"Não, ao contrário do que afirma Bolsonaro, definitivamente essa história (da morte de Herzog) não passou. A ditadura militar e o fascismo continuam vivos na fala do candidato capitão do exército e do seu vice general. " - Leonardo Isaac Yarochewsky, criminalista e Doutor em Ciências Penais
Do Justificando:
Terça-feira, 18 de setembro de 2018
Não ao fascismo: por Herzog e por todos que foram vítimas da ditadura
Arte: André Zanardo
No ano de 1975 – governo do general Ernesto Geisel – o rabino Henry Sobel se recusou a enterrar o jornalista Vladimir Herzog na ala dos suicidas do cemitério israelita. Sobel não aceitou a versão oficial, apresentada pelos militares, acerca das circunstâncias da morte de Herzog nos porões do DOI-CODI em 25 de outubro de 1975. O nome de Vlado – nascido na antiga Iugoslávia e filho de judeus – tornou-se fundamental no movimento pela restauração da democracia no país após o golpe de 1964.
Uma semana após seu assassinato, em 31 de outubro de 1975, Sobel juntamente com Dom Paulo Evaristo Arns e Jaime Wright realizaram um ato ecumênico em homenagem ao jornalista Herzog na Praça da Sé. O evento reuniu 8 mil pessoas, além dos 500 policiais e agentes da repressão.
No ano de 2018, em entrevista ao programa Marina Godoy Entrevista (RedeTV), o candidato à presidência Jair Bolsonaro declarou que “alguns inocentes acabaram tendo um fim que não mereciam, no meu entender“. E prosseguiu: “Lamento a morte dele, em que circunstância, se foi suicídio ou morreu torturado. Suicídio acontece, pessoal pratica suicídio“. Ao ser questionado se não deveria reconhecer o assassinato de Vlado, o candidato Bolsonaro respondeu: “Essa é uma história que passou“.
Não, definitivamente essa história não passou. A ditadura militar e o fascismo continuam vivos na fala do candidato capitão do exército e do seu vice general. Frases do tipo:
1- “Eu fui num quilombola em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado com eles” (Em palestra no Clube Hebraica, abril de 2017).
2- “Ela não merece (ser estuprada) porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar porque não merece”.
3- “Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso” (A um programa de TV, em 1999). E “O erro da ditadura foi torturar e não matar” (Em entrevista no rádio, em junho de 2016).
4- “Não é questão de gênero. Tem que botar quem dê conta do recado. Se botar as mulheres vou ter que indicar quantos afrodescendentes” (Em entrevista em Pouso Alegre, questionado se aumentaria o número de mulheres no ministério, em março de 2018).
As declarações do capitão do exército revelam o seu desprezo pela dignidade da pessoa humana como postulado do Estado Democrático de Direito. As ideias e propostas de Bolsonaro/Mourão afrontam a democracia.
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A democracia, ao que tudo indica, leva a tolerância. A tolerância com as diferenças e divergências são próprias de regimes democráticos que têm na pluralidade um de seus principais pilares. Porém, quando as ditas “diferenças” e “divergências” são incompatíveis com a própria democracia – que como asseverou Winton Churchill “é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais” – não parece possível sustentar, para aqueles que se opõem a própria democracia e os valores do Estado Constitucional, tolerância.
Por seu turno, o fascismo, como bem observou Rubens Casara – na apresentação do livro da filósofa Márcia Tiburi – “possui inegavelmente uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classe etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência do saber. O fascismo é cinza e monótono, enquanto a democracia é multicolorida e em constante movimento. A ideologia fascista, porém, deve ser levada a sério, pois, além de nublar a percepção da realidade, produz efeitos concretos contrários ao projeto constitucional de vida digna para todos”.
O capitão Bolsonaro e o general Mourão enaltecem a ditadura militar (1964-1985), um dos períodos mais nefastos da história do país. Negam a história em nome de interesses escusos e eleitoreiros. O capitão, como já dito alhures, revela uma suposta simpatia pelo Estado de Israel, mas nega que judeus – entre eles Vlado Herzog – foi assassinado pelos seus colegas de farda.
Bolsonaro, com seu ódio, com suas declarações misóginas e racistas insulta todas as minorias. Em uma verdadeira democracia, não há espaço para que seres humanos sejam transformados em objetos e tratados como coisa. Em uma formulação kantiana, o ser humano é um fim em si mesmo e jamais poderá ser tratado como meio ou instrumento. Por tudo, independente de preferência política e partidária, todas e todos que estimam a democracia e respeitam o Estado Constitucional, precisam dizer um rotundo NÃO aos candidatos fascistas.
Leonardo Isaac Yarochewsky é Advogado e Doutor em Ciências Penais (UFMG).
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