domingo, 31 de maio de 2015

As Caras do Brasil: Havelange, Zé Maria Marin, Eduardo Cunha e o Parlashopping, por Jânio de Freitas






JANIO DE FREITAS, HOJE, NA FOLHA

Caras do Brasil

Da arquibancada ao poder econômico, o maior por aqui, Havelange e Teixeira faziam uma síntese perfeita do país
Muito mais do que mostrar o que tem sido a cúpula do futebol no mundo, o escândalo da Fifa mostra ao mundo o que é o Brasil. Como se ainda fosse necessário fazê-lo.
A Fifa, que recebe aqui o tratamento apropriado para os covis, baniu dos seus quadros, há muito tempo, os ilustres brasileiros João Havelange e Ricardo Teixeira, seu ex-presidente e o ex-conselheiro por ela declarados catadores de suborno e de outros modos de corrupção. Nem depois disso a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público (o Federal e o do Rio) foram capazes de dar aos dois as consequências da lei. Ambos enriquecidos, muito antes de chegarem aos balcões internacionais, aqui mesmo na CBD/CBF.
A aparência é de que Ricardo Teixeira tratou de escapar para Miami. Mas não o fez, de fato, senão para as delícias de que desfruta em sua mansão. Os vários processos que ainda tem no Brasil jamais o incomodaram, tal como os anteriores. Havelange tornou sua velhice suportável em um dos prédios magníficos de São Conrado. A rejeição da Fifa não chegou ao prestígio social de ambos.
Da arquibancada ao poder econômico, que é o maior poder por aqui, Havelange e Ricardo Teixeira faziam uma síntese perfeita e discreta do Brasil. José Maria Marin, o mau discípulo, escancarou. Já se percebe que as autoridades brasileiras sentem necessidade de adotar iniciativas. Deve ser o melhor que pode acontecer a Marin.
PARLASHOPPING
Eduardo Cunha providenciou a inclusão, na medida provisória 668 sobre alíquotas do PIS-Pasep, da construção do shopping do Congresso. O Senado seguiu a Câmara e aprovou toda a MP. Mas Eduardo Cunha fica irritado quando essa sua obsessão é chamada de shopping e, pior ainda, já apelidada de parlashopping.
No entanto, é só isso mesmo. Uma obra que, sem ter projeto, já tem o custo calculado em R$ 1 bilhão, com gabinetes desnecessários e amplos como desejado pelos deputados, e lojas, lojas e mais lojas.
Duas imoralidades em uma: o contrabando do shopping na MP e a sua aprovação pela Câmara e pelo Senado, que aprovam, sob o falso nome de ajuste, medidas perversamente prejudiciais aos assalariados, aos aposentados, à Educação e à Saúde.
Diante da indignação que a presença e aprovação do shopping causou em alguns senadores, e prevenindo reação forte (que não houve) da imprensa, Renan Calheiros recorreu ao seu experiente escapismo: "Isso é da autonomia da Câmara".
Não é verdade. Tanto que foi à votação do Senado. Onde Renan Calheiros contribuiu para o truque de votar a MP perto do prazo em que caducaria: se feita alteração no Senado, deveria voltar à apreciação pela Câmara, e ocorreria a extinção do prazo.
Em seu exaltado discurso contra o golpe do shopping e contra o próprio, disse o senador Jader Barbalho que "só falta uma medida provisória que inclua a construção de um motel". Não haverá, talvez, porque é desnecessária: para a mesma finalidade são usados os gabinetes.
SEM MÁSCARA
Na hora da verdade, o chão do plenário da Câmara ficou repleto de máscaras de bem-intencionado. O PSDB e seu líder, Carlos Sampaio, deixaram cair 46 de uma vez com esses votos pela permanência do dinheiro de empresas para financiar candidatos --a velha causa da corrupção mais devastadora.
Entre as propostas de "reforma" ainda a serem votadas, uma pretende estapafúrdia redução da idade mínima para senador: de 35 para 29 anos. Só podia ser coisa de má-fé, mas o que seria? A repórter Júnia Gama descobriu.
Não lhe bastando prestar-se ao serviço de substituir o relator Marcelo Castro, destituído por não fazer o relatório como desejado por Eduardo Cunha, o deputado Rodrigo Maia se dispôs a outro serviço deplorável.
Como não chegará aos 35 anos para candidatar-se ao Senado nas próximas eleições, o milionário deputado paraibano Wilson Filho conseguiu que Rodrigo Maia proponha, como relator, a redução da idade mínima de governadores e seus vices, de 30 para 29. E no bolo inclua os senadores.
Rodrigo Maia (de Cesar Maia) é o apagado líder do fosco DEM. Deve ter recebido uma quantidade grande de argumentos para servir ao petebista paraibano.

Era um ser singular que conseguiu da alienação e manipulação consumista escapar



Era um ser singular que conseguiu da alienação e manipulação consumista escapar


Carlitos era um ser singular
Que não buscava a todos agradar
Se com isto tivesse que se anular...
   
   Por não querer aparentar
   Já não sofria da neura de comprar...
   Por achar que todos deveriam viver
   Não julgava quem de muito não parecia ter

  Mas por ser assim tão singular
  Carlitos começou a incomodar
  E logo pretensos "formadores de opinião"
  Passaram logo a o julgar

   "Como pode alguém aparentar tanta simplicidade?"
    Diziam midiáticos e,  de revistas e jornais, pseudo-sábios,
    "Tudo isso cheira a grande falsidade"
    Falavam políticos e empresários

  E logo a massa dos midiotas passaram a gritar
  Que Carlitos era um comuna e um perigo
  Da "boa sociedade" Carlitos agora era o inimigo
  Que deveria, por isso, ser espancado, maltratado
  Pois só um louco perigoso ousaria viver contra o modelo estabelecido....

Carlos Antonio Fragoso Guimarães




sábado, 30 de maio de 2015

Russo, o antigo assistente do Chacrinha, dos Trapalhões, de Xuxa, do Jô e outros globais, fez um curto vídeo crítico das maldades da Vênus Platinada em seus 50 anos de manipulação, golpismo e alienação




  Vejam toda a maldade da Rede Globo, a manipuladora e sempre golpista, na crítica silenciosa feita em video feita por Russo, 45 anos de casa e jogado fora sem mais nem menos, pela grande empresa falseada em defensora da "liberdade de expressão"  :



sexta-feira, 29 de maio de 2015

O mal que a Bancada Evangélica faz: o médico e deputado (que é evangélico) Carlos Bezerra Jr. escreve e descreve "Quando a fé cheira a pólvora"



Quando a fé cheira a pólvora




Artigo de Carlos Bezerra Jr. publicado na Folha de São Paulo em 26 de maio de 2015


Há alguns dias, recebi pelas redes sociais a imagem de uma Bíblia aberta com um revólver em cima. Fiquei estarrecido porque a postagem trazia a logomarca de um deputado federal e usava um versículo do livro de Êxodo para justificar projeto que aumenta de seis para nove o número de armas por cidadão e o número de munições de 50 por ano para 50 por mês.

Segundo o relatório da CPI do Tráfico de Armas da Câmara Federal, em 2006, "55% das armas rastreadas a partir das informações de venda das fábricas brasileiras foram legalmente vendidas antes de caírem na ilegalidade".

O Mapa da Violência 2013, de Julio Waiselfisz, feito com dados do Ministério da Saúde, indica que, de 1980 a 2010, morreram quase 800 mil pessoas por arma de fogo no Brasil. Não há base bíblica que sustente turbinar esses números.

Há outros casos preocupantes. No âmbito federal, parlamentares da chamada bancada evangélica têm se unido a ruralistas e à denominada bancada da bala contra a Lista Suja do Trabalho Escravo – um dos principais mecanismos de luta contra esse tipo de crime – e estão a favor da transferência da demarcação de terras indígenas do Executivo para o Legislativo.

Os deputados da "bancada evangélica" também estão entre os principais defensores da redução da maioridade penal, contra o que disseram as ONGs cristãs Visão Mundial e Rede Evangélica Nacional de Ação Social, em audiência pública que promovi na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Essas duas organizações cristãs concordam com as exposições da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Associação Paulista do Ministério Público, Defensoria Pública de São Paulo, Fundação Casa e Fundação Abrinq - Save the Children.

Faltaria espaço nesta página se fossem elencados os absurdos legislativos nascidos da leitura obtusa do Velho Testamento. Associar trechos da Bíblia fora de contexto a posturas policialescas, moralismo e populismo é das receitas mais antigas para causar tragédias.

Nós, cristãos protestantes, vítimas históricas dessa prática, temos a responsabilidade de não permitir que isso seja feito em nosso nome e de forma tão insistente que começa a gerar estigmatização.

Cria-se um estereótipo tão pesado que já vi questionarem, por exemplo, se evangélicos têm capacidade de atuar na defesa dos direitos humanos e civis, como se fosse possível negar a história de cristãos como William Wilberforce, Martin Luther King e Desmond Tutu.

São histórias humanas de luta, mas não de vingança, jamais de violência gratuita ou de ódio. Pela ética do Sermão da Montanha, são infelizes os justiceiros e os vingadores. Bem-aventurados são os pacificadores, os que enxergam que a violência é a doença, não a cura.

Entristece, mas não espanta, a existência dos que dizem seguir o Mestre que pregava a paz, o perdão, a misericórdia, a compaixão e a vida, mas se notabilizam por fomentar o ódio, a vingança, a intolerância e o medo. É um comportamento milenar, descrito pelo próprio Jesus na Bíblia.

No Evangelho de Mateus, Ele fala dos que seguem detalhes milimétricos, como o dízimo dos temperos, mas não obedecem aos mandamentos mais importantes, como o amor ao próximo e a justiça. Não os chama de seguidores, mas de hipócritas, oito vezes só no capítulo 23.

Segundo o teólogo anglicano John Stott, "a mente bíblica não é a que cita versículos, mas a que raciocina dentro dos parâmetros das Escrituras". Recomendo fortemente a leitura a certos deputados da "bancada evangélica".

O circo armado do retrocesso faz um sucesso retumbante, mas não tem nada de bíblico muito menos de evangélico, é simplesmente o "business" do ódio.

CARLOS BEZERRA JR., 47, médico, é deputado estadual pelo PSDB-SP e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo

quarta-feira, 27 de maio de 2015

A importância e atualidade de Paulo Freire







  “A partir de uma concepção educativa própria, que cruza a teoria social, o compromisso moral e a participação política, Paulo Freire é, ele próprio, um patrimônio incontornável da reflexão pedagógica atual”, afirma António Nóvoa, professor da Universidade de Lisboa (Portugal), autor de diversas obras científicas no domínio da Educação. Para ele, a vida e a obra de Freire constituem uma referência obrigatória para várias gerações de educadores.

Segue texto de  Lisete Areralo, professora da USP, extraído do site da Carta Fundamental:

A importância de Paulo Freire

A atualidade do pensamento pedagógico transformador do educador brasileiro mais conhecido do mundo

Por Lisete Arelaro*
  A atualidade do pensamento de Paulo Freire vem sendo atestada pela multiplicidade de experiências que se desenvolvem tomando o seu pensamento como referência, em diferentes áreas do conhecimento e em diferentes países do mundo. 

  Intelectual chamado de “educador popular” é o professor brasileiro mais conhecido no mundo. Foi criador de uma teoria epistemológica de aprendizagem que grande parte das publicações denomina de Método Paulo Freire, e é também o cidadão brasileiro mais condecorado do País. Foram 39 títulos de Doutor Honoris Causa – 34 em vida e cinco in memoriam – e mais de 150 títulos honoríficos e/ou medalhas. Em 2012, foi declarado Patrono da Educação Brasileira, por meio da Lei Federal nº 12.612, de 13/4/2012.

  Paulo Freire escreveu mais de 20 livros como único autor e 13 em coautoria. Seu livro mais importante, Pedagogia do Oprimido, foi traduzido em mais de 20 idiomas e, somente em inglês, já foram publicados mais de 500 mil exemplares. Seu livro Pedagogia da Autonomia – Saberes Necessários à Prática Educativa vendeu mais de 1 milhão de exemplares. Seus livros são comercializados em 80 países, podendo-se afirmar, em razão disso, que ele é o educador brasileiro mais lido no mundo.

  Tal projeção confere ao conjunto de suas produções o caráter de uma obra universal, que vem sendo destacada na literatura, nos depoimentos de importantes autores, em diferentes países, e no crescente número de pesquisas que se referenciam na matriz de pensamento de Paulo Freire.
Michael W. Apple, professor da Universidade de Wisconsin – Madison, um dos mais conhecidos especialistas internacionais na área do currículo e na análise das políticas educacionais e um dos principais difusores do pensamento freireano nos Estados Unidos, destaca que as numerosas obras de Freire serviram de referência a várias gerações de trabalho educacional crítico. 

  Para António Nóvoa, professor da Universidade de Lisboa, Portugal, autor de diversas obras científicas no domínio da Educação, a vida e a obra de Freire constituem uma referência obrigatória para várias gerações de educadores. As propostas por ele lançadas foram sendo apropriadas por grupos distintos, que as relocalizaram em vários contextos sociais e políticos. “A partir de uma concepção educativa própria, que cruza a teoria social, o compromisso moral e a participação política, Paulo Freire é, ele próprio, um patrimônio incontornável da reflexão pedagógica atual. Sua obra funciona como uma espécie de consciência crítica, que nos põe em guarda contra a despolitização do pensamento educativo e da reflexão pedagógica.”

  Na área acadêmica, a última década revela grande interesse e ampliação de trabalhos sobre e a partir do pensamento freireano. Em recente pesquisa realizada no Portal da Capes (SAUL e SILVA, 2008) constatou-se, no período 1987-2007, um total de 804 produções – dissertações e teses – defendidas, que utilizaram o referencial freireano em diferentes áreas do conhecimento. 
No entanto, é importante destacar alguns aspectos de sua teoria epistemológica, para que os que nunca leram Paulo Freire se sintam motivados a fazê-lo. Dentre tantos aspectos, destacamos de sua teoria: a crítica à educação bancária; a educação crítica como prática da liberdade; a defesa da educação como ato dialógico; a necessidade de o professor ser pesquisador e ter rigor científico nas suas aulas; a problematização e a interdisciplinaridade no ato educativo e a noção de ciência aberta às necessidades populares.

  Freire apresenta, em amplo acervo teórico, reflexões que apontam para a importância de uma educação que parta das necessidades populares como prática de liberdade e de emancipação das pessoas, e não de categorias abstratas. Para ele, a educação requer, de forma permanente: a) O cultivo da curiosidade; b) As práticas horizontais mediadas pelo diálogo; c) Os atos de leitura do mundo; d) A problematização desse mundo; e) A ampliação do conhecimento que cada um detém sobre o mundo problematizado; f) A interligação dos conteúdos apreendidos; g) O compartilhamento do mundo conhecido a partir do processo de construção e reconstrução do conhecimento.

  Suas obras são críticas, mas cheias de esperança porque o homem e a mulher, como seres inconclusos, sempre podem aprender mais e mudar a sua realidade e a do mundo. Não há destino. Ninguém aprende sozinho, aprende-se em comunhão. E isso se faz nas práxis da ação, reflexão e ação. Por isso, ele nos lembrava: “O mundo não é, ele está sendo”.

  É importante registrar, também, a ampliação do número, na última década, de Institutos e Cátedras Paulo Freire em vários países do mundo, entre os quais estão Portugal, Espanha, Itália, Peru, México, Colômbia, Estados Unidos e Brasil. Essas instituições, sediadas ou não em espaços acadêmicos, têm realizado eventos de caráter internacional para o aprofundamento e divulgação do pensamento freireano.

  Será que todos esses professores, intelectuais e movimentos sociais são comunistas? 

* Liste Arelalo é professora titular do Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação da Faculdade de Educação da USP

segunda-feira, 25 de maio de 2015

O pensador Edgar Morin integra frente de intelectuais franceses contra a 'barbárie da sonegação, do cálculo e dos juros' representado pelo Escândalo HSBC. Enquanto isso, a grande mídia, envolvida ela mesma e seus patrocinadores no escândalo, abafa o caso.





  Ao contrário do que dizem certos Coxinhas golpistas que, no protesto orquestrado do dia 12 de abril apresentaram cartazes dizendo, entre outras pérolas, que "Sonegação não é Crime", pessoas civilizadas dizem exatamente o oposto:  Sonegação é sim CRIME! Aprendam! O Brasil ocupa o 4º lugar entre os sonegadores do HSBC, envolvendo gente de mídia e donos da grande imprensa, além de empresários e políticos, e a mesma grande mídia, comprometida, mantém silêncio obsequioso... Vejamos como agem as pessoas daquele "primeiro mundo" que eles tanto admiram diante de fatos assim:

Edgar Morin integra frente de intelectuais franceses contra a 'barbárie da sonegação'

 'Devemos resistir a uma forma de barbárie que é gelada: a barbárie do cálculo e dos juros. Sou contra a sonegação e os procedimentos do HSBC'


    Antoine Peillon, do La Croix
Paolo Sacchi


  Desde o dia 12 de fevereiro, o inquérito sobre o "furto coletivo" de oito cadeiras da agência do HSBC em Bayonne (na parte francesa do País basco) enfrenta dificuldades aparentemente intransponíveis.

   No dia 18 de fevereiro, três destas cadeiras foram encontradas durante uma ação de busca e apreensão na sede da organização ambientalista Bizi ("Viver" em basco).

  A associação havia realizado, em plena luz do dia e com rostos descobertos, uma "requisição cidadã" de móveis daquela agência em protesto contra o esquema de evasão fiscal organizada pelo banco HSBC, no montante de 180 bilhões de euros – o crime financeiro revelado alguns dias antes, no chamado caso Swissleaks.

  Até hoje, cinco das cadeiras ainda não foram encontradas, apesar dos esforços da polícia: ativistas do Bizi foram intimados, sofreram duros interrogatórios e tiveram que fazer exames de DNA.

  “Recursos inacreditáveis” para encontrar as cadeiras (ou toda a proteção aos bancos)

  Em 31 de março, Txetx Etcheverry, um dos fundadores da associação basca, foi ouvido pela terceira vez pela polícia sobre a ocultação das cinco cadeiras, de que são acusados outros militantes como Thomas Coutrot, co-presidente da associação Attac, Florent Compain, presidente dos Amigos da Terra, Vincent Drezet, secretário-geral do sindicato Solidárias Finanças Públicas (primeiro sindicato da direção geral das finanças públicas) e Patrick Viveret, presidente do Movimento SOL - "por uma apropriação cidadã do dinheiro". 

  No depoimento, o militante basco declarou: 

  "Os inacreditáveis recursos utilizados na busca das cinco cadeiras torna ainda mais cínica e escandalosa a falta de medidas para recuperar os muitos bilhões de euros sonegados a cada ano dos cofres europeus, de acordo com o ex-comissário europeu Michel Barnier”. 

  A partir de então, a causa e a ação da Associação Bizi ganharam o apoio de um grande número de associações. E atraíram a atenção de algumas personalidades, que decidiram declarar publicamente sua "cumplicidade" com os ambientalistas bascos. 

  No dia 8 de abril, Patrick Viveret, filósofo, ex-auditor do Tribunal de Contas e ex-assessor do ex-primeiro ministro Michel Rocard, organizou uma reunião em Paris, na casa do sociólogo Alain Caillé. Estiveram presentes, entre outros, o filósofo e ex-membro da Resistência francesa Edgar Morin, o financista e também antigo resistente Claude Alphandéry e a ensaísta franco-americana Susan George. Todos fizeram questão de se sentar na cadeira do HSBC levada por Patrick Viveret.

  "Resistir contra duas barbáries" 

  Edgar Morin, feliz e cheio de energia aos 93 anos, comentou que tanto ele quanto seu amigo Claude Alphandéry estavam presentes com o mesmo espírito que os levou à Resistência francesa durante a Segunda Guerra, "mas também de outras resistências bem menos perigosas, mas que nos mobilizam da mesma forma".

"Contra o que devemos resistir hoje? Há duas formas de barbárie. Aquela que todos conhecemos, cometida pelo Estado Islâmico e por diversos grupos fanáticos. Mas também há outra barbárie, que é fria, gelada: é a barbárie do cálculo, do dinheiro e dos juros. Devemos resistir a ambas", afirmou, com entusiasmo. 

  Descrevendo sua solidariedade com a associação Bizi de "ato de resistência", Morin completou: "Quando éramos contra a ocupação nazista, era em nome da liberdade. Hoje, pelo bem da França e o bem-estar dos franceses, sou contra a sonegação e os procedimentos de bancos como o HSBC”.

(Tradução de Clarisse Meireles)

Brasil ocupa 4º lugar entre sonegadores do HSBC e a mídia segue em silêncio


Os 8.667 de Pindorama: Brasil detém um honroso quarto lugar no campeonato mundial de potenciais sonegadores clientes do HSBC. Longe de combater a corrupção, a imprensa brasileira é parte dela

Luiz Gonzaga Belluzo, CartaCapital


Bancos como o HSBC criaram um sistema para seu próprio enriquecimento à custa da sociedade, ao promover a evasão fiscal e a lavagem de dinheiro, disse Hervé Falciani, o funcionário que vazou as informações.

No Painel do Leitor de 17 de fevereiro, a Folha de S.Paulo exibiu a opinião de Celso Balotti. O leitor do prestigioso matutino disparou: “Talvez o colunista Ricardo Melo ainda não tenha percebido que a pouca repercussão do escândalo financeiro mundial (as contas secretas no HSBC da Suíça) na imprensa brasileira se deva ao fato de que, longe de combater a corrupção, a imprensa brasileira é parte dela… Quem se surpreenderia se muitos dos sujeitos que aparecem todos os dias gritando ‘pega ladrão’ estivesse na lista do HSBC”. O colunista da Folha Ricardo Melo teve o desassombro de apontar a omissão da mídia diante do escândalo global do HSBC.

O International Consortium of Investigative Journalists (Icij) teve acesso a uma lista de 106 mil clientes de 203 países. Esses cidadãos do mundo descansaram suas patacas de 100 bilhões de dólares nas contas secretas do private bank do HSBC suíço. Entre o total de depósitos, há indícios de uma quantia parruda de grana mal havida ou em esperta manobra para fraudar o Fisco dos países de origem. Certamente, algumas contas são legais.

O Brasil contribuiu com 8.667 depositantes, um honroso quarto lugar no campeonato mundial de potenciais sonegadores. Se o valor total das contas (7 bilhões de dólares) for o critério de classificação, caímos para nono lugar.

O leitor Balotti, imagino, empregou a palavra corrupção em seu sentido amplo, ao atribuir essa prática à imprensa do País do Carnaval. Interpreto as palavras do missivista como uma denúncia de omissão. Omissão regada à cumplicidade com as camadas sociais useiras e vezeiras em sambar ao som das picaretagens financeiras e ao ritmo do descumprimento de suas obrigações com o Fisco. É a mesma turma que proclama O Fim do Brasil. Enquanto fazem das suas, gritam “pega ladrão” diante das patifarias – vou repetir, patifarias – dos vizinhos-adversários.

Não creio, sinceramente, que os senhores da mídia nativa tenham sucumbido às mesmas tentações que levaram o grupo do jornal argentino Clarín, a enfiar a mão na cumbuca, engrossando o ervanário do HSBC. Prefiro entender o silêncio midiático como uma manifestação das muitas obsessões oligárquicas que assolam os senhores de Pindorama: nas sinapses dos patrícios da Pátria, sobrevive a hierarquia “natural” que organiza a sociedade brasileira desde os tempos da escravidão. Nem mesmo os corruptos e a corrupção conseguem escapar da fúria classificatória e classista.

Em meio às folias e algazarras de Momo, entreguei-me à leitura dos documentos do Icij, sem, no entanto, descurar das interessantes opiniões que circulam na página Tendências e Debates da Folha. No mesmo dia e na mesma página, o economista Marcos Cintra sentou a pua na turma do andar de baixo:

“O corporativismo, a cultura do direito conquistado, a demagogia, o populismo e a ditadura do politicamente correto transformaram o Brasil na república dos coitadinhos, onde os que são considerados vulneráveis julgam ser detentores de privilégios a ponto de desafiarem as autoridades constituídas para conquistarem suas metas.”

O senhor Cintra exibe uma visão do mundo elaborada a quatro mãos por Átila, o rei dos hunos, e Al Capone. As engenharias fiscais e cambiais dos amigos da finança antissocial e predatória surripiaram, só no private bank suíço, 7 bilhões de dólares do Tesouro. É justo imaginar que há mais bufunfa circulando em outros paraísos. Sendo assim, diante da resistência dos “vulneráveis”, o ajuste fiscal deveria completar o trabalho, lançando a multidão dos “coitadinhos” penhasco abaixo.

Lembro aqui o fiasco do Fisco nos trabalhos que buscavam investigar os protagonistas da avalanche de grana enviada para paraísos fiscais e contas suíças no caso Banestado. A investigação iniciada pelo procurador federal Celso Três naufragou no “Acordão” costurado na CPI do Banestado e vazou para os subterrâneos, filtrada entre as decisões e acórdãos do “novo” Judiciário brasileiro. Os nomes dos transgressores estavam gravados no então famoso “disco rígido”, cujo acesso foi bloqueado pelo Supremo Tribunal Federal.

Devo relembrar a frase do finado e saudoso Stanislaw Ponte Preta: “Restaure-se a moralidade ou nos locupletemos todos”. Por aqui, a moralidade proclamada por quem se pretende Bom e Bonito perde de goleada para os princípios que regem suas práticas, aquelas dos Feios, Sujos e Malvados. À falta de Stanislaw, o Brasil estaria melhor com Ettore Scola.

SAIBA MAIS: UOL esconde nomes dos brasileiros envolvidos no escândalo do HSBC

VEJA TAMBÉM: Por que o silêncio em torno do escândalo do HSBC?

Ângela Carrato: "Imprensa investe cada vez mais na imbecilização".




 "Existe outro grande responsável por este estado caótico de coisas que nunca é lembrado: a mídia brasileira, sobretudo a mídia audiovisual comercial que pensa apenas no lucro e transforma o ouvinte/telespectador em mero número na disputa desenfreada por audiência. Nunca houve, de forma efetiva e continuada, investimento desta mídia no aprendizado e desenvolvimento de crianças, jovens e adultos. Ao contrário, investiu-se e investe-se cada vez mais na imbecilização geral." 


JORNAL DE DEBATES > MÍDIA E ILETRAMENTO NO BRASIL

Imprensa investe cada vez mais na imbecilização

Por Ângela Carrato em 28/04/2015 na edição 848 do Observatório da Imprensa

  Recente pesquisa divulgada pela Federação do Comércio do Rio de Janeiro mostrou que 70% dos brasileiros não leram um livro sequer em 2014. O resultado é preocupante, especialmente se comparado a anos anteriores. Até 2012, a média de leitura do brasileiro era pequena, mas apresentava um número bem mais significativo. Esta média era de quatro livros por ano, sendo 2,1 livros lidos até o fim, segundo levantamento feito pelo Ibope Inteligência em 2011. Por que o Brasil lê tão pouco?
  O assunto não gerou nenhuma comoção nacional. Não motivou manchetes de jornais e revistas, reportagens especiais no rádio ou na TV e muito menos comentários ou editoriais indignados. Em outras palavras, pouquíssimo se falou sobre o tema, com professores e escritores repetindo as respostas de sempre: o problema se deve ao pouco investimento em estudo, à falta de vontade política e à própria cultura do povo brasileiro, mais oral do que textual.
  Vistas assim, estas explicações acabam jogando a responsabilidade no colo do governo (seja ele qual for) e das próprias pessoas, já que seria parte da “própria cultura do povo brasileiro”. Se para alguns estas “explicações” podem ser suficientes, elas estão longe de abranger o problema em toda a sua dimensão e, principalmente, de apontarem soluções eficazes.

  Além do governo e das próprias pessoas, existe outro grande responsável por este estado de coisas que nunca é lembrado: a mídia brasileira, sobretudo a mídia audiovisual comercial que pensa apenas no lucro e transforma o ouvinte/telespectador em mero número na disputa desenfreada por audiência. Nunca houve, de forma efetiva e continuada, investimento desta mídia no aprendizado e desenvolvimento de crianças, jovens e adultos. Ao contrário, investiu-se e investe-se cada vez mais na imbecilização geral. 

  Em todos os países democráticos, a educação sempre foi uma das tarefas prioritárias dos meios de comunicação, ao lado de informar, entreter e prestar serviços. Tarefa reforçada pelo fato de que na Europa, a mídia audiovisual pública, comprometida os interesses da cidadania, precedeu à mídia comercial. O quê faz uma enorme diferença. Mesmo nos Estados Unidos, onde a mídia comercial prevalece, existem mais de 600 emissoras de rádios e TVs públicas que servem de parâmetro para as demais e para a própria sociedade.

  Roquette-Pinto e a “escola dos sem-escola”
  No Brasil, as primeiras experiências envolvendo o rádio e a televisão tiveram em comum a mesma pessoa: o médico, sociólogo, educador, professor e cientista carioca Edgar Roquette-Pinto. A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, por ele criada em 1923, tinha como objetivo difundir a educação e a cultura em todo o território nacional, pois entendia este veículo como “a escola de quem não tem escola”.
  A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro foi a primeira emissora na América do Sul a transmitir uma ópera completa, a apresentar um programa de teatrinho infantil, a levar ao ar cursos de português, história, inglês, física, biologia e química, além de transmitir palestras sobre assuntos do momento e tocar música brasileira com regularidade. Apesar de sua importância e do compromisso com a educação, num país tão carente de iniciativas dessa ordem, uma série de determinações do governo federal passou a complicar a vida da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.
  O decreto nº 16.657 de 5 de novembro de 1924 proibiu a inserção comercial nas suas transmissões. Até aí, tudo bem, porque a emissora sobrevivia graças à mensalidade paga por seus 300 filiados. No entanto, o crescimento da radiodifusão provocou o interesse de agências de publicidade norte-americanas em relação ao mercado consumidor brasileiro. Agências que vieram para cá acompanhando as empresas dos Estados Unidos, Canadá e Inglaterra que aqui se instalavam. O enorme interesse das pessoas pelo rádio começou a ter efeitos também sobre os proprietários de jornais que identificaram o novo veículo como adequado para se ganhar dinheiro.
  Um desses proprietários era Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Melo que, já possuindo sete jornais e uma revista, o Cruzeiro, inaugura, em 1935, no Rio de Janeiro, sua primeira emissora de rádio, a Tupi. Para viabilizar seu negócio, contou com recursos de empresas como a General Eletric e de patrocinadores, entre os quais estavam quase todos os milionários cariocas e paulistas. Chateaubriand passa a pressionar – e consegue – que o governo liberasse a publicidade nestas emissoras. Depois disso, o rádio brasileiro nunca mais voltou a dar ênfase à educação, com o próprio Roquette-Pinto entregando, no ano seguinte, numa atitude inédita, sua emissora para o Ministério da Educação e Cultura (MEC). Ele não aceitava condicionar a programação aos interesses dos anunciantes e, sem outra forma para manter a rádio, uma vez que os assinantes minguavam, acreditava que nas mãos do governo ela poderia ter um futuro melhor.
  Numa triste coincidência, mais de duas décadas depois, Roquette-Pinto vai se deparar novamente com Assis Chateaubriand, desta vez nos primórdios da televisão no Brasil. Como cientista Roquette-Pinto já vinha, desde 1940, pesquisando sobre a “oitava maravilha do mundo” e dispunha de todas as condições técnicas para colocar no ar uma emissora comprometida com a educação e a cultura. Já o empresário Chateaubriand, em 1943, é apresentado à tecnologia da televisão numa visita que faz aos Estados Unidos e imediatamente percebe que ali residia uma nova fórmula para ampliar seu poder e ganhar mais dinheiro.
 Resumo da ópera: a televisão educativa sonhada e planejada por Roquette-Pinto, que já contava com o apoio e o financiamento da Prefeitura do Rio de Janeiro (então distrito federal), acabou, por pressões políticas, sendo inviabilizada, enquanto a emissora comercial de Chateaubriand foi inaugurada em 19 de setembro de 1950, em São Paulo. Ao contrário de outros países, a televisão comercial no Brasil nunca pensou seriamente em seu compromisso com a educação e menos ainda que foi e continua sendo uma das principais responsáveis pelo próprio iletramento vigente no país.
  Iletramento e alienação
  Os males do analfabetismo são conhecidos. Uma pessoa que não dispõe da “tecnologia” do ler e do escrever, não pode exercer em toda a plenitude os seus direitos de cidadão. O analfabeto é marginalizado e não tem acesso aos bens culturais das sociedades letradas. No entanto, existe, nos dias atuais, outra forma de analfabetismo tão ou mais grave, sobre a qual quase nada é dito. Trata-se do iletramento provocado pelos meios de comunicação, em especial os audiovisuais.
  No campo acadêmico, estes estudos são denominados media literacy, que em português não tem tradução direta, pois a palavra letramento não existe nos dicionários da língua portuguesa. Razão pela qual, muitos preferem referir-se ao tema como sendo educação para a mídia. Seja como for, o certo é que letramento ou educação para a mídia significa que o indivíduo precisa de uma educação especial que o habilite a entender o conteúdo da mídia e o possibilite a formular sua própria opinião sobre os assuntos abordados.
  O iletrado é o oposto disso. É o cidadão que não dispõe de recursos para compreender como a mídia funciona e, sobretudo, para relativizar o que lhe é mostrado. Até porque, a verdade/realidade para a mídia comercial, com as exceções de praxe, é quase sempre o que interessa aos seus proprietários e anunciantes.
  Na Europa e nos Estados Unidos, onde este problema há muito foi detectado, a preocupação em evitar que o iletramento leve à alienação da sociedade está se transformando em prioridade para universidades, instituições de ensino e cidadãos.  Nestes países, a mídia audiovisual é regulada e conta com o contraponto da mídia pública. Situação que torna a realidade brasileira mais grave ainda, a exigir das autoridades, dos Ministérios (Educação, Cultura e Comunicações), das escolas de ensino básico e fundamental, das universidades e dos setores mais sensíveis a esta temática um posicionamento imediato.
  Que a mídia comercial brasileira nunca teve preocupação com a elevação do nível intelectual e de informação da população é fato. O problema é que este descompromisso está aumentando e a grande maioria não se dá conta disso. Quando se pensa em educação da população brasileira, pensa-se como há 50 ou 100 anos, quando a tarefa era função primordial da família, das igrejas e da escola. Hoje não é mais.
  Midiotas
  A mídia, em especial a televisão, transformou-se na arena por excelência do espaço público brasileiro. Presente em 98% dos lares, ela é também o principal meio de que dispõe a população para se informar e para entender o mundo em que vive.  Quando a televisão deixa de lado esta tarefa e passa a mostrar uma realidade que não condiz com os fatos, não é preciso muito esforço para se avaliar os problemas daí decorrentes.
  As novas tecnologias da comunicação, em especial a internet 2.0 com suas redes sociais, tem contribuído para minimizar os efeitos deseducativos da mídia comercial. Mas no Brasil, infelizmente, ainda se está longe de uma universalização do acesso a estas redes, o quê mantem e aprofunda a gravidade do quadro, em que a redução da leitura é apenas uma das pontas do iceberg.
  Em outras palavras, fica mais fácil entender como diria o saudoso Stanislaw Ponte Preta, o febeapá dos dias atuais, com “indignados” reivindicando “intervenção militar constitucional” ou tendo como palavras de ordens difusos xingamentos e palavrões contra o governo. Os telejornais brasileiros (Jornal Nacional à frente) são os principais responsáveis pela desinformação que permeia a sociedade brasileira, pois ao mostrarem diariamente, sem qualquer contextualização e espaço para o contraditório, problemas diversos envolvendo, por exemplo, corrupção, acabam levando a população a acreditar que ela começou agora e é o inimigo número 1 do Brasil.
  Mais ainda, a mídia tem sido, no Brasil, fonte de “soluções” conservadoras e reacionárias. Basta pensar nos Big Brothers, nos programas de auditório, com suas competições e jurados duvidosos, e nos programas policialescos, com o permanente estímulo ao se fazer “justiça com as próprias mãos”. Daí, não causar surpresa, que no início do século 21, existam aqui tantas pessoas acreditando que “vencer na vida é questão de puro mérito pessoal”, outras tantas pensando que “homossexualismo é doença”, e um contingente cada dia maior disposto a apoiar a redução da maioridade penal, como solução para a criminalidade.
  Mesmo quando a televisão, através de algumas telenovelas, tenta abordar temas tabus (a exemplo do homossexualismo feminino) o faz de uma forma descontextualizada que passa longe de conseguir aprofundar, efetivamente, a questão. Isto porque esta temática, por exemplo, está ausente de outros programas de sua grade, sem falar que é apresentada para a população sem mediações. Situação que mostra como fazem falta, aqui, programas educativos como os da British Broadcasting Corporation (BBC), a TV Pública Inglesa, ou da Public Broadcasting System (PBS), a TV Pública norte-americana, ou mesmo da TV Nacional, a TV Pública argentina, em que estas e tantas outras temáticas são discutidas e aprofundadas através de documentários, mesas-redondas e até mesmo reality shows. Só que reality showscompletamente diferentes dos que conhecemos.
  A título de exemplo, um dos realities shows de maior sucesso na BBC, até recentemente, envolvia personalidades e gente comum e suas críticas ao consumismo e aos produtos nocivos e sem interesse para a comunidade. Uma celebridade ou uma pessoa simples jogar na fogueira um determinado refrigerante ou posicionar-se contra um novo modelo de celular é quase impensável no Brasil. Mas na Inglaterra, não.
  Os debates presidenciais nos Estados Unidos são realizados e conduzidos pela PBS e seria inaceitável para a maioria da população que eles acontecessem nas emissoras comerciais e com regras impostas por elas, como se dá no Brasil. Mais ainda: na Argentina, a população tem na TV Nacional o contraponto à cobertura partidarizada que a mídia comercial faz de questões desde responsabilidades por violações aos direitos humanos e torturas durante o período de ditadura militar até recentes convênios de cooperação técnico-científica, assinados pela presidente Cristina Kirchner em viagens à China e à Rússia.
  Enquanto isso, aqui no Brasil, a mídia comercial, numa unanimidade que Nelson Rodrigues já sabia ser burra, continua promovendo e contribuindo para o iletramento da população. Ou, como já bem definiu Luciano Martins Costa (aqui neste Observatório) para que no lugar de cidadãos tenhamos, cada vez mais, midiotas. Voltarei ao assunto.
 ***
 Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG. Este artigo foi publicado no blog Estação Liberdade


sábado, 23 de maio de 2015

Goethe e a Sincronicidade ou a Divina Providência




Carlos Antonio Fragoso Guimarães

 O psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) denominou de "Sincronicidade" aquelas "coincidências" que, de tão significativas para quem as vivencia, chega a abalar positivamente a alma da pessoa, fazendo-a mudar, ao menos por um tempo, sua perspectiva de mundo De certa forma, uma certa configuração emocional e cognitiva interna parece ser reforçada por eventos externos.
  O poeta alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) conhecia bem tais fatos, as sincronicidades, ocorridas por diversas vezes na sua vida e que ele, e sua cultura, interpretavam - talvez em certa medida corretamente - como manifestação da Providência Divina. Vejamos um poema em que ele reflete sobre tais eventos:


A Providência Divina

Em relação a todos os atos de iniciativa e de criação
existe uma verdade elementar:
no momento em que nos compromissamos,
a Providência Divina 
também se põe em movimento.
Todo um fluir de acontecimentos surge ao nosso favor.
Como resultado da decisão,
seguem todas as formas imprevistas de coincidências,
encontros e ajudas, que nenhum ser humano
jamais poderia ter sonhado encontrar.
Qualquer coisa que você possa fazer ou sonhar,
você pode começar.
A coragem contém em si mesma
o poder,
o gênio
e a magia.

Johann von Goethe (1749-1832)

Segue, agora, artigo de Letícia Capriotti sobre o tema, extraído do site Symbolon:

JUNG E SINCRONICIDADE: O CONCEITO E SUAS ARMADILHAS

Letícia Capriotti
O CONCEITO DE SINCRONICIDADE

A sincronicidade é um conceito empírico que surge para tentar dar conta daquilo que foge à explicação causal. Jung diz que “a ligação entre os acontecimentos, em determinadas circunstâncias, pode ser de natureza diferente da ligação causal e exige um outro princípio de explicação” (CW VIII, par. 818). A física moderna tornou relativa a validade das leis naturais e assim percebemos que a causalidade é um princípio válido apenas estatisticamente e que não dá conta dos fenômenos raros e aleatórios.

Ao longo de sua obra, Jung deu várias definições ao conceito de sincronicidade. Aqui estão algumas delas:

> “... coincidência, no tempo, de dois ou vários eventos, sem relação causal mas com o mesmo conteúdo significativo.” (CW VIII, par.849)

> “... a simultaneidade de um estado psíquico com um ou vários acontecimentos que aparecem como paralelos significativos de um estado subjetivo momentâneo e, em certas circunstâncias, também vice-versa.” (CW VIII, par. 850)

> “Um conteúdo inesperado, que está ligado direta ou indiretamente a um acontecimento objetivo exterior, coincide com um estado psíquico ordinário.” (CW VIII, par. 855)

> “...um só e o mesmo significado (transcendente) pode manifestar-se simultaneamente na psique humana e na ordem de um acontecimento externo e independente.” (CW VIII, par.905)

> “um caso especial de organização acausal geral.” (CW VIII, par.955)

> “coincidência significativa de dois ou mais acontecimentos, em que se trata de algo mais do que uma probabilidade de acasos.” (CW VIII, par. 959)

> “uma peculiar interdependência de eventos objetivos entre si, assim como os estados subjetivos (psíquicos) do observador ou observadores.” (I Ching, p.17)

> “o princípio da causalidade nos afirma que a conexão entre a causa e o efeito é uma conexão necessária. O princípio da sincronicidade nos afirma que os termos de uma coincidência significativa são ligados pela simultaneidade e pelo significado”. (CW VIII, par. 906)

Jung define também três categorias de sincronicidade:

1. coincidência de um estado psíquico com um evento externo objetivo simultâneo.

2. coincidência de um estado psíquico com um evento externo simultâneo mas distante no espaço.

3. coincidência de um estado psíquico com um evento externo distante no tempo.

Através da definição destas categorias, podemos perceber que nos fenômenos sincronísticos, o tempo e o espaço são relativos, isto é, o fenômeno acontece independente destes. Basicamente o que define a sincronicidade são a coincidência e o significado.

Jung observou também que tais coincidências ocorrem principalmente quando um arquétipo está constelado. O arquétipos são fatores psicóides que possuem uma transgressividade pois “não se acham de maneira certa e exclusiva na esfera psíquica, mas podem ocorrer também em circunstâncias não psíquicas (equivalência de um processo físico externo com um processo psíquico).” (CW VIII, par. 954) 

Jung propõe que o princípio de sincronicidade seja acrescentado à tríade espaço, tempo e causalidade, dizendo que “o espaço, o tempo e a causalidade, a tríade da Física clássica, seriam complementados pelo fator sincronicidade, convertendo-se em uma tétrada, um quatérnio que nos torna possível um julgamento da totalidade”(CW VIII, par. 951). Um gráfico então ficaria assim:

Espaço

Causalidade --------------------------- Sincronicidade

Tempo

Porém através de sugestões de Pauli, Jung e ele modificam o gráfico substituindo o esquema clássico da física pelo moderno, ficando assim:

Energia Indestrutível

Conexão constante de Conexão inconstante
fenômenos através do ------------------------------------------------------- através de contingência efeito (causalidade) com identidade de significado (sincronicidade)

Continuum Espaço-Tempo

Através desse modelo, a microfísica e a psicologia profunda se aproximam, chegando na concepção dos arquétipos como constantes psicofísicos da natureza e fatores estruturantes criativos.

Jung referiu-se à sua definição de sincronicidade como sincronicidade em sentido estrito e a diferenciou de uma visão mais abrangente de sincronicidade que chamou de ordenação acausal. Os fenômenos sincronísticos em sentido estrito são “atos de criação” no tempo, e incluem a telepatia, fenômenos ESP e PK. Já a organização acausal geral inclui todos estes “atos de criação” e todos os fatores a priori como as propriedades dos números inteiros e as descontinuidades da física moderna.

É com base neste princípio de organização acausal geral que Jung tece suas considerações sobre o número. Ele diz que o cálculo é o método mais apropriado para se tratar do acaso, pois o número é misterioso, nunca foi despojado de sua aura numinosa. “Se, como diz qualquer manual de Matemática, um grupo de objetos for privado de todas as suas características, no final ainda restará o seu número, o que parece indicar que o número possui um caráter irredutível.” Pelo fato de o número ser o elemento ordenador mais primitivo do espírito humano, ele “é o instrumento indicado para criar a ordem ou para apreender uma certa regularidade já presente, mas ainda desconhecida, isto é, um certo ordenamento entre as coisas.” Por isso Jung chegou a chamar o número de “o arquétipo da ordem que se tornou consciente” e cita a estrutura matemática das mandalas, produtos espontâneos do inconsciente para chegar à conclusão de que “o inconsciente emprega o número como fator ordenador”. (CW VIII, par.870)

Os precursores históricos

Jung dedica uma parte do “Sincronicidade: um princípio de conexões acausais” para falar dos precursores históricos da sincronicidade. Ele afirma que a concepção chinesa da realidade, e particularmente o conceito de Tao, é, em grande parte, sincronística. Ele diz: “...segundo a concepção chinesa, há uma “racionalidade” latente em todas as coisas. Esta é a idéia fundamental que se acha na base da coincidência significativa: esta é possível porque os dois lados possuem o mesmo sentido.” (CW VIII, par. 912)

Aqui no ocidente esse princípio existiu por muito tempo. Jung diz que “a concepção primitiva, assim como a concepção clássica e medieval da natureza, postulam a existência de semelhante princípio ao lado da causalidade.” (CW VIII, par. 929) A idéia de uma unidade de toda a natureza (unus mundus) permeia essas concepções, e portanto nelas não existe uma diferença entre o micro e o macrossomo - há uma correspondência entre todas as coisas; também permeando essas concepções está a idéia de que existe na natureza uma fonte de todo conhecimento que se situa fora da alma humana, um conhecimento absoluto. Porém antigamente não se pensava em sincronicidade porque não se pensava em acaso. Tudo era atribuído a uma causalidade mágica que hoje nos parece ingênua. Com o advento do pensamento científico, essas concepções desaparecem. Jung aponta o que fez com que desaparecessem dizendo que “com a ascensão das ciências físicas, no século XIX, a teoria da correspondentia desaparece por completo da superfície e o mundo mágico dos tempos antigos parece sepultado para sempre.” (CW VIII, par. 929) Mas essa idéia de uma sincronicidade e de um significado subsistente à natureza, que é a base do pensamento chinês clássico e faz parte da concepção ingênua da idade média, embora pareça a alguns uma regressão, teve que ser retomada pela psicologia moderna uma vez que só o princípio da causalidade não explica toda a realidade dos acontecimentos.

Jung aponta como precursores da idéia de sincronicidade a “simpatia de todas as coisas” de Hipócrates; a idéia de que o sensível e o supra-sensível estão unidos por um vínculo de comunhão de Teofrasto; a idéia de uma necessidade e amizade que une o universo de Filo de Alexandria; a idéia de mônada, que também tem um significado de unidade de todas as coisas, do alquimista Zózimo; a alma universal de Plotino; a idéia do mundo como um único ser de Pico Della Mirandola; o “conhecimento” ou “idéia” inata dos organismos vivos de Agrippa von Nettesheim e a idéia da anima telluris de Johann Kepler. Jung cita também Schopenhauer e a idéia da vontade ou prima causa e da simultaneidade significativa (daí o termo “sincronicidade” usado por Jung). Mas o autor que Jung mais cita é Gottfried Wilhelm Leibniz. Leibniz explica a realidade através de quatro princípios: espaço, tempo, causalidade e correspondência (harmonia praestabilita). Este último é um princípio acausal de sincronismo dos acontecimentos psíquicos e físicos. Jung discorda de Leibniz em apenas um ponto: para Leibniz este é um fator constante, enquanto que para Jung os eventos sincronísticos ocorrem esporadica e irregularmente.

AS ARMADILHAS DO CONCEITO DE SINCRONICIDADE

Para o pensamento ocidental desde Descartes, a “explicação científica” remonta a uma validação causal: D é causado por C, C por B, B por A. Não é de espantar então que a discussão da hipótese de Jung de um princípio de sincronicidade tenha produzido inúmeros mal-entendidos.
Marie-Louise von Franz em seu artigo “A Contribution to the Discussion of C.G. Jung’s Synchronicity Hipothesis” aponta uma série de erros que já se cometeu ou que se pode cometer na interpretação desse conceito e que aqui serão resumidos e sistematizados.
A autora começa falando das dificuldades que muitos parapsicólogos têm em compreender esse novo modo de pensar e diz que:

Na minha opinião isso vem do fato de muitos parapsicólogos estarem sempre fazendo um esforço intenso por conseguir a aceitação de seu campo fundamentando-o em um método científico “rigoroso”, isto é, em métodos quantitativos e pensamento causal enquanto que justamente o que a hipótese de Jung propõe está em uma direção oposta para longe daquilo que até agora foi considerado o único modo “científico” de pensar. (p. 229)

Ela então continua falando de algumas pessoas que tendem a achar que a sincronicidade explica os fenômenos “psi” causalmente e afirma:

a hipótese da sincronicidade não “explica” causalmente os fenômenos psi, mas comparada com os resultados obtidos até hoje pelas pesquisas, ela os coloca em um contexto novo, mais amplo, isto é, no domínio dos arquétipos, um campo no qual estudos biológicos e psicológicos detalhados já foram feitos. Entretanto estes estudos infelizmente parecem ser desconhecidos da maioria dos parapsicólogos. (p. 230)

Outra tendência errônea é encontrada entre aqueles que buscam uma explicação neurológica para os fenômenos sincronísticos, quando na verdade o que caracteriza um evento sincronístico é justamente a ausência de uma relação causal. Há também aqueles que supõem que os eventos sincronísticos sejam causados pelo inconsciente do observador. Com relação a isto, ela diz:

De acordo com a visão junguiana, o inconsciente coletivo não é de forma alguma uma expressão de desejos e objetivos pessoais, mas uma entidade neutra, psíquica em sua natureza que existe de uma forma absolutamente transpessoal. Atribuir a ocorrência de eventos sincronísticos ao inconsciente do observador não seria nada além de uma regressão ao pensamento mágico primitivo, de acordo com o qual supunha-se antigamente que, por exemplo, um eclipse poderia ser “causado” pela malevolência de um feiticeiro. Jung chegou a advertir explicitamente contra considerar-se os arquétipos (ou o inconsciente coletivo) ou poderes psi como sendo a agência causal dos eventos sincronísticos. (p.231)

O fato do evento sincronístico não ter uma causa pode levar ao erro de se imaginar que tudo aquilo que não tem uma causa conhecida é um evento sincronístico. Quanto a isso Jung é bem claro, afirmando que: “Devemos obviamente nos prevenir de pensar todo evento cuja causa é desconhecida como “sem causa”. Isso é admissível apenas quando uma causa não é nem sequer imaginável. Este é especialmente o caso quando espaço e tempo perdem seu significado ou aparecem relativizados, caso em que uma conexão causal também torna-se impensável.” (CW VIII, par. 957)
A questão do significado, que é crucial na classificação de um evento sincronístico, também pode causar confusões. Afirmar que a existência de um observador que dê significado ao evento é fundamental não quer dizer que os eventos sincronísticos e seu significado sejam produzidos pelo observador. Essa questão do significado também traz outros problemas. Pelo fato do significado ser subjetivo, como podemos saber se não estamos fantasiando um significado quando na realidade ele não existe? Tudo o que diz respeito a fenômenos arquetípicos tem uma “lógica” de asserção que Jung chama de “necessary statements” (“afirmações necessárias”). Estas não são criadas pelo ego, são “impostas” pelo arquétipo e são esperadas sempre que um arquétipo está constelado, como é o caso dos eventos sincronísticos, nos dando um parâmetro para saber se o evento é mesmo significativo ou não.
A ordenação acausal e o “conhecimento absoluto” que estão por trás dos eventos sincronísticos não devem ser confundidos com um “Deus” teológico. É possível postular um deus faber por trás destes eventos, mas isso vai além de qualquer possibilidade de prova e Jung nunca o fez.
Já que a constelação de um arquétipo é fundamental para a ocorrência de um evento sincronístico, é fácil incorrer no erro de considerar que foi o arquétipo que o ‘causou’. Jung diz que:

Eu me inclino, porém a admitir que a sincronicidade em sentido mais estrito é apenas um caso especial de organização geral, aquele da equivalência dos processos psíquicos e físicos onde o observador está em condição privilegiada de poder reconhecer o tertium comparationis. Mas logo que percebe o pano de fundo arquetípico, ele é tentado a atribuir a assimilação dos processos psíquicos e físicos independentes a um efeito (causal) do arquétipo, e assim, a ignorar o fato de que eles são meramente contingentes. Evitamos este perigo se considerarmos a sincronicidade como um caso especial de organização acausal geral. (...) ... devemos considerá-los [os acontecimentos acausais] como atos de criação no sentido de uma creatio continua (criação contínua) de um modelo que se repete esporadicamente desde toda a eternidade e não pode ser deduzido a partir de antecedentes conhecidos. (CW VIII, par. 516)

A organização arquetípica “aparece” ou torna-se “visível” em um evento sincronístico, mas não é a causa deste. O evento sincronístico é uma creatio, um surgimento espontâneo de algo inteiramente novo e que portanto não é predeterminado causalmente.
Embora Jung tenha sugerido que a ordenação acausal geral pode ser verificada experimentalmente através dos métodos de adivinhação, os eventos sincronísticos não são passíveis de serem investigados estatisticamente, uma vez que Jung é claro ao afirmar que os eventos sincronísticos são imprevisíveis, espontâneos e não podem ser repetidos.
Bibliografia



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