terça-feira, 18 de outubro de 2022

Bob Fernandes: Bombástico, o “Pintou um clima” esquenta a campanha, e a resposta é “atentado” que não foi atentado

 

Do Canal do analista político Bob Fernandes:



BOMBÁSTICO, O “PINTOU UM CLIMA” ESQUENTA A CAMPANHA, E A RESPOSTA É “ATENTADO” QUE NÃO FOI ATENTADO

Fim de tarde, começo da noite do domingo. Do cineasta italiano Giuseppe Tornatore revejo Ennio.

Com e sobre o compositor e músico, também italiano, Ennio Tornatore.

Mestre maior da música para o cinema. Um mestre da música.

Arte. Toda a beleza que humanos são capazes de criar...

Música, cinema, prosa, poesia, beleza, amor...

E esperança.

Mas o mundo não é só isso. Muito menos o Brasil de agora.

Minutos antes das oito da noite do domingo. Bolsonaro chega à TV Bandeirantes para o debate com Lula.

E diz numa entrevista o que repetiria no debate.

Que não é pedófilo. Espanto para os ainda então desatentos ao “Pintou um Clima”.

Diz também o que, de forma oblíqua, acrescentará no debate.

Que não é genocida, que não é canibal e que não é amigo de milicianos.

Uma vacina contra temas que frequentaram a campanha nas TVs e redes sociais nos últimos dias e horas.

Vacina contra temas que já são parte da sua história.

Por conta do “Pintou um Clima”, o presidente da República se viu obrigado a fazer uma live no início da madrugada do domingo.

Diz Bolsonaro terem sido as “piores 24 horas da sua vida”.

Falou do que ele mesmo, em uma entrevista, citou como local onde “meninas de 14 e 15 anos, bonitinhas” se arrumavam pra “ganhar a vida”. Quando era apenas uma ação social.

O que na cena descrita por Bolsonaro tinha ares de bordel, era um curso de estética, maquiagem e corte de cabelo.

No palco da Band, Bolsonaro valeu-se da decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, para se defender.

O ministro do STF, por ora presidente do TSE, proibiu o PT de usar o material na campanha.

Alexandre de Moraes, como bem sabemos, é aquele ministro que Bolsonaro já chamou de “canalha”.

Ministro ameaçado de impeachment por aliados do presidente, se Bolsonaro reeleito.

Ao que parece, não apenas o presidente teve péssimas 24 horas antes do debate.

Advogado da família em casos vários, Frederick Wassef tentou buscar um outro sentido para o “pintou um clima”.

Wassef, recordemos, aquele do Queiroz escondido em um imóvel de sua propriedade, em Atibaia.

Vamos à livre interpretação do “pintou um clima”.

- O que ele falou do clima é muito claro, gente. É o clima da questão do comunismo.

Essa cena lembra Ionesco e Beckett, dois dos dramaturgos do chamado Teatro do Absurdo.

No confronto, Lula não tocou diretamente no assunto “Pintou um Clima”.

Porque não é do seu estilo e porque poderia pegar mal depois da decisão do TSE.

Mas sua equipe não deixou de alertar jornalistas...

O pequeno broche pregado no paletó de Lula - e Bolsonaro viu - é símbolo da campanha contra exploração sexual infantil.

Confiantes na falta de memória e percepção, não faltaram absurdos.

Bolsonaro levou para o palco como assessor seu ex-ministro e ex-juiz Moro.

Dallagnol, o chefe da Lava Jato no Ministério Público Federal, também estava na comitiva.

Percebam a tessitura toda do absurdo.

Dallagnol, aquele do tristemente famoso powerpoint.

E a 6 dias do primeiro turno, em 2018, o Moro juiz vazou uma delação do ex-ministro Palocci.

Delação que depois a Polícia Federal não aceitou. Por ser uma farsa.

Com frases bombásticas que até hoje repercutem, mas a delação mesmo só tinha palavras. Sem nenhuma prova.

E por isso a PF a rejeitou.

Ali, naquela véspera do primeiro turno, Moro ganhou o futuro Ministério da Justiça.

O então juiz recebeu convite ainda durante a campanha. Como depois revelaria o vice-presidente Hamilton Mourão.

Moro, lembremos, deixou o governo Bolsonaro, humilhado.

Tem quem entenda ter sido mera encenação a demissão. Não foi.

Recorde-se a reunião que o Brasil só conheceu porque o STF obrigou o governo a torná-la pública.

Com Moro presente, sendo humilhado, e Bolsonaro dando a senha para sua demissão logo em seguida.

- Eu não vou esperar foder minha família toda, de sacanagem, ou amigo meu porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura... Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele. Não pode trocar o chefe dele, troca o ministro!

Foi o ministro Celso de Mello, então decano do STF, quem liberou esse vídeo da reunião ministerial do “passar a boiada” e demais. Com aqueles diálogos desastrosos para a imagem do governo.

“Ah, mas Jair e Moro estão juntos de novo!”.

Claro, estratégias à parte, tipos como estes a história e o caráter se encarregam de juntar.

“Ah, mas o Alckmin, a Tebet e o PDT do Ciro estão com o Lula”, rebatem Tico e Teco.

Tico e Teco são os dois neurônios de muitos e muitas.

Alckmin, Tebet e o PDT de Ciro não eram, não são juízes. Nem procuradores da República.

Não condenaram um réu para, em seguida, servir o adversário interessado e beneficiado na condenação.

E no debate da Band, capachescamente, lá estavam Dallagnol e, na beira do palco, Moro.

“Ah, mas agora ele é senador eleito”, diz o Teco para concordância do Tico.

Vamos à cena no Teatro do Absurdo.

Também a cenografia a cargo do filho Carlos, o Carluxo, fiel discípulo da escola Steve Bannon.

Moro logo à frente da plateia, à vista de Lula, como tentativa de intimidação.

Como intimidação, não funcionou.

Mas teve função num dos blocos do debate.

Porque essa é uma isca que Lula ainda morde. Como mordeu com aquele “padre de festa junina”.

A condenação imposta por Moro aos seus comandados da Lava Jato de Curitiba. Do Ministério Público e da Polícia Federal.

Mesmo anulada e desmoralizada a condenação por parcialidade e ilegalidades, a isca é sempre usada.

E toca no que Lula, aos 76 anos, tem de mais caro dentro de si.

Não há aviso ou alerta prévios, ou durante, que, até aqui, impeçam Lula de morder essa mesma isca.

Veremos no debate da Globo.

A dupla Bolsonaro e Moro encenou a desmoralização final da Lava Jato no palco.

O juiz que interferiu na eleição em 2018 e ajudou a eleger Bolsonaro agachou-se novamente para servi-lo.

A Lava Jato já morta juridicamente, no palco da Band foi sepultada também definitivamente na história.

Na GloboNews, o epitáfio. Por Merval Pereira.

Que, fora abalizadas opiniões do Tico e do Teco, não pode ser chamado de “cumunista”.

Nem de ser alguém que não tenha defendido a Lava Jato e Moro com todo empenho. Ouçamos, vejamos Merval.

- Presença do Moro como assessor do Bolsonaro num debate só mostra uma coisa: que o alvo dele sempre foi o Lula. E que ele, depois de ter feito tudo isso, ter falado tudo isso do Bolsonaro, voltar a apoiar o Bolsonaro para derrotar o Lula é um atestado de que ele, desde o início, estava com esse objetivo. É uma coisa que…

Ainda na categoria dos absurdos.

O tema “igreja, cristãos” não foi citado no palco, salvo quando Bolsonaro o usou.

Ao morder a isca Petrolão, Lula entregou preciosos minutos, que poderiam ter sido usados exatamente neste tema.

Durante a semana toda, Bolsonaro foi duramente criticado pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, e por arcebispos.

De Belém do Pará, Alberto Taveira, e de Aparecida, Orlando Brandes.

No santuário, em Aparecida, aquele espetáculo bizarro, absurdo.

Com fiéis de Bolsonaro fazendo arruaça e bebendo diante da igreja.

Vaiando Dom Brandes e em coro chamando jornalistas, inclusive da TV da Igreja, de “cumunistas”.

Absurdo que tem se repetido país afora.

No domingo, depois das saraivadas da CNBB e de arcebispos, foi a vez do cardeal de SP, Dom Odílio Scherer.

Scherer, um reconhecido conservador. Que, no seu Twitter, se viu obrigado a responder ataques de Tico e Teco.

Os dois neurônios.

Que acusam o cardeal de ser “cumunista”. Por quê?

Porque cardeais, do mundo todo, têm a cor vermelha numa faixa sobre a batina.

E, também a depender da hierarquia, um mini-manto em vermelho. Eventualmente, vermelho também no solidéu.

Aquela pequena touca posta no cocoruto. Semelhante ao Kipá dos judeus.

Pois não é que o cardeal de São Paulo teve que informar não ser “cumunista” nem abortista?

Ao mesmo tempo, o cardeal Scherer aproveitou a deixa para baixar a ripa, com endereço claríssimo. Escreveu:

- Parece-me reviver os tempos da ascensão ao poder dos regimes totalitários, especialmente o fascismo.

Entendamos definitivamente, caros ólogos, caras ólogas de todas latitudes e longitudes.

É o cardeal de SP, a mais rica cidade da América Latina, um conservador, ainda que sem citar nominalmente, referindo-se a Bolsonaro & cia.

É o fascismo. São os fascistas tentando tomar o Poder de vez.

Assumido no Teatro do Absurdo, o “compromisso” público de Bolsonaro.

O de não atacar e não tentar controlar o STF, se reeleito.

Promessa e compromisso que valem o que valem sua palavra e história.

O presidente chama o ministro Alexandre de Moraes, entre outros, de canalha.

Mas no debate usou Alexandre de Moraes para escapar ao clima por ele mesmo, Bolsonaro, pintado.

No teatro, o presidente usou a expressão "bandidos, bandidos”.

Na manhã seguinte, tiroteio e um morto em Paraisópolis, periferia de São Paulo.

Tarcísio anunciou o tiroteio no Twitter. E atravessou o dia num tom de ambiguidade.

Teria sido um atentado contra ele.

Os esgotos do bolsonistão nas redes sociais cultuam armas e mortes, incluindo ameaças.

Nunca foram solidários em meio ao genocídio e tantos assassinados por bolsonaristas.

Mas nesta segunda robôs e fakes pularam no morto de Paraisópolis.

Para fazer política para fingir compaixão.

No fim do dia Tarcísio já admitia: não foi um atentado contra ele, teria sido intimidador.

O tiroteio entre PMs e bandidos foi a 100 metros.

Os PMs envolvidos negaram a fantasia do “atentado”. Disseram ao UOL:

- O alvo não era Tarcísio.

Por fim o Secretário de Segurança de São Paulo, general João Camilo, próximo de Bolsonaro enterrou a fantasia. Nesta terça, nas manchetes:

- Secretário de Segurança descarta indícios de atentado contra Tarcísio.

A armação serviu aos esgotos nazifastas, e as campanhas do bolsonistão o dia inteiro.

24 horas depois, Rodrigo Garcia, governador de SP, e no momento apoiador do Bolsonistão também descartou a fantasia do atentado.

Quem já viu, por exemplo, Collor politizar um aborto inexistente e o Caso Abilio Diniz em 1989 ou a “bolinha de papel do Serra” em 2010 e a “mamadeira de piroca em 2018” pode esperar qualquer coisa.

Mais ainda tendo Bannon/Carluxo como diretor de cena.

E atenção à história dos hackers que sequestraram todos os arquivos da Record.

Nesta terça, voltou ao ar o bombástico “Pintou o Clima”.

Bolsonaro, a mulher Michelle ao lado, gravou um pedido de desculpas.

Às meninas venezuelanas que ele insinuou estarem arrumadas para “ganhar a vida”.

Nesta terça surgiram novos vídeos.

Com Bolsonaro insinuando ou afirmando que meninas venezuelanas estavam bem arrumadas para “fazer programa”.

Recordando. Tudo isso começou no vídeo em que Bolsonaro diz isso:

- Olhei umas menininhas, três, quatro, bonitas, de 14, 15 anos, arrumadinhas num sábado, numa comunidade. E vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei: ‘Posso entrar na tua casa?’ Entrei.

Não faltam nem faltarão bang-bangs nesse novo Velho Oeste chamado Brasil.

Brasil de Bolsonaro.

Indígenas cercados e mortos, terras invadidas, garimpo ilegal, destruição ambiental, ataques e assassinatos comandados por poderosos contra os que resistem.

Militares na Funai prometem atropelar IBAMA e liberar garimpo em terras indígenas.

Não só. Fantasia à parte, a real: em agosto, queda de 1,3% na atividade econômica. O tal PIB, Produto Interno Bruto.

O preço da gasolina está subindo de novo.

Pesquisa do IPEC nesta segunda-feira. Lula com 50% das intenções de voto, Bolsonaro com 43%.

Pesquisa é momento, é o agora.

E Arthur Lira, presidente da Câmara do orçamento secreto, o Secretão, delira.

Quer urgência na votação para criminalizar os institutos de pesquisa.

E no Secretão, Lira, não vai nada?

Domingo de teatro no palco da Band, com a venda de um país que só existe no discurso absurdo.

Que ignora 680 mil mortos, um genocídio absolutamente evitável na pandemia, 33 milhões de pessoas com fome e o país sendo arrastado ao delírio religioso coletivo.

É por isso que a arte, se não fosse mais nada, é, pode ser um bálsamo nas nossas vidas.

Música, cinema, poesia, prosa, beleza, amor. Esperança.

Humanos que não perderam a humanidade.

Como Ennio Morricone, capaz de criar beleza até com a violência do velho Velho Oeste.

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