"Eu estou falando de um Estado que avança em operações ilegais e se torna mais poderoso do que ele é na esfera legal. Porque ele vai agora determinar sobre a sua vida de uma forma totalitária. E você não consegue se contrapor a ela."
"Cinco décadas de grupo de extermínio resultaram em 70% de votação em Bolsonaro"
Jornal GGN - José Cláudio Souza Alves, sociólogo, ex-pró-reitor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e autor do livro "Dos Barões ao extermínio: a história da violência na Baixada Fluminense", disse em entrevista à Agência Pública que milícias não devem ser consideradas um "poder paralelo", pois elas são uma extensão do próprio Estado.
"Eu estou falando de um Estado que avança em operações ilegais e se torna mais poderoso do que ele é na esfera legal. Porque ele vai agora determinar sobre a sua vida de uma forma totalitária. E você não consegue se contrapor a ela."
Sem ter influência dentro da estrutura do poder público, as milícias não sobreviveriam. Não à toa, ao contrário do tráfico de drogas, as milícias conseguem eleger seus representantes, e ter membros trabalhando dentro de gabinetes de parlamentares é muito normal.
"A grana da milícia vai financiar o poder de um político como Flávio Bolsonaro e o poder político de um Flávio Bolsonaro vai favorecer o ganho de dinheiro do miliciano. Isso roda em duas mãos. É determinante então que essa estrutura seja assim. Ela só se perpetua porque é assim", disse.
Segundo o especialista, as milícias diferenciam-se do tráfico porque atuam em outras atividades, geralmente comerciais. Pode ser organizando a segurança de uma comunidade, ou cobrando taxas de comerciantes paga garantir sua operação. Há ainda negócios imobiliários que têm por trás a ajuda de pessoas com cargos públicos, nem que seja na condição de informantes. Fora as execuções sumárias.
A estrutura foi consolidada há décadas, a ponto de sair um chefão e outros 100 que estavam na fila se colocam de prontidão para assumir o comando, disse o professor, ao lembrar da ordem de prisão contra o ex-capitão do Bope Adriano Nóbrega, acusado de comandar o Escritório do Crime, um grupo de extermínio suspeito de ter executado Marielle Franco.
Capitão Adriano tinha mãe e esposa contratadas há anos no gabinete de Flávio Bolsonaro. O miliciano é amigo de Fabrício Queiroz, motorista de Flávio. Para o professor, é assim que o miliciano vende influência no poder público.
Ele minimizou, contudo, a crítica às populações que elegem políticos ligados a milicianos. Para Alves, essas pessoas vivem sob a violência do crime organizado em confronto com os aparatados do estado. Na prática, se veem sem opção e acabam sendo facilmente coagidas.
"Cinco décadas de grupo de extermínio resultaram em 70% de votação em Bolsonaro na Baixada. Três gestões do PT no governo federal, 14 anos no poder, não arranharam essa estrutura. Deram Bolsa Família, vários grupos políticos se vincularam ao PT e se beneficiaram, mas o PT não alterou em nada essa estrutura. O PT fez aliança eleitoral, buscou apoio desses grupos."
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