Agora se tem presente o maior fator de aglutinação: o fantasma do bolsonarismo, que continuará presente mesmo após sua derrota eleitoral
Por Luis Nassif (Jornal GGN)
É significativo o artigo de Fernando Gabeira em O Globo – “Esperança no Brasil pós-Bolsonaro – Bolsonarismo deixará um legado amargo. Mas pelo menos haverá de novo a possibilidade de sonhar”. Remete, de forma nítida, ao período pós-ditadura, à Constituinte.
Gabeira não é um Pablo Ortellado, seu colega de Blog – um neo-direitista que deturpa vergonhosamente os fatos e estabelece as analogias mais amalucadas, para as suas catilinárias. A última de Ortellado, em um momento em que o país lamentava o assassinato de um líder petista por um bolsonarista, foi acusar os “defensores de direitos humanos” de planejar as manifestações em frente à casa de Higienópolis, da senhora acusada de manter a empregada em estado de escravidão, inclusive sendo responsável por um tiro na janela. Hoje em dia, na mídia, provavelmente apenas Boris Casoy tem tal capacidade de manipulação dos fatos.
Mesmo assim, o perfil do Gabeira das últimas décadas estava longe de um conciliador. Desde que se aliou a José Serra, aliás, tornou-se um radical em tempo integral. Daí a relevância de seu artigo. Mas, também, os sinais de que poderá haver um pacto de imunidade semelhante ao que sucedeu a Lei da Anistia.
Gabeira propõe que se deixe de lado a identificação das culpas pelo bolsonarismo, ante o objetivo maior, que é erradicá-lo da face da política. Está certo.
Mas o objetivo maior não pode deixar de lado a punição de crimes reais cometidos nesse período, o papel de Eduardo Pazuello, os militares de Bolsonaro que estimulam o golpismo, a corrupção em todos os níveis.
Em relação às disputas políticas, Gabeira antevê na sociedade em geral uma imensa vontade de reconstruir o país. Diz ele:
“Meu otimismo com a saída de Bolsonaro não se prende tanto à instalação de outro governo e outro Congresso. Ele se baseia mais na energia social que pode ser liberada quando sua passagem se consumar.”
E está coberto de razão. Em poucos momentos da história contemporânea vi clima igual, com as pessoas tirando das gavetas as ideias, os projetos, pensando no novo.
Não foi possível logo após a Constituinte, devido à situação econômica complicada, à morte de Tancredo Neves e ao controle do Centrão em formação sobre o governo Sarney.
O governo Collor permitiu algumas experiências exitosas na Câmara Setorial da Indústria Automobilística e no meio ambiente. Mas era extraordinariamente autocrata, anti-político, anti-social para aglutinar as forças sociais do país. O governo de Itamar foi um interinato, consagrado pelo Plano Real.
Quando Fernando Henrique Cardoso assumiu a presidência, imaginava-se que toda a energia acumulada seria liberada. Havia bons quadros na área social, na área de tecnologia e inovação. Mas FHC era um acomodado, inebriado pelas pompas do poder, mas sem gana de trabalhar as grandes mudanças.
O momento seguinte foi a eleição de Lula em 2002, no auge de uma crise social ampla. Houve alguns ensaios iniciais, inibidos pelo conservadorismo da política econômica. Mas o grande feito foi liberar as energias dos movimentos e das políticas sociais. Aí se dá o início da grande revolução social brasileira, com o Movimento dos Sem Teto, Movimento dos Sem Terra, o Bolsa Família, os avanços na educação, a criação de programas para agricultura familiar, cisternas, Luz Para Todos.
Mesmo assim, havia uma má vontade generalizada da mídia. A consagração das políticas sociais de Lula vieram de fora, quando a mídia internacional percebeu que não poderia se basear apenas na mídia corporativa nacional para entender o Brasil.
O grande momento foi em 2008. A crise internacional despertou o sentimento de solidariedade, pipocaram as conferências nacionais, os conselhos de participação. Ali, parecia que o país tinha encontrado o rumo.
Agora se tem presente o maior fator de aglutinação do Brasil real: o fantasma do bolsonarismo, que continuará presente mesmo após sua derrota eleitoral. E é a isso que o artigo de Gabeira remete.
Lula captou esse sentimento lá atrás, quando convidou Geraldo Alckmin para vice e garantiu que ele terá muitas atribuições.
Certamente colocará agricultores de cabeça aberta na Agricultura, como Roberto Rodrigues no primeiro governo; recriará o Ministério do Desenvolvimento com autênticos representantes da indústria. E remontará as políticas sociais com participação direta dos movimentos sociais.
Resta avaliar até onde essa grande frente – e o temor da volta do bolsonarismo – permitirá avançar nos grandes nós fiscais, monetários e orçamentários.
Mas, de fato, o país está caminhando a passos largos para o grande pacto nacional.
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