terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A lição obscurantista do Encontro da Consciência "Cristã"

 


Carlos Antonio Fragoso Guimarães

  Em época de avanço da mediocridade e da superficialidade de venda fácil, o campo da religião se mostrou propício para o enriquecimento rápido de picaretas e manipuladores de consciência das pessoas simples que se deixam levar por promessas fáceis e ensaiadas em um roteiro de dizeres ao estilo auto-ajuda...

  Ao invés da reflexão espiritual que leve à maturidade humana, à tolerância e ao respeito do próximo, o que vemos é o estímulo ao exclusivismo egoísta, à pertença a uma forma rígida de doutrina (que, claro, desconsidera as demais), o fundamentalismo, o fanatismo e o adesismo, pago, à certas seitas espetaculosas. De fato, é tal a associação entre a ética evagélica e o espírito do capitalismo que os líderes "detentores de verdade" de tão certos estão que devem ser ouvidos e seguidos, exigem rios de dinheiro de tudo e de todos.

  Em vez de destacar a reflexão íntima e a vivência de uma espiritualidade que nos une a todos na grande familia humana, muitos por vaidade e imaturidade preferem as diferenças e pequenezas que nos dividem e fazem destas as pedras fundamentais de suas doutrinas...

  O mais absurdo é a força que a bancada evangélica exerce sobre os políticos, sempre ameaçando com as eleições, casos eles não liberem dinheiro para os seus eventoss (e olhe que o Brasil, no papel, é um país laico).

Isto é amplamente percebido em um evento chamado Encontro para a Consciência "Cristã", criado por evangélicos da linha neo-pentecostal para reprimir um outro evento macro-ecumênico, leigo e participativo, chamado Encontro para a Nova Consciência, ainda sobrevivente e já em sua 21ª Edição. Este encontro original, da Nova Consciência, estimulava o diálogo, respeito e troca de idéias interreligioso e filosófico e, com isso, ajudou a divulgar o nome da cidade de Campina Grande, Paraíba, durante o período do Carnaval, trazendo à esta cidade, antes parada durante o período momesco, um afluxo notável de pessoas. Mas os evangélicos se sentiram incomodados com este sucesso e, assim, se sentiram desafiados a acabar com este fórmula madura de tolerância. Assim, através da bancada evangélica, planejaram e construíram o seu agressivo encontro próprio, e fazem o máximo de barulho sobre isso, refletindo o fundamentalismo e o fanatismo que lhes é típico, com um discurso apologético auto-referente, dogmático, mas preocupado com um redução literal ao pé da letra escrita dos textos, sem levar em conta seu contexto histórico e processo de formulação, e ao moralismo de fachada, aplicado aos outros, gerando uma postura perseguidora, arrogante e nada cristã.

  Como fala com rara lucidez e muita propriedade o esclarecido pastor Ed René Kivtz, doutor em ciências das Religiões, essa atitude fundamentalista e arrogante de alguns evangélicos"acaba gerando uma postura inquisitorial, uma vez que sua identidade  implica o combate violento a tudo e todos que compreende como  inimigos da sã doutrina e da moral e dos bons costumes. O fundamentalismo é  expressão do que há de pior  prepotência ocidental, que confunde Cristianismo com positivismo e evangelização com colonização e, seguindo os modelos das potências econômicas, pretende com que a fé, tal como por eles e tão só por eles entendida, seja equivalente á cultura do homem branco imperialista."

  A belicosidade dos "conscientes cristãos" (pois assim intitulando-se subentende-se que cristãos são apenas eles e que, belicosamente, eles são os verdadeiramente "conscientes", ou seja, a percepção de mundo e dos assuntos do mundo deles é melhor que a dos demais) chegou ao ponto de, além de ficarem á porta do Teatro Municipal, onde ocorre o maduro Encontro para a Nova Consciência, acusando a dialogicidade, o enconto das diferenças e o pensamento laico e ecumênico serem coisa do diabo, chegarem a queimar pneus e tábuas, em claro desafio inquisitorial ao Encontro da Nova Consciência, há alguns anos. Para eles, não importa que Deus faça a luz do sol brilhar para todos, a verdade é propriedade exclusiva evangélica. Se julgam superior ao Rei, que se faz tolerante para com todos, e buscam impor sua visão aos demais. A Bíblia deve ser literalmetne interpretada, especialmente o belicoso Antigo Testamento, e o pensamento divergente deve ser perseguido e a tolerância ecumênica, destruída.

 Isso sem falar na mistura de denominações e estilos, muitas vezes mercantilistas, dos pastores do tal evento da "Consciência Cristã". Não é à toa que novamente evangélicos esclarecidos (alguns até participantes do Encontro da Nova Consciència) questionem esta postura infantil. É novamente o pastor Ed René Kivtz que reflete que

"(...) um é o evangelho dos evangélicos, outro é o evangelho do reino de Deus. Registro que uso o termo “evangélico” para me referir à face hegemônica da chamada igreja evangélica, como se apresenta na mídia radiofônica e televisiva.
O evangelho dos evangélicos é estratificado. Tem a base e tem a cúpula. Precisamos falar com muito cuidado da base, o povo simples, fiel e crédulo. Mas precisamos igualmente discernir e denunciar a cúpula. A base é movida pela ingenuidade emocional e singeleza da fé; a cúpula, muitas vezes é oportunista, mal intencionada, e age de má fé. A base transita com certa liberdade entre o catolicismo, o protestantismo e as religiões afro. A base de certa forma busca a Deus onde parece haver algo bom, vai à missa no domingo, faz cirurgia em centro espírita, leva a filha em benzedeira, e pede oração para a tia que é evangélica. Assim é o povo crédulo e religioso. Uma das palavras chave desta estratificação é “clericalismo”: os do palco manipulando os da platéia, os auto-instituídos guias espirituais tirando vantagem do povo simples, interesseiro, ignorante e crédulo.
A cúpula é pragmática, e aproveita esse imaginário religioso como fator de crescimento da pessoa jurídica, e enriquecimento da pessoa física. Outra palavra chave é “sincretismo”. A medir por sua cúpula, a igreja evangélica virou uma mistura de macumba, protestantismo e catolicismo. Tem igreja que se diz evangélica promovendo “marcha do sal”: você atravessa um tapete de sal grosso, sob a bênção dos pastores, e se livra de mal olhado, dívida, e tudo que é tipo de doença. Já vi igreja que se diz evangélica distribuir cajado com água do Jordão (i.é, um canudo de bic com água de pia), para quem desejasse ungir o seu negócio, isto é, o seu business. Lembro de assistir a um programa de TV onde o apresentador prometia que Deus liberaria a unção da casa própria para quem se tornasse um mantenedor financeiro de sua igreja."


 Vê-se, pois, que a tal "consciência 'Cristã' " é um encontro político-religioso pensado para se fazer  exclusivista e proselitista, pois pretende fundos públicos para se impor e demonstrar força (cadê a tolerância e a mansidão pregadas por Cristo, que eles dizem seguir?) e foi criado para competir e destruir um outro evento já existente e que tinha por característica exatamente a tolerância, o diálogo e a aceitação das diferenças, exemplificando o diálogo e a fraternindade....

Mas há o que se aprender da comparação entre estes dois eventos bem diferentes. Um, é atrelado à religião, o outro, à espiritualidade. A religião é construção de quem, percebendo de certo modo a transcendência, contudo não a vivencia intimanete, mas busca encerrá-la em suas mãos, engarrafá-la, tornando-se, desde então, propriedade farisáica de certos doutores da lei, antigos e moderns. Por isso temos centenas de religiões (basta contar o número das que se dizem evangélicas). Já quem tem espiritualidade, percebe que elas possuiem diferentes entendimentos da divinidade e, assim, consegue cicular e dialogar com elas sem pertencer a nenhuma, rigidamente.

 A religião é rígida, pretende ter receitas prontas e pretende seguir literalmente textos (embora duas religiões com os mesmos textos possam interpretar diferentemente as mesmas coisas, ainda que se digam literalistas). Preferem a letra que mata ao espírito que vivifica. Já a espiritualidade te convida a refletir que os textos apenas apontam para algo que deve ser vivenciados e sentido mais do que lido. A espiritualidade procura ver para onde apontam os textos mais do que adorar os próprios textos que apenas apontam, com a carga contextual de suas épocas, para o mais além...

 Portanto, a religião é a forma fragmentada e egóica de se entender, ou melhor, pretender entender Deus, enquanto a espiritualidade de um Francisco de Assis, de um Gandhi, de uma Madre Teresa, de um Martin Luther King, de um Dalai Lama ou de um  Chico Xavier mostram que a espiritualidade é uma e permite a fraternidade dentro e na diversidade. A religião é para quem necessita ser guiado, a espiritualidade é para quem despertou para caminhar.

  O Encontro evangélico chamado de "Consciência 'Cristã' " é tão somente um partido religioso. O Encontro da Nova Consciência é a demonstração da diálogo e convivência entre pessoas espiritualmente maduras para trocarem idéias e perceberem a riqueza da unidade na diversidade.

  A religião é produto social. Quando se torna um grêmio exclusivista e auto-indugente e não uma comunidade de diálogo com o diferente, é causa de divisões e, com estas, de extremismos. Já a espíritualidade sadia reconhece a parte de verdade de cada tradição religiosa, mas a entende como parte e não como todo. É no reconhecimento que a centelha divina está em todos e que todos os caminhos são expressões da busca de Deus que promove o entendimento, a fraternidade e a civilidade. É o reconhecimento de que todos provimos de uma mesma fonte superior, que está acima e além de nosso intelecto, e por isso pede a vivência do amor. E isso é, de fato, uma Nova Consciência... Consciência que causa unidade na diversidade..... E não a utilização de uma interpretação seletiva de um texto que sirva de pretexto para a agressividade (para eles, Direito de Expressão), e qualquer reação normal vai ser interpretada por eles como maldade do outro e não de quem a provocou, como nos quadrinhos abaixo:

Um comentário:

  1. Quem usa palitó e bíblia embaixo do braço ou quer votos ou quer dízimo. Este é o Brasil

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