Jornal norte-americano destaca viés autoritário do governo e lembra de recente frase dita por Onyx Lorenzoni para jornalistas: “Aqui está uma pequena mensagem: não brinque com a gente”
Do Jornal GGN:
Jornal GGN – Neste domingo (28), o New York Time publicou uma matéria sobre a relação entre o aumento da destruição da floresta Amazônica com o governo Jair Bolsonaro, por conta da redução dos esforços da gestão “para combater a extração ilegal de madeira, pecuária e mineração”.
“Proteger a Amazônia esteve no centro da política ambiental do Brasil nas últimas duas décadas. Em um ponto, o sucesso do Brasil em desacelerar a taxa de desmatamento fez dele um exemplo internacional de conservação e do esforço para combater a mudança climática”, escrevem Letícia Casado e Ernesto Londoño, que assinam a matéria.
“Mas com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, um populista que foi multado por violar as regulamentações ambientais, o Brasil mudou substancialmente de rota, recuando dos esforços que fez para desacelerar o aquecimento global ao preservar a maior floresta tropical do mundo”, completam.
Os jornalista pontuam que, durante a campanha eleitoral, no ano passado, Bolsonaro declarou que as vastas terras protegidas do Brasil eram um obstáculo ao crescimento econômico, prometendo que iria abrir a região à exploração comercial.
Sete meses após assumir o Planalto, é isso que vem acontecendo. A Amazônia brasileira perdeu mais de 1.330 milhões de quilômetros quadrados de cobertura florestal, desde que Bolsonaro assumiu o poder. Um aumento de 39% em relação ao mesmo período do ano passado, de acordo com dados oficiais.
Somente em junho, durante a estação mais fria e seca, que facilita o corte de árvores, a taxa de desmatamento aumentou drasticamente em 80% em relação a junho de 2018.
“O desmatamento da Amazônia está aumentando à medida que o governo de Bolsonaro recua com medidas de fiscalização, como multas, advertências e apreensão ou destruição de equipamentos ilegais em áreas protegidas”, diz a reportagem.
Um levantamento com base nos registros públicos do próprio New York Times revela que as ações de fiscalização do governo brasileiro caíram em 20% nos seis primeiros meses de 2019, em comparação ao mesmo período de 2018.
A reportagem destaca que as duas tendências – o aumento do desmatamento e a crescente relutância do governo em enfrentar atividades ilegais – são preocupantes para pesquisadores, ambientalistas e ex-autoridades. Eles alegam que o mandato de Bolsonaro pode levar a perdas impressionantes de um dos recursos mais importantes do mundo.
“Estamos enfrentando o risco de desmatamento descontrolado na Amazônia”, escreveram oito ex-ministros do Meio Ambiente do Brasil em uma carta conjunta em maio, argumentando que o país precisava reforçar as medidas de proteção ambiental, e não enfraquecê-las.
Bolsonaro, por outro lado, rejeitou os dados mais recentes sobre desmatamento, chamando os dados que são do próprio governo – do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) – de mentirosos. A declaração, tida como infundada por especialistas, aconteceu durante uma reunião com jornalistas estrangeiros, quando o presidente chamou a preocupação com o desmatamento na Amazônia de “psicose ambiental”. “A Amazônia é nossa, não sua”, prosseguiu Bolsonaro a um jornalista europeu.
“A posição do governo Bolsonaro tem atraído fortes críticas dos líderes europeus, injetando uma irritação a um acordo comercial fechado no mês passado entre a União Europeia e um bloco de quatro países sul-americanos, incluindo o Brasil”, reforça a matéria do NYT se referindo ao Mercosul.
O artigo lembra que, durante uma recente visita, à cidade de São Paulo, o ministro de Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha, Gerd Müller, disse que proteger a Amazônia é um imperativo global, especialmente considerando o papel vital da floresta tropical na absorção e armazenamento de dióxido de carbono. Fenômeno contrário acontece quando as árvores são cortadas e queimadas, liberando mais ainda dióxido de carbono para a atmosfera, o que acelera o aquecimento global.
“A Alemanha e a Noruega ajudam a financiar um fundo de conservação de US $ 1,3 bilhão para a Amazônia, mas o governo Bolsonaro questionou sua eficácia, levantando a possibilidade de que o esforço possa ser suspenso”, escreve o NYT.
O jornal norte-americano lembra que ainda durante a campanha eleitoral, Bolsonaro prometeu acabar com o Ministério do Meio Ambiente, mas não cumpriu essa promessa por pressão do próprio agronegócio, que temia que a medida gerasse um boicote internacional contra os produtos brasileiros.
A matéria aponta também que, pouco depois de assumir o governo, Bolsonaro tirou o Brasil do compromisso de sediar os eventos da cúpula global sobre mudanças climáticas. E, em seguida, cortou em 24% o orçamento oficial do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
A reportagem lembra que Bolsonaro acusou os órgãos ambientais de fiscalização de funcionarem como “indústrias da multa” que precisam ser fechados, prometendo que, em seu governo, eles teriam a autoridade enfraquecida.
Com essas medidas, Bolsonaro se tornou alvo de críticas internacionais, todas rejeitadas por ele, “argumentando que os pedidos para preservar grandes partes do Brasil fazem parte de um plano global para impedir o desenvolvimento de seu país”.
Seguindo a mesma trajetória, neste mês, em julho, Bolsonaro acusou os líderes europeus de pressionar o Brasil por uma conservação mais forte da Amazônia, porque eles esperam desenvolvê-la no futuro. “O Brasil é como uma virgem que todo pervertido do lado de fora quer”, disse Bolsonaro.
“O Brasil já havia tentado se apresentar como um líder na proteção da Amazônia e no combate ao aquecimento global. Entre 2004 e 2012, o país criou novas áreas de conservação, aumentou o monitoramento e retirou créditos governamentais de produtores rurais que foram apanhados arrasando áreas protegidas. Isso trouxe o desmatamento ao nível mais baixo desde que os registros sobre desmatamento começaram”, pontua o NYT.
A partir de 2014, o Brasil entrou em um período de recessão tornando-o mais dependente das commodities agrícolas, especialmente dos setores de carne bovina e soja, os grandes causadores do desmatamento e de poderosos do lobbies políticos. A partir de então, os níveis de desmatamento no país voltaram a subir.
A reportagem lembra que os setores ambientais de fiscalização atacados por Bolsonaro já autuaram o político, antes de assumir a presidência.
“Em 25 de janeiro de 2012, agentes ambientais interceptaram um pequeno barco de pesca em uma reserva ecológica no estado do Rio de Janeiro que o Sr. Bolsonaro, então deputado federal, estava a bordo. Ele discutiu com os agentes por cerca de uma hora e ignorou suas exigências de que ele fosse embora, disse José Augusto Morelli, o agente responsável pela equipe”.
O jornal norte-americano ressalta que Bolsonaro nunca pagou pela multa. “No final de março, Morelli foi rebaixado do cargo, decisão que ele considera uma forma de retaliação à multa de 2012”.
A recusa de Bolsonaro em pagar a multa é comum. Quase 5% das multas ambientais no Brasil são contestadas na justiça, um processo que muitas vezes se arrasta por vários anos.
Agora, o ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro, Ricardo Salles, quer criar um mecanismo que daria ao governo o poder de reduzir ou suspender penalidades ambientais.
O NYT diz que Salles não aceitou a vários pedidos de entrevista, entretanto respondeu algumas perguntas que foram enviadas. Em uma delas, reconheceu as deficiências das agências de fiscalização ambiental encarregadas de policiar a atividade comercial em áreas protegidas. “Mas argumentou que o sistema havia sido esvaziado pelos governos anteriores”, diz a reportagem.
“Quanto ao meio ambiente, Salles disse que o governo está priorizando problemas urbanos, como a modernização dos sistemas de gerenciamento de esgoto e tratamento de esgoto, que ele disse estarem em um estado ‘vergonhoso’”.
O NYT também conseguiu resposta do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que chamou a preocupação ambiental “de tentativas do exterior para moldar a política ambiental do Brasil”.
“Não somos ingênuos. Existe uma visão no mundo, patrocinada por organizações não-governamentais, que relativiza a soberania do Brasil sobre a Amazônia”, disse.
O NYT lembra que, em uma recente reunião com jornalistas, o mesmo ministro disse: “Aqui está uma pequena mensagem: não brinque com a gente”.
Clique aqui para acessar a matéria do NYT na íntegra.
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