Do Deutsche Welle:
Esquema de venda de joias: entenda os principais pontos
PF apura suposta atuação de organização criminosa para desviar e vender itens de luxo recebidos pelo governo de Jair Bolsonaro em viagens ao exterior. Ex-presidente nega irregularidades. Polícia pede quebra de sigilo.
Segundo as investigações, desvios começaram em meados de 2022 e terminaram no início deste ano, mas os itens negociados foram recebidos em viagens desde 2019.
Uma nova investigação envolvendo o entorno do ex-presidente Jair Bolsonaro veio à tona nesta sexta-feira (11/08), com a deflagração pela Polícia Federal (PF) da Operação Lucas 12:2, que apura a suposta atuação de uma organização criminosa que desviava e vendia presentes de luxo dados ao governo federal por autoridades estrangeiras.
A suspeita, segundo a PF, é de que os valores recebidos nas vendas, realizadas no exterior, fossem diretamente para o bolso do ex-mandatário, muitas vezes em dinheiro vivo, para que não houvesse registros de transações bancárias em seu nome.
No âmbito da investigação, que realizou buscas e apreensões em endereços de aliados de Bolsonaro, a PF também pediu a quebra dos sigilos bancário e fiscal do ex-presidente. A operação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, a quem caberá, também, a decisão sobre a quebra dos sigilos.
A seguir, confira em seis pontos o que se sabe até agora sobre o esquema de venda dos objetos de luxo.
Os personagens envolvidos
A Operação Lucas 12:2 fez buscas e apreensões em endereços de quatro pessoas próximas ao ex-presidente: o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e que já foi personagem de outras polêmicas envolvendo o ex-mandatário, como a suposta falsificação da carteira de vacinação; Mauro Lourena Cid, pai de Mauro Cid e ex-colega de turma de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) nos anos 1970; o tenente Osmar Crivelatti, também ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; e Frederick Wassef, advogado que já defendeu a família Bolsonaro.
A operação investiga se militares ligados ao ex-presidente fizeram negociações de joias e itens de luxo de maneira ilegal, cujo valor pode ter superado R$ 1 milhão. Os objetos foram dados a Bolsonaro como presentes durante o período em que ele esteve na Presidência da República.
Segundo a PF, os fatos investigados configuram crimes de peculato e lavagem de dinheiro. A operação foi batizada de Lucas 12:2 em alusão ao versículo 12:2 da Bíblia, que diz: “Não há nada escondido que não venha a ser descoberto, ou oculto que não venha a ser conhecido”.
A origem da investigação
A Lucas 12:2 foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes em desdobramento do inquérito sobre as chamadas milícias digitais, que investiga a atuação de uma possível organização criminosa na internet que atuaria com o objetivo de atacar o Estado Democrático de Direito e desestabilizar as instituições democráticas. No âmbito dessa apuração, aberta após o encerramento do inquérito das fake news, o entorno de Bolsonaro passou a ser investigado.
O documento da Corte que autoriza a Operação Lucas 12:2 cita especificamente o caso das joias vindas da Arábia Saudita em outubro de 2021 e que teriam sido incorporadas ilegalmente ao patrimônio do ex-presidente, em um caso que veio a público em março deste ano.
As peças sauditas foram presentes para o então presidente Jair Bolsonaro e sua esposa, Michelle, e entraram no país em comitiva do Ministério de Minas e Energia que esteve no Oriente Médio em eventos oficiais.
Quais sãos as provas do esquema
Na decisão que determinou a realização da Operação Lucas 12:2, Moraes cita o avanço das investigações da PF, apontando que o dinheiro das vendas dos presentes era remetido a Bolsonaro “por meio de pessoas interpostas e sem utilizar o sistema bancário formal”. O objetivo seria ocultar “a origem, a localização e a propriedade dos valores”.
Entre as provas obtidas na investigação está um áudio que revela uma conversa de Mauro Cid, na qual ele cita 25 mil dólares “possivelmente pertencentes” ao ex-presidente.
No dia 18 de janeiro de 2023, Mauro Cid trocou mensagens com Marcelo Câmara, apontado como assessor de Bolsonaro, sobre a venda de esculturas presenteadas pelo governo do Bahrein durante viagem oficial.
Na avaliação dos investigadores, o general Mauro Lourena Cid estaria com o valor de 25 mil dólares, “possivelmente pertencentes a Jair Bolsonaro”. Conforme o relatório, os interlocutores também evidenciaram receio de usar o sistema bancário para “repassar o dinheiro ao ex-presidente”.
“Tem vinte e cinco mil dólares com meu pai [Mauro Lourena Cid]. Eu estava vendo o que era melhor fazer com esse dinheiro, levar em cash [dinheiro vivo] aí. Meu pai estava querendo inclusive ir aí falar com o presidente. E aí, ele poderia levar. Entregaria em mãos. Mas, também pode depositar na conta. Eu acho que quanto menos movimentação em conta, melhor, né?”, escreveu Mauro Cid.
Outro indício é uma foto em que aparece o rosto de Mauro Lourena Cid. Ao fotografar uma caixa com itens para que fossem avaliados, o militar acabou deixando seu rosto aparecer no reflexo.
Conforme as regras do Tribunal de Contas da União (TCU), presentes de governos estrangeiros dados ao governo brasileiro devem ser incorporados ao Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH), setor da Presidência da República responsável pela guarda dos presentes. Ou seja: esses itens não poderiam ficar no acervo pessoal de Bolsonaro, nem deixar de ser catalogados.
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