O Brasil tem Constituição própria, agradece os espelhinhos e prendas, mas declina do “Evangelho” reformulado, pois os fascistas da extrema-direta continuam pecando
Glenn Greenwald. Depois de espelhinhos e perfume, o Evangelho!
por Armando Coelho Neto, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo, no Jornal GGN
Cena 1 – Abril de 1500, dia 22, é a data aceita como da “descoberta” do Brasil. Em troca de pau-brasil com mão de obra grátis, portugueses dão aos nativos apitos, espelhos, chocalhos… Quase 50 anos depois, padres jesuítas chegam para catequisar os povos originários. A louca da goiabeira, Malafaias e Valdomiros ainda vivam no espectro do mal e só muito, muito depois deram o ar da (des) graça.
Cena 2 – Em abril de 2013, Dilma Rousseff presidenta, surfa nos 78% de aprovação nacional e internacional superando Lula. Quem diria, em junho do mesmo ano, a “Liberdade de Expressão” vai para as ruas e, em conluio com a “Liberdade de Imprensa” mostraram os dentes do golpe. À época, apareceu o premiado jornalista Glenn Greenwald e presentou os brasileiros com espelhinho e chocalhos.
O jornalista Glenn revelou que a presidenta Dilma Rousseff e a Petrobras haviam sido espionados. Provou com documentos fornecidos por Edward Snowden – um analista de sistemas que trabalhou para a CIA e a NSA (Agência de Segurança NacionaL/EUA. Dilma reclamou, mas Barack Obama disse que fez isso no mundo todo e que não iria deter-se aos “protocolos de cada pais”. Coisas de império, não?
Com muita liberdade de expressão, num circo de horrores de conotações pornográficas, sob a liderança de um mafioso, a presidenta Dilma Rousseff, sem cometer crime algum foi derrubada. Um deputado fascista (hoje inelegível) enalteceu a figura de Brilhante Ustra (um torturador impune como tantos outros). Com STF e tudo, incluindo FFAA, o atentado à democracia se consumou. Coisas do império!
Do ano 1500 para cá, os EUA mataram seus povos originários e mais de 100 milhões de pessoas em guerras. Usou duas bombas atômicas e agente laranja, seus soldados urinaram sobre cadáveres de talibãs, criaram guerras de atrito, fria, híbrida, revoluções coloridas. Teve (?) Ku Klux Klan, usaram a “democracia” para criar ditaduras sangrentas em países frágeis ricos em petróleo, gás e minerais preciosos.
Cena 3 – Abril de 2018, dia 7. O fascismo reedita o 19 de abril de 1980 (prisão de Lula metalúrgico no ABC). Lula, sem provas, é preso pela segunda vez, fica proibido de dar entrevista, de ir ao enterro do irmão, e só a muito custo vai ao velório do neto. A Farsa a Jato, a exemplo da operação Mãos Limpas, na Itália, coloca a máfia no poder. Ainda viva nas sombras, atua como braço da extrema direita internacional.
Olhos clínicos percebiam a farsa, mas soava como teoria conspiratória. O jornalista Reinaldo Azevedo, até hoje, desafia a máfia a mostrar as provas contra Lula e ninguém se habilita. Glenn Greenwald reaparece e dá de presente aos tupiniquins as miçangas e apitos. Após desmascarar a máfia, diz que o ex-juiz “Sabe que eu sei tudo que ele disse e fez. E sabe que vamos contar tudo”. Festa em Pindorama!
Cena 4 – Abril de 2024. Depois de espelhinhos, miçangas e chocalhos, Glenn volta ao ano de 1549 com uma nova “Companhia de Jesus” para pregar o evangelho yanke da “Liberdade de Expressão” como valor absoluto. Traz consigo o jesuíta Elon Musk e juntos, tentam convencer que, o que põe em risco a democracia é não deixar criminosos (presos ou não) fazerem apologia a crimes e golpe de estado.
Pouco importa que lá na Corte (EUA), onde vige uma ditadura de dois partidos (e quem tem mais voto perde a eleição), seja permitido apoiar holocaustos, pregar o nazismo, ódio, violência, cyberbullying, automutilação. O Brasil tem Constituição própria, agradece os espelhinhos e prendas, mas declina do “Evangelho”, pois os fascistas continuam pecando por pensamento, palavras e obras. Amém?
O Brasil sofreu um golpe em 2016 que foi reconfigurado em 2018, com a prisão de Lula. Nos últimos quatro anos esteve sob ameaça de nova ruptura, enquanto milicianos e traficantes foram armados, forças militares e policiais aliciadas. Granadas foram atiradas contra Policiais Federais, a sede da PF foi atacada… Até que em janeiro do ano passado, veio a tentativa frustrada. Eis o contexto.
Liberdade de expressão é tema complexo inerente à democracia, e como valor democrático, ela não pode ameaçar a própria democracia. Eis um debate impossível de se realizar sem cotejar as tantas Cenas de Abril lá de cima, a própria história e a ideia de barbárie. A nova “Companhia de Jesus” pode até ser “iluminista”, mas só ilumina a horda fascista de parasitas civis/militares, financistas, charlatões da fé…
Consumado o golpe em 2023, o fim da liberdade de expressão seria o primeiro ato dos que pegam carona no “purismo” de Glenn e na hipocrisia de Elon Musk. Trata-se de guerra assimétrica. Musk, dizem, vem inflando perfis alinhados com a sarjeta do golpe, enquanto elimina seguidores com perfis humanistas, progressistas. Daí que o Brasil agradece os espelhinhos mas recusa, respeitosamente, o “Evangelho”.
Os tempos são de terror. As redes sociais, hoje, são o monstro que de olho em seus próprios lucros, se prepara para devorar o povo. E aqui vale Lembrar Lula ainda preso citando Mia Couto: “Em tempos de terror, escolhemos monstros para nos proteger”. E isso pode não acabar bem, inclusive para “paladinos da liberdade”.
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo
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