quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

'Não tem sentido', diz pesquisador da Fiocruz sobre exigências da Anvisa (aparelhada e controlada por Bolsonaro por meio de seus militares)


 "Não tem sentido nenhum, ainda mais que a gente tem duas agências que são até superiores em termos de avaliação do que a Anvisa, o FDA [agência reguladora dos Estados Unidos] e a agência europeia, aprovando isso, a agência do Reino Unido também", disse o pesquisador em entrevista à GloboNews.

Do UOL:

O infectologista e pesquisador da Fiocruz Júlio Croda - Erasmo Salomão/Ministério da Saúde
O infectologista e pesquisador da Fiocruz Júlio CrodaImagem: Erasmo Salomão/Ministério da Saúde

Um dia após a Pfizer confirmar que desistiu da intenção de pedir o registro de uso emergencial da sua vacina contra a covid-19 no Brasil, o infectologista e pesquisador da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), Júlio Croda, disse que não vê sentido nas exigências feitas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para avaliar com urgência o imunizante. Croda argumentou que outros países já estão aplicando a vacina da Pfizer/BioNTech.

 "Não tem sentido nenhum, ainda mais que a gente tem duas agências que são até superiores em termos de avaliação do que a Anvisa, o FDA [agência reguladora dos Estados Unidos] e a agência europeia, aprovando isso, a agência do Reino Unido também", disse o pesquisador em entrevista à GloboNews.

"Não tem nenhum sentido essa vacina da Pfizer não ser aprovada pela Anvisa e as exigências serem superiores a essas outras agências", reforçou o infectologista da Fiocruz, instituição federal que será responsável no Brasil pela produção da vacina de Oxford. O imunizante é desenvolvido pelo laboratório AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford e é a principal aposta do governo brasileiro para o plano nacional de vacinação contra a covid-19.

Croda criticou ainda a afirmação feita ontem pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), de que seriam os laboratórios os maiores interessados em venderem vacinas contra a covid-19 para o Brasil.

"Nenhuma empresa pediu a aprovação no Brasil, então a gente está neste cenário, enquanto a Argentina, por exemplo, país que está aqui do lado, manda um avião buscar a Sputnik V na Rússia [o país iniciou a vacinação contra a covid-19 hoje com o imunizante russo], o presidente está discutindo que as empresas devem procurar o Ministério da Saúde para vender suas vacinas. A gente não vai ter vacinas, vai ter uma disputa enorme no mundo", argumentou.

O pesquisador reforçou que faltou planejamento ao governo brasileiro para garantir doses suficientes para começar a vacinação. O imunizante da Pfizer, responsável por já ter iniciado campanhas em vários países do mundo, tentará agora junto à Anvisa o registro de uso definitivo, mas Croda lembrou que o laboratório não deve ter um grande quantitativo de doses disponíveis para o Brasil.

"A previsão, que está no próprio plano nacional [de vacinação], é de 8,5 milhões de doses. Não dá nem para a gente terminar a fase 1 do nosso plano de vacinação", afirmou o pesquisador, lembrando a primeira fase da vacinação, destinada a grupos prioritários e que ainda não tem data de início.

"Infelizmente, o Brasil errou lá no passado, não fez nenhum termo de cooperação com outras empresas. Vamos ter uma falta de vacinas para os países pobres, para a África, Ásia e alguns países da América do Sul como o Brasil. A gente colocou nossas esperanças em duas vacinas", completou Croda.

Leia o restante da reportagem em no UOL.

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Após “cobrança” de Bolsonaro, Pfizer responde que desistiu de oferecer vacina emergencial ao Brasil por encontrar vários obstáculos impostos pela ANVISA (agora aparelhada por Bolsonaro com militares)

 

A fabricante norte-americana afirmou que não irá solicitar o registro para uso emergencial no Brasil porque encontrou muitos obstáculos da Anvisa

Foto: Arquivo ABr

Jornal GGN Após Bolsonaro cobrar das farmacêuticas a responsabilidade por “vender” suas vacinas e apresentar os pedidos de registros dos imunizantes à Anvisa, a Pfizer deixou bem claro que não precisa da compra do Brasil. A fabricante norte-americana afirmou que não irá solicitar o registro para uso emergencial no Brasil porque encontrou muitos obstáculos da Anvisa.

Em nota divulgada nesta segunda (28), a Pfizer explicou que teve uma reunião, no dia 14 de dezembro, com representantes da Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do país, para entender como funcionava o processo de uso emergencial da vacina.

Decidiu nãi se submeter ao processo, porque encontrou muitos obstáculos criados pela Anvisa para a vacinação contra Covid-19 emergencial no Brasil. Trata-se do Guia de Submissão para Uso Emergencial, que como já amplamente noticiado, traz diversas barreiras e compromissos para os laboratórios e fabricantes de vacinas.

Assim, a BNT162, desenvolvida pela Pfizer em parceria com a BioNTech do Brasil, pode não ser usada nessa primeira fase emergencial no país. A medida ocorre paralelamente a outros 47 países que já aplicam as primeiras doses de vacinação contra o coronavírus, incluindo os EUA e outras dezenas com o próprio imunizante da Pfizer, deixando o Brasil para trás.

Para o presidente do país, Jair Bolsonaro, contudo, o interesse não seria do Brasil, mas deveria ser mostrado pelas farmacêuticas, como “vendedoras” das vacinas. Foi o que afirmou o mandatário nesta segunda (28).

“Os laboratórios não tinham que estar interessados em vender para gente? Por que eles, então, não apresentam documentação na Anvisa? Pessoal diz que eu tenho que ir atrás. Não, não. Quem quer vender, se eu sou vendedor, eu quero apresentar”, havia dito.

Além dos Estados Unidos, a farmacêutica norte-americana já aplicou suas doses no Reino Unido, o primeiro país a iniciar o plano de imunização, no dia 8 de dezembro, no Canadá, México, Chile e Costa Rica. A Argentina também começará a imunizar com a vacina da Pfizer nesta terça (29).

De acordo com a farmacêutica, a agência reguladora do Brasil exigiu “uma análise dos dados levantados exclusivamente na população brasileira, o que demanda tempo e avaliações estatísticas específicas”. “Outras agências regulatórias que possuem o processo de uso emergencial analisam os dados dos estudos em sua totalidade, sem pedir um recorte para avaliação de populações específicas”, criticou.

“A submissão de uso emergencial também pede detalhes do quantitativo de doses e cronograma que será utilizado no país, pontos que só poderão ser definidos na celebração do contrato definitivo”, lembrou a farmacêutica. O cronograma com as datas é uma responsabilidade do Ministério da Saúde com o Plano Nacional de Imunização, e não foi divulgado pelo próprio governo.

“A Pfizer já submeteu à Anvisa, pelo processo de submissão contínua, nossos resultados estudos Fase 3, o que significa mais um passo rumo à aprovação de nossa vacina”, detalhou, em nota. Assim, a vacina estaria disponível para o Brasil somente na categoria definitiva, e não emergencial, como todos os demais países já estão aplicando.

 

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segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

Breve retrospectiva do terrível 2020 e a perspectiva ambiental para 2021

 

Ambientalistas, pesquisadores e profissionais do meio ambiente fazem balanço de 2020 e lançam suas apostas para o que deve mover o Brasil e o mundo em 2021


Por Renato Santana

No EcoDebate

Enchentes, queimadas, desmatamento, ciclone bomba, nuvem de gafanhoto, animais invasores e uma pandemia sem precedentes na história moderna. O ano de 2020 apresentou grandes desafios relacionados ao meio ambiente e encerra como o terceiro ano mais quente já registrado. Por um lado, 2020 foi marcado pela união dos países em construir uma economia mais verde; por outro, pelos desafios mais imediatos provocados pelo coronavírus.

“Este foi um ano de paradoxos. Apesar do efeito nefasto em mortes pela Covid-19 e a perda de renda devido à desaceleração econômica, esta situação provocou uma redução considerável na poluição do ar, tanto pela redução da movimentação de veículos no planeta como pela desaceleração industrial”, resume o membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor do Laboratório de Inovação em Sustentabilidade da Universidade de Colorado, Gunars Platais.

Ele e outros especialistas fizeram um balanço dos eventos mais marcantes da área ambiental em 2020 e traçaram algumas perspectivas para 2021. Veja a seguir:

Retrospectiva 2020

Fim da Década da Biodiversidade

Em 2020, encerra-se a Década da Biodiversidade, criada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para proteger as espécies do planeta. No entanto, nenhuma das metas definidas para o período foi atingida de acordo com o balanço final da Década divulgado pela entidade em setembro deste ano. No Brasil, números apresentados em novembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostraram que o país tem 3.299 espécies ameaçadas de extinção.

Redução das emissões de gases do efeito estufa

Um estudo da revista científica Nature Communications mostrou que a pandemia teve grande impacto na redução da poluição atmosférica. Segundo cálculos dos pesquisadores, houve uma queda de 8,8% nas emissões de dióxido de carbono (CO2) na primeira metade do ano em comparação com igual período de 2019. A redução é maior do que a registrada em crises econômicas anteriores ou na Segunda Guerra Mundial. Por outro lado, em relação à redução das emissões de gases de efeito estufa, o Brasil estabeleceu recentemente metas pouco ambiciosas a serem cumpridas até 2030, mantendo o que havia sido proposto há cinco anos.

Enchentes e estiagens

O primeiro semestre foi de chuvas fortes em muitas cidades do país, causando alagamentos recordes e devastação. Ao mesmo tempo, outras regiões sofreram com o problema da estiagem, que em alguns casos, como em Curitiba (PR), foi a mais longa já registrada. De acordo com especialistas, o fenômeno de precipitações mais intensas e secas mais duradouras é reflexo dos efeitos das mudanças climáticas. “São eventos extremos que afetam a biodiversidade, o equilíbrio dos ecossistemas e as pessoas, com restrição ao abastecimento de água, falta de energia e aumento de tarifas, por exemplo. Além disso, quando a estiagem é muito longa, é preciso acionar as usinas termelétricas, que são mais poluentes”, explica o gerente de Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, André Ferretti, alertando que esse cenário deve permanecer em 2021 e nos próximos anos.

Pantanal

Em 2020, o Pantanal recebeu atenção internacional em razão dos incêndios que queimaram o bioma e mataram milhares de animais. O fogo atingiu Unidades de Conservação (UCs), incluindo o Parque Estadual Encontro das Águas, que reúne a maior população de onça-pintada do mundo. “Em 2020, a intensidade e a quantidade de áreas atingidas pelo fogo foram muito grandes. Apesar das políticas equivocadas do governo federal e algumas em nível dos estados do Mato Grosso do Sul e do Mato Grosso, a tragédia estabeleceu um clima de solidariedade na sociedade e ao mesmo tempo aparou algumas arestas entre o terceiro setor e a iniciativa privada”, comenta o membro da RECN e diretor executivo do Instituto SOS Pantanal, Felipe Dias.

Eventos climáticos extremos

Além das chuvas e estiagens, o Brasil também conviveu com eventos climáticos incomuns ao longo do ano, como o ciclone bomba, que prejudicou mais gravemente a região Sul do país, e a nuvem de gafanhotos, ocasionada pelas mudanças climáticas e por práticas não sustentáveis de agricultura.

Passando a boiada

Em uma reunião ministerial em 22 de abril, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, declarou que o governo deveria aproveitar o foco da imprensa na cobertura da pandemia do novo coronavírus para passar “reformas infralegais de desregulamentação e simplificação”. “Para isso, precisa ter um esforço nosso aqui, enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só falam de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”, disse Salles na ocasião. Entre as tentativas de mudanças orquestradas pelo governo federal estão as alterações na fiscalização da exportação de madeira e demissões nos órgãos de controle ambiental.

Pesca de sardinhas em Fernando de Noronha

No final de outubro, o governo federal autorizou a pesca de sardinhas no Parque Nacional Marítimo de Fernando de Noronha, o que gerou preocupação entre ambientalistas e pesquisadores. “Foi autorizada de uma forma equivocada, atropelando um processo que já ocorria no âmbito do Parque e que acabou levando a uma situação que nos deixa muito receosos em relação ao que pode gerar. Temos como beneficiários dessa autorização pessoas que sequer têm atuação de pesca mais tradicional ou local”, alerta o membro da RECN, professor da Universidade de São Paulo (USP) e responsável pela Cátedra de Sustentabilidade de Oceano da Unesco, Alexander Turra. Já o pesquisador da Voz da Natureza e da Academia de Ciências da Califórnia, Hudson Pinheiro, lembra que a sardinha é base da cadeia alimentar de outras espécies. “É um precedente inacreditável você poder entrar num Parque Nacional para pescar. É inaceitável. A sardinha é a base da cadeia alimentar, seu desaparecimento pode resultar no colapso de toda ecologia trófica da ilha, inclusive da própria pesca de recursos locais”, diz Pinheiro, que também é membro da RECN.

Najas e pitons

O episódio da cobra naja – uma espécie exótica do Brasil – tomou conta do noticiário no segundo semestre. Um estudante de veterinária do Distrito Federal acusado de traficar o animal foi picado pela cobra e foi parar no hospital, em coma. Na metade de dezembro, uma piton albina birmanesa, espécie típica da Ásia e da África, foi resgatada no município de Mucambo (CE). Os casos trouxeram à tona a questão das espécies exóticas invasoras, capazes de causar sérios distúrbios aos ecossistemas. “Esses animais trazem vários riscos, desde o ataque a outras pessoas, como foi o caso da naja, à proliferação de doenças”, alerta a diretora executiva do Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental e membro da RECN, Sílvia Ziller.

Decisão do Conama

No final de setembro, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) se reuniu para revogar três resoluções publicadas em anos anteriores, incluindo medidas que fortaleciam a proteção de áreas de restingas e manguezais. A decisão foi criticada por ambientalistas e acabou indo parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que já formou maioria pela restauração das resoluções em julgamento ainda sem data de conclusão.

Perspectivas para 2021

Início da Década do Oceano

Com o fim da Década da Biodiversidade, a ONU dá início em 2021 à Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável. O objetivo é unir esforços de todos os setores relacionados ao mar para reverter o ciclo de declínio na saúde do oceano e criar melhores condições para concretizar o desenvolvimento sustentável. No Brasil, foram conduzidas diversas oficinas para a construção do Plano Nacional de Implementação da Década, com participação de diversos atores da sociedade. A criação de um banco de dados on-line, integrado, transparente e acessível a todos, não somente aos espaços de educação formal, foi a principal necessidade identificada para o país.

COP 26 e COP 15

Em 2021, importantes eventos relacionados ao meio ambiente, dentro do âmbito da ONU, ocorrerão como forma de unir os países em torno de um futuro sustentável. “Será um ano crucial para a agenda ambiental global, com o início da Década da ONU de Restauração de Ecossistemas; a realização – em Glasgow, na Escócia – da Conferência das Partes (COP) 26 de Clima para pactuar acordo sobre as regras de implementação do Acordo de Paris; e a realização da COP 15 de Biodiversidade — em Kunming, na China — para adotar a nova Estratégia Global de Biodiversidade para o período de 2021 a 2050. São oportunidades únicas que o Brasil não pode perder para influenciar, fazendo bom uso das lições aprendidas com as ricas experiências desenvolvidas no país”, comenta o membro da RECN e professor do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília, Braulio Dias, que também é ex-secretário executivo da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica.

Impacto das eleições nos EUA

A eleição do presidente Joe Biden nos Estados Unidos e o retorno do país ao Acordo de Paris irá fortalecer a política ambiental global e influenciar países como o Brasil. “No governo do presidente Donald Trump foram sistematicamente desmanteladas mais de cem regulações ambientais de grande importância. O presidente-eleito Biden já indicou que vai começar a, paulatinamente, voltar a implantá-las”, detalha Platais. Já para Dias, a política ambiental de Biden irá impactar e influenciar o Brasil, uma vez que ela é “diametralmente oposta” à política de Trump.

Intensificação da recuperação econômica verde

O ano atual foi marcado por posicionamentos cada vez mais enfáticos das empresas na proteção e conservação do meio ambiente e numa crescente conscientização da sociedade sobre os impactos ambientais de negócios econômicos. “O fato de os setores financeiros de grande envergadura estarem prestando muita atenção ao impacto que a mudança climática está causando no lucro das empresas é de suma importância. O resultado esperado é que estejamos cada vez mais descarbonizados”, comenta Platais, ex-economista do Bando Mundial. Outro fator que caminha nessa direção é a adoção e o fortalecimentos de boas práticas ambientais, sociais e de governança (ESG) pelas corporações, o que tem levado grandes investidores a levarem isso em conta na hora de escolher os negócios que receberão recursos.

Novos hábitos de consumo

A mudança dos padrões de consumo da sociedade, em especial da juventude, é um importante aspecto a monitorar ao longo do próximo ano e década, indicam os especialistas. Os modelos atuais de crescimento econômico estão sendo questionados e a economia circular ganha cada vez mais tração e relevância nesse novo contexto.

Cidades sustentáveis

A tendência de cidades em todo o mundo de implantar ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas deve continuar em 2021. No Brasil, especificamente, essa ação deve ser liderada pelos novos prefeitos e vereadores eleitos em 2020. Exemplos já existem, como o movimento Viva Água, em São José dos Pinhais (PR), que busca contribuir com a segurança hídrica para milhares de famílias e indústrias locais por meio da recuperação do solo e da vegetação da bacia hidrográfica do rio Miringuava. O projeto é uma iniciativa da Fundação Grupo Boticário em parcerias com os governos municipal e estadual, além de empresas e entidades da sociedade civil organizada. “É preciso dar espaço para a natureza, introduzindo tipologias de Soluções Baseadas na Natureza (SBN) por meio de tetos verdes nas edificações, jardins de chuvas, canteiros fluviais, biovaletas e parques multifuncionais”, explica a membro da RECN e pesquisadora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Cecilia Herzog.

Olhos atentos à Amazônia

Seguindo a pauta dos últimos anos, a política ambiental para proteger a Amazônia continuará a atrair a atenção da população global. A falta de medidas eficazes para combater o desmatamento – que cresceu 9,5% em 12 meses, passando de 11 mil km² devastados – e preservar povos e terras indígenas seguirá desencadeando pressões ao Brasil vindas a partir da perda de investimentos estrangeiros, boicote a produtos nacionais e sanções comerciais de outros países.

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sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Em sua mensagem de Natal, o Papa Francisco pede ‘vacina para todos’ e critica ‘vírus do individualismo radical’ tão próprio dos neoliberais

 

“Não me posso pôr a mim mesmo antes dos outros, colocando as leis do mercado e as patentes de invenções acima das leis do amor e da saúde da humanidade”, disse Francisco


Vatican News
O papa lembrou o compromisso solidário com "as pessoas mais frágeis, os doentes e quantos neste tempo se encontram desempregados ou estão em graves dificuldades pelas consequências económicas da pandemia"

“No Natal, celebramos a luz de Cristo que vem hoje ao mundo e Ele vem para todos: não só para alguns. Hoje, neste tempo de escuridão e incertezas pela pandemia, aparecem várias luzes de esperança, como a descoberta das vacinas”, apontou o papa.

“Peço a todos os responsáveis dos Estados, empresas, organismos internacionais, que promovam a cooperação e não a concorrência, procurando uma solução para todos, vacinas para todos, especialmente os mais vulneráveis e necessitados de todas as regiões do planeta. Em primeiro lugar, os mais vulneráveis e necessitados”, disse.

‘Vírus do individualismo radical’

O Papa Francisco criticou ainda “o vírus do individualismo radical” que torna as pessoas “indiferentes ao sofrimento de outros irmãos e irmãs”, segundo ele. “Não me posso pôr a mim mesmo antes dos outros, colocando as leis do mercado e as patentes de invenções acima das leis do amor e da saúde da humanidade”, pontuou.

Na mensagem, o papa lembrou ainda o compromisso solidário com “as pessoas mais frágeis, os doentes e quantos neste tempo se encontram desempregados ou estão em graves dificuldades pelas consequências económicas da pandemia”, destacando “as mulheres que nestes meses de confinamento sofreram violência doméstica”.

Ao realizar um balanço da situação em diversos países, o Papa referiu-se à América Latina desejando “que a eterna Palavra do Pai seja uma fonte de esperança para o continente americano, particularmente afetado pelo coronavírus, que tem agravado os muitos sofrimentos que o oprimem, muitas vezes agravado pelas consequências da corrupção e do tráfico de drogas.”

Com informações de Agência Ecclesia e El Diario



Juan Arias, colunista do El País: Jesus existiu? O que restou das palavras do Jesus histórico?

 

"Nenhum outro movimento religioso e humanista, seguido hoje por um terço da humanidade, teve tanta influência não só no campo religioso, mas também na cultura e na arte, assim como nos costumes e na política. Afinal, Jesus significa o ideal da humanidade, a esperança de que a morte não acaba na sepultura, que o homem foi criado para a felicidade e não para a dor."


Do El País:


Jesus existiu? Era realmente Deus? Restou-nos alguma frase dele considerada autêntica?

Sua influência histórica é incontestável. Jesus significa o ideal da humanidade, a esperança de que a morte não acaba na sepultura, que o homem foi criado para a felicidade e não para a dor


Uma estátua de Jesus Cristo na Igreja de Gauhati, na Índia.ANUPAM NATH / A


A cada Natal surge a questão de saber se Jesus existiu. Foi realmente um personagem histórico ou criado com restos das velhas mitologias? Nada que influencie a vida dos cristãos ou provoque fissuras em sua fé, mas tampouco é pura curiosidade.

Onde nascem as dúvidas sobre a figura histórica de Jesus, cuja doutrina é professada por um terço da humanidade e é maioria absoluta no Brasil entre católicos e evangélicos? Do fato de que nenhum documento histórico de seu tempo fala de sua existência. Por exemplo, o filósofo Fílon de Alexandria, que morreu depois de Jesus, em nenhum de seus 50 escritos conservados mencionou Jesus, embora tenha se interessado pela grande atividade das seitas dentro do judaísmo daquela época.

Daí a alegria da Igreja ao descobrir que o famoso historiador judeu do final do século I, Flávio Josefo, fez alusões a Jesus, mas com tantos elogios que parece impossível que tenha sido escrito por um judeu. Daí as dúvidas de que o texto tenha podido ser modificado posteriormente pelos cristãos. De fato, o teólogo espanhol Juan José Tamayo em sua obra Por Eso lo Mataron, escreve: “Parece ser um texto muito modificado, sobre cuja autenticidade paira uma longa série de dúvidas”. E de fato o texto parece falso em sua totalidade, visto que reflete muito mais a pregação cristã de Jesus em uma chave totalmente apologética na linha dos evangelhos do que a visão de um historiador judeu da época de Jesus. No entanto, muitos pensam que embora possa ter sido manipulado mais tarde, na realidade é a única alusão à existência de Jesus.

E se dos historiadores judeus daquela época não sabemos praticamente nada sobre a historicidade da existência de Jesus, o que parece impossível é que tenha sido apenas um mito, pois a influência que aquele profeta que foi crucificado pelo poder religioso e civil da época como subversivo acabou tendo na história foi tanta que parece impossível que não tenha existido.

E os evangelhos que a Igreja considerou inspirados? É outra questão muito controvertida, pois havia dezenas de evangelhos cuja autenticidade é difícil de provar. Inclusive dos quatro evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, que a Igreja acabou considerando canônicos, o mais antigo é o de Marcos, escrito oitenta anos depois da morte de Jesus. Saber o que neles existe de realmente histórico e não de mitificação do personagem não é fácil.

Tanto é verdade que os especialistas em estudos bíblicos consideram que de tudo o que é atribuído nos evangelhos a Jesus apenas 12 frases seriam literais. O resto é difícil saber se eram dele ou dos evangelistas. Uma experiência feita por Robert Funk, do Westar Institute, fala muito claramente da dificuldade de poder fazer uma reconstrução das palavras pronunciadas literalmente por Jesus durante sua vida pública. Uma reunião internacional de especialistas católicos e protestantes foi convocada para tentar reconstruir as palavras realmente pronunciadas por Jesus. Os eruditos trabalharam em várias universidades durante cinco anos para separar as frases que consideravam pronunciadas literalmente por Jesus.

A tarefa desses especialistas foi desesperada, pois nem sequer eles conseguiram entrar em um acordo. O que fizeram então foi submeter a uma votação para que cada um com sua especialidade votasse nas frases que poderiam ser consideradas autênticas ou não. Votaram com bolas de quatro cores. A vermelha significava “Jesus disse isso”, a rosa que deveria ter dito “algo parecido”, a cinza “Jesus não disse isso, mas pertence à suas ideias”, e a preta “Jesus não disse isso de forma alguma” e foi fruto da catequese dos primeiros cristãos. Esse trabalho com as cores das bolas foi publicado em um grosso volume intitulado Five Gospels: What Did Jesus Really Say (Cinco Evangelhos: O Que Jesus Realmente Disse). Somente 12 frases foram votadas em vermelho, ou seja, foram consideradas autênticas. Entre elas a já famosa “Ninguém é profeta em sua terra”, a parábola do bom samaritano, pois é uma clara condenação dos fiéis. Quem realmente ajuda o homem ferido na rua é um ateu. O fiel passa ao largo. Outras duas consideradas autênticas são “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” e “É mais difícil um rico se salvar do que um camelo passar pelo fundo de uma agulha”. Também são consideradas autênticas as Bem-aventuranças devido à sua radicalidade.

Outro dos pontos mais delicados e controvertidos da história de Jesus era se ele era ou não Deus. Teólogos modernos, sejam católicos ou protestantes, hoje praticamente concordam que em nenhum momento Jesus se proclama Deus. Ao contrário, ele se chamava de “filho do homem”, que em seu dialeto aramaico significava simplesmente “homem”. Jamais se proclamava Deus. Além disso, no momento de sua morte, quando agonizava na cruz, se queixou a Deus por tê-lo abandonado.

Se tudo isso pode ser importante do ponto de vista puramente histórico, a verdade é que Jesus foi o personagem que mais influência teve na história. Sua revolução ética, sua defesa permanente dos últimos, seu senso de justiça, seus anátemas contra aqueles que desprezam e pisoteiam os mais desvalidos, sua visão sobre a vida e a morte, sua influência não só religiosa, mas secular na vida e na humanidade resistiram intactas nestes mais de dois mil anos.

Nenhum outro movimento religioso e humanista, seguido hoje por um terço da humanidade, teve tanta influência não só no campo religioso, mas também na cultura e na arte, assim como nos costumes e na política. Afinal, Jesus significa o ideal da humanidade, a esperança de que a morte não acaba na sepultura, que o homem foi criado para a felicidade e não para a dor.

Em nome do cristianismo travaram-se guerras, inquisições e extermínios, mas também milhões de ações em defesa dos últimos e em favor dos direitos humanos.

O Natal afinal nos dá, todos os anos, com a bela lenda do nascimento de Jesus, sentimentos de fraternidade, desejos de afeto, amor pela vida e a esperança de que os sentimentos de vida superem os da morte.

Parece-lhes pouco?

Juan Arias é jornalista e escritor, com obras traduzidas em mais de 15 idiomas. É autor de livros como ‘Madalena’, ‘Jesus esse Grande Desconhecido’, ‘José Saramago: o Amor Possível’, entre muitos outros. Trabalha no EL PAÍS desde 1976. Foi correspondente deste jornal no Vaticano e na Itália por quase duas décadas e, desde 1999, vive e escreve no Brasil. É colunista do EL PAÍS no Brasil desde 2013, quando a edição brasileira foi lançada, onde escreve semanalmente.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Podemos desejar feliz Natal nesse 2020? Por Dora Incontri

 

Poderíamos estender indefinidamente as multidões de seres humanos do bem, que estão alinhados com a ética de Jesus.

Jornal GGN:

Podemos desejar feliz Natal nesse 2020? Por Dora Incontri

Natal de 2020. Quisera ter braços e presença para abraçar todos os que amo, os amigos próximos e distantes e mesmo os supostos adversários. Pois somos todos humanos, frágeis, nesse barco terrestre, em meio a tempestades, nevoeiros e zonas de incerteza e obscuridade.

Quisera ter voz e escrita com o alcance da consolação e da esperança para todos os que estão adoecidos física ou psiquicamente com a pandemia, com o isolamento, com o empobrecimento, com a perplexidade que nos assola.

Quisera ter colo para oferecer a todas as crianças do mundo, as que estão trancafiadas em casa, as que estão refugiadas, as que estão em fome e necessidades tantas…

Quisera… quisera… poder anunciar aqui nesse texto notícias alvissareiras: o fim das violências contra qualquer ser humano, contra qualquer ser vivo, o cessar fogo contra a natureza que se arrebenta pela exploração, pelo desmatamento, pela terra arrasada.

Quisera poder falar da queda de todos os governos que aviltam o planeta, de todos os bancos que extorquem nossas vidas, de todos os privilégios de meia dúzia de bilionários do mundo e proclamar uma sociedade fraterna, justa, igualitária, universal… de mãos unidas entre todos os povos.

Quisera afinal poder desejar um feliz Natal… mas sabemos que não será feliz. Com tantas mortes, com tantos abusos, com tantas perversidades, com tantas más notícias… Será necessariamente um Natal enlutado. Mesmo assim, podemos transformá-lo numa experiência meditativa e espiritual, que nos reconforte.

Como? Em primeiro lugar, conectando nossos corações com o personagem central do Natal – aquele que a civilização dita cristã diz seguir, mas está longe de compreender e aplicar sua proposta ética. Uma ética de inclusão, de amor, de perdão, de solidariedade e paz.

Nessa ética, nessa mensagem, nesse exemplo está uma luz que nos mostra um caminho de solução para nossos impasses. Luz que muitos ainda consideram utópica. Tantos não conseguem nem se reconciliar com os que amam num espírito natalino, outros tantos não enxergam como possíveis caminhos para nosso planeta proposições que consideram piegas, como compaixão, fraternidade e acolhimento.

Mas, sim, é essa ética que propôs Jesus que pode nos salvar do caos, da barbárie, da injustiça. Jesus, um personagem histórico que não deve estar encarcerado aos dogmas e às interpretações sectárias das igrejas, mas pode ser entendido como um ser humano, cuja transcendência, renúncia, entrega e amor continuam sendo um alta inspiração para as almas que anseiam pelo Reino da bondade nesse mundo.

Desapego dos bens terrenos, reconciliação entre todos e todas, perdão irrestrito, compaixão para com os que estão em sofrimento, trabalho incessante de serviço ao próximo, mesmo com perda em interesses próprios e egoístas, lutas por causas humanitárias, ecológicas, para transformações estruturais da sociedade… eis a receita para superarmos o capitalismo, o patriarcado, a miséria e todas as mazelas do mundo.

A recente encíclica do Papa Francisco Fratelli Tutti (Todos irmãos) – finalmente um Papa que consegue falar com cristãos e não cristãos – faz um diagnóstico preciso e brilhante de todos os problemas que devastam a terra e a nossa humanidade. E apresenta justamente uma proposta de superação, com essa ética de Jesus, exemplificada por Francisco de Assis, grande inspirador das ideais de Francisco de Roma.

Que posso dizer então, nesse texto natalino? Ressaltar que em meio à avalanche de notícias pesadas que tivemos em 2020, foi publicada uma encíclica luminosa como essa, tivemos muitas lideranças no Brasil e no mundo na resistência contra o retrocesso da liberdade, da ciência, do amor ao próximo. Gente que sofreu, trabalhou, se entregou, fez a diferença. Cientistas, médicos e médicas, enfermeiros e enfermeiras e pessoas da saúde em geral, lutando de corpo e alma, para combater o Covid, para descobrir tratamentos, vacinas, ou mesmo para pegar nas mãos dos moribundos, afastados da família, para que sua morte não fosse totalmente solitária.

Artistas que se viraram do avesso para sobreviver à crise, iluminando lives de música, teatro, dança, poesia… e trazendo à nossas almas aquilo que realmente importa.

Professores que se esfolaram para aprender de última hora como mexer com o Zoom ou outras plataformas, outros tentando passar alguma coisa pelo mero Whatsapp, no caso das crianças que não têm acesso a computadores.

Jornalistas corajosos, que denunciaram, apontaram as calamidades, brigaram pela verdade, contra tantas Fake News que manipulam a população – mesmo enfrentando processos injustos e até ameaças de morte.

Pessoas de todas as profissões, exploradas por um capitalismo selvagem, como os entregadores de comida – só para citar um dos grupos em maior evidência no momento – que não só contribuíram para manutenção do funcionamento social, mas começaram a se organizar politicamente e ganharam consciência de classe.

Negros de todas as partes do planeta, mas sobretudo dos EUA e do Brasil, que apesar das violências inomináveis sofridas, não descansaram um minuto na missão de denunciar, reivindicar, lutar… #vidasnegrasimportam, encerrando o ano aqui com o emocionante filme AmarElo, do Emicida, uma verdadeiro libelo pela retificação histórica dessa vergonha nacional que foi a escravidão e continua sendo o racismo entre nós.

Psicólogos, terapeutas, psicanalistas – que trataram a preços módicos ou gratuitamente – as pessoas em depressão, em surto, em grandes urgências psíquicas, provocadas pela pandemia, pelos lutos complicados, pelas violências aumentadas.

Poderíamos estender indefinidamente as multidões de seres humanos do bem, que estão alinhados com a ética de Jesus.

Lamentamos por aqueles que não cumpriram seu dever humano, cívico, moral de cuidar, proteger, acudir, providenciar medidas que pudessem minimizar a desgraça da pandemia e ainda aprofundaram nossas dores com todo tipo de violência verbal e atos contrários à justiça e à dignidade humana.

Mas resistimos. Sobrevivemos. Para mim, que tenho convicção e fortes evidências de que a vida continua depois da morte, mesmo aqueles que se foram em meio a esse caos da pandemia, seguirão conosco, trabalhando em outro plano para mudarmos esse cenário terreno.

Por isso tudo, e apesar de tudo, desejo que nesse Natal, possamos ter pelo menos um pensamento de paz, uma oração sincera (para aqueles que creem) e uma vibração de amor por toda a humanidade!