O gesto de Cid deveria servir de exemplo, em vez de motivo para críticas vazias, inoperantes e ressentidas, daqueles que nada propõem a não ser mais do mesmo
Ainda sobre o ousado gesto de Cid Gomes
por Roberto Bitencourt da Silva
É inacreditável – mentira, infelizmente acredito – ler postagens e textos em redes sociais, nos quais personagens reconhecidos ou autoproclamados de esquerda, defenderam os policiais amotinados no Ceará ou criticaram o bravo, audacioso, explosivo, gesto do senador pedetista Cid Gomes. Não é inacreditável. Mas, é inadmissível.
No leque das referidas e controversas tomadas de posição encontraram-se, entre outros, o PSTU e o ex-deputado federal psolista, Chico Alencar – fina flor do anti-brizolismo e do moralismo lacerdista no Rio, um dos ícones do célebre adágio “a esquerda que a direita gosta”, formulado pelo grande Darcy Ribeiro. Na contramão, a petista e ex-presidente Dilma Rousseff manifestou-se prontamente, denotando digna posição solidária ao senador auferido por balas.
Honesta e francamente, mal sei das posições e diretrizes políticas que orientaram e hoje norteiam a trajetória do senador do Ceará. Não sei se é reacionário, acho que não, situado à direita, se é liberal, de esquerda (também acho que não; mero achismo, perdoem esse carioca, pouco atento às especificidades da política cearense, que tenta se libertar das amarras de uma visão sudestinocêntrica).
O que sei é que se trata de um ex-governador do Ceará e, principalmente, irmão do Ciro Gomes – notoriamente um político com significativo estofo intelectual, que oferece contribuições enriquecedoras ao debate público nacional, ainda que sob os estritos limites de um superado desenvolvimentismo, que igualmente delimita os horizontes de demais partidos e personagens inseridos no terreno da esquerda institucional, como Lula, PT, PDT, PC do B, Psol etc.
O que importa: o senador cearense, atendendo aos apelos e às preocupações da população da cidade de Sobral, foi ao município tentar conversar com as frações flagrantemente bandidas da polícia amotinada, que ameaçava a população. Segmentos policiais ainda articulados com o nefasto, reacionário, criminoso e vende pátria bolsonarismo.
Cid revelou, praticamente e com destemor, uma estreita sintonia com um princípio político há muito defendido pelos democratas radicais e pelos socialistas: o mandato imperativo, atrelando e subordinando a sua sorte à da população atemorizada.
Peitou os bandidos milicianos, ou familiarizados com as práticas da milícia, com engenho e rara iniciativa de ousadia. Foi baleado. Corajoso e audaz. Seguramente, vai entrar para o folclore político nacional, como manifestação individual incomum de bravura e de ruptura com a passividade e a acomodação das lideranças eleitorais e partidárias. Nunca se esqueçam: a passividade e a docilidade política às regras do jogo político – prevalecentes em cada época – é moeda corrente na história política brasileira. Lamentável patrimônio e tradição nacional.
O gesto de Cid deveria servir de exemplo, em vez de motivo para críticas vazias, inoperantes e ressentidas, daqueles que nada propõem a não ser mais do mesmo, destituídos de capacidade criativa e imaginativa, atrelados às suas rotinas, como também à lógica eleitoreira e da obtenção de boquinhas nas instituições políticas. Lógica que, definitivamente, não irá retirar o Povo Brasileiro da lamentável e desprezível situação neocolonial em que se aprofunda a economia e o destino nacional.
Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.
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