sábado, 28 de dezembro de 2019

Balanço de 2019: o império da impostura, por Leonardo Boff


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   "Instalou-se aqui o império da impostura. Um presidente que deveria dar exemplo ao povo de virtudes que todo governante deve ter, realizou atos acintosos que na linguagem religiosa, bem entendida por ele, são verdadeiros pecados mortais. Pela moral cristã mais tradicional é pecado mortal caluniar certas ONGs, bem o ator Leonardo di Caprio culpando-os de incentivar os incêndios da Amazônia ou difamando o reconhecido educador Paulo Freire e o cientista Ricardo Galvão ou mentir contumazmente mediante fake news e alimentar ódio e rancor contra homoafetivos, LGBTI, indígenas, quilombolas, mulheres e nordestinos."



Afora os grandes empresários que aplaudem calorosamente o ministro Paulo Guedes porque ganham com a crise, o balanço de 2019 na perspectiva das vítimas dos ajustes fiscais, dos que perderam direitos na reforma da previdência e dos resistentes é repudiável.
Instalou-se aqui o império da impostura. Um presidente que deveria dar exemplo ao povo de virtudes que todo governante deve ter, realizou atos acintosos que na linguagem religiosa, bem entendida por ele, são verdadeiros pecados mortais. Pela moral cristã mais tradicional é pecado mortal caluniar certas ONGs, bem o ator Leonardo di Caprio culpando-os de incentivar os incêndios da Amazônia ou difamando o reconhecido educador Paulo Freire e o cientista Ricardo Galvão ou mentir contumazmente mediante fake news e alimentar ódio e rancor contra homoafetivos, LGBTI, indígenas, quilombolas, mulheres e nordestinos. A lentidão no julgamento do massacre de Brumadinho-MG e de Mariana-MG está mostrando a insensibilidade das autoridades. Algo parecido ocorreu com o derrame ignoto(?) de petróleo em 300 praias de 100 municípios do Nordeste.
Não cabe a ninguém julgar sua intenção subjetiva. Isso é coisa para Deus. Mas cabe fazer um juízo  sobre fatos e atos, portanto, realidades objetivas e concretas para as quais cabe um juízo ético e teológico. Tal atitude imoral foi entendida por muitos como carta branca para desmatar mais, assassinar lideranças indígenas e a polícia tornar-se mais violenta e até assassina.
Estamos vivendo sob o império da impostura no campo nacional e no internacional. Um psicanalista francês, Roland Gori escreveu um instigante livro “La fabrique des imposteurs”(Paris 2013). Para ele o impostor é aquele que prefere os meios aos fins, que nega as verdades científicas, que distorce a realidade solar, que não se rege por valores porque é apenas um oportunista, que afirma algo e logo depois o nega conforme suas conveniências, que pratica a arte de iludir as pessoas ao invés de emancipá-las pelo pensamento critico, que despreza o cuidado pelo meio ambiente, que passa por cima das leis, que culpabiliza os pobres e que não demonstra  amor nem  piedade.
O que transcrevi aqui está referido no livro “La fabrique des imposteurs e representa um retrato da atmosfera de impostura reinante nas mais altas instâncias políticas do Brasil.
As medidas contra a educação, a saúde, a ciência, ao meio ambiente e aos direitos humanos concretiza a mais rude impostura contra tudo o que se construiu de positivo nos últimos decênios. Somos conduzidos a um estágio regressivo, anterior ao iluminismo, numa mentalidade fundamentalista com viés fascistóide.
Talvez o ato para nós mais humilhante foi o gesto de vassalagem explícita do atual governante ao presidente dos USA, oferecendo-lhe o que podia sem receber nada em troca. Risível e ridículo foi quando, numa recepção de chefes de estado lhe diz a Trump “I love you” e recebeu apenas 17 segundos de atenção.
A impostura grassa veemente, em primeiro lugar, nos USA onde o presidente Trump, segundo repete Paul Krugman, Nobel de economia, constitui um perigo para a humanidade. Mente a mais não poder e se justifica ao dizer que são “verdades alternativas”. Igual impostura ocorre nos países ultra neoliberais onde o povo se rebela como no Chile, no Equador,na Colômbia, culminando com um golpe de estado contra a população indígena e seu representante na Bolívia, lançando o povo na fome e no desespero.
Perigosa impostura ocorreu na COP25 em Madrid que contra todas as evidências e dados científicos predominaram os negacionistas do aquecimento global, o Brasil incluído. Contra eles o relatório final recolhe a advertência da ONU:”Se nada fizermos, no final do século, a temperatura pode aumentar de 4-5 graus”. Com estes níveis, a vida que conhecemos não subsistirá. Será um verdadeiro Armagedom ecológico. Nossa espécie correrá perigo.
Não obstante esta atmosfera tenebrosa cabe celebrar a libertação de Lula, vítima da aplicação da law fare, instrumento de perseguição política com o objetivo de prendê-lo. O que ocorreu.
Termino com as palavras severas do prêmio Nobel de medicina de 1974, Christian de Duve:”A perspectiva não é apenas preocupante: é aterrorizante. Se não conseguirmos conter o crescimento demográfico (poderia dizer o aquecimento global) racionalmente, a seleção natural fará isso por nós irracionalmente, às custas de privações sem precedentes e de danos irreparáveis ao meio ambiente. Tal é a lição que quatro bilhões de anos  nos oferece a história da vida na Terra”(Poeira vital 1997,369).
Bem o enfatizava o Papa Francisco em sua encíclica ecológica:”as previsões catastróficas não se podem olhar com desprezo e ironia”(n,161). A impostura nos faz surdos a estes clamores. Por causa disso, o destino humano dificilmente escapará de uma tragédia.

Leonardo é teólogo e filósofo e escreveu:A saudade de Deus-a força dos pequenos, Vozes 2019.

Allan Kardec concordaria com Paulo Freire sobre a Educação...



sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Leonardo Attuch e Mauro Lopes discutem sobre o excelente filme da Netflix, dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles, intitulado "Dois Papas", com Anthony Hopkins no papel de Beto XVI e Jonathan Pryce no papel de Francisco



Do Canal da TV 247:



Papa encoraja grupos a lutar por terra, moradia e trabalho





O papa se reuniu com representantes de organizações de base 

e os encorajou na luta por terra, moradia decente e trabalho digno

Cidade do Vaticano – O papa Francisco se reuniu nesta terça-feira com representantes de organizações de base dos cinco continentes e os encorajou na luta para que todos as pessoas tenham acesso “à terra, moradia decente e trabalho digno”.
Durante o Encontro Mundial dos Movimentos Populares, que reúne até amanhã, em Roma, 200 representantes de uma centena de organizações de base de todo o mundo para analisar as causas da exclusão social, o papa lamentou que pelo fato de falar destes três conceitos possa ser tachado de “comunista”, apesar de lembrar que “o amor aos pobres está no centro do Evangelho” e que “não responde a nenhuma ideologia”, conforme informou a “Rádio Vaticana”.
“Digamos juntos de coração: “Nenhuma família sem casa!”, ” “Nenhum camponês sem terra!” “Nenhum trabalhador sem direitos!” “Nenhuma pessoa sem a dignidade que dá o trabalho!”, falou o papa.
Em declarações à Agência Efe, Sergio Sánchez, participante do encontro e conhecido na Argentina como “o catador de papel do papa” pela amizade que tem com Francisco, explicou emocionado que o pontífice os encorajou a continuar lutando por um “mundo mais justo”.
Ele teve a possibilidade de contar a Francisco sua história pessoal, a de um portenho que há quase 15 anos se dedica a reciclagem, depois que perdeu seu emprego em 2001.
Hoje, ele lidera uma cooperativa que realiza ações em para pessoas com baixa renda e, em maio desse ano, se uniu à greve de fome que moradores dos bairros periféricos de Buenos Aires fizeram para reivindicar a urbanização das zonas mais pobres da capital.
Ao término do encontro Joaquín Sánchez, representante do movimento social Plataforma dos Afetados pela Hipoteca (PAH) da Espanha, garantiu ter se sentido “abraçado” pelo pontífice, que durante sua fala também defendeu o direito à moradia e a “uma democracia real e dos povos”.
Os movimentos populares, por sua vez, transmitiram ao papa algumas das conclusões que foram recolhidas, até o momento, e que abordam a violação dos Direitos Humanos, os despejos de inquilinos, o trabalho precário e “a soberania alimentar”, ou seja, a terra concentrada nas mãos de poucos. Francisco, segundo os entrevistados, incentivou os representantes a “seguir lutando por um mundo novo” e estes, por sua vez, pediram “uma aposta mais clara pelos pobres”.
Como chefe indígena, da etnia aimara, também esteve presente durante esta jornada o presidente da Bolívia, Evo Morales, o único líder que participou deste encontro e que, por isso, falou durante o ato para saudar publicamente o papa e os demais participantes.
Morales e Francisco terão uma reunião informal nesta tarde no Vaticano, a segunda ocasião em que se encontram de forma privada.
Após este segundo dia dedicado ao pensamento do papa Francisco, o Encontro Mundial dos Movimentos Populares continuará trabalhando dividido em três subgrupos – trabalho, terra e moradia – a fim de articular e facilitar os debates e as análises.


Natal com Jesus e sem papai noel e menos ainda sem a apologia da violência e da tortura! por Dora Incontri





Como pode alguém se afirmar cristão e concordar com a guerra, com a violência, com o armamento, com a tortura?


Religião Brasileira de Tarsila

Natal com Jesus e sem papai noel! por Dora Incontri

Então, é de novo Natal. E o povo que se diz cristão invoca o Papai Noel, criado pela Coca-cola, para incentivar o consumo e a comilança. Mas, milhões no mundo sequer têm água, sequer tem comida, sequer sabem o que é o Natal… E a Coca-cola anda se apropriando da água de todo o planeta!
No Brasil, onde a maioria se afirma cristã, e em que o Natal é feriado, temos aqueles que se empanturram de bichos criados com antibióticos e trocam presentes caros e temos cada vez mais uma multidão sem trabalho, sem teto e sem Natal. E temos os remediados, cada vez mais sem remédio, tentando não cair totalmente na pobreza, e terão nesse ano um amigo secreto barato e uma grande preocupação com o ano que vem.
No bairro burguês (e nem tão burguês) em que moro, apareceram mensagens no Whatsapp, dizendo que se alguém precisasse de um “serviçal” esperto e com iniciativa, para servir durante as festividades, que havia um disponível…  Só faltou dizerem que tinha dentes fortes e estava sendo leiloado. A Casa Grande continua firme em seu paradigma escravocrata.
Em suma, de Jesus, o aniversariante, temos muito pouco no Natal, no mundo, no Brasil, no coração das pessoas.
Porque Natal deveria ser um marco de fraternidade, de comunhão, de elevação pela prece, de troca de afeto entre os que se amam e de entrega para quem precisa, guardando-se nos outros dias do ano, a consciência de que é preciso fazer uma sociedade mais justa, mais ajustada ao preceito máximo que Jesus trouxe: amar ao próximo como a si mesmo!
Como pode alguém ter esse amor ao próximo e se dizer seguidor de Jesus, exercitando o racismo, o egoísmo social, a discriminação, a divisão profunda de classes, a indiferença pela saúde e educação do povo?
Como pode alguém se afirmar cristão e concordar com a guerra, com a violência, com o armamento, com a tortura?
Jesus ainda não nasceu no coração da maioria. Jesus ainda não conseguiu se fazer entender pelo povo da Terra. Jesus tem muito poucos seguidores comprometidos com seu programa de implantação do Reino de Deus no planeta. Reino de Deus não se faz com Cruzadas, cavaleiros armados, sacerdotes que exploram o povo, arminhas na mão e ódio na boca e no coração… Tudo isso é traição ao Reino, tapa na cara de Jesus menino, farisaísmo de quem usa o nome de Cristo, para semear a maldade e auferir lucros.
O Reino de Deus se faz com preocupação e cuidado com a necessidade do próximo (e isso tanto individual como coletivamente), se faz com serviço desinteressado ao bem coletivo, se faz com amparo à infância, respeito à mulher, acolhimento às diferenças e desprendimento dos interesses pessoais, financeiros, de poder e de ego…
Mas… para quem é evolucionista, reencarnacionista como eu, ainda haverá tempo. Não esperamos um juízo final (apesar do aquecimento global anunciar coisas mais apocalípticas que a Bíblia)… esperançamos um amadurecimento geral, ainda que tardio, ainda que lento, uma conscientização dos justos para mais ação engajada e dos injustos para menos ou nenhuma injustiça. As dores que atravessamos – e haverá ainda muitas dores e para sabermos disso não precisarmos ser profetas, nem médiuns, nem astrólogos – devem nos servir para finalmente sabermos que só há uma solução para o mundo: o caminho do amor, o caminho da fraternidade universal.
Mas enquanto esperançamos, estejamos a postos, na resistência e no bom combate, como dizia Paulo de Tarso, fazendo de tudo para que esse amadurecimento coletivo se acelere, essa consciência humana brote cristalina e possamos, enfim, viver em paz!
Saibamos ter um Feliz Natal: com o afeto dos que amamos, com música e oração!

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"A Direita é violenta e injusta e está até mesmo fuzilando o Papa Francisco", afirma o Bispo de Aparecida, Dom Orlando Brandes



"Temos o dragão do tradicionalismo. A direita é violenta, é injusta, estão fuzilando o Papa, o Sínodo, o Concílio Vaticano Segundo. Parece que não queremos vida, o Concílio Vaticano segundo, o evangelho, porque ninguém de nós duvida que esta é a grande razão do sínodo, do concílio, deste santuário, a vida como já falei", disse o Bispo Dom Orlando Brandes.
Do Site Domtotal:

RELIGIÃO
12/10/2019 | domtotal.com



Direita é injusta e está fuzilando o papa, diz arcebispo de Aparecida

Em sermão na missa de Aparecida, arcebispo critica 'dragão do tradicionalismo'
Sobre a homilia, religioso disse após a missa que referência foi a ideologia, não a governos

Sobre a homilia, religioso disse após a missa que referência foi a ideologia, não a governos (Reprodução TV Aparecida)
O arcebispo de Aparecida, Dom Orlando Brandes, criticou, durante missa solene na manhã deste sábado no Santuário Nacional da padroeira do Brasil, o que chamou de 'dragão do tradicionalismo'. Para ele, a 'direita é violenta e injusta'.O arcebispo também criticou a corrupção, defendeu a preservação da natureza e pediu para que crianças não morram mais vítimas de bala perdida.
A missa foi acompanhada por uma multidão e durou 10 minutos."Temos o dragão do tradicionalismo. A direita é violenta, é injusta, estão fuzilando o Papa, o Sínodo, o Concílio Vaticano Segundo. Parece que não queremos vida, o Concílio Vaticano segundo, o evangelho, porque ninguém de nós duvida que esta é a grande razão do sínodo, do concílio, deste santuário, a não ser a vida como já falei", disse.
Após a missa, dom Orlando Brandes disse que a referência foi a ideologia, não a governos.
Papa
O papa Francisco desejou um caminho de paz, alegria e de Justiça em mensagem pelo dia da padroeira do país. A mensagem foi gravada no intervalo dos trabalhos do Sínodo da Amazônia, que acontece no Vaticano: “Que ela os acompanhe em suas dores, quando não podem crescer por tantas limitações políticas ou sociais ou ecológicas, e de tantos lugares provêm. Que Ela os ajude a crescer e a se libertar continuamente. Que os abençoe”, disse o papa Francisco.
Assista:


Dom Total

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EMGE
*O DomTotal é mantido pela Escola de Engenharia de Minas Gerais (EMGE). Engenharia Civil conceito máximo no MEC.

"Não há democracia com fome, nem desenvolvimento com pobreza, nem justiça na desigualdade", afirma Papa Francisco focando sobretudo no uso de lawfare de falsos juizes para destruir ou contaminar as Democracias e impor governos-gerentes dos interesses neoliberais de bancos, especuladores e rentistas



   "O lawfare, além de colocar em sério risco a democracia dos países, geralmente é utilizado para minar os processos políticos emergentes e propor a violação sistemática dos direitos sociais. Para garantir a qualidade institucional dos Estados é fundamental detectar e neutralizar esse tipo de práticas que resultam da imprópria atividade judicial em combinação com operações multimidiáticas paralelas" - Papa Francisco




"O lawfare, além de colocar em sério risco a democracia dos países, geralmente é utilizado para minar os processos políticos emergentes e propor a violação sistemática dos direitos sociais. Para garantir a qualidade institucional dos Estados é fundamental detectar e neutralizar esse tipo de práticas que resultam da imprópria atividade judicial em combinação com operações multimidiáticas paralelas", afirma o papa Francisco, em intervenção na Cúpula Pan-Americana de Juízes, em 04-06-2019, promovida pela Pontifícia Academia de Ciências Sociais, no Vaticano sobre o tema: "Direitos sociais e doutrina franciscana”. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

Eis o discurso.

Senhoras e senhores, é motivo de alegria e também de esperança encontra-los nessa Cúpula, na qual deram uma citação que não se limite somente a vocês, mas sim que evoca o trabalho que realizam conjuntamente com advogados, assessores, fiscais, defensores, funcionários e evoca também aos seus povos com o desejo e a busca sincera para garantir a justiça, e especialmente a justiça social, para que possa chegar a todos. Vossa missão, nobre e pesada, pede para se consagrar ao serviço da justiça e do bem-comum com o chamado constante a que os direitos das pessoas e especialmente dos mais vulneráveis sejam respeitados e garantidos. Dessa maneira, vocês ajudam aos Estados que não renunciem a sua mais excelsa e primária função: fazer-se serviço do bem-comum do seu povo. “A experiência ensina que – assinalava João XXIII – quando falta uma ação apropriada dos poderes públicos no econômico, o político ou o cultural, se produz entre os cidadãos, sobretudo em nossa época, um maior número de desigualdades em setores cada vez mais amplos, resultando assim que os direitos e deveres da pessoa humana carecem de toda eficácia prática” (Pacem in Terris, 63).
Celebro essa iniciativa de se reunir, assim como a realizada o ano passado na cidade de Buenos Aires, na qual mais de 300 magistrado e funcionários judiciais deliberaram sobre os Direitos Sociais, à luz da Evangelii GaudiumLaudato Si’ e o discurso aos Movimentos Populares em Santa Cruz de la Sierra. Dali saiu um conjunto interessante de vetores para o desenvolvimento da missão que tem entre mãos. Isso nos recorda a importância e, porque não, a necessidade de se encontrar para enfrentar os problema de fundo que vossas sociedades estão atravessando e, como sabemos, não podem ser resolvidos simplesmente por ações isoladas ou atos voluntários de uma pessoa ou de um país, mas sim que reivindica a geração de uma nova atmosférica; isso é, uma cultura marcada pelas lideranças compartilhadas e valentes que saibam envolver outras pessoas e outros grupos até que frutifiquem em importantes acontecimentos históricos (cf. Evangelii Gaudium, 223) capazes de abrir caminhos às gerações atuais, e também às futuras, semeando condições para superar as dinâmicas de exclusão e segregação de modo que a desigualdade não tenha a última palavra (cf. Laudato Si’,53.164). Nossos povos reivindicam esse tipo de iniciativas que ajudem a deixar todo tipo de atitude passiva ou espectadora como se a história presente e futura tivesse que ser determinada e contada por outros.
Nos toca viver uma etapa histórica de transformações onde se põe em jogo a alma de nossos povos. Um tempo de crise – crise: o caráter chinês, riscos, perigos e oportunidades, é ambivalente, muito sábio isso – tempo de crise – na qual se verifica um paradoxo: por um lado, um fenomenal desenvolvimento normativo, por outro uma deterioração no gozo efetivo dos direitos consagrados globalmente. É como início dos nominalismos, sempre começam assim. É mais, cada vez, e com maior frequência, as sociedades adotam formas anômicas de fato, sobretudo em relação às leis que regulam os direitos sociais, e o fazem com diversos argumentos. Essa anomia está fundamentada por exemplo em carências orçamentárias, impossibilidade de generalizar benefícios ou o caráter-programático mais que o operativo dos mesmos.
Preocupa-me constatar que se levantam vozes, especialmente de alguns “doutrinários”, que tratam de “explicar” que os direitos sociais já são “velhos”, estão fora de moda e não tem nada que contribuir a nossas sociedades. Desse modo, confirmam políticas econômicas e sociais que levam a nossos povos à aceitação e justificativa da desigualdade e da indignidade. A injustiça e a falta de oportunidades tangíveis e concretas por trás de tantas análises incapazes de se colocar aos pés do outro – e digo pés, não sapatos, porque em muitos casos essas pessoas não têm –, é também uma forma de gerar violência: silenciosa, porém violenta ao fim. A normatividade excessiva nominalista, independentista, desemboca sempre na violência.
“Hoje vivemos em imensas cidades que se mostram modernas, orgulhosas e até vaidosas. Cidades – orgulhosas de sua revolução tecnológica e digital – que oferecem inumeráveis prazer e bem-estar para uma minoria feliz..., porém os nega o teto a milhares de vizinhos e irmãos nossos, inclusive crianças, e se os chama, elegantemente, 'pessoas em situação de rua'. É curioso como no mundo das injustiças, abundam os eufemismos” (Encontro Mundial dos Movimentos Populares, 28-10-2014). Parecia que as Garantias Constitucionais e os Tratados Internacionais ratificados, na prática, não tem valor universal.
A “injustiça social naturalizada” – ou seja, como algo natural – e, portanto, invisibilizada que somente recordamos ou reconhecemos quando “alguns fazem barulho nas ruas” e são rapidamente catalogados como perigosos ou molestados, termina por silenciar uma história de postergações e esquecimentos. Permitam-me dizer, isso é um dos grandes obstáculos que encontra o pacto social e que debilita o sistema democrático. Um sistema político-econômico, para seu desenvolvimento saudável, necessita garantir que a democracia não seja somente nominal, mas sim que possa se ver moldada em ações concretas que velem pela dignidade de todos os seus habitantes sob a lógica do bem-comum, em um chamado à solidariedade e uma opção preferencial pelos pobres (cf. Laudato si’, 158). Isso exige os esforços das máximas autoridades, e por certo do poder judicial, para reduzir a distância entre o reconhecimento jurídico e a prática do mesmo. Não há democracia com fome, nem desenvolvimento com pobreza, nem justiça na desigualdade.
Quantas vezes a igualdade nominal de muitas das nossas declarações e ações não faz mais que esconder e reproduzir uma desigualdade real e subjacente, que esconde que se está diante de uma ordem fictícia. A economia dos papeis, a democracia adjetiva, e a mídia concentrada geram uma bolha que condiciona todos os olhares e opções desde o amanhecer até o pôr do sol [1]. Ordem fictícia que iguala em sua virtualidade, porém que, no concreto, amplia e aumenta a lógica e as estruturas da exclusão-expulsão porque impede um contato e compromisso real com o outro. Impede o concreto, a tomada do controle do que é concreto.
Nem todos partem do mesmo lugar na hora de pensar a ordem social. Isso nos questiona e nos exige pensar novos caminhos para que a igualdade ante a lei não degenere na propensão da injustiça. Em um mundo de virtualidades, mudanças e fragmentação – estamos na época do virtual -, os Direitos sociais não podem ser somente exortativos ou apelativos, nominais, mas sim sejam farol e bússola para a estrada porque “a saúde das instituições de uma sociedade tem consequências no meio ambiente e na qualidade de vida humana” (Laudato si’, 142).
Se nos pede lucidez de diagnóstico e capacidade de decisão diante o conflito, se nos pede não nos deixarmos dominar pela inércia ou pela atitude estéril como quem os olha, os nega ou os anula e segue adiante, como se nada passasse, lavam as mãos para poder continuar com suas vidas. Outros entram de tal maneira no conflito que ficam prisioneiros, perdem horizontes e projetam nas instituições as próprias confusões e insatisfações. O convite é olhar de frente para o conflito, sofrê-lo e resolvê-lo transformando-o no enganche de um novo processo (Evangelii Gaudium, 227).
Assumindo que o conflito é claro que o nosso compromisso é o de nossos irmãos para dar operacionalidade aos direitos sociais com o compromisso de buscar a desmantelar todos os argumentos que prejudicam a sua concretude, e isso através da aplicação ou a criação de uma legislação capaz de levantar as pessoas no reconhecimento da sua dignidade. As lacunas legais, tanto em termos de legislação adequada como de acessibilidade e cumprimento, desencadearam círculos viciosos que privam as pessoas e as famílias das garantias necessárias para o seu desenvolvimento e bem-estar. Essas lacunas são geradoras de corrupção que encontram nos pobres e no meio ambiente os primeiros afetados.
Nós sabemos que o direito não é apenas a lei ou as regras, mas também uma prática que configura as ligações, o que os transforma de algum modo, "praticantes" do direito sempre que confrontado com as pessoas e realidade. E isso convida a mobilizar toda a imaginação legal para repensar as instituições e lidar com as novas realidades sociais que estão sendo vivida [2]. É muito importante neste sentido, que as pessoas que alcançam as mesas de você e seus bancadas sentir que vieram antes deles, que você vir em primeiro lugar, que você conhecê-los e entendê-los na sua situação particular, mas especialmente reconhecê-los em sua plena cidadania e em seu potencial para serem agentes de mudança e transformação. Nunca perca de vista os setores populares não são primariamente um problema, mas uma parte ativa da face de nossas comunidades e nações, eles têm todo o direito de participar na busca de soluções e construindo inclusive. "O quadro político e institucional não é apenas para evitar más práticas, mas também para incentivar as melhores práticas, estimular a criatividade buscando novas maneiras de facilitar as iniciativas pessoais e coletivas" (cf. Laudato si', 177).
É importante incentivar que desde o início da formação profissional, os operadores legais possam fazer contato real com as realidades, conhecendo em primeira mão e compreendendo as injustiças quais um dia terão de enfrentar. É também necessário encontrar todos os meios e mecanismos para que os jovens em situações de exclusão ou marginalização possam ser treinados para que possam desempenhar o papel necessário. Muito tem sido dito para eles, também precisamos ouvi-los e dar-lhes voz nessas reuniões. O leitmotiv implícito de todo o paternalismo jurídico-social vem à mente: tudo para o povo, mas nada com o povo. Tais medidas nos permitirão estabelecer uma cultura do encontro "porque nem conceitos nem ideias se amam [...]. A entrega, a verdadeira entrega, surge do amor de homens e mulheres, crianças e idosos, povos e comunidades ... rostos, rostos e nomes que enchem o coração "(II Encontro Mundial dos Movimentos Populares, Santa Cruz de la Sierra, 9 de julho de 2015).
Aproveito esta oportunidade de reunir-me convosco para manifestar a minha preocupação por uma nova forma de intervenção exógena nos cenários políticos dos países através do uso indevido de procedimentos legais e tipificações judiciais. O lawfare, além de colocar a democracia dos países em sério risco, é geralmente usado para minar os processos políticos emergentes e tender para a violação sistemática dos direitos sociais. A fim de garantir a qualidade institucional dos Estados, é fundamental detectar e neutralizar este tipo de práticas que resultam de uma atividade judicial imprópria em combinação com operações multimídia paralelas. Sobre isso eu não paro, mas o julgamento anterior da mídia é conhecido por todos.
Isso nos lembra que, em muitos casos, a defesa ou a priorização dos direitos sociais sobre outros tipos de interesses, vocês vão lidar não apenas com um sistema injusto, mas também com um sistema de comunicação poderoso, que distorce muitas vezes o âmbito de suas decisões, vai questionar a sua honestidade e também a sua probidade, eles podem até mesmo julgá-lo. É uma batalha assimétrica e erosiva em que para superá-lo é necessário manter não só a força, mas também a criatividade e uma elasticidade adequada. Quantas vezes os juízes enfrentam na solidão as paredes da difamação e da reprovação, se não da calúnia! Certamente, requer uma grande força para lidar. "Felizes são aqueles que são perseguidos por praticar a justiça, porque a eles pertence o Reino dos Céus" (Mt 5,10), disse Jesus. A este respeito, estou satisfeito que um dos objetivos desta reunião é a criação de um Comitê Permanente Pan-Americano de Juízes e Juízas pelos Direitos Sociais, que tenha um dos objetivos superar a solidão na magistratura, fornecendo apoio e assistência mútua para revitalizar o exercício de sua missão. A verdadeira sabedoria não é alcançada com um mero acúmulo de dados - que é enciclopedismo - uma acumulação que acaba saturando e obscurecendo uma espécie de poluição ambiental, mas com a reflexão, o diálogo e o generoso encontro entre as pessoas, aquele confronto adulto, saudável, faz nós todos crescermos (cf. Laudato Si', 47).
Em 2015, eu dizia aos membros dos movimentos populares: “Vocês têm um papel essencial, não apenas exigindo e reivindicando, mas fundamentalmente criando. Vocês são poetas sociais: criadores de obras, construtores de casas, produtores de alimentos, especialmente para os descartados pelo mercado mundial" (II Encontro Mundial de Movimentos Populares, Santa Cruz de la Sierra, 9 de julho de 2015). Queridos magistrados: Você tem um papel essencial: deixem-me dizer-lhe que também são poetas, são poetas sociais quando não têm medo de "serem protagonistas na transformação do sistema judicial, baseado na coragem, na justiça e na primazia da dignidade da pessoa humana"[3] sobre qualquer outro tipo de interesse ou justificativa. Eu gostaria de concluir dizendo: "Felizes são aqueles que têm fome e sede de justiça; felizes são aqueles que trabalham pela paz "(Mt 5,6,9). Muito obrigado!

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