quarta-feira, 27 de maio de 2020

Religião, Bolsonarismo, Direitos Humanos e Reunião Ministerial do dia 22 de Abril de 2020, por Marcos V. Reis



Em vários momentos, na fala do presidente, ele evoca que está cumprimento a vontade de Deus em sua gestão e está preparado para vencer os “inimigos”.
Jornal GGN:

Religião e Política em Debate

Religião, Bolsonarismo, Direitos Humanos e Reunião Ministerial do dia 22 de Abril de 2020

por Marcos Vinicius de Freitas Reis

No último final de semana a principal notícia dos noticiários dos variados meios de comunicação do Brasil e certamente do mundo foi a respeito da polêmica e exótica reunião ministerial ocorrida no dia 22 de abril de 2020. A gravação da reunião foi autorizada a divulgação pelo decano do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Melo, em função do inquérito aberto para investigação da possível interferência na gestão da polícia federal do Rio de Janeiro para possíveis benefícios particulares que teoricamente pudesse beneficiar a família do nosso atual presidente Jair Bolsonaro.
Ao longo das duas horas de reunião houveram diversos palavrões, pedidos de prisões aos ministros do STF e a prefeitos e governadores, privatização dos bancos públicos, modificações nas leis de defesa ambiental e demarcação de terras indígenas, defesa do armamento da população brasileira, defesa do estado mínimo, reforço na defesa dos valores cristãos, família e de uma nova visão dos direitos humanos.
Quero destacar aqui a visão da reunião sobre os direitos humanos que vem sendo implementada no Brasil pelo atual governo. Desde o período eleitoral o lema da campanha foi “Brasil acima de tudo, e Deus acima de todos”, e nos pronunciamentos oficiais não são raros os momentos que o nosso presidente evoca a passagem bíblica “Conhecereis a Verdade, e a Verdade vos libertará” João 8:32. O governo atribui a si mesmo sua gestão como conservadora, defesa da tradicional da família, cristã, liberal e nacionalista.
As referências bíblicas e religiosas citadas no parágrafos anterior representam ataque total a laicidade do estado. Beneficia grupos cristão católicos e evangélicos em detrimento dos outros grupos religiosos. Ao enunciar passagens bíblicas e alusão ao Deus cristão em agendas presidenciais podemos interpretar um claro aceno à sua base cristã que comunga com os valores defendidos pelo atual governo bolsonarista. Sem dúvida segmentos do universo evangélico e católico defendem o atual executivo presidencial. Em resumo: na ótica desses grupos religiosos é a primeira vez depois da redemocratização que o Brasil possui um presidente verdadeiramente comprometido com os valores judaico-cristãos. Reforçam ainda que ele é um enviado de Deus que possui a missão de levar o Brasil ao caminho do desenvolvimento, e supressão dos problemas sociais e o Brasil de fato ser um país cristãos.
A reunião ministerial ocorrida no dia 22 de abril de 2020 foi reforço da visão cristã e conservadora que este governo representa. Em vários momentos, na fala do presidente, ele evoca que está cumprimento a vontade de Deus em sua gestão e está preparado para vencer os “inimigos”. Ou seja, aqueles que em gestões anteriores conduziram a política brasileira em ataque frontal aos valores cristãos.
Um dos personagens emblemáticos da supracitada reunião é a Ministra Damares Alves que lidera o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Em poucos minutos de fala defendeu a prisão de prefeitos e governadores. Salientou que reforçaria ações judiciais ao que considera ataque aos direitos humanos proferidos por governos de esquerda no período da pandemia, e defendeu o combate aos possíveis abusos contra padres e pastores em possíveis multas aplicadas por estimulo à aglomeração. Ainda alertou na necessidade de ampliarmos a militância no combate à legalização do aborto e o combate à violência a índios e as mulheres. Damares para que não sabe é pastora de uma Igreja Evangélica famosa no Brasil.
Acreditamos nesta coluna que deve ter ocorrido abuso por parte dos governadores e prefeitos em algumas situações, e que devem ser revistas urgentemente. Mais não esquecemos que lideres religiosos católicos e evangélicos de expressão nacional defendem abertamente serem contrários ao isolamento social e reabertura das atividades religiosas que geram aglomerações e circulação de pessoas.  Ou seja, contrariando as diretrizes da Organização Mundial da Saúde, Ministério da Saúde brasileiro e não reconhecendo o isolamento que deu certo em outros países do mundo.
Tanto a fala da ministra quanto a fala do presidente pouco solidarizaram com as famílias que têm perdido entes queridos em função do Coronavirus. A região Norte, que foi citada na fala da Ministra Damares, é a região que mais sofre com a expansão do novo coronavirus. O sistema de saúde há muito tempo colapsou e são muitas mortes diariamente ocorridas. Estados falidos e quebrados necessitam de ajuda do governo federal com políticas públicas de compra de mascaras, respiradores, hospitais de campanha, medicamentos , luvas, repasses financeiros para atender aos pobres desempregados e aos pequenos empresários para manter os empregos. Pouco disso foi feito. O que vemos é em nome de Jesus ou da crença religiosa promessas de prisão aos gestores municipais e estaduais que tem feito ao máximo para estancar o desastres causado pela terrível pandemia.
Entendemos por direitos humanos a defesa dos interesses dos excluídos, pobres e marginalizados da sociedade. Esperamos do governo federal políticas públicas para melhoria da situação econômica, política e social das camadas pobres do Brasil. Esperamos do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos articulações, projetos e investimentos para retirar as famílias da situação vulnerável que atualmente se encontram. Esperamos um mínimos de solidariedade com a dor alheia e seus problemas sociais.
O que vemos na reunião foi pronunciamentos de ódio ao pobre e ao povo brasileiro como um todo em nome de Deus. Em nenhum momento debateu ações que pudessem ser efetuadas para salvar vidas e pensar como o Brasil possa ser reconstruído depois da pandemia. O que vimos na reunião ministerial é o que representa este atual governo: autoritarismo, delirante, fascista, preconceito com pobre, amazônico, indígena, mulher, negro e outros grupos marginalizados. A discussão de políticas redistributivas nem foram mencionadas. Esta é a visão dos direitos humanos deste governo e que é endossado por pastores, padres, espiritas e outros segmentos religiosos.
A presença do elemento religioso na reunião nos mostra como as Instituições Religiosas são importantes para a manutenção de um projeto de poder. Há interesses políticos e econômicos em apoiar o governo Bolsonaro. Estar na base de governo de qualquer gestão é ter a possibilidade das estruturas públicas e a influência do cargo articular benefícios para o meu grupo religioso. Isto é clientelismo e patrimonialismo clássicos. Nada tem isto de novo. E pura e simplesmente velha reprodução do que tem mais de corrupto na política brasileira. Repito: o que temos são instituições religiosas defendendo princípios antidemocráticos e reproduzindo atos da velha política. Nada de novo nos apresenta.
Para finalizar, as religiões e religiosidades tem papel fundamental na manutenção das estruturas democráticas, laicidade e a pluralidade cultural do Brasil. As articulações feitas com o poder executivo, legislativo e judiciários necessitam caminhar para atender as demandas dos excluídos, ou seja, interesse em formulação de políticas públicas voltadas para o bem comum e não pensando em meus valores particulares religiosos ou morais. Ser cristão é solidariza com a dor do outro. O governo que se diz cristão deve em vez de ficar falado palavrões, defender a prisão de ministros do supremo, prefeitos e governadores, deve trabalhar para salvar vidas e de fato que os direitos humanos sejam para defender os pobres.
Marcos Vinicius de Freitas Reis – Professor da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) do Curso de Graduação em Relações Internacionais. Possui graduação em História pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e mestrado em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Docente do Curso de Pós-Graduação em História Social pela UNIFAP, Docente do Curso de Pós-Graduação em Ensino de História (PROFHISTORIA). Membro do Observatório da Democracia da Universidade Federal do Amapá. Docente do Curso de Especialização em Estudos Culturais e Políticas Públicas da UNIFAP.  Líder do Centro de Estudos de Religião, Religiosidades e Políticas Públicas (CEPRES-UNIFAP/CNPq). Interesse em temas de pesquisa: Religião e Politicas Públicas. E-mail para contato: marcosvinicius5@yahoo.com.br

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