evangélicos. Um pensamento comum, uma cosmovisão única, foi se formando a partir das músicas, cânticos, canções, que circulam livremente entre as igrejas, sem as amarras doutrinárias”. [3]

A hinologia evangélica foi fundamental para a difusão de trechos das Escrituras, assim como da formulação, nada sistemática mas por isso mesmo muito influente, de interpretações deturpadas dessas passagens — quase que exclusivamente com intenção política. A lenta propagação dos fundamentos da Teologia do Domínio dificilmente teria tido idêntico êxito sem sua assimilação, por vezes insciente, propiciada pela multiplicação de louvores, que dominam o cotidiano de milhões de fiéis. A observação do pastor Sérgio Dusilek ilumina a dimensão do problema:

“A influência militar não se deu somente no trânsito dos favores, da reciprocidade entre importantes figuras evangélicas e as principais figuras da república. Esta influência foi gestada e transmitida pela hinologia evangélica, especialmente por certo tipo de música que se popularizou como Gospel. Os chamados cânticos de guerra emularam gerações de jovens às muitas batalhas imaginárias, seguindo a um Jesus, ora apresentado como capitão, ora como general”. [4]

O próprio louvor “Todavia me alegrarei” opera uma colagem de duas instâncias da Bíblia. Além do Salmo 30, Samuel Messias também recorreu ao livro do profeta Habacuque. Recordemos sua oração (cito apenas os trechos mencionados no louvor):

“Ainda que a figueira não floresça,

nem haja fruto na videira;

ainda que a colheita da oliveira

decepcione,

e os campos não produzam mantimento

ainda que as ovelhas

desapareçam do aprisco

nos currais não haja mais gado,

mesmo assim eu me alegro no Senhor,

e exulto no Deus da minha salvação.

O Senhor Deus é a minha fortaleza”. [5]

 

“Todavia me alegrarei” adapta a passagem, com ligeiras alterações:

“Ainda que a figueira não floresça

Nem haja fruto na vide

Ainda que falhe o produto da oliveira

E os campos não produzam mantimento

Ainda que o rebanho seja exterminado da malhada

E nos currais não haja gado

Todavia eu me alegrarei no Senhor

Exultarei o Deus da minha Salvação

Porque o Senhor Deus

Ele é a minha força”.

Se o proponente da Teologia do Domínio, Nikolas Ferreira, desejasse citar o livro de Habacuque, você acha que ele teria como referência realmente à mão o texto da Bíblia ou a letra do louvor?

As bem-aventuranças

Na sequência da fala do deputado teonomista, a deturpação do repertório bíblico não se constrange nem mesmo diante das bem-aventuranças. O contexto é dos mais conhecidos e celebrados dos Evangelhos: o “Sermão do Monte”:

“Ao ver as multidões, Jesus subiu ao monte. Ele se assentou e os seus discípulos se aproximaram dele. Então ele passou a ensiná-los”. [6]

Seguem-se no Evangelho de Mateus as sete bem-aventuranças; agora, assinalo somente as duas instâncias deturpadas por Nikolas Ferreira:

“ — Bem-aventurados os que choram,

porque serão consolados.

(…)

— Bem-aventurados os que têm fome

e sede de justiça,

porque serão saciados”. [7]

Não somente o deputado altera a ordem das bem-aventuranças, mas também manipula seu sentido, a fim de lhes atribuir uma deriva política rasa e vulgar, concluindo com uma ameaça velada — “Deus continua com os olhos abertos para nossa Nação”. Tradução automática: nos momentos de delírio dos presentes na avenida Paulista, o impeachment do Ministro Alexandre de Moraes equivale ao início do Paraíso prometido e à suprema Consolação dos justos que já choraram demais.

E não apenas.

A manipulação das bem-aventuranças foi uma das estratégias centrais na imposição de uma ordem teonomista na República de Gilead, na distopia fundamentalista de Margaret Atwood, “O conto da aia”.

Duvida?

“Na hora do almoço eram as Beatitudes. Bem-aventurado isso bem-aventurado aquilo. Elas punham para tocar uma gravação em disco, a voz era de um homem. Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados os misericordiosos. Bem-aventurados os mansos. Bem-aventurados os que se calam. Eu sabia que este último eles tinham inventado, sabia que estava errado, e que tinham excluído partes também, mas não havia nenhuma maneira de verificar”. [8]

No Brasil de 2024 ainda podemos verificar e portanto denunciar as inúmeras deturpações do repertório bíblico feitas por defensores da Teologia do Domínio.

(Pelo menos por enquanto.)

 

[1] “Então o rei e todo o Israel com ele ofereceram sacrifícios ao Senhor. Salomão ofereceu em sacrifício pacífico ao Senhor vinte e dois mil bois e cento e vinte mil ovelhas. Assim, o rei e todos os filhos de Israel consagraram a Casa do Senhor”. 1Rs, 8: 62–63. Bíblia de Estudo Nova Almeida Atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2017, p. 589.
[2] Salmo 30: 4-5. Bíblia de Estudo Nova Almeida Atualizada. Op. cit., p. 935.
[3] Paulo Donizeti Siepierski. “Prefácio”. In: Sérgio Dusilek & Tayná Louise de Maria (orgs.). A noiva sob o véu. Novos olhares sobre a participação das igrejas evangélicas nas eleições de 2022. Rio de Janeiro: Menocchio, 2024, p. 7.
[4] Sérgio Dusilek. “Os batistas da convenção batista brasileira e as eleições de 2022: um caminho de difícil retorno”. In: In: Sérgio Dusilek & Tayná Louise de Maria (orgs.). A noiva sob o véu. Op. cit., p. 25.
[5] HC 3: 17–19. Bíblia de Estudo Nova Almeida Atualizada. Op. cit., p. 1605.
[6] MT 5: 1-2. Bíblia de Estudo Nova Almeida Atualizada. Op. cit., p. 1705.
[7] MT 5: 4 e 6. Bíblia de Estudo Nova Almeida Atualizada. Op. cit., p. 1706.
[8] Margaret Atwood. O Conto da Aia. Tradução de Ana Deiró. Rio de Janeiro: Rocco, 2017, p. 109.

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Ranieri Costa explica como a teologia dos coaches flerta com o pior do fundamentalismo da religião e do charlatanismo

 

Do Canal ICL:




Como a Teoria da Estupidez de Dietrich Bonhoeffer ajuda a entender a invasão dos ratos do fascismo e do bolsonarismo

 

Vídeo do Canal Razão e Reflexão:

Neste vídeo, exploramos a teoria da estupidez de Dietrich Bonhoeffer, um dos grandes pensadores do século XX. Ele argumenta que a estupidez é mais perigosa do que a maldade, pois é imune à razão e crítica. Bonhoeffer destaca como a conformidade social e a falta de pensamento crítico levam a ações irracionais, mesmo entre pessoas inteligentes. Discutimos a relevância dessas ideias no contexto atual, onde a desinformação e a manipulação são abundantes. Através de suas reflexões, somos desafiados a cultivar a sabedoria e a resistência contra a estupidez coletiva. Junte-se a nós nesta jornada provocativa e instigante.



sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Acadêmicos lançam carta contra os ataques à soberania digital promovidos por big techs empresarias e X de Elon Musl

 

Países democráticos que buscam independência da dominação das Big Techs correm o risco de sofrerem interrupções em suas democracias

Brazilian supreme court justice Alexandre de Moraes took the unprecedented decision to shut down Elon Musk’s X social media platform. Photograph: Andre M Chang/ZUMA Press Wire/Rex/Shutterstock


Um grupo de acadêmicos divulgou, nesta quinta-feira (19), uma carta pública contra o ataque das big techs à soberania digital do país, em que demonstram preocupação com as tentativas de minar a autonomia tecnológica do Brasil. 

Os ataques do bilionário Elon Musk é, segundo os signatários, “o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade das nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos Estados Unidos”.

O grupo relembrou que a suspensão do X, rede social de Elon Musk, foi resultado de descumprimentos de decisões judiciais. 

“O caso brasileiro tornou-se o principal front no conflito global em evolução entre as corporações digitais e aqueles que buscam construir um cenário digital democrático e centrado nas pessoas, focado no desenvolvimento social e econômico”, continua o texto.

Porém, o banimento do X e o posicionamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a intenção de buscar a independência digital do Brasil, inflaram aliados das big techs dentro e fora do país. 

E, mais que isso: o conflito entre a nação e uma gigante da tecnologia evidenciou que países democráticos que “buscam independência da dominação das Big Tech correm o risco de sofrerem interrupções em suas democracias” a partir do apoio das big techs aos partidos de extrema-direita. 

Por isso, os acadêmicos pedem apoio à busca pela soberania digital brasileira, além de suporte da Organização das Nações Unidas (ONU) e outros governos ao redor do mundo, pela regulamentação transnacional de ecossistemas digitais que coloquem pessoas e o planeta à frente dos lucros. 

Leia a carta na íntegra:

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Do Portal do José: PERDEU MANÉ! COVARDIA DE MUSK FRUSTRA BOLSONARO E DIREITA! MORAES ENQUADRA E HUMILHA O FALSO "MITO DA LIBERDADE"!


Do Portal do José:




Do Portal do José: QUE CADEIRADA! MORAES REAGE E MUSK CUMPRE ORDENS! ZONZO QUER VOLTAR AO BRASIL! OS SÓCIOS SINISTROS O CERCAM!

 

Do Portal do José:




Reinaldo Azevedo: Episódio envolvendo o X e os interesses nada decentes de Musk libera o ódio dos fanáticos à democracia e ao país

 

Da Rádio Band News FM:




Tríade terrivelmente evangélica em 3M: Marçal, Malafaia e o falso Messias (o tal do Mito). Artigo de Valdemar Figueiredo

 

  Poderíamos alongar a lista de adeptos da seita terrivelmente evangélica que usam o “M” como senha de acesso: Michelle Bolsonaro, Bispo Macedo (líder máximo da IURD), Marcos Pereira (bispo da IURD e presidente nacional do partido Republicanos), Magno Malta (pastor batista e senador, PL-ES), André Mendonça (pastor presbiteriano e ministro do STF), Marcelo Crivella (bispo da IURD, cantor gospel e deputado federal, Republicanos-RJ), Marcos Feliciano (pastor da Assembleia de Deus, cantor gospel e deputado federal, PL-SP). Enfim, a lista é grande.

Do iclnotícias.com.br

Valdemar Figueredo (Dema)
Valdemar Figueredo (Dema)

Idealizador e coordenador desde 2017 do Observatório da Cena Política Evangélica pelo Instituto Mosaico (www.institutomosaico.com.br). Pós-doutorando em sociologia pela USP. Doutor em ciência política (antigo IUPERJ, atual IESP-UERJ) e em teologia (PUC-RJ). Pastor da Igreja Batista do Leme e da Igreja Batista da Esperança, ambas na cidade do Rio de Janeiro.

Tríade terrivelmente evangélica em 3M: Marçal, Malafaia e o Messias (Mito)

Eleições Municipais de 2024: nós, evangélicos, estamos nos acostumando a passar vergonha

Nós, evangélicos, estamos nos acostumando a passar vergonha. Eleições Municipais de 2024 e eis que estamos superexpostos como se a nossa cara tivesse a ver com o trio rude.

Qual a pesquisa de intenção de voto para prefeito que deixa de citar os evangélicos? Seja qual for a fotografia do momento eleitoral, do Brasil profundo ao litoral, lá estamos compondo o cenário.

O cientista político Jairo Nicolau analisou a eleição de Bolsonaro em 2018. Documentou, através de dados, duas evidências inequívocas, entre outras: o Brasil dobrou à direita e algo em torno de 70% dos evangélicos votou no Bolsonaro no segundo turno.

O que fora dito sobre as eleições de 2018 sobre evangélicos como variável importante continua a vigorar nas Eleições Municipais de 2024. Não é exagero admitir que a mobilização dos terrivelmente evangélicos é um dos fatores determinantes para a força eleitoral do neoconservadorismo de direita.

Poderíamos alongar a lista de adeptos da seita terrivelmente evangélica que usam o “M” como senha de acesso: Michelle Bolsonaro, Bispo Macedo (líder máximo da IURD), Marcos Pereira (bispo da IURD e presidente nacional do partido Republicanos), Magno Malta (pastor batista e senador, PL-ES), André Mendonça (pastor presbiteriano e ministro do STF), Marcelo Crivella (bispo da IURD, cantor gospel e deputado federal, Republicanos-RJ), Marcos Feliciano (pastor da Assembleia de Deus, cantor gospel e deputado federal, PL-SP). Enfim, a lista é grande.

Sabe o que essa profusão de “M” quer dizer? Nada. Apenas uma curiosidade do ser terrivelmente evangélico.

Marçal

Influenciador digital que vive de lacração, lucra com o descontrole dos seus clientes. Usou a fórmula para desestabilizar os seus rivais na eleição para prefeito de São Paulo. Desta vez, foi o Datena que perdeu as estribeiras e deu uma cadeirada no Marçal durante o debate da TV Cultura no final deste domingo (15).

O autodenominado ex-coach conseguiu “entrar na cabeça” dos seus adversários num baixo nível tão fundo que só os mais talhados canalhas conseguem descer.

Como um ser tão repugnante que assume o mau-caratismo com tanta desenvoltura pode ser identificado como evangélico?

Marçal é uma variante do bolsonarismo. Expõe da pior forma possível a imagem já bastante desgastada das igrejas evangélicas no país.

Necessário que os evangélicos sérios se pronunciem distinguindo a versão “terrivelmente evangélica” como praga demoníaca que em nada lembra o Evangelho vivido e ensinado por Cristo.

O tal coach messiânico já havia aloprado no domingo anterior (8) profanando o showmício planejado por Malafaia para a extrema-unção do Bolsonaro.

Os cardeais evangélicos desenvolveram tecnologias para aperfeiçoar o voto de cabresto.

O aumento da rejeição do Marçal entre os evangélicos evidencia o poder das hierarquias eclesiásticas. O candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo não pediu a bênção com o simples gesto do beijar a mão, está sendo forçado a se ajoelhar em sinal de humilhação.

Quis bancar o outsider da política. Quando tentou repetir a fórmula com os religiosos, caiu no tormento do inferno. Sim, os tais terrivelmente evangélicos estão no extremo. Aprendeu a duras penas que os outsiders em relação aos terrivelmente evangélicos caem no lago de fogo e enxofre (contém ironia).

Malafaia

Tem ascendência sobre o Bolsonaro, enquanto Marçal está fora do seu controle.

Espiritualmente falando, Malafaia sabe que assim como o personagem bíblico Sansão, a unção de Deus que esteve sobre ele, foi retirada. Agora, no seu puro discurso de ódio, está por conta própria.

Ninguém em sã consciência poderia acreditar que este pastor odioso fala pela inspiração do Espírito Santo. Ultrapassou o ponto do não retorno na sua agressividade excessiva.

O problema do Malafaia está bem nítido no verso bíblico:

“Porque o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males; o que apetecendo alguns, se desviaram da fé, e se transpassaram a si mesmos com muitas dores” (1 Timóteo 6:10).

Sem medo de errar, pelos frutos, pelo comportamento que só piora na proporção em que seus poderes econômico, político e religioso crescem, Malafaia se desviou da fé.

Os crentes sinceros que vivem no entorno do pastor maior da ADVEC deveriam ter coragem para exortá-lo em amor para que volte para Cristo. Mas, na boa, você acha que alguém teria a coragem de dizer que depois que ele raspou o bigode nunca mais foi o mesmo (contém ironia)?

Cortaram a trança de Sansão. Cortaram o bigode grosso do Malafaia. Hoje ele está por conta própria, embora evoque os símbolos sagrados pentecostais e pronuncie o nome de Deus.

Já tive muita raiva desse personagem. Hoje, olho com pena pelo que virou e pelo que virá.

Messias (Mito)

Compreendo que alguns evangélicos fizeram cálculos políticos e concluíram que o voto no Bolsonaro era um dano menor. Eleitores são senhores das suas escolhas e quanto a isso, estamos conversados.

Contudo, pelo histórico de vida e pela biografia política do capitão, qualquer evangélico que o tenha confundido com o enviado de Deus para salvar o Brasil, misericórdia! O senso de humor de Deus não chegaria a tanto.

Igrejas se transformaram em comitês, púlpitos emporcalhados por políticos com lamas nas botas, cantores gospel pagos para cantar em “cultomícios”, dízimos desviados para financiar caravanas que inflaram comícios e atos políticos, pastores reduzidos ao papel de cabos eleitorais, círculo de oração decomposto em grupos de WhatsApp que fazem circular fake news, perseguição e exclusão de crentes que não adoraram ao messias da extrema-direita, clube de tiro como lazer dos diáconos e malabarismos teológicos encomendados para a glorificação do mito.

Agora veja o absurdo: Jair Messias, que não é evangélico, é a melhor tradução do que vem a ser o “terrivelmente evangélico”.

Lá ele

Aos meus irmãos e irmãs.

As eleições municipais no Brasil em 2024 ocorrerão em 6 e 27 de outubro. Participe seguindo a sua sensibilidade e segundo os seus interesses. Quanto ao que ouve na igreja ou recebe pelas redes sociais enviados pelos irmãos, examine tudo e retenha só o que for bom.

Não discuta, ignore.

Ninguém vai pagar os seus boletos. Então, não deixa ninguém “entrar na sua cabeça” para dizer o que é o melhor para você. Estará em jogo nas eleições quem vamos escolher para administrar a nossa cidade e não quem é o melhor amigo do seu pastor.

No limite, no silêncio do seu quarto, como ensinou Jesus, fecha a porta e ora pedindo discernimento. No que depender de você, não permita que uma vez mais a Igreja de Cristo seja confundida com isso aí que se convencionou chamar de “terrivelmente evangélico”.


quarta-feira, 18 de setembro de 2024

BRICS, a ascensão da China e como o Hegemon enterrou o conceito de “segurança”, por Pepe Escobar

 

Na mesa do BRICS, o tema abrangente era como as nações-membro deveriam apoiar umas às outras, apesar de tantos desafios




do Strategic Culture

BRICS, a ascensão da China e como o Hegemon enterrou o conceito de “segurança”

por Pepe Escobar, Analista geopolítico internacional, escritor e jornalista

A primeira reunião de especialistas em segurança/Conselheiros de Segurança Nacional sob o formato expandido BRICS+ no Palácio Konstantinovsky em São Petersburgo revelou algumas pepitas.

Vamos começar com a China. O Ministro das Relações Exteriores Wang Yi propôs quatro iniciativas de segurança centradas no BRICS. Essencialmente, o BRICS+ — e além, considerando uma expansão maior — deve ter como objetivo coexistência pacífica; independência; autonomia; e verdadeiro multilateralismo, o que implica uma rejeição do Excepcionalismo.

Na mesa do BRICS, o tema abrangente era como as nações-membro deveriam apoiar umas às outras, apesar de tantos desafios — a maioria desencadeados por você-sabe-quem.

Sobre a Índia, o Secretário do Conselho de Segurança Russo Sergei Shoigu, reunido com o Conselheiro de Segurança Nacional Indiano Ajit Doval, enfatizou a força da aliança, “resistir confiantemente ao teste do tempo”.

O contexto maior foi de fato oferecido em paralelo, na Suíça, no Centro de Política de Segurança de Genebra, pelo sempre encantador Ministro das Relações Exteriores S. Jaishankar:

“Havia um clube chamado G7, mas você não deixaria ninguém entrar nele — então dissemos, iríamos e formaríamos nosso próprio clube (…) Na verdade, é um grupo muito interessante porque, se você olhar para ele, normalmente qualquer clube ou grupo tem uma contiguidade geográfica ou alguma experiência histórica comum ou uma conexão econômica muito forte.” Mas com o BRICS o que se destaca são “grandes países em ascensão no sistema internacional.”

Corta para o Vice-Ministro das Relações Exteriores Russo Sergey Ryabkov, enfatizando como a Rússia e o Brasil “têm abordagens semelhantes para questões internacionais importantes”, enfatizando como Moscou preza o atual “entendimento mútuo bilateral e interação, inclusive à luz das presidências simultâneas do BRICS e do G20 este ano.”

Em 2024, a Rússia presidirá o BRICS enquanto o Brasil presidirá o G20.

A parceria estratégica Rússia-Irã

O presidente Putin, além de discursar na reunião, teve negociações bilaterais com todos os principais participantes. Putin observou como 34 nações “já expressaram seu desejo de se juntar às atividades de nossa associação de uma forma ou de outra”.

Ao se encontrar com Wang Yi, Putin enfatizou que a parceria estratégica Rússia-China é a favor de uma ordem mundial justa, um princípio apoiado pelo Sul Global. Wang Yi confirmou que o presidente Xi Jinping já aceitou o convite oficial russo para a cúpula do BRICS no mês que vem em Kazan.

Putin também se encontrou com o secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã, Ali Ahmadian. Putin confirmou que está esperando o presidente iraniano Masoud Pezeshkian para outra visita à Rússia, além da cúpula do BRICS, para assinar seu novo acordo de parceria estratégica.

A geoeconomia é fundamental. O desenvolvimento do Corredor Internacional de Transporte Norte-Sul (INSTC) foi confirmado como uma das principais prioridades da Rússia e do Irã.

Shoigu, por sua vez, confirmou: “Estamos prontos para expandir a cooperação entre nossos conselhos de segurança”. O acordo será assinado por ambos os presidentes em breve. Além disso, Shoigu acrescentou que a entrada do Irã no BRICS avança a cooperação entre os membros para formar uma “arquitetura comum e indivisível de segurança estratégica e uma ordem mundial policêntrica justa”.

Agora compare com a nova “estratégia” coletiva do Ocidente – adotada pelos EUA, Reino Unido, França e Alemanha: outra onda de sanções contra o Irã relacionada ao caso dos mísseis iranianos transferidos para a Rússia.

Ahmed Bakhshaish Ardestani, membro da Comissão de Segurança Nacional e Política Externa do Parlamento Iraniano, confirmou no início desta semana que o Irã está enviando mísseis e drones para a Rússia como parte de seus acordos de defesa.

Mas o cerne da história é que esses mísseis são russos de qualquer maneira; eles estão apenas sendo produzidos no Irã.

Enquanto a segurança era discutida em São Petersburgo, a China estava sediando o Fórum BRICS sobre Parceria na Nova Revolução Industrial 2024 em Xiamen, na província de Fujian.

Fale sobre a cooperação interligada dos BRICS: assim como o Irã, que está sob sanções até o esquecimento, vem tentando obter acesso a novas tecnologias industriais, a colaboração Irã-China em tudo, desde IA até tecnologias verdes, aumentará ainda mais no futuro.

Uma nova arquitetura de segurança eurasiana

O cerne da questão é o status crescente da China como a principal potência comercial global – à medida que dezenas de nações em todo o Sul Global se adaptam ao fato de que a interação com a China é o vetor privilegiado para melhorar seus próprios padrões de vida domésticos e desenvolvimento socioeconômico. Essa mudança monumental nas relações internacionais está reduzindo o Ocidente coletivo a um bando de galinhas sem cabeça.

O poder crescente da China se reflete em todos os principais movimentos geoeconômicos: da RCEP (Parceria Econômica Abrangente Regional), um mega acordo de livre comércio (FTA) interasiático às inúmeras ramificações dos projetos da Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), e todo o caminho até a cooperação BRICS+. O futuro de todas as nações do Sul Global envolvidas significa se aproximar cada vez mais da China.

Em nítido contraste, o Hegemon – e isso é bipartidário, descendo desde a plutocracia rarefeita – simplesmente não consegue contemplar um mundo que não controla. Uma UE propensa à desagregação aguda basicamente “raciocina” da mesma forma. Para todo o Ocidente coletivo, o desejo demente de dupla dificuldade de manter a hegemonia enquanto impede a ascensão da China é insustentável.

Adicione a isso a obsessão louca da atual administração dos EUA em infligir uma “derrota estratégica” à Rússia, já que rejeitou a proposta de Moscou no final de 2021 para uma nova arquitetura de segurança europeia, na verdade uma “indivisibilidade da segurança” referente a toda a Eurásia.

Este novo sistema de segurança pan-eurasiano proposto por Putin foi discutido em detalhes na última cúpula da Organização de Cooperação de Xangai (SCO). Putin realmente declarou que uma “decisão foi tomada para transformar a estrutura antiterrorista regional da SCO em um centro universal encarregado de responder a toda a gama de ameaças à segurança”.

Tudo começou com o conceito de “Grande Parceria Eurasiana”, que Putin avançou no final de 2015. Isso foi refinado durante seu discurso anual à Assembleia Federal em fevereiro passado. E então, em uma reunião com diplomatas russos importantes em junho, Putin enfatizou que era o momento certo para dar início a uma discussão abrangente sobre garantias bilaterais e multilaterais incorporadas em uma nova visão para a segurança coletiva da Eurásia.

A ideia, desde o início, sempre foi inclusiva. Putin enfatizou a necessidade de criar uma arquitetura de segurança aberta a “todos os países da Eurásia que desejam participar”, incluindo “países europeus e da OTAN”.

Acrescente a isso o impulso para conduzir discussões com todos os tipos de organizações multilaterais em toda a Eurásia, como o Estado da União da Rússia e Bielorrússia, a CSTO, a EAEU, a CEI e a SCO.

Crucialmente, essa nova arquitetura de segurança deve “gradualmente eliminar a presença militar de potências externas na região da Eurásia”. Tradução: OTAN.

E na frente geoeconômica, além de desenvolver uma série de corredores de transporte internacional pela Eurásia, como o INSTC, o novo acordo deve “estabelecer alternativas aos mecanismos econômicos controlados pelo Ocidente”, desde a expansão do uso de moedas nacionais em acordos até o estabelecimento de sistemas de pagamento independentes: duas das principais prioridades do BRICS, que terão destaque na cúpula de Kazan no mês que vem.

Queremos uma guerra de três frentes

Do jeito que está, uma Washington surda, muda e cega continua obcecada com seu objetivo declarado e determinado de infligir uma derrota estratégica à Rússia.

O embaixador russo nos EUA, Anatoly Antonov, vai direto ao ponto: “É impossível negociar com terroristas”, acrescentando que “nenhum esquema ou as chamadas ‘iniciativas de paz’ ​​para cessar fogo na Europa Oriental sem levar em conta os interesses nacionais da Rússia são possíveis. Conferências também não ajudarão, não importa quão lindamente sejam nomeadas. Como nos anos da Grande Guerra Patriótica, o fascismo deve ser erradicado. Metas e objetivos da operação militar especial serão cumpridos. Ninguém deve ter dúvidas de que é exatamente assim que vai ser.”

E isso nos leva à atual conjuntura incandescente. Existem apenas duas opções à frente para a guerra por procuração dos EUA contra a Rússia na Ucrânia: uma rendição incondicional de Kiev ou uma escalada em direção a uma guerra da OTAN contra a Rússia.

Ryabkov não tem ilusões — mesmo quando ele coloca isso de forma bastante diplomática:

“Os sinais e ações que estamos testemunhando hoje visam à escalada. Esta observação não nos forçará a mudar nosso curso, mas criará riscos e perigos adicionais para os Estados Unidos e seus aliados, clientes e satélites, não importa onde estejam.”

Após bombardear o conceito de diplomacia, o Hegemon também bombardeou o conceito de segurança. A demência aguda nos EUA, terra dos Think Tanks, chegou até mesmo ao ponto de sonhar com uma guerra de três frentes. E isso de uma “nação indispensável” cuja poderosa Marinha foi totalmente humilhada pelos Houthis no Mar Vermelho.

É realmente um espetáculo para as eras ver a plutocracia de uma nação selvagem de mais de 200 anos que essencialmente saqueou a maior parte de suas terras de outros que acreditam que pode desafiar simultaneamente os persas, os russos e uma civilização asiática com 5.000 anos de história registrada. Bem, selvagens sempre serão selvagens.

Pepe Escobar – Analista geopolítico independente, escritor e jornalista


terça-feira, 17 de setembro de 2024

Lembrando a ação da mão golpista de Bolsonaro e seus apoiadores do agronegócio nas queimadas e incêndios criminosos e ataques ao meio-ambiente e povos originários

 


    O vídeo à seguir foi originalmente postado por @doantidoto no Instagram:






Apoio internacional, diálogo sobre impunidade e investigação sobre terrorismo ambiental: como o governo enfrentará as queimadas?

 

Uma das suspeitas do núcleo político de Lula é a de que as queimadas resultam de um movimento orquestrado para atingir o governo federal

“No Mato Grosso, em uma região que abrange três biomas: Cerrado, Amazônia e Pantanal, os impactos tem gerado vários processos, como a erosão genética na biodiversidade, a perda de sementes”, enfatiza Fran. Foto: Iberê Périssé/Projeto Solos

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu, nesta segunda-feira (16), com ministros para discutir ações para por fim aos incêndios espalhados pelo país. 

O encontro contou ainda com representantes do do ICMBio, do Ibama e de cientistas. A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, apresentou um mapa com as áreas devastadas, além de ações e estratégias que precisam ser implementadas.

Uma das suspeitas levantadas em conversas privadas do núcleo político de Lula é a de que as queimadas resultam de um movimento orquestrado para atingir o governo federal. 

“A gente apaga 10 focos, eles fazem mais 10”, disse um dos ministros à imprensa. 

Nas redes sociais, Lula afirmou que a Polícia Federal está trabalhando para responsabilizar os criminosos que iniciaram os incêndios ou financiaram tais crimes ambientais.  

“O governo federal está atuando junto com o Corpo de Bombeiros do DF para ajudar no combate às chamas. A Polícia Federal tem hoje 52 inquéritos abertos contra os responsáveis por esses crimes contra o nosso país”, escreveu Lula.

Ações intencionais


De acordo com fontes do Palácio do Planalto, a suspeita é a de que pequenos grupos de pessoas cumprem ordens de um grupo de mandantes, que determinam os locais e financiam os crimes à distância.

Apenas em agosto, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 10.328 focos de incêndios florestais, que ganharam mais força devido ao clima seco. 

O total de ocorrências foi o maior da série histórica do INPE, que monitora os focos de incêndio desde 1998.

Apoio internacional

Entre as ações previstas pelo Planalto está o pedido de ajuda para combater as queimadas direcionado para Paraguai, Colômbia, México, Peru, Uruguai, Chile, Canadá e Estados Unidos.

Até o momento, apenas o Uruguai respondeu ao pedido. O país vizinho vai enviar uma aeronave da Força Aérea Uruguaia e 40 mil litros de líquido extintor de incêndio.

O pedido foi feito no início do mês, por Marina Silva, que além de verificar a possibilidade do envio de aeronaves e brigadistas, também sondou as contrapartidas do Brasil para a consolidação do apoio. 

Para por fim às queimadas, o Brasil também enviou ajuda para a Bolívia, a fim de combater os focos de incêndio nas fronteiras.

Penalidade

Lula abordou ainda o  presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luís Roberto Barroso, também nesta segunda-feira. A intenção do presidente foi fazer um apelo para que os crimes ambientais sejam tratados “com a gravidade que eles possuem” pela polícia e pelo Poder Judiciário. 

Isso porque, para o presidente, impera a impunidade em relação a tais crimes. “O próprio presidente da República me telefonou, preocupado com a circunstância de impunidade em a essas queimadas dolosas, de modo que daqui faço já um apelo ao Poder Judiciário, aos juízes, que tratem esse crime com a seriedade que ele merece ser tratado”, afirmou Barroso, durante o discurso de abertura da reunião do Observatório do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas (OMA) do Poder Judiciário.

Segundo levantamento do Observatório do Clima, as queimadas recordes na Amazônia resultaram em 31 milhões de toneladas de gás carbônico (CO2) emitidos na atmosfera entre junho e agosto deste ano.

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Cidades administradas por prefeitos latifundiários bolsonaristas retornam a lista de desmatadores

 

Marcelândia e Querência (MT) deixaram lista prioritária do plano para Prevenção e Controle do Desmatamento, mas retornaram


Por Carolina Bataier e Bruno Stankevicius Bassi — De Olho nos Ruralistas

Estabelecida a partir do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), a lista de municípios prioritários teve sua primeira versão publicada em 2008. Desde então, tornou-se um dos principais instrumentos de política pública por trás da redução drástica do desmatamento no bioma. Em 2012, durante o governo Dilma Rousseff (PT), o corte de vegetação atingiu sua mínima histórica, com 4,6 mil km² de perda florestal anual.

Durante o governo de Jair Bolsonaro, o programa foi paralisado. Uma das poucas atualizações realizadas no período foi a revisão da lista prioritária, publicada em 2021, com 52 municípios. Entre eles, 29 deles pertencem à lista dos cem maiores municípios do país.

Os dados integram o dossiê “Os Gigantes”, publicado no dia 5 pelo De Olho nos Ruralistas. Realizado ao longo de quatro meses, o estudo detalha as políticas ambientais e climáticas dessas cem prefeituras, espalhadas por onze estados e que, juntas, administram uma área equivalente a 37% do território brasileiro.

Oito novos municípios foram incluídos pela primeira vez na lista do PPCDAm, enquanto outros cinco foram devolvidos à condição de prioritários. Entre eles, dois são destaque por integrarem os Gigantes e serem administrados por prefeitos latifundiários: Querência e Marcelândia, ambos no Mato Grosso.

Os dois possuem secretarias de Meio Ambiente unificadas com Agricultura, conforme mostramos em reportagem anterior da série, que detalha os achados do dossiê: “Os Gigantes: 30 municípios têm secretarias de ambiente fundidas com agronegócio, mineração e turismo“.

Prefeito de Marcelândia é sócio de colonizadora ré por desmatamento

O município de Marcelândia é o 97º na lista dos cem maiores do país. Ele deixou a lista do PPCDAm em 2013. A conquista foi fruto de uma bem-sucedida política de controle estabelecida por Adalberto Diamante (PR), prefeito entre 2005 e 2012.

Celso Padovani visita fazenda de soja da Pronorte, em Marcelândia. (Foto: Instagram)

Na administração seguinte, de Arnóbio Vieira de Andrade (PSD), as ações regrediram, levando Marcelândia de volta à relação dos maiores desmatadores da Amazônia, formalizada em portaria de 2018. Sob Arnóbio, a perda florestal anual saltou de 12 km², quando assumiu, para 112 km² em 2020 — posicionando o município entre os vinte maiores desmatadores da Amazônia naquele ano.

Ele foi sucedido por outro pecuarista, Celso Padovani (DEM), que concorreu sozinho ao cargo nas eleições de 2020. Na ocasião, ele declarava um patrimônio de R$ 10,5 milhões, que incluía fazendas, veículos e 1.694 cabeças de gado. Em 2024, ele novamente concorre sozinho. Seu patrimônio aumentou para R$ 16,1 milhões.

O político é sócio da Celso Padovani & Cia Ltda., razão social da Pronorte Colonização, uma das principais imobiliárias agrícolas do Mato Grosso. A empresa é ré em uma ação civil pública movida em 2021 pela Força-Tarefa em Defesa da Amazônia (Amazônia Protege). A ação visa a recuperação de 6.117 hectares, desmatados sem autorização no imóvel Projeto Santa Rita, em Marcelândia. A autuação ocorreu em 2007, por fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Segundo o processo, a empresa reincidiu na prática outras duas vezes, entre 2016 e 2018.

A Força-Tarefa solicita a recuperação imediata da área e pede o pagamento de uma multa de R$ 42,3 milhões. A Pronorte, por sua vez, diz que o corte de vegetação foi realizado por arrendatários e compradores dos imóveis do Projeto Santa Rita, e que não é responsável pelo dano ambiental. O processo corre na 1ª Vara Federal Cível e Criminal de Sinop (MT).

Em Querência, Gorgen pagou multa de R$ 1,36 mi por desmatamento

Outro dos Gigantes que voltou para a lista de municípios prioritários do MMA, Querência se alterna entre o domínio de dois fazendeiros. O atual prefeito, Fernando Gorgen (União) está em seu quarto mandato: ele comandou o executivo entre 2005 e 2012 e, após um hiato de quatro anos, voltou em 2016; foi reconduzido em 2020, quando declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma fortuna avaliada em R$ 17,3 milhões. Junto dos irmãos, Gorgen comanda um império agropecuário, encabeçado pelas empresas Chapada Água Azul e Javaés.

Um dos integrantes originais da lista de municípios prioritários do MMA, Querência foi reclassificado em 2011, durante a primeira passagem de Gorgen na prefeitura. Nesse período, ele alcançou uma média de 20 km² desmatados ao ano, tirando o município do inglório “top 20” de maiores desmatadores da Amazônia. Seu sucessor, Gilmar Reinoldo Wentz (MDB), manteve a mesma toada, reduzindo a média para 17 km² ao ano — o equivalente a dez Parques do Ibirapuera, em São Paulo.

Quando Gorgen regressou, em 2016, as taxas passaram a subir, chegando ao pico de 69 km² em 2018. No ano passado, o município perdeu 37 km² de floresta. Embora Querência continue distante dos “líderes”, o aumento lhe valeu o retorno ao PPCDAm.

Foi nesse período que Gorgen e sua família tornaram-se alvo da Operação Polygonum, deflagrada em 2018 pelo Ministério Público do Mato Grosso e pela Delegacia de Meio Ambiente. O prefeito, sua ex-esposa Roseli Zang e os sobrinhos Tiago Gorgen, Fernanda Gorgen Cunha e Franciele Gorgen Jacob foram autuados por desmatar uma área de 5.447 hectares.

O caso ganhou repercussão pela suspeita de envolvimento de um superintendente da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema-MT), que teria fraudado as autorizações de desmatamento expedidas em nome dos Gorgen. O processo foi extinto em 2023 após a família assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), onde se comprometeu a reverter o dano ambiental e a pagar uma multa de R$ 1,36 milhão, quitada em março daquele ano.

Nas eleições de 2024, Fernando Gorgen apoia outro representante do agronegócio, Jean do Coutinho (União). Se eleito, ele será o quarto fazendeiro a comandar Querência, o 61º maior do Brasil. Coutinho disputa contra o ex-prefeito Gilmar Ventz e contra a ex-primeira-dama Roseli Zang.

Nova lista prioritária tem 38 gigantes, oito não firmaram compromisso

Em abril, a ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, lançou o programa União com Municípios pela Redução do Desmatamento e Incêndios Florestais na Amazônia. Pensado como um complemento ao PPCDAm (relançado no ano passado), o novo programa prevê investimentos de R$ 730 milhões em ações de regularização fundiária e ambiental e assistência técnica, visando a ousada meta de zerar o desmatamento na Amazônia até 2030.

Fernando Gorgen (dir.) ao lado do deputado federal José Medeiros e do estadual Gilberto Cattani (com a estampa Agro “Facista”). (Foto: Instagram)

O ato de lançamento em Brasília marcou a divulgação da nova relação de municípios prioritários, que substitui a anterior, de 2021. Agora, são 70 prefeituras listadas, responsáveis por 78,1% do desmatamento na Amazônia entre 2021 e 2022. Dessas, 38 estão na lista dos Gigantes.

Programa União com Municípios amplia para 70 lista de prefeituras prioritárias para ação contra desmatamento e queimadas

Os prefeitos e secretários de Meio Ambiente foram convidados a firmar um convênio com o governo federal para acessar os recursos. Até o momento da publicação deste relatório, 53 municípios haviam aderido ao programa.

Entre os dezessete que não assinaram dentro do prazo inicial, oito integram os Gigantes. Destes, seis possuem secretarias de Meio Ambiente subalternas às pastas de Agricultura e Turismo. São eles: Senador José Porfírio (PA) e os mato-grossenses Apiacás, Colniza, Juína, Paranatinga e Marcelândia, do prefeito “colonizador” Celso Padovani.

Ao longo de quatro meses de pesquisa, De Olho nos Ruralistas tentou contato com as secretarias de Meio Ambiente das cem prefeituras que integram a lista dos Gigantes, solicitando informações sobre a execução do orçamento voltado a ações ambientais e a eficácia dessas políticas. Apenas oito responderam. Uma delas foi Querência, que compartilhou informações sobre as ações ambientais realizadas no município.

Em uma segunda etapa, a equipe de pesquisa enviou perguntas específicas relativas aos casos de irregularidades ambientais apontadas no dossiê, envolvendo catorze prefeitos. Entre eles, os titulares de Marcelândia e Querência. Não houve retorno até o fechamento da reportagem.

Confira vídeo sobre “Os Gigantes”

O território brasileiro comporta quase todo o continente europeu. Um quinto das Américas. É a maior área continental do hemisfério sul. O Oiapoque, no Amapá, está mais próximo do Canadá do que em relação a Chuí, no extremo sul do país. Entre o litoral paraibano, onde se inicia a Rodovia Transamazônica, e Mâncio Lima, na divisa com o Peru, são 4.326 quilômetros — quase a mesma distância entre Lisboa e Moscou.

Entre esses extremos existem 5.568 municípios. Entre eles, desponta um time seleto cujas proporções são comparáveis a países inteiros: os cem maiores municípios do país. O maior deles, Altamira (PA), é maior que a Grécia. Bem maior que Portugal.

“É uma fatia decisiva e esquecida do Brasil”, aponta o diretor do De Olho nos Ruralistas, Alceu Luís Castilho. “Esses municípios costumam ficar fora da cobertura eleitoral, diante da ênfase nos grandes centros urbanos, mas a importância ambiental deles é gigantesca. O impacto deles é planetário”.

Além do dossiê “Os Gigantes”, o observatório publica uma série de vídeos e reportagens detalhando os principais achados do estudo, que mapeia as políticas ambientais dos cem municípios e conta casos emblemáticos de conflitos de interesses envolvendo prefeitos-fazendeiros e a influência de empresas e sindicatos rurais.