"(...) Para além do impeachment e a prisão de Lula, há um objetivo semiótico mais insidioso: polarização (petismo X anti-petismo) e despolitização (o jargão do empreendedorismo e moralismo travando qualquer debate de macro-conjuntura) - infantilização o debate político através do ódio e irracionalidade de uma opinião pública que se acostumou a odiar a Política. E nesse momento, a grande mídia busca mais uma “bala de prata” para turbinar a polarização"
Do Jornal GGN:
por Wilson Ferreira
Mais uma vez a sabedoria desconfiada do velho Leonel Brizola. Acostumado com os truques da geopolítica dos EUA, em 1989 Brizola acusava Lula de ser inflado pela direita para mais facilmente a própria direita, representada então por Collor, vencer. Tudo leva a crer que Bolsonaro e Haddad irão ao segundo turno. Otimismo e ufanismo ganham a esquerda, saudando o gênio político de Lula, mesmo com todo massacre midiático e “lawfare”. Como sempre, a esquerda apenas compreende a superfície da atual guerra híbrida brasileira, em ação desde 2013. Para além do impeachment e a prisão de Lula, há um objetivo semiótico mais insidioso: polarização (petismo X anti-petismo) e despolitização (o jargão do empreendedorismo e moralismo travando qualquer debate de macro-conjuntura) - infantilização o debate político através do ódio e irracionalidade de uma opinião pública que se acostumou a odiar a Política. E nesse momento, a grande mídia busca mais uma “bala de prata” para turbinar a polarização. Será que o velho Brizola tem mais uma vez razão? (ilustração: Felipe Lima, "Gazeta do Povo")
Dias antes da eleições que levariam Lula ao Segundo turno, contra Fernando Collor, em 1989, Brizola foi ao ar alertando as “forças democráticas” de que “a direita tinha feito muito esforço junto a Lula e ao seu movimento... encheram o balão de Lula para leva-lo ao segundo turno... Por que? Pois nós estamos vendo: será muito mais fácil derrota-lo do que qualquer um de nós...”.
O notável crescimento de Fernando Haddad nas últimas pesquisas e a consolidação da ultrapassagem sobre Ciro Gomes é comemorada como praticamente uma definição do cenário do segundo turno: Bolsonaro (o “coiso”) contra Haddad, visto agora como uma esperança civilizatória à beira do abismo da barbárie.
Alguns ainda mais ufanistas vislumbram um crescimento escalar do candidato petista com a transferência integral dos votos que pertenciam a Lula, podendo o candidato do PT até vencer a eleição já no primeiro turno. E muitos saúdam o gênio político de Lula capaz de, dos cárceres da PF de Curitiba, reger o script e de colocar Haddad na cabeça da chapa no cenário mais oportuno.
Nesse momento vêm à mente aquele longínquo vídeo em tom conspiratório de Leonel Brizola. Lá nos anos 80 Brizola via a si mesmo como um legítimo herdeiro da luta contra o “entulho autoritário” que ainda persistia após a ditadura militar. E para ele, Lula era nada mais do que um inocente útil usado para travar as “forças democráticas”, conduzido ao segundo turno para uma derrota anunciada diante de Collor.
Sobre este vídeo, o jornalista Paulo Henrique Amorim fez uma críptica observação: “Collor preferia Lula a Brizola. Deu no que deu... Quem ganhou foi a direita; confiscou a poupança e se entregou aos americanos”.
O perigo da simplificação
Mais do que Lula e o PT (haja vista a facilidade com que foi defenestrado do Poder pela guerra híbrida), Brizola era muito sensível às manobras da logística norte-americana no Brasil – afinal, viveu toda a cena da desestabilização do governo João Goulart pelas estratégias do complexo IPES-IBAD (o Instituto Millennium da época), apoiado pela inteligência dos EUA, de 1962 a 64, preparando a opinião pública para a inevitabilidade e necessidade de um golpe militar.
Outra vez a sabedoria do velho Brizola pode revelar que o atual otimismo da esquerda de retornar ao governo dois anos após o golpe pode ser simplificador e perigoso. E que, mais uma vez, continua a não compreender os movimentos da guerra híbrida. Agora, em sua fase decisiva depois de impregnar o psiquismo nacional com a despolitização e polarização – “Guerra Híbrida”: a continuidade da guerra convencional por meios semióticos. Articulação entre grande mídia, Judiciário, ONGs, spin doctors, paid experts e técnicas de ação diretas nas ruas para acender o rastilho de pólvora.
A articulação da guerra híbrida com as bombas semióticas diárias da grande mídia (bombas linguísticas que explodem fragmentos de significação para impregnar a opinião pública de diversas maneiras – medo, ódio, insegurança, dúvida etc., sem nunca conseguir concatenar causa e efeito) é de uma complexidade de longo prazo, com diversas fases que, muitas vezes, se sobrepõem como camadas. Atuando simultaneamente.
Se não, vejamos. O rastilho foi aceso com as ações diretas nas ruas nas manifestações iniciadas em 2013 no sentido de se criar uma “Revolução Popular Híbrida” – sobre a receita para fazer uma RPH, clique aqui.
Jovens liberais e até a extrema-esquerda (PSOL, PSTU etc.) seduzidos para criar uma espécie de “Primavera Brasileira”, seguindo passo a passo a cartilha de “Ação Direta” (táticas de promoção de “ação não violenta”) das pesquisas do cientista político Gene Sharp, financiadas pela Fundação Ford. Essa era a primeira fase: iniciar a desestabilização do Governo, principalmente às vésperas de eventos de repercussão mundial: Copa do Mundo e Olimpíadas.
A segunda fase, simultânea e perpassando todas as fases posteriores, a judicialização da política e do atual processo eleitoral – prisão de Lula, fake news e STE etc. Subliminarmente reforçada pelo “meganhamento” da Justiça – diariamente, a grande mídia gritando o mantra “policiais federais nas ruas!” para dar destaque de portas sendo colocada abaixo pelos policiais, homens de preto com toucas ninja e armados até os dentes levando políticos e empresários algemados em prisões preventivas.
O que torna a grande mídia numa narrativa monofásica: corrupção e moralismo, pautando Lava Jato, Polícia Federal, MPs e STF.
Claro que o objetivo imediato era, através do lawfare, derrubar o governo Dilma, retirar as lideranças de esquerda, em particular Lula, para abrir espaço à implementação das medidas econômicas neoliberais. Mas, principalmente, desarticular à política externa de cooperação Sul-Sul que, ao lado do Pré-sal, representava uma ameaça à geopolítica aos EUA.
Impregnação semiótica
Mas há algo mais insidioso, uma impregnação semiótica em corações e mente dos brasileiro a longo prazo nesses últimos cinco anos, cujos panelaços, camisetas verde-amarelas e “coxinhas” tirando selfies ao lado de policiais militares de choque nas manifestações anti-Dilma eram apenas a superfície de um movimento generalizado: polarização e despolitização, os dois lados de uma mesma moeda.
Segundo Antônio Martins, em análise no Jornal GGN sobre os gráficos da pesquisa Ibope de intenção de voto divulgada em 19/09, a pesquisa mostra que as eleições 2018 estão polarizadas (uma disputa rasa entre petismo X anti-petismo) e despolitizadas – um nítido descolamento entre as tendências políticas na sociedade (civilização X barbárie, perda das históricas conquistas sociais etc.) e as opções pelos candidatos.
Martins sintetiza da seguinte maneira:
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