Segue, para reflexão, três textos sobre o vergonhoso "acordo" dos bancos e do FMI, com incisivo apoio da Alemanha de Angela Merkel, imposto sem piedade ao sofrido povo da Grécia que ousou dizer "não", em um referendo histórico, à exploração a que já são submetidos pela mesmo conjunto de vampirismo financeiro neoliberal chamado Troika - no que, aliás, já é chamado de operação "Cavalo de Troika". Claro, os neoliberais, sua mídia tendenciosa e os coxinhas acham todo esse conchavo cruel o "certo" e o "inevitável"....
Alemanha destrói a soberania da Grécia em golpe talvez fatal para a União Européia
Por Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia, em texto publicado originalmente no New York Times e reproduzido no blog Viomundo:
Mesmo que tudo isso seja verdade, a lista de exigências do Eurogrupo é loucura. A hashtag do twitter #ThisIsACoup [IssoÉUmGolpe] é exata. A lista é mais que dura, é vingança pura, destruição completa da soberania nacional e sem esperança de alívio. É, presumivelmente, uma oferta para que a Grécia não aceite; ainda assim, é uma traição grotesca de tudo o que o projeto europeu supostamente representava.
Há algo que tire a Europa do precipício? Dizem que Mario Draghi [primeiro-ministro da Itália] está tentando reintroduzir alguma sanidade, que [o presidente francês] Hollande finalmente está demonstrando alguma reação à “economia da moralidade” alemã, que ele fracassou em demonstrar no passado. Mas a maior parte do dano já está feito. Quem vai acreditar nas boas intenções da Alemanha depois disso?
De certa forma, a questão econômica se tornou secundária. Ainda assim, sejamos claros: o que aprendemos nas últimas semanas é que ser membro da zona do euro significa que os credores podem destruir sua economia se você sair da linha. Isso não tem nada a ver com os princípios econômicos da austeridade. É tão certo quanto antes que impor austeridade dura sem alívio da dívida é uma política fracassada independentemente de o país aceitar ou não o sofrimento. Isso significa que mesmo uma completa capitulação da Grécia é uma rua sem saída.
A Grécia conseguirá sair do euro? A Alemanha tentará bloquear uma recuperação econômica? (Desculpem, mas essas são as perguntas que agora precisamos responder).
O projeto europeu — que eu sempre elogiei e apoiei — recebeu um golpe terrível, talvez fatal. O que quer que você pense do Syriza ou da Grécia, não foram os gregos que deram este golpe.
PS1 do Viomundo: De Wolfgang Munchau, no Financial Times:
Ao forçar uma derrota humilhante de Alexis Tsipras, os credores da Grécia fizeram mais que provocar mudança de regime na Grécia ou colocar em risco as relações do país com a zona do euro. Eles destruiram a zona do euro como a concebíamos e demoliram a ideia de uma união monetária como um passo em direção à união política democrática. Ao fazer isso, reverteram às disputas de poder nacionalistas da Europa dos séculos 19 e 20. Eles transformaram a zona do euro num sistema tóxico de câmbio fixo e moeda única, governado pelos interesses da Alemanha, mantido pela ameaça de destituição absoluta daqueles que desafiarem a ordem. A melhor coisa que pode ser dita sobre as negociações do fim de semana é a honestidade brutal daqueles que perpetraram a mudança de regime.
PS2 do Viomundo: Pelos termos do acordo, a Grécia não receberá qualquer alívio em sua dívida e, sob monitoramento da troika, será obrigada a tomar medidas ainda mais duras do que aquelas que rejeitou no referendo, inclusive colocando 50 bilhões de euros em bens públicos sob controle dos credores. É uma forma de “punir” coletivamente a população que votou majoritariamente contra a troika, em outras palavras, de punir a democracia. Abre as portas para a ascensão na Grécia da extrema-direita anti-europeia do partido neonazista Golden Dawn.
* Artigo publicado originalmente no New York Times.
Ontem, começou a morrer a zona do euro
Por Marisa Matias*, Socióloga e Eurodeputada, artigo publicado no Esquerda.net
A imposição de uma humilhação nacional, contra a vontade inequívoca e esmagadora de um povo, à qual se seguirão mais três anos de massacre gerará inevitavelmente um ressentimento profundo
Na maratona noturna de ontem, jogava-se a sobrevivência do Euro e projeto europeu. Hoje de manhã, são muitos os que celebram a salvação da Zona Euro e da Grécia. Os mais ousados ainda puxam dos ideais da união e da solidariedade, celebrando um novo pacote de “ajuda à Grécia”.
A realidade é que, esta noite, atravessaram-se várias das fronteiras que tinham sido declaradas como intransponíveis. A mais clara de todas foi a irreversibilidade do Euro, pulverizada por um ultimato escrito com todas as linhas. Com esta, foi-se também a da democracia. A União Europeia nunca foi uma União democrática mas foi, até hoje, uma União de Estados democráticos. Ambas estão associadas. Na Europa da Sra. Merkel, a porta da rua é serventia de quem não obedece.
O acordo que ontem foi imposto, sob ameaça de expulsão, traz de volta a austeridade e sequestra ativos fundamentais do Estado grego. Curiosamente, nessas condições, a reestruturação da dívida grega, que Schäuble tinha garantido ser contra os tratados, poderá ser discutida.
Os termos deste acordo são relevantes para determinar o que será o futuro da Grécia e do primeiro governo grego que se atreveu a lutar para defender o seu país, mas temo bem que, para a Europa, seja tarde demais. A imposição de uma humilhação nacional, contra a vontade inequívoca e esmagadora de um povo, à qual se seguirão mais três anos de massacre gerará inevitavelmente um ressentimento profundo.
As respostas a esse ressentimento só poderão ser emancipatórias, senão não serão respostas, mas terão que ser certamente construídas contra esta pseudo-União, na Grécia e onde quer que os cidadãos se fartem dos maus-tratos de uma elite de rufias e mafiosos. Agradeçam à Sra. Merkel: ontem à noite, começou a morrer a Zona Euro. Paz à sua alma.
*Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga. Título original: O princípio de novos princípios
Foto: Pixabay
Crise: os pontos do vergonhoso acordo Grécia-Eurogrupo
TER, 14/07/2015 - 12:11
Enviado por Antonio Ateu
do Deutsche Welle
Parlamento grego tem dois dias para aprovar primeiras medidas, que incluem reforma das aposentadorias e do mercado de trabalho e aumento de impostos. Terceiro pacote de resgate pode chegar a 86 bilhões de euros.
O acordo sobre um terceiro pacote de resgate para a Grécia, fechado nesta segunda-feira (13/07) entre os líderes da zona do euro, exige que o país execute amplas reformas, algumas delas em prazos apertados.
O compromisso não prevê um corte nas dívidas da Grécia, mas considera a possibilidade de ampliar o prazo de vencimento das atuais dívidas.
A estimativa é de que o valor total do terceiro pacote de resgate fique entre 82 bilhões e 85 bilhões de euros, com um período de três anos.
Diante das necessidades imediatas de dinheiro da Grécia, o acordo prevê que 10 bilhões de euros sejam liberados imediatamente para o setor bancário grego. O valor pode chegar a 25 bilhões de euros.
Ficou acertada ainda a criação de um programa para estimular o crescimento econômico e a geração de empregos, orçado em 35 bilhões de euros.
Outro ponto destacado é que a Grécia deve buscar um novo empréstimo também com o Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de o atual programa do Fundo vencer, em março de 2016.
A Grécia também terá de se submeter ao controle das "instituições", como é chamada a antiga troica, formada por Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI.
Os líderes da zona afirmam que é importante restaurar a confiança na Grécia. Para isso, a primeira missão de Atenas será apressar a aprovação de reformas legais no parlamento em diferentes prazos.
O novo pacote só sairá do papel depois de Parlamento grego aprovar a implementação das seguintes medidas:
Até esta quarta-feira (15 de julho):
– Aprovar reformas iniciais no sistema de aposentadorias, dentro de um plano mais amplo de reformas para garantir a sustentabilidade de longo prazo do sistema.
– Garantir a independência total do serviço nacional de estatísticas da Grécia, o Elstat.
– Aumento do Imposto sobre o Valor Agregado (VAT) e ampliação da base de cobrançapara elevar as receitas do Estado.
– Aplicação integral das principais disposições do Pacto Fiscal Europeu, formalmente conhecido como Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação da União Econômica e Monetária e que regulamenta o deficit público e o nível de endividamento dos países que usam o euro.O objetivo é assegurar a meta de superávit primário, por meio de cortes quase automáticos nas despesas caso haja desvio da meta.
Até a quarta-feira da semana que vem (22 de julho):
– Aprovar a adoção do Código de Processo Civil, que é uma profunda reformulação de normas e disposições para o sistema de justiça civil e pode acelerar significativamente os processos judiciais e reduzir os seus custos.
– Transpor para a legislação nacional, com o apoio da Comissão Europeia, as regras comuns para a recuperação e a liquidação bancárias, conhecidas como Diretiva de Recuperação e Resolução dos Bancos (DRRB). Elas regulamentam a prevenção de crises bancárias e asseguram a liquidação ordenada de bancos em situação de insolvência, minimizando, ao mesmo tempo, o impacto desses fenômenos na economia real e nas finanças públicas.
O governo grego também se comprometeu a reformar e fortalecer algumas áreas apontadas como frágeis pelas instituições europeias. Tais reformas deverão ter etapas e prazos claros tanto para a definição de legislação específica como para implementação. São elas:
– Iniciar uma ambiciosa reforma nas aposentadorias e especificar políticas para compensar totalmente o impacto fiscal da decisão da Justiça grega sobre a reforma das aposentadorias de 2012. Além disso, terá de aplicar a cláusula de deficit zero ou uma medida alternativa aceita por ambas as partes até outubro de 2015.
– Adotar reformas mais ambiciosas de mercado, com a implementação de todas as recomendações básicas da OCDE, incluindo abertura do comércio aos domingos, ampliação dos horários de abertura, alteração na lei de propriedade de farmácias, reformas no mercado de leite e de padarias e desregulamentação de algumas profissões, como condutor de ferrys.
– Privatização da rede de distribuição de energia, a não ser que possam ser encontradas outras medidas que tenham um efeito equivalente para estimular a competitividade do setor, desde que as instituições concordem.
– No mercado de trabalho, executar uma rigorosa revisão e modernização das negociações coletivas, incluindo demissões coletivas, de acordo com práticas recomendadas internacionalmente e pela União Europeia.
– Adoção de medidas para fortalecer o setor financeiro, incluindo uma ação decisiva contra créditos "podres" (non-performing loans) e medidas para fortalecer a governança do Fundo Helênico de Estabilização Financeira (HFSF) e dos bancos, em especial eliminando qualquer interferência política em procedimentos de nomeação.
Um dos pontos mais críticos das obrigações assumidas pelo governo grego se refere às privatizações e à modernização da máquina administrativa do Estado. Para isso, a Grécia concordou em:
– Desenvolver um amplo plano de privatizações com melhor governança. Ativos do Estado grego serão transferidos para um fundo independente que irá rentabilizá-los por meio de privatizações e outros meios. A rentabilização dos ativos será uma das fontes para o pagamento do novo empréstimo junto ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) e para a geração, durante o período de vigência do novo empréstimo, de um total de 50 bilhões de euros, dos quais 25 bilhões serão usados para o pagamento da recapitalização dos bancos. Metade do dinheiro restante será usada para reduzir a dívida pública e os demais 50% servirão para investimentos. O fundo será estabelecido na Grécia e será administrado por autoridades gregas sob a supervisão de instituições europeias. Uma legislação será adotada para garantir a transparência e fixação dos preços dos ativos.
– Em linha com os esforços do próprio governo grego, modernizar e fortalecer significativamente a administração grega, colocando em prática um programa, sob os auspícios da Comissão Europeia, para capacitar e despolitizar a administração do país. A primeira proposta deve ser encaminhada em 20 de julho após discussão com as instituições. Deverá ocorrer ampla redução de custos na administração pública.
– Normalização dos métodos de trabalho com as instituições, incluindo o trabalho em Atenas, para melhorar a aplicação do programa e o seu controle. O governo precisa consultar e concordar com as instituições em todos os novos projetos legislativos nas áreas relevantes em tempo adequado, antes de submetê-los à consulta pública ou ao parlamento.
– Exceto para o caso da lei da crise humanitária, o governo grego deve reexaminar, com a intenção de alterar, as leis que foram introduzidas a partir do acordo de 20 de fevereiro e que recuam em compromissos previamente estabelecidos ou identificar compensações aos direitos adquiridos que foram criados subsequentemente.
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