segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

A verdade imortal e o moral e intelectualmente cada vez mais pobre Brasil nas mãos de uma elite obscurantista, por Aracy Balbani




 Em tempos de mentiras, deslavadas ou mal-lavadas, de supostas autoridades, os viventes honestos se perguntam se ainda é possível que a verdade vença. Não falta quem queira sepultá-la sob a terra (Terra plana!), o aço ou concreto, afogá-la em águas turvas, silenciá-la por suborno ou intimidação, ou dissolvê-la no ar.



A verdade imortal, por Aracy Balbani

A Verdade é, por essência, Lei.
Rabindranath Tagore (1861-1941)
A Índia é fascinante. Seja pelo conhecimento médico milenar da Ayurveda, pela trajetória de Mahatma Gandhi, pela poesia de Rabindranath Tagore – o primeiro asiático a ser laureado com o Nobel de Literatura, em 1913 -, pela beleza monumental do Taj Mahal ou pela culinária.
Mais recentemente, notabilizou-se pelo seu impressionante desenvolvimento científico e tecnológico, inclusive no programa espacial, que não ajuda a vender travesseiros e foi mencionado por estudiosos brasileiros.  Documento publicado pela Câmara dos Deputados aponta que “(…) apesar de termos reconhecida competência de pessoal no setor aeroespacial, estamos perdendo oportunidades para outros países, como Índia e China, que investem mais e melhor nessas atividades”.
A Índia e sua tradição religiosa e cultural inspiraram inúmeras obras cinematográficas de sucesso mundial, livros, ensaios fotográficos deslumbrantes e documentários. Entre os últimos, “A História da Índia”, produzido pela BBC e apresentado pelo historiador Michael Wood, e “Templos da Índia”, exibido pela Globosat e narrado por Maitê Proença. Seja no relato de antigos colonizadores, da atriz brasileira famosa por receber pensão do governo brasileiro na condição de filha de militar, numa telenovela global ou no florescimento de Bollywood (com “B” mesmo), a Índia atrai multidões para a frente das telinhas e telonas. Regina Duarte, colega de Dona Maitê, está apta a confirmar isso.
A mística presente em muitas manifestações artísticas da Índia permite comparações interessantes com a cultura ocidental. Tagore, por exemplo, teria afirmado: “Não quero rezar para me proteger dos perigos, mas para ser destemido ao encará-los”.
Na mitologia grega, há a fábula do Rei Midas, aquele cujo castigo foi ficar com orelhas de burro. Decretou-se segredo do reino sobre o fato, mas o barbeiro da corte cavou um buraco e nele gritou “O rei tem orelhas de burro!”. Os juncos que cresceram ali depois se incumbiram de espalhar a frase com o vento.
Dante Alighieri (1265-1321) dedicou grande parte dos 14.000 versos da Divina Comédia a descrever os castigos que aguardariam a humanidade após o Juízo Final. As penas variam: condenação dos covardes ao ataque incessante de moscas e vespas no vestíbulo do inferno, passando pelos fossos do oitavo círculo da morada de Lúcifer – onde os aduladores permaneceriam eternamente imersos em fezes; os corruptos, trapaceiros e prevaricadores seriam imersos em betume fumegante; os hipócritas se arrastariam aos prantos com pesadíssimas capas de chumbo; os ladrões seriam picados por serpentes, arderiam em chamas, ficariam reduzidos a cinzas e renasceriam para perpetuar o suplício –, até aquelas do nicho reservado aos traidores da família, da pátria, dos amigos ou dos benfeitores. No Inferno do poeta florentino há lugar garantido e punição exemplar para todo tipo de mau caráter. Mas isso é ficção, tá OK?
Em tempos de mentiras, deslavadas ou mal-lavadas, os viventes honestos se perguntam se ainda é possível que a verdade vença. Não falta quem queira sepultá-la sob a terra (Terra plana!), o aço ou concreto, afogá-la em águas turvas, silenciá-la por suborno ou intimidação, ou dissolvê-la no ar.
Se Rabindranath Tagore alcançou algo sobrenatural que ainda não compreendemos, presume-se que nada deterá a verdade. Ela resistirá a facadas, rajadas de balas, ataque de fake news digital, guerra jurídica – a tal lawfare -, estatísticas forjadas ou a qualquer artimanha. Ainda que se tente pulverizar a verdade, ela poderá permanecer indelével e livre numa partícula subatômica qualquer. Talvez flutue triunfante como um fóton – ora partícula, ora onda. Sabe lá.
No nosso humilde arroz-com-feijão terreno, de apenas quinhentos e poucos de História, é melhor não subestimar a verdade. E viva o curry!

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