" “Meus corruptos são menos corruptos”. Há duas semanas neste GGN, usei esta expressão para ironizar o falso moralismo vigente na sociedade brasileira. Disse que corrupção não é só dinheiro, e não é, que pessoas podem se corromper, por exemplo, em troca de cargos. Sem provas, mas com muita convicção, reafirmo suspeita a indicação de Sejumoro para a pasta da Justiça, depois de suas peripécias jurídicas para prender e condenar o ex-presidente Lula. Causou perplexidade à massa crítica nacional, por exemplo, a naturalidade com a qual Sejumoro perdoou seu colega de ministério, Onyx Lorenzoni, que confessou crime de Caixa 2." - Armando Coelho, ex-representante da Interpol no Brasil
Jesus na goiabeira, a vendedora de açaí e o Coaf puxadinho do MJ
por Armando Rodrigues Coelho Neto, no GGN
“Meus corruptos são menos corruptos”. Há duas semanas neste GGN, usei esta expressão para ironizar o falso moralismo vigente na sociedade brasileira. Disse que corrupção não é só dinheiro, e não é, que pessoas podem se corromper, por exemplo, em troca de cargos. Sem provas, mas com muita convicção, reafirmo suspeita a indicação de Sejumoro para a pasta da Justiça, depois de suas peripécias jurídicas para prender e condenar o ex-presidente Lula. Causou perplexidade à massa crítica nacional, por exemplo, a naturalidade com a qual Sejumoro perdoou seu colega de ministério, Onyx Lorenzoni, que confessou crime de Caixa 2.
Volto em parte ao assunto, depois da notícia de que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf, considerou suspeita movimentação financeira feita por um tal Fabrício Queiroz, PM do Rio de Janeiro, amigo do presidente eleito. Ele movimentou R$ 1,2 milhão em 12 meses. Além disso, num só dia, fez 176 saques e recebeu 59 depósitos em dinheiro vivo. Fabrício é motorista, segurança e assessor do filho de Flávio, filho do futuro presidente da República. Sete funcionários da Alerj, vinculados ao deputado estadual Flávio (eleito senador), fizeram depósitos na conta do motorista. Um desses servidores teria passado quase 250 dias em Portugal. Cacoete de família, claro!. Afinal, o presidente eleito teria como funcionária uma vendedora de açaí em Angra dos Reis/RJ.
Alhos e bugalhos à parte, o dinheiro movimentado pelo motorista de “Flávio Coiso” é incompatível com seus ganhos. A imprensa até já mostrou a casa simples onde ele mora, se é que mora, pois estaria desaparecido. A movimentação suspeita apareceu num desdobramento da Operação Furna da Onça que chegou à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Leia-se, corrupção, lavagem de dinheiro, loteamento de cargos, etc em troca de apoio ao governador do Rio, Sérgio Cabral. Puxa daqui e dali, ainda sem explicação aceitável, o motorista teria dado um cheque de R$ 24 mil reais em favor de Michelle, esposa do presidente eleito.
O estranho dessas estranhezas é estarem ligadas ao falso moralismo que norteou o golpe contra Dilma Rousseff e a prisão sem provas de Lula da Silva. É estranho ainda ver que nesse caso Sejumoro ainda não perdoou ninguém, mas correu dos jornalistas que queriam sua opinião sobre os fatos.
O mais grave, porém, é que o presidente Coiso vai entregar o Coaf a Sejumoro. Bom lembrar que o relatório do Coaf saiu às vésperas da eleição, mas não foi divulgado. Se fosse, certamente arranharia a campanha do golpista e de seus filhos. Também iria dar um trabalho danado à equipe de Steve Bannon para transformar o relatório em “fake news” produzidas por comunistas, que só existem na cabeça de bolsopatas e gente que já viu Jesus na goiabeira. Para quem não sabe, Bannon é o cara que teria manipulado a eleição de Trump, a votação do Brexit no Reino Unido e as eleições 2018 no Brasil.
Coaf na mão do Sejumoro é um grande risco. Fere o Princípio da impessoalidade, consta de um documento que recebi de gente da Receita Federal. Com termos deste documento, resumido e editado, avanço nesta fala.
Nas grandes democracias do mundo ocidental, a atividade de seleção de pessoas e empresas a serem investigadas é separada das atividades operacionais de investigação. Tal separação serve para evitar que o Estado se transforme em aparelho policial e degenere o Estado democrático de direito.
O alerta é importante, pois os investigados podem ser vítimas do capricho. Um jornalista, um advogado, um empresário, um político, pode virar alvo preferencial pelo simples fato de exercer a crítica das escolhas e métodos utilizados pelos investigadores, diz o documento produzido por servidores da Receita Federal. As investigações pelas autoridades policiais, com base nos relatórios do COAF, deve obrigatoriamente ocorrer de forma técnica e impessoal. Permitir o contrário é incrementar a corrupção. E aqui volto ao tema: corrupção não é só dinheiro.
A equipe do Coiso quer transferir o COAF para o MJ por pretensas falhas que ele, nem seus postos Ipiranga sabem explicar. Nos últimos anos houve grande avanço no combate a fraudes fiscais, corrupção e lavagem e não há registros de que o modelo atual tenha sido obstáculo. Quem fiscaliza não seleciona. A tarefa que querem dar ao tirano Sejumoro é dos Auditores Fiscais, conforme definido no Código Tributário Nacional - CTN e em leis específicas, diz o documento que deve virar manifesto. Para Auditores Fiscais, o Coaf não pode virar puxadinho do Ministério da Justiça. O caso do motorista que o diga.
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Os argumentos até agora expostos que justificariam a transferência do COAF para o MJ são inconsistentes. Não se vislumbram vantagens em termos de eficiência no combate à corrupção. Pelo contrário, cria problemas novos de difícil solução. O mais grave é a fragilização do sistema no que se refere à guarda e tratamento das informações sigilosas. Como será feito isso se prosperar a ideia do puxadinho no MJ, com servidores de vários órgãos trabalhando sob a coordenação do MJ, que é um órgão político? Será ilegal qualquer improviso que tente impor aos Auditores Fiscais tarefas a serem realizadas em outros órgãos junto com servidores não autorizados a acessarem e manipularem informações protegidas pelo sigilo. Essa atuação improvisada, com o agravante de ficar submetido a autoridades políticas do MJ, compromete a garantia da guarda dos dados sigilosos, coloca em risco as prerrogativas legais do cargo de Auditor, além de representar um afrontoso rebaixamento da Receita Federal
Armando Rodrigues Coelho Neto - jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-integrante da Interpol em São Paulo
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