General ocupou cargos de alta relevância na Fundação Trompowsky, cujo histórico é marcado por escândalos. Confira
Do Jornal GGN:
General da reserva Sérgio Tavares Carneiro. | Foto: Clube Militar
Ana Gabriela Salesjornalggn@gmail.com
No último dia 31 de março, o Clube Militar do Rio de Janeiro, presidido pelo general da reserva Sérgio Tavares Carneiro, promoveu um almoço para “rememoração” do golpe militar de 1964, ato que gerou forte repúdio por sua natureza antidemocrática.
A escolha da data e a realização do evento em um local de grande simbolismo militar causaram indignação, especialmente considerando o histórico de Carneiro. O general ocupou cargos de alta relevância e chegou a ser o presidente da Fundação Marechal Roberto Trompowsky Leitão de Almeida, ligada ao Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), que esteve no centro de escândalos de corrupção que vieram à tona na última década.
Investigações conduzidas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Ministério Público Federal (MPF) revelaram que a Fundação Trompowsky desviou sua finalidade original para obter contratos milionários com o governo federal, estados, municípios e instituições privadas.
Levantamentos da Agência Sportlight, baseados em dados do Portal da Transparência, apontam que a Fundação Trompowsky firmou contratos que somam mais de R$ 35 milhões apenas com o governo federal, no período entre 1999 e 2017.
Em 2021, a má gestão dos militares levou a entidade à beira da extinção, com dívidas acumuladas que ultrapassaram os R$ 51 milhões. Na época, bens da organização, como computadores e móveis, chegaram a ser penhorados para o pagamento de dívidas trabalhistas. O GGN relembra os escândalos da Fundação Trompowsky, com base nos dados do Sportlight.
R$ 600 milhões em licitação fraudada
Um dos casos mais emblemáticos sobre a Fundação Trompowsky envolve uma licitação de R$ 600 milhões da Secretaria de Meio Ambiente do Pará (SEMA-PA), que a instituição vendeu em 2010.
Para isso, os generais da reserva manipularam o estatuto da fundação, permitindo que ela atuasse na área ambiental. No entanto, o contrato foi anulado pela própria SEMA-PA um ano depois, devido a evidências de fraudes.
A Justiça Federal, após denúncia do MPF, identificou diversas irregularidades na gestão da Fundação Trompowsky, desde desvio de finalidade, desvio de recursos, prática de atos ilícitos e falta de prestação de contas. Em 2014, a fundação foi descredenciada como entidade de apoio ao Exército.
Após as irregularidades serem descobertas, os generais da fundação ainda tentaram transferir o contrato da SEMA-PA para uma empresa recém-criada, a “Ambiente Natural Inspeção Veicular SPE Ltda“, que tinha como sócios ex-diretores da Fundação Trompowsky.
Fraude em concurso em Rio das Ostras escancara impunidade
Em 2011, a Prefeitura de Rio das Ostras também contratou a Fundação Trompowsky, desta vez para organizar um concurso público, mesmo sem a organização ter participado da licitação. A decisão gerou estranheza, com a justificativa de que a fundação apresentava a “melhor proposta técnica e financeira“.
A Fundação Trompowsky recebeu mais de R$6 milhões (90% do valor arrecadado com as inscrições) pelo serviço. No entanto, o concurso foi anulado após denúncia do MPF, que apontou diversas irregularidades, como dispensa de licitação ilegal, fraudes durante as provas e favorecimento pessoal na divulgação dos resultados.
Há um padrão nos casos de corrupção envolvendo as fundações ligadas ao Exército: enquanto outros envolvidos são punidos, os generais escapam de responsabilização direta. No caso do concurso público fraudulento em Rio das Ostras, servidores municipais e a Fundação Trompowsky foram condenados, mas os generais que comandavam a organização não foram responsabilizados individualmente.
A Justiça justificou a ausência de punição aos generais com a alegação de que não havia provas de que eles tivessem participado diretamente das fraudes, induzido outros a cometê-las ou se beneficiado financeiramente do esquema. Assim, a condenação recaiu sobre a fundação como pessoa jurídica e sobre os servidores municipais como pessoas físicas, enquanto os generais ficaram impunes.
Atuação conjunta fraudulenta
Os processos da Fundação Trompowsky também envolvem a Fundação Ricardo Franco, que prestou apoio ao Instituto Militar de Engenharia (IME) e firmou convênios com o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT), quando Tarcísio de Freitas (Republicanos) era ministro da Infraestrutura – caso já exposto pelo jornalista Luís Nassif.
Ainda em 2011, as entidades uniram forças para cometer fraudes em contratos relacionados aos 5º Jogos Mundiais Militares (JMM) no Rio de Janeiro, que custaram R$ 1,27 bilhão aos cofres públicos e serviram como um “laboratório de testes” para os Jogos Olímpicos de 2016, com a participação de empresas e indivíduos envolvidos em ambos os eventos, incluindo membros da “República de Mangaratiba”, grupo ligado ao ex-governador Sérgio Cabral.
Neste caso, o TCU identificou irregularidades como superfaturamento, licitações fraudulentas e desvio de recursos públicos nas obras de reforma e construção de instalações esportivas para o evento.
Dois protagonistas do governo de Jair Bolsonaro (PL), os generais Augusto Heleno e Joaquim Luna e Silva, também foram considerados culpados pelo TCU por irregularidades em convênios com as fundações, embora as multas tenham sido posteriormente anuladas.
Na esfera da Justiça Militar, um Inquérito Policial Militar (IPM) não encontrou indícios de crimes, e o caso foi arquivado.