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segunda-feira, 26 de outubro de 2015

O Caso Vlademir Herzog: Um momento para não esquecer


    "Nesta era das gigantescas redes e vastos compartilhamentos não estamos conseguindo aquele mínimo de convergências para distinguir as sutilezas do mal. Pior: estamos sozinhos, cada um por si. A intensidade da comunicação não forma – ao contrário deforma — comunhões e comunidades. O mundo globalizado é na realidade, um tecido de solidões." - Alberto Dines


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Um momento para não esquecer

Por Alberto Dines em 25/10/2015 na edição 873 do Observatório da Imprensa
A ditadura militar começou a desabar com um ato ecumênico, verdadeiramente espiritual, celebrado na Sé de São Paulo em memória do jornalista Vlado Herzog e em protesto contra o seu assassinato dias antes nos cárceres do DOI-CODI local.
Hoje, 25 de outubro, no mesmo templo paulistano, exatos quarenta anos depois, novo culto inter-religioso desta vez para evocar aquele momento único de congraçamento humano e resistência à brutalidade.
O tempo decorrido não nos deixa mais tranquilos: fantasmas com outras roupagens substituíram os de então, novas perversidades articulam-se ostensivamente em diferentes recantos do planeta. Desatentos, tomados por estranhas derivações estamos permitindo que o país se dissolva no ódio. As certezas então produzidas pela unidade e pela solidariedade, apenas quatro décadas depois parecem irremediavelmente desfeitas.
Nesta era das gigantescas redes e vastos compartilhamentos não estamos conseguindo aquele mínimo de convergências para distinguir as sutilezas do mal. Pior: estamos sozinhos, cada um por si. A intensidade da comunicação não forma – ao contrário deforma — comunhões e comunidades. O mundo globalizado é na realidade, um tecido de solidões.
As próprias religiões estão sendo torpemente usadas para difundir desconfianças e fragmentações. O boato espalhado pela imprensa italiana sobre o tumor no cérebro do papa Francisco é uma clara manobra para desqualificar suas arrojadas tentativas de agregar, incluir, aproximar tanto na esfera dos costumes como na política.
A gigantesca e inacreditável lorota proposta pelo premiê israelense, Bibi Netanyahu — aliás filho de um eminente historiador — sobre a suposta origem palestina do projeto nazista de extermínio dos judeus na Segunda Guerra Mundial dá uma ideia da paranoia que domina os setores xenófobos da sociedade israelense. O negacionismo do Holocausto no qual os aiatolás iranianos estão engajados, jamais fabricou tão execrável disparate, inédita dessacralização do martírio dos seis milhões de vítimas do ódio racial.
Onde poderia o bilionário norte-americano Donald Trump encontrar inspiração para formatar sua jurássica plataforma política senão entre as seitas fundamentalistas dos EUA?
Com a credibilidade reduzida a pó e um pé no primeiro degrau do patíbulo o deputado Eduardo Cunha (até o momento, presidente da Câmara Federal), tenta desesperadamente armar uma base de apoio, por isso recorre com evidente desespero aos correligionários evangélicos. O projeto de sua autoria que fez aprovar há dias na Comissão de Constituição e Justiça torna quase impossível o aborto em caso de estupro apesar de garantido pela legislação. De uma perversidade medieval, torna o poder público um algoz, cumplice da maternidade precoce, incubadora de uma geração de menores abandonados que logo irão reforçar a delinquência.
Eduardo Cunha é o clássico caçador de bruxas, modelado pelo farisaísmo, a hipocrisia, servo de duas moralidades quando se trata do erário e de bens públicos, dos quais deveria ser guardião, não tem qualquer escrúpulo em apropriar-se. Mente descaradamente sem importar-se com a sua responsabilidade de guardião da fé pública.
Eduardo Cunha saiu do armário para nos lembrar que os fundamentos ideológicos e morais da brutalidade do regime militar permanecem intactos.
 Por que Cunha só faz declarações andando e apressado?
O mais cínico e assíduo dos entrevistados da cena política neste ano, Eduardo Cunha consegue passar incólume pelos diversos encontros diários com os repórteres que cobrem a Câmara Federal graças a um estratagema e uma desfaçatez que ultrapassam de longe a “cara-de-pau” de Paulo Maluf, até há poucos anos o indiscutível campeão na modalidade.
Cunha não se nega a falar, parece disponível, mas nunca recebe os repórteres parado. Procura sempre dar a impressão de que tem pressa, assuntos urgentes e transcendentais o convocam. Responde andando, rápido, sem olhar o repórter, inferiorizando-o e abatendo qualquer tentativa de réplica ou contestação das contumazes mentiras.
O comité de imprensa da Câmara deveria protestar, isso não é maneira de oferecer explicações à sociedade. E se o esperto deputado insistir na manha existem muitos recursos para sossega-lo.
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Alberto Dines é jornalista, escritor e fundador do Observatório da Imprensa

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