domingo, 14 de novembro de 2010

O Brasil não se reduziu a duas simples cores



Este desenho, ou infográfico, foi feito por Bruno Barros.


A divisão bicolor do Brasil corresponde à realidade?

Carlos Antonio Fragoso Guimarães

O resultado das urnas não foi algo maniqueisticamente redutível a uma divisão entre Norte/Nordeste e Sul/Sudeste, entre lugares onde ganhou Dilma ou Serra, sem levar em consideração a proporção real de votos dados a um e outro em cada local.

Esse reducionismo simplório entre vermelhos e azuis levou às expressões xenófobas de patricinhas e mauricinhos bem-nascidos mas pouco sábios para entender estatísticas. A vitória azul só podemos dizer que foi completa em dois estados apenas, e ambos do Norte, pois em lugares como o Rio Grande do Sul e mesmo São Paulo, a candidata petista teve votação expressiva, sem falar que estados como Rio de Janeiro e Minas Gerais, até onde se sabe, fazem parte do sudeste. Contudo, o reducionismo midiático, com interesses bem voltados à direita, pintou o mapa do Brasil em duas cores, como se isso resolvesse a situação entre a complexidade do real e os interesses (e preconceitos) que tentam dividir o Brasil e os brasileiros.

A República Proclamada por Acaso




Artigo do jornalista Carlos Chagas

Amanhã é dia de festa, de divulgação de versões patrióticas sobre a Proclamação da República, mas, também, de acertamos contas com a memória nacional.

O saudoso e incomparável Hélio Silva, dos maiores historiadores brasileiros, titulou um de seus múltiplos livros de “A República não viu o amanhecer”. Contou em detalhes, fruto de muita pesquisa, que a República foi proclamada por acaso. As lições daquele episódio não devem ser esquecidas. Vale lembrá-las com outras palavras e um pouquinho de adendos que a gente colhe com o passar do tempo, junto a outros historiadores e, em especial, pela leitura dos jornais da época.

Desde junho que o primeiro-ministro do Império era o Visconde de Ouro Preto. Vetusto, turrão, exprimia os estertores do chamado “poder civil” da época, muito mais poder do que civil, porque concentrado nas mãos da nobreza e dos barões do café, com limitadíssimas relações com o cidadão comum. O Brasil havia saído da Guerra do Paraguai com cicatrizes profundas, a começar pela dívida com a Inglaterra, mas com novos personagens no palco. O principal era o Exército, composto em maioria por cidadãos da classe média, com ênfase para os menos favorecidos. Escravos aos montes também haviam sido libertados para lutar nos pântanos e charcos paraguaios. Nobres lutaram, como Caxias e Osório, mas a maioria era composta daquilo que se formava como o brasileiro médio.

Ouro Preto, como a maior parte da nobreza, ressentia-se daqueles patrícios fardados que começavam a opinar e a participar da vida política. Haviam sido peça fundamental na abolição da escravatura, em 1888. Assim, com o Imperador já pouco interessado no futuro, o governo imperial tratou de limitar os militares. Foram proibidos de manifestações políticas, humilhados e punidos, como Sena Madureira e tantos outros.

Havia, nos quartéis e em certos círculos políticos, um anseio por mudanças. Até o Partido Republicano tinha sido criado no Rio e depois em São Paulo, mas seus integrantes estavam unidos por um denominador comum: República, só depois que o “velho” morresse, pois era queridíssimo pela população. E quem passaria a mandar no Brasil seria um estrangeiro, o Conde d’Eu, francês, marido da sucessora, a princesa Isabel.

Cogitava, aquele poder civil elitista, de dissolver o Exército, restabelecendo o primado da Guarda Nacional, onde os coronéis e altos oficiais careciam de formação militar. Eram fazendeiros, em maioria. Os boatos ganhavam a rua do Ouvidor, no Rio, onde localizavam-se as redações de jornal.

Na tarde de 14 de novembro movimentam-se um regimento e dois batalhões sediados em São Cristóvão. Com canhões e alguma metralha, ocupam o Campo de Santana, defronte ao prédio onde se localizava o ministério da Guerra, na região da hoje Central do Brasil. Declararam-se rebelados e exigiam a substituição do primeiro-ministro, que lá se encontrava com seus companheiros. Comandados por majores, estava criado o impasse: não tinham como invadir o prédio, por falta de um chefe de prestígio, mas não podiam ser expulsos, já que as tropas imperiais postadas nos fundos do ministério não se dispunham a atacá-los. O Secretário-Geral do ministério da Guerra era o marechal Floriano Peixoto, que quando exortado por Ouro Preto a investir à baioneta contra os revoltosos, pois no Paraguai haviam praticado feitos muito mais heróicos, saiu-se com frase que ficou para a História: “Mas no Paraguai, senhor primeiro-ministro, lutávamos contra paraguaios…”

Madrugada do dia 15 e os majores, acampados com a tropa revoltada, lembram-se de que ali perto, numa casinha modesta, morava o marechal Deodoro da Fonseca, há meses perseguido pelo governo imperial, sem comissão e doente. Dias atrás o próprio Deodoro recebera um grupo de republicanos, com Benjamim Constant, Aristides Lobo e outros, aos quais repetira que não contassem com ele para derrubar o Imperador, seu amigo.

Acordado, Deodoro ouve que dali a poucas horas Ouro Preto assinaria decreto dissolvendo o Exército. Não era verdade, mas irrita-se, veste a farda e dispõe-se a liderar a tropa. Não consegue montar a cavalo, tão fraco estava. Entra numa carruagem e acaba no pátio fronteiriço ao ministério da Guerra. Lá, monta um cavalo baio e invade o prédio, com os soldados ao lado, todos gritando “Viva Deodoro! Viva Deodoro!” Saudando-os com o agitar o boné na mão direita, grita “Viva o Imperador! Viva o Imperador!”. Apeia e sobe as escadarias, para considerar Ouro Preto deposto. Repete diversas vezes : “Nós que nos sacrificamos nos pântanos do Paraguai rejeitamos a dissolução do Exército.” Estava com febre de 40 graus. O Visconde, corajoso e cruel, retruca que “maior sacrifício estava fazendo ele ouvindo as baboseiras de Vossa Excelência!” Foi o limite para Deodoro dizer que estava todo mundo preso.

O marechal já ia voltando, o sol ainda não tinha nascido e os republicanos, a seu lado, insistem para que aproveite a oportunidade e determine o fim do Império. Ele reluta. Benjamin Constant lembra que se a República fosse proclamada naquela hora, seria governada por um ditador. E o ditador seria ele, Deodoro. Conta a lenda que os olhos do velho militar se arregalaram, a febre passou e ele desceu ao andar térreo, onde montou outra vez o cavalo baio. A tropa recrudesceu com o “Viva Deodoro! Viva Deodoro!” e ele agradeceu com os gritos de “Viva a República! Viva a República!”

Não havia populares nas proximidades, muito menos operários. Aristides Lobo escreverá depois em suas memórias que “o povo assistiu bestificado a proclamação da República.”

Preso no Paço da Quinta da Boa Vista, com a família, o Imperador teve 48 horas para deixar o Brasil. Deodoro quis votar uma dotação orçamentária para que subsistissem no exílio. D. Pedro II recusou, levando apenas pertences pessoais. A República estava proclamada.

Conta-se o episódio pelo dia que transcorre amanhã, apenas? Não. Conta-se porque a História do Brasil é feita de episódios como esse…

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Uma análise psicológica junguiana do filme Labirinto, a Magia do Tempo, de Jim Henson (1986)




Carlos Antonio Fragoso Guimarães


“Desenvolver a fantasia significa aperfeiçoar a humanidade”.

Carl Gustav Jung



I - Introdução

Este pequeno artigo visa a uma interpretação do filme Labyrinth (no Brasil, Labirinto – A Magia do Tempo) do diretor norte-americano Jim Henson, o criador dos Muppets e da Vila Sezamo.
Em nossa análise, partimos do pressuposto de que a linguagem do filme é de conotação mítica e, como bem expressam os mitólogos, todo o mito possui um significado simbólico e imagético (a linguagem própria da psique profunda) em que se entrelaçam quatro dimensões distintas: o mito trata de uma visão simbólica sobre os processos de desenvolvimento das forças psíquicas internas próprias do ser humano. Essas forças precisam, para se atualizar, de se enfrentar com os aspectos sociais que se apresentam historicamente, ao mesmo tempo que fazem referência às forças inerentes aos inconsciente e às pulsões mais básicas do ser humano ( a floresta ou o oceano dos contos de fadas populares ), que são as raízes que ligam o ser às estruturas evolutivas estimuladas pelo próprio ambiente e o cosmos inteiro. Nesse sentido, o filme de Henson parece, quer seus autores tivessem ou não consciência disto – o produtor do filme, George Lucas, da série Guerra nas Estrelas, foi profundamente influenciado pelos estudos em mitologia de Joseph Campbell - refletir o esquema básico da mitologia conhecido como A Jornada do Herói – no caso do filme em questão, da Heroína, que parte de um estado de consciência imatura, passa por desafios, e retorna mais amadurecida, com uma nova percepção de si mesma e da vida.

II – A Jornada da Heroína

O psicanalista e psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) foi um dos mais importantes estudiosos a se debruçar sobre os aspectos psicológicos dos mitos no século XX. Ele demonstrou que a linguagem mais profunda da psique se expressa simbolicamente e que os mitos, que são frutos da criação coletiva, apontam para aspectos do desenvolvimento humano expressos de modo simbólico através do imaginário.
Suas idéias foram retomadas e desenvolvidas por pesquisadores como Mircea Eliade e Joseph Campbell. Ambos dirão quase a mesa coisa: “as imagens e símbolos expressam as mais profundas modalidades do ser” (ELIADE, 1996), ou, como diz Campbell, os contos e histórias que tem como base uma figura heróica – que não necessariamente precisa ser um indivíduo, mas também pode ser um grupo de pessoas – expressam figuradamente as capacidades de superação e transcendência presentes em todos. Isso lembra os conceitos de processo de individuação, de Jung, ou da confiança básica dos psicólogos humanistas na capacidade de auto-atualização ou auto-realização, como postulam Carl Rogers e Abraham Maslow. Deste modo, costumava dizer Campbell que, em havendo condições favoráveis mínimas, cada pessoa poderá ter a chance de desenvolver suas capacidades a partir dos desafios da vida, como ocorrem nos diferentes mitos do herói:

“Siga sua bem-aventurança até lá, onde há um profundo sentido do seu ser, lá onde seu corpo e sua alma querem ir. Quando você alcançar essa sensação, fique aí e não deixe ninguém arrancá-lo desse lugar. E portas se abrirão onde você nem sequer imaginava que pudesse haver algo."

Em uma análise mais psicológica, Jung dirá que o herói de um conto ou mito é o ego que se vê repentinamente envolto em desafios de toda a ordem, freqüentemente para lhe fazer ver que o mundo é mais amplo e mais dinâmico do que ele imagina. Muitos dos desafios e monstros de sua jornada advém do seu meio, mas eles estão ligados igualmente às forças internas do inconsciente. Deste modo, parte da força que o Ego percebe serem externas são, de fato, projeções de elementos que o próprio sujeito possui e de que seu ego não faz idéia, elementos esses - como coragem, generosidade, compaixão – que só se sabe que se tem diante de desafios.

Neste sentido, o filme de Henson expressa à perfeição essa jornada de auto-conhecimento e maturação. Talvez isso explique, em grande parte, o fascínio deste filme que, apesar de não ter sido um sucesso de bilheteria à época de seu lançamento (1986) se transformou em um Cult, marcou a infância e a adolescência de muita gente e vem se consolidando com uma legião de aficcionados que vem crescendo neste últimos 24 anos.

III – Sinopse da história e interpretação do seu significado.

A jovem Sarah Williams (interpretada pela belíssima Jennifer Connelly que, à época, ainda não tinha completado 15 anos), é uma garota sensível, que adora os personagens do livro Labyrinth. O filme inicia-se com Sarah, vestida ao estilo medieval, citando os trechos finais do livro.
Logo depois, ao badalar do relógio, a jovem é despertada de seu mundo de fantasia e ficamos sabemos que Sarah é uma jovem adolescente órfã de mãe e que se sente ofendida pela madrasta, que a faz ficar em casa tomando conta de seu meio irmão Toby, enquanto ela e o pai saem para se divertir. Sarah se acha impedida de ter vida própria (não é isso o que sete a maioria dos adolescentes, que se vêm crescidos demais para serem vistos como crianças, mas ainda jovens demais para terem a liberdade que sonham?) e, inevitavelmente, culpará os pais e o irmãozinho de menos de dois anos por isso.
A ver que um de seus ursinhos estava faltando em seu quarto, Sarah corre ao quarto do irmão e, irada, pega o ursinho do chão, afirmando que odeia o bebê. Ao mesmo tempo, devido à tempestade que cai lá fora, o bebê, visivelmente assustado com os trovões e relâmpagos, chora desesperadamente. Sarah começa a desabafar contando a história de uma linda garota que era obrigada a cuidar de seu irmão menor. Não agüentando mais o choro do bebê ela expressa o desejo de que o rei dos Gnomos, Jareth (interpretado pelo famoso roqueiro David Bowie) viesse e levasse o irmão para seu reino mágico. E é exatamente o que acontece. Ao agir assim, Sarah demonstra ser como todos os heróis: uma pessoa imperfeita, falível, mas que reconhece seu próprio erro. Ou seja, estava pronta pela vida (e pelo destino) a adentrar em uma aventura que permitesse amadurecer suas qualidades positivas, apesar de seus traços ainda infantis, psicologicamente falando.

É assim que, arrependida do que desejou, Sarah implora ao Rei dos Duendes (que demonstra uma clara “queda” pela mocinha) que devolva o irmãozinho. Jareth de início tenta convencer Sarah, por meio de um afago ao ego, de que estar sem o irmão traria vantagens para ela. Sarah, contudo, já despertou o suficiente para superar essa tentação e implora pela volta do irmão. Jareth então diz que ela o terá de volta se conseguir, dentro de 13 horas (e ai vemos o tempo psicológico transcendendo o tempo cronológico. São 13 horas porque no mundo do desenvolvimento interno o tempo não segue o padrão do relógio que, como sabemos, marca apenas doze horas em seu mostrador), chegar ao centro do labirinto mágico, onde está seu castelo, ladeado pela cidade dos gnomos ou duendes. Vemos que a aventura de Sarah se dá em um espaço diferente do trivial, o espaço da significação psicológica, com características próprias. A busca pelo irmão no centro do labirinto é o caminho de reconhecimento de suas próprias capacidade. Sarah busca o centro do labirinto e, com isso, caminha ao reconhecimento de seu próprio Self, seu centro interno, sua essência.
Sarah recebe o chamado da aventura e não o recusa. Ela assume sua decisão de ir em busca do irmão, passando por inúmeros perigos e dificuldades, mas que a fará conhecer amigos e ajudantes pelo caminho, como o aparentemente inútil Hogle, o afetuoso grandalhão Ludo e o espevitado Fox Terrier Sir Dydimus. Ou seja, ela adentra no modelo do herói: por escolhas acaba por cair em uma aventura e se lança em busca em meio desconhecido, o labirinto, onde passará por dificuldades e enfrentará os perigos até se encontrar, finalmente, com seu grande rival, Jareth, encontrando, pelo caminho, ajuda improváveis.

Cada uma dessas estranhas criaturas ajuda Sarah a entender parte de sua própria realidade e capacidade íntima.

No final, Jareth, aparentemente querendo fazer o mal, é como Mefistófeles no Fausto de Goethe: por mais que queira fazer o mal, acaba por fazer o bem. Jareth é a representação das projeções da própria Sarah, sua sombra, sua personificação de capacidades boas e más. No final, Jareth é seu professor. Poderia, como tenta, fazer Sarah fracassar em seu processo de individuação, quando ele mais uma vez a tenta ao dizer que daria tudo o que ela mais desejasse se ela o amasse e obedecesse. Sarah, contudo, aprendeu com sua viagem por este mundo que esta promessa era mais uma armadilha. Muita gente que assistiu o filme sonha ou desejava que a menina aceitasse o convite de Jareth, o que equivaleria a vender sua alma. Mas a moça integrou a força sedutora dos arquétipos em si, fortaleceu o Ego (que não é mais egoísta) e triunfa do último grande desafio que lhe foi dado: a tentação de viver fora do mundo real (o que derruba muita gente no universo da fantasia com traços da loucura).

Quando, finalmente, Sarah reconhece, na cena do enfrentamento final, que Jareth não tem poderes sobre ela, ela o derrota – ela integrou os aspectos de seu próprio inconsciente, reconhecendo que os poderes do rival são dela mesma – e, supera seu erro e sai da experiência triunfante e amadurecia, renovada e possuidora de um novo patamar de identidade.
O incrível é que essa mesma sensação de completude e alegria atinge uma parte grande das pessoas que assistem o filme, jovens e adultos, indicando que ele desperta nos mesmos uma empatia inconsciente com a personagem central.
A jornada de Sarah pelo labirinto é uma metáfora da jornada ao auto-conhecimento que todos nós somos convidados a fazer pela vida, mas que poucos têm coragem de aceitar.

FICHA TÉCNICA
Diretor: Jim Henson
Elenco: David Bowie, Jennifer Connelly, Toby Froud, Brian Henson, Shelley Thompson, Christopher Malcolm, Natalie Finland, Ron Mueck, Daivd Barclay.
Produção: David Lazer, Eric Rattray.
Roteiro: Lewis John Carlino, Jim Henson, Edward C. Hume, Terry Jones, John Varley.
Fotografia: Alex Thomson
Trilha Sonora: Trevor Jones
Duração: 101 min.
Ano: 1986
País: EUA – Reino Unido
Gênero: Aventura Fantasia


João Pessoa, 05 de novembro de 2010

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Tudo é uma questão de percepção


Carlos Antonio Fragoso Guimarães


Acho, como dizia Nietzsche, que ao contrário do que pensam os empiristas e positivistas, nosso saber não fala ou discorre sobre fatos, mas são nossas criações aceitas em grupo interpretações puramente mentais, ou seja, são nossas interpretações sobre os fatos tudo o que temos. Se isto nos aproxima mais ou menos na verdade? Vai depender, mas mais do que isso, esse conhecimento intelectual só valerá a pena se nos ajudar a nos sentirmos vivos e em paz conosco e com nossos semelhantes.

Nos dizeres de Fernando Pessoa (lembrando Buda), resgatando a psicologia da Gestalt:

A vida é para nós o que concebemos dela. Para o rústico cujo campo lhe é tudo, esse campo é um império. Para o César cujo império lhe ainda é pouco, esse império é um campo. O pobre possui um império; o grande possui um campo. Na verdade, não possuímos mais que as nossas próprias sensações; nelas, pois, que não no que elas vêem, temos que fundamentar a realidade da nossa vida.

A diferença entre o conhecimento e a sabedoria


Não se deve confundir jamais conhecimento com sabedoria. Um o ajuda a ganhar a vida; o outro a construir uma Vida.

Sandra Carey

A função do esquecimento...


Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito.


Machado de Assis

Não acredite, vivencie...



Não acredite em algo simplesmente porque ouviu. Não acredite em algo simplesmente porque todos falam a respeito. Não acredite em algo simplesmente porque esta escrito em seus livros religiosos. Não acredite em algo só porque seus professores e mestres dizem que é verdade. Não acredite em tradições só porque foram passadas de geração em geração. Mas depois de muita análise e observação, se você vê que algo concorda com a razão, e que conduz ao bem e beneficio de todos, aceite-o e viva-o.

Sidarta Gautama, o Buda

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A vitória da luta contra a hipocrisia



Carlos Antonio Fragoso Guimarães

A vitória de ontem, dia 31 de outubro de 2010, não foi só de Dilma Rousseff ou de Lula, ou dos simpatizantes de sua linha política, ou dos que se dizem de esquerda. Não.

Foi muito mais do que isso. Foi a vitória de uma resistência aos poderes e interesses de quem detém grande capital, o mesmo que financia certas famílias que dominam praticamente o monopólio da comunicação, e que demonstrou sua face tendenciosa nos factóides de grande circulação impressa (a família Civita com a sujíssima Veja, por exemplo), ou televisiva ( tanto a Vênus Platinada nas mãos dos Marinhos como quase todas as demais emissoras tinham, por interesse próprio ligados ao mercado, dado sua contribuição para alavancar a candidatura neoliberal do oponente).

Foi até mais do que isso. Foi a vitória contra a hipocrisia conservadorista, quer em cores religiosas (de evangélicos radicais a católicos ultra-conservadores), contra o machismo, contra a arrogância de uma elite que vive de ganhos em cima da exploração do trabalho e da mega-especulação (ainda que as surreais taxas de juros nas alturas seja uma contribuição do atual governo a estes mesmos vampiros que tanto quiseram derrubar a candidatura da outrora guerrilheira contra a ditadura), a mesma pequena elite que se acha acima, entre os seus, dos demais brasileiros, vistos e entendidos como "ignorantes" e "atrasados". Enfim, foi a vitória de uma população que começa a despertar para o poder que tem diante da força do voto ante os cantos de sereia e efemeridades de fogos de artifícios políticos...

O refugo da campanha de acirrado ódio e preconceito, por parte dos partidários da direita neoliberal, fica patente nos dizeres "explicativos" dada pelo PiG para a vitória de Dilma: uma "divisão" entre o "sul maravilha", rico, "esclarecido" e o restante do Brasil:

O preconceito que se esconde por trás do mapa vermelho e azul

por Luiz Carlos Azenha

Nem de longe é uma tentativa majoritária. E a imensa maioria dos analistas tem dito isso: o mapa que divide o Brasil entre azul e vermelho não conta toda a história da escolha de Dilma Rousseff.
Mas o mapinha simplório e simplista serve aos que pretendem ligar Dilma Rousseff ao suposto “atraso” das regiões Norte e Nordeste. O preconceito sempre dá um jeito de reaparecer, sob outros disfarces.
Dilma teve 58% dos votos de Minas Gerais, mais de 60% dos votos do Rio de Janeiro, quase 50% dos votos no Rio Grande do Sul e quase 46% dos votos em São Paulo.
Se todos os votos dos dois candidatos no Nordeste fossem descartados, ainda assim Dilma venceria a eleição, mas dizer isso assim pode soar — ao gosto dos que semeiam preconceitos — como desqualificação do voto do nordestino.
Individualmente, os governadores Eduardo Campos, Jacques Vagner, Sergio Cabral, Cid Gomes, Sarney e o vice-presidente José Alencar foram os grandes cabos eleitorais de Dilma.
Quanto ao preconceito, foi o alimento de uma das candidaturas e não há de desaparecer assim, por encanto. Neste momento, serve às tentativas de “deslegitimar” o resultado das eleições.



Portanto, agora, a ex-guerrilheira terá de se preparar para a vingança do Pig (partido da imprensa golpista), que não costuma perdoar seus inimigos. Veja-se, como bem mostra Paulo Henrique Amorim em seu blog Conversa Afiada, que já começou a reação na tentativa de desconstruir a figura de Dilma como pessoa atuante... Para eles, a vitória não é de Dilma, mas de Lula.

Diz a manchete do Globo: Lula elege Dilma e aliados já articulam sua volta em 2014.

Ou seja, para eles, como bem destaca Paulo Henrique Amorim, Dilma não é nada. Ela, para eles, não passa de um fantoche, uma interina para Lula ou uma pedra no caminho da volta ao poder explícito dos descendentes dos antigos senhores do café.

Mas não se pode dizer de um fantoche a sua presença brilhante no segundo turno, sua coragem, demonstrada na juventude enfrentando paus-de-arara, não correndo de denúncias ou enfrentando um câncer em pleno ano eleitoral.

O que será seu governo, o tempo irá dizer. Erros e acertos são inevitáveis como igualmente inevitável é a articulação da direita conservadora para minar seu governo antes mesmo de o começar... Na verdade, temem que ela seja mais ideologicamente atrelada à crítica do status quo, das benesses sempre crescente de uma minoria, muito mais resistente a isso que o atual presidente. E isso, vindo de uma MULHER, eles, claro, não vão suportar.

Portanto, a mesma elite que aplaudiu o golpe de 64 também aplaudiu a Veja e a Globo no novo modo de tortura: os ataques baixos. Diz Mino Carta, o criador da Revista Veja em seus áureos tempos de fins dos anos sessenta (há tanto tempo perdido), agora em editorial da revista Carta Capital, onde atua hoje:

"Nos porões do regime dos gendarmes da chamada elite, Dilma Rousseff foi encarcerada e brutalmente torturada. Poderia ter sofrido o mesmo fim de Vlado Herzog, que os jornalistas não se esquecem de recordar todo ano.
Mas a hipocrisia da mídia não tem limites, com a contribuição da
ferocidade que imperou na internet ao sabor da campanha de ódio nunca tão capilar e agressiva. E na moldura cabe à perfeição a questão do aborto, praticado à vontade pelas privilegiadas e, ao que se diz, pela própria esposa de José Serra, e negado às desvalidas sem assistência.
Até o papa alemão a presidente recém-eleita teve de enfrentar. Ao se encontrar já nos momentos finais da campanha com um grupo de bispos nordestinos, Ratzinger convidou-os a orientar os cidadãos contra quem não respeita a vida, clara referência à questão que, lamentavelmente, invadiu as primeiras páginas, as capas, os noticiários da tevê. Parece até que Bento XVI não sabe que o Vaticano fica na Itália, onde o aborto foi descriminalizado há 40 anos."


Já começou, portanto, a guerra contra a presidenta Dilma antes mesmos dos resultados oficiais das eleições - aliás, muitissimo antes disto.

O Capital não tolera inovações, especialmente as que possam potencialmente contrariar seus interesses. Mas hoje não é mais os gritos e letras garrafais da mídia, do caledoscópio editado do quarto poder ou dos assim pagos "formadores de opinião" os que modificam percepções em prol do mercado... Hoje as pessoas percebem onde se faz, de fato melhoras e onde se percebe, de fato, o momento em que o Brasil passa a ser reconhecido no exterior.

Dilma aguentou perseguições, choques, espancamentos e venceu, ao contrário de um outro que quis se fazer de vítima de uma bola de papel com amplo apoio da mídia...

Brasil, acorde este gigante adormecido. Seu povo é esse gigante que inicia o despertar!