Jornal GGN - Após quase dois anos detido em um processo penoso da Operação Lava Jato, o ex-presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, agora solto, trouxe traumas de seu isolamento em uma cela, em duras condições. Para ele, os culpados de sua detenção foram os "interesses internacionais".
Othon foi condenado em primeira instância a uma das maiores penas da Lava Jato: 43 anos de prisão por supostamente ter cometido cinco crimes - corrupção passiva, lavagem de dinheiro, embaraço às investigações, evasão de divisas e participação em organização criminosa.
Considerado o pai do programa nuclear no Brasil e um dos mais importantes cientistas nucleares no país, teve que aprender a comer com as mãos e chegou a tentar suicidio quando lutava, sem mais esperanças, aos 77 anos, por sua liberdade. Com a idade, os 43 anos de prisão seriam equivalentes a pena perpétua.
A primeira prisão de Othon, de 77 anos, foi decretada pelo juiz Marcelo da Costa Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal de Brasília, ainda em julho de 2015. Então investigado, o cientista conseguiu passar ao regime aberto em dezembro daquele ano, sendo novamente preso em julho de 2016.
A suspeita alegada pela Justiça do Distrito Federal era que o pai do programa nuclear brasileiro ainda mantinha influência na Eletronuclear, onde desvios e irregularidades em contratos foram detectados, a exemplo do que ocorreu com a Petrobras.
A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) sustentava que o almirante recebeu R$ 4,5 milhões por meio de propina, que seria 1% dos contratos firmados entre a Eletronuclear e as empreiteiras Andrade Gutierrez e Engevix, para a construção da Usina Nuclear Angra 3, no complexo nuclear de Angra dos Reis.
Mas para Othon, a sustentação que partiu do Ministério Público tinha outra origem. Certificando-se de sua inocência, acredita com "forte sentimento" que sua prisão teve as mãos dos "interesses internacionais".
Em entrevista à Monica Bergamo, na Folha, afirmou as suas motivações para acreditar nos interesses externos: "Tudo o que eu fiz [de avanços na área nuclear] desagradou. Qual o maior noticiário que tem hoje? A Coreia do Norte e suas atividades nucleares. A parte nuclear gera rejeição na comunidade internacional. E o Brasil ser potência nuclear desagrada. Disso eu não tenho a menor dúvida", disse.
Mostrou também que, apesar da idade e dos traumas que levou da cadeia, seu conhecimento na área permanece vivo: "[Se necessário, o Brasil produziria uma bomba nuclear] em uns quatro meses. Com a tecnologia de enriquecimento que nós usamos, podemos fazer a bomba com o plutônio, como a de Nagasaki, ou com o urânio, que foi a de Hiroshima. Temos os dois porque quem tem urânio enriquecido pode ter o plutônio também."
Mas defende o não uso da arma: "O artefato nuclear é arma de destruição de massa e inibidora de concentração de força. Mas, no nosso caso, se tivéssemos a bomba, desbalancearíamos a América Latina, suscitando apreensões. E a última coisa que a gente precisa na América Latina é de um embate."
Contrariando um dos eixos das acusações que recaiu sobre ele, de que o almirante teria contribuido para a desvalorização da Eletronuclar, lembrou que antes de assumir a presidência, a empresa era chamada de "vaga-lume".
"Em poucos anos, passou a figurar entre as centrais de melhor desempenho do mundo. As ações se valorizaram. Como então eu contribuí para desvalorizar as ações? Nada disso foi levado em conta no meu julgamento. O meu passado serviu como agravante. Eu peguei cinco anos de cadeia a mais porque, se eu tinha aquele passado, eu tinha que ter um comportamento [exemplar]. É a primeira vez que antecedente virou agravante. Vida pregressa ilibada virou agravante."
Neste momento da entrevista à jornalista, as emoções de Othon Luiz tomam conta: "Tá lá, escrito [na sentença]. É só ler. Eu li. Me deu uma revolta tão grande...", chorando ao se lembrar.
Nas polêmicas de sua condenação e de sua filha, contou ainda que ficou sabendo de sua pena pela televisão. E também para a sua filha. Logo viu que o suicidio não alertaria para nenhum abuso do processo contra ele, e tudo seria esquecido.
"Pensei 'os caras ficaram loucos'. E mais 14 anos para a minha filha [Ana Cristina]. E ela não fez nada. Tive um desespero... não é desespero. É revolta. Uma profunda revolta. Eu queria chamar a atenção. E pensei 'vou fazer um ato de revolta'. Eu reuni os cadarços do calção e com eles eu ia me enforcar. Pela câmara, a oficial viu e [impediu]. Mais 15 minutos ela não pegava mais. Na hora eu fiquei pau da vida. Mas depois eu vi que era bobagem. Me enterravam e em três dias tudo acabava. Vou bancar o japonês, confissão de culpa? Não. Hoje penso que tenho que ficar vivo e lutar."
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