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quinta-feira, 1 de março de 2012

Para entender a Crise Econômica, 1ª Parte





Professor da secular Universidade de Coimbra, Portugal, António Avelãs Nunes discorre sobre as causas da crise mundial, a partir da estreiteza do modelo neoliberal, e seu impacto, especialmente na Europa, desde 2008.

Transcrevemos aqui sua entrevista concedida ao jornal Correio da Paraíba por ocasião do recebimento do título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Paraíba, UFPB, em entrevista publicada dia 08 de janeiro de 2012.

Entrevista:

- Professor, como se explica essa sucessão de crises econômicas que vêm atingindo a Europa?

- A crise começou por não ser uma crise europeia. É uma crise do capitalismo como um todo e ela surgiu mais uma vez, como em 1929, no centro do capitalismo e com muitos pontos em comum com a crise de 29.

- O senhor se refere aos Estados Unidos?

- Sim, foi o berço da crise, o maior país do mundo capitalista. Como em 1929, a crise se deve a um período de euforia nas bolsas com desenfreada especulação financeira, ou seja, de jogo de papeis em bancos buscando ganho fácil em cima de juros em detrimento do investimento na produção real de bens.

- O que realmente aconteceu?

- O capital financeiro (especialmente bancário) descobriu uma maneira de se remunerar a partir da especulação sem ter as dificuldades do capital aplicado, produtivo, que dá emprego, e sem os riscos da atividade produtiva normal. Depois, com a consolidação da ideologia neoliberal (após Reagan e Thatcher e com Collor e FHC no Brasil), ou seja, com a liberalização absoluta dos movimentos de capitais – impostas pelos grandes senhores do mundo – o capital financeiro tem se dedicado aos jogos de cassino, a apostar perigosamente para ganhar muito em pouco tempo. Por isso alguns autores tratam o capitalismo atual como capitalismo de cassino. Veja que os bancos apostaram e criaram a crise e foram os que mais receberam dinheiro dos governos depois de esta instalada. Essa tem sido a grande prática do capitalismo nos últimos anos com riscos diagnosticados há muitos anos.

- O senhor poderia ser mais preciso em relação a esse espaço de tempo?

- O próprio Keynes, há 50 anos, alertou para isso: “vamos mal se o capital financeiro se sobrepor ao capital produtivo”. E particularmente Keynes tinha uma grane aversão ao que ele chamava de “rentista” (o que vive de rendas de aplicações financeiras em bancos) e tem uma expressão famosa dele em que defendeu a eutanásia dos rentistas, ou seja, daqueles que vivem das rendas do seu dinheiro, dos que não poupam para a atividade produtiva.

- Que solução o senhor vê para o problema?

- Tenho defendido que o estado deveria intervir com oferta de moeda para evitar que a oferta fosse inferior à procura e assim evitando subir a taxa de juros (exatamente o oposto do que propagam os arautos do neoliberalismo para quem quanto mais auto a taxa de juros, melhor para uma minoria e pior para toda a humanidade). É preciso que o Estado venha a intervir para reduzir a taxa de juros e acabar com o rentista, o endeusado “investidor” especulativo.

- O que realmente esses “rentistas” trouxeram de mau para o mercado?

- Produtos financeiros derivados que são, nada mais nada menos, que objetos de apostas, no capitalismo de cassino em que se transformou o mundo do capitalismo. (Veja-se o documentário de Michael Moore Capitalismo, uma história de amor, sobre o jogo sujo por trás da criação dos tais “derivativos” das bolsas de valores) Os capitalistas dizem que a sofisticação desses produtos financeiros é tal que, muitas vezes, nem os próprios jogadores habituais deste cassino sabem o que compram e vendem...

- E é interessante que a crise tenha chegado à Europa via um banco alemão que havia comprado títulos podres...

- Mas boa parte do sistema financeiro europeu fazia aplicação em títulos podres dos grandes empórios, dos grandes conglomerados financeiros americanos – as companhias de seguros, os fundos de pensão e investimentos privados e todos os bancos. Fazia isso de modo que as poupanças das pessoas comuns foram investidas em produtos que os especialistas já vinham chamando a atenção como sendo armas de destruição em massa.

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