sábado, 4 de outubro de 2014

A resposta à arrogância das elites, ao vampirismo dos exploradores, à burrice dos coxinhas e ao golpismo da mídia começará a ser dada neste domingo, dia 05 de outubro


Seguem, para reflexão, dois excelentes textos, o primeiro, de Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, e o segundo, de Fernando Britto, do Tijolaço.com

A resposta de Dilma será nas urnas

Eduardo Guimarães
A primeira vez em que me dei conta da razão pela qual há tão poucas mulheres na política foi ao longo do mandato da ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (1989 – 1993), que sucedeu o mandato do ex-presidente Jânio da Silva Quadros (1986 – 1989).
Erundina governou prioritariamente para o social. A intensidade de programas e medidas voltadas para a população mais pobre desagradou as elites paulistanas, que trataram de acionar sua máquina midiática de “desconstrução” moral.
Erundina foi massacrada pela imprensa paulista ao longo de seu mandato. Porém, por ser mulher, nordestina e, o que é pior, petista, em lugar das acusações de “corrupção” ou de “incompetência”, a principal arma usada contra si foi o deboche.
E deboche, contra mulheres, primordialmente se baseia na questão sexual – ela foi acusada de ser “sapatão”, o que, à sociedade paulistana da época, ao lado de ser “vagabunda” significava a morte moral para qualquer mulher.
A campanha contra Erundina foi tão virulenta que os paulistas preferiram escolher para sucedê-la ninguém mais, ninguém menos do que Paulo Maluf, que pariria Celso Pitta.
Após Maluf e Pitta implantarem uma genuína cleptocracia em São Paulo, com uma máfia de fiscais da prefeitura que chocou o país, deixando a capital paulista literalmente falida, mais uma vez os paulistanos chamaram uma petista para recompor as contas públicas.
Eis que, em 2000, Marta Suplicy se elege prefeita de São Paulo e retoma a profunda preocupação de Erundina com o social. Mais uma vez, os recursos gastos com o social desagradam a imprensa e a elite paulistanas e começa outra campanha de demolição moral.
Como na campanha contra Erundina, mais uma vez a questão de gênero se torna o mote. Eu 2003, Marta cometeu outro crime social, aos olhos da hiperconservadora sociedade paulistana: ousou separar-se de Eduardo Suplicy para se unir a outro homem.
Desta vez, outra pecha mortal para as mulheres brasileiras ignorou a vastidão de obras e programas de distensão social de Marta, a de “vagabunda”.
A partir dali, estereótipos com os quais as mulheres são acossadas se sucederam. Histérica, fútil etc. Marta tornou-se uma caricatura de si mesma e nunca mais se recuperou. Assim como Erundina foi derrotada por alguém como Maluf, em 2004 Marta foi derrotada por José Serra, que pariu Gilberto Kassab, quem, em 2012, viu São Paulo recorrer a outro petista para consertar os estragos da direita.
Fernando Haddad teve azar. Sua impopularidade, de 2012 para cá, foi edificada em cima das tais “jornadas de junho”, que exigiram dele o impossível após seis meses como prefeito. Contudo, sua popularidade já começa a se recuperar e nunca, jamais, foi alvo dos deboches que, em São Paulo, são tão eficientes contra mulheres fortes.
Haddad jamais foi alvo de deboches simplesmente porque é homem. Ninguém consegue citar um só deboche sexista contra ele ou contra qualquer espécime macho da política tupiniquim. Sem destruição moral em uma cidade moralista, deve se recuperar até o fim de seu mandato.
Quando Lula indicou Dilma Rousseff para sucedê-lo, preocupei-me. Ser mulher e petista continua não sendo uma boa combinação na política brasileira.
Claro que qualquer outro presidente petista teria sido alvo da campanha contra o PT que começou em 2012, quando o STF deu à direita os argumentos de que precisava para fazer a velhíssima campanha moralista contra a esquerda. Uma campanha que, inclusive, permitiu o golpe militar de 1964. Mas ser mulher ajudou a desconstruir Dilma.
A imprensa sabe usar muito bem o preconceito contra as mulheres. Principalmente quando são petistas. Em 2009, por exemplo, no UOL, um dos colunistas do portal publicou matéria em que achincalhava Dilma e Marta com epítetos “suaves” como “vadias” e “vagabundas”.

Em 2010, em pleno ano eleitoral, o mesmo UOL e o mesmo Josias publicam charge retratando a então candidata a presidente Dilma Rousseff como prostituta.

Essa é a imprensa que diz que Dilma “jogou sujo” contra Marina…
Ainda em 2010, a direita, valendo-se do fato de Dilma não ter um homem em sua vida – apesar de ser mãe e avó –, usou contra ela a mesma estratégia usada contra Erundina quase vinte anos antes: acusou-a de ser homossexual e inventou até uma “amante” para si.
A partir da desconstrução da imagem de Dilma no ano passado, o machismo contra ela tornou-se virulento. As redes sociais passaram a ser inundadas por montagens em que a presidente da República aparecia nua.
O uso do corpo nu de mulher idosa para o rosto da presidente fez sucesso entre uma legião de mulheres, inclusive, que compartilhavam essas imagens infames acompanhadas daquela indefectível onomatopeia para risadas histéricas, o odioso “kkkkkk…”
Uma das armas do machismo é o corpo nu de uma mulher. Se não estiver em forma, serve para ridicularizar; se estiver em forma, serve para acusações de promiscuidade.
Mas foi em 2014 que o machismo, a misoginia e a falta de escrúpulos contra a condição feminina de Dilma chegou ao máximo. Na abertura da Copa de 2014, na Arena Corinthians, em São Paulo, no “camarote VIP” do Banco Itaú, torcedores gritam “Hei, Dilma, vai tomar no cu”.
A imprensa se esbaldou com essa prova de falta de civilidade, apesar de dissimular. Bastaria não ter repercutido. Mas para “provar” como a presidente seria “impopular”, a Globo, e depois o resto da mídia, destacaram o fato, ainda que depois, vendo a má repercussão da atitude daquelas pessoas, tenham criticado.
Ora, bastava abafar o caso, em respeito às mulheres e à própria condição de chefe de Estado de Dilma. Mas noticiá-lo conferia verossimilhança à tese de que ela estava “acabada”, politicamente.
Dilma manteve, durante todo esse tempo – desde junho do ano passado, quando era massacrada nas manifestações –, uma postura altiva e corajosa. Jamais respondeu aos insultos, jamais perdeu a calma, jamais passou recibo.
Há cerca de um mês, a direita midiática já esfregava as mãos e salivava ante o sangue fresco de Dilma, que imaginava que seria vertido durante a eleição. Pela internet, o machismo, as piadas sexistas, as montagens infames usando a sexualidade de uma senhora sexagenária, mãe e avó, foram uma farra.
Eis que chegamos à véspera da eleição presidencial. Em algumas horas, após tantas humilhações, após tantas calúnias, após tanto machismo, finalmente Dilma responderá aos seus algozes, que terão que rezar para que ela não se reeleja em 1º turno.
Se existir justiça divina, Dilma encerrará essa eleição no próximo domingo. Mas, seja lá como for, seu alto favoritismo nesta reta final e sua condição de supremacia no segundo turno constituem a melhor resposta que essa grande mulher poderia dar.

Agora não é mais só uma eleição. Agora é a História.





Fernando Britto

Não é difícil perceber que se formou, nestes dias finais da campanha eleitoral do primeiro turno (e talvez da própria campanha eleitoral), uma imensa e tresloucada aliança do conservadorismo brasileiro.
Um clima histérico que capturou, admita-se, parte da classe média e da mediocridade fútil que foi entronizada pela mídia como sendo a “inteligência” brasileira.
Chegamos aos píncaros de uma onda de pessimismo que não encontra base nos fatos profundos da economia – não há desemprego, não há queda violenta do poder de compra da população, não há uma crise social como tantas que vimos em nossa história – e muito menos nos da política, porque jamais vivemos numa democracia formal tão completa como hoje, embora os imbecis chamem a tudo de “perigo vermelho”, 50 anos atrasados em sua guerra-fria neurótica.
Mas os jornais publicam um país que arde: as bolsas despencam,  o “mercado” incorpóreo  prevê o desastre e embolsa lucros milionários.
Mas o outro mercado, o da esquina, faz tempo que não tira a plaquinha do “estamos contratando”.
O debate nacional se reduz à pobreza  mental do aparelho excretor de Levy Fidélix, como se Levy Fidélix e e a polivalência de aparelhos excretores fossem as causas nacionais e este não fosse um país que tenta se livrar de sua condição histórica de colônia.
Um Brasil que pode e vai assumir seu papel de um dos gigantes do mundo, já não só pela sua “própria natureza”, e não mais ser, me perdoem, o cu da Terra.
Mas é assim a alienação de nossas classes médias transformadas em diletantes do voto: o ator americano que faz o papel de Hulk ou a neurose  fanática do pecuniário pastor Malafaia  contam mais que o aumento do salário mínimo que alimenta melhor 40% dos 200 milhões de brasileiros.
Ou que os espelhinhos energéticos da Siemens (caríssimos, aliás) fossem nos prover da gigantesca energia de que precisamos e nos fizessem guardar para os espertos o petróleo do pré-sal. Ou se um país pudesse se desenvolver sem portos, ferrovias, gasodutos, estradas, transportes.
Assim é, em tudo, a manipulação que nos impõe, como se fôssemos,  um bando de tolos e superficiais.
O que teria ou não teria dito um safardana que foi demitido da Petrobras e ao qual se promete o perdão de anos de cadeia por todos os roubos se envolver neles  os que o demitiram de lá ( perdão que faria um desqualificado moral que, a esta altura, acusaria a própria mãe) flui, anonima e criminosamente, de meia dúzia de meganhas e promotores que podem dizer o que quiserem, na sombra do que seria, no mínimo, a violação dos seus deveres funcionais, mas os confessados e comprovados aeroportos privados e jatinhos de caixa-2, ah, estes repousam no silencioso limbo da conveniência.
Em tudo se tenta distrair o povo brasileiro do que está por trás da eleição.
É preciso que se deixe de olhar para a história deste país infelicitado por quase ininterruptos 512  anos de governos de elites coloniais, daqui e de fora, para que se atribua a quem nos tenta  tirar daí a culpa pelas carências e roubalheiras que nos marcaram por séculos.
É preciso transformar em tolos ou corruptos quem tem trajetória de luta, de honradez, de amor ao povo brasileiro e que não se serviu dele para exibir-se como um exotismo manso e servil aos senhores de nossa escravidão histórica.
O povo brasileiro a tudo vem resistindo, na sua sabedoria inconsciente, aquela que se forma apenas pela força irresistível da realidade, que é  o único componente da verdade que não se forma com fumaça e que, por isso, não se esfumaça com os dias.
Hoje não é dia mais de dados, de números, de “denúncias”.
Nada disso importa mais, porque nossa imprensa e nossas classes dominantes transformaram dados, números e “denúncias” em  panfletos imundos que se penduram nas bancas de jornal ou se exibem na tela das televisões. O nosso povão, na sabedoria que lhe vem da vida e da pele, na sua maioria, já o entendeu e o repele.
Hoje e os próximos três dias são de honradez, de altivez, de dignidade e, por isso, de absoluta tranquilidade.
Sabemos contra o que lutamos e pelo que lutamos.
A nossa causa é digna, é bonita, é humana, é generosa.
A deles, é feia, sombria, perversa e, por isso, precisa revestir-se de mil mentiras e das falsas juras de quem há muito entregou  sua fé, como Judas, pelos trinta dinheiros com que os novos (e eternos) romanos compram alguns de nossos filhos.
Os que representam a causa do povo brasileiro, nestes dias finais, devem se sublimar.
Banharem-se na  serenidade dos  que sabem que sentem a razão e o destino a seu lado.
Distantes do ódio, do nervosismo e dos medos, inseguranças próprias de cada um e de todos nós, seres humanos.
Há momentos em que as circunstâncias são o  senhor supremo nossos atos e decisões.
Porque  é a hora que faz os grandes e os que e aqueles que apenas planejam sê-lo declinam quando chega o momento da verdade.
Este é o instante em que já não somos apenas nós mesmos, mas somos o o passado mesclado ao futuro,  somos nossos pais e nossos filhos,  somos negros, pardos, brancos, índios, somos esta massa diversa, fervilhante e teimosa que é o povo brasileiro .
A História, esta  força imensa que habita em cada um de nós, nos absorve quanto mais a amamos.
E, quando  amamos agudamente, temos a confiança dos amantes e  deixamos que ela nos possua e fale por nossa boca.
E as palavras, então, tornam-se invencíveis.


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