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quinta-feira, 5 de setembro de 2024

O preço do subdesenvolvimento é a eterna ignorância, por Luís Nassif

 

Baixarias, assassinatos de reputação, ódio, direito penal do inimigo, tudo isso consumia o país, enquanto ativos nacionais, eram distribuídos

    w3design/Canva

Em plena Lava Jato, depois que uma tropa de choque dela voltou dos Estados Unidos com a missão de prender o Almirante Othon, conversei com um dos poucos procuradores sérios da força tarefa. E ele me disse algo simbólico:

  • No Ministério Público Federal tem gente de esquerda e de direita, mas todos são patriotas.

Retruquei que o problema não era o patriotismo ou não, mas a profunda ignorância de não perceber o jogo geopolítico por trás da operação.

A maneira com que a operação envolveu Ministros do Supremo, a mídia em peso, o Judiciário, figuras ilustres da República, ao lado do rebotalho intelectual que ascendeu, ajuda a esclarecer o preço do subdesenvolvimento nacional: é o nível extraordinariamente baixo da opinião pública dita esclarecida.

No auge do mensalão, o Ministro Ayres Britto, presidente do Supremo, acatou a tese de que a Visanet era empresa pública porque seu nome era Companhia Brasileira de Meios de Pagamento (CBMP). E se tem brasileiro no nome, dizia o brilhante Ministro, só pode ser empresa pública.

Dizia ele, em sessão no Supremo:

  • Constatei e verifiquei que a Companhia Brasileira de Meios de Pagamento figurava no ativo permanente do Banco do Brasil. Aliás, o próprio nome Companhia Brasileira já evidencia que é uma companhia integrante do setor público.

Todo esse besteirol sendo falado em uma sessão da Suprema Corte! E não se ficou nisso. A quantidade de asneiras, de narrativas, de notícias falsas espalhadas pela opinião pública, por mais de uma década, evidenciam o pouco apreço do país, nem se diga pela análise mais sofisticada, mas por conceitos básicos de democracia, de sistema jurídico e de bom senso.

Essa catarse coletiva se espalhou pelo país inteiro. Baixarias, assassinatos de reputação, linguagem de ódio, direito penal do inimigo, tudo isso consumia o país, enquanto ativos nacionais, como o pré-sal, eram distribuídos a companhias estrangeiras.

O caso Elon Musk

Agora, é inacreditável que, em pleno 2024, com acesso online às principais publicações internacionais, os maiores jornais tenham ficado do lado do Elon Musk contra o Supremo Tribunal Federal, e só baixando as críticas quando a imprensa mundial mostrou o óbvio: a megalomania do sujeito e a disputa global entre estados nacionais e redes sociais.

Aí caiu a ficha de que esse mesmo conflito perpassa as relações da União Europeia, da Índia, da Turquia com as redes sociais. E, agora, vem a informação de que um juiz dos Estados Unidos condenou Musk pela manipulação da rede contra Kamala Harris. E o bordão mais utilizado para descrevê-lo é que está fora de prumo.

Não se tratava de informação irrelevante: a disputa entre estados nacionais e redes sociais é tema recorrente em todo o Ocidente.

Mas, em nome de um antilulismo cego, aceitam-se todas as bobagens, minimizam-se todos os avanços e cria-se toda uma fantasia em torno do suposto esquerdismo de Lula.

Qual a diferença de um Pablo Marçal deblaterando contra o consórcio comunista – que englobaria todos seus adversários – e os jornalões equiparando o Brasil à Venezuela? Ou vendo qualquer laivo de esquerdismo em Lula?

O padrão Jorge Paulo Lemann

Do mesmo modo, há uma infinidade de exemplos sobre a tragédia recorrente do assalto às empresas públicas de saneamento e energia. Em todos os lugares em que houve a privatização, os novos controladores trataram de esvaziar as empresas, vender seus ativos, reduzir manutenção e investimentos, para tirar o máximo possível de lucro no curto prazo. Mas essa discussão não penetra na mídia nacional.

Mesmo depois do fracasso rotundo das Americanas, da Boeing, da General Eletric, até hoje são enaltecidos os seguidores de Jack Welch e sua contraparte brasileira, Jorge Paulo Lemann. 

No livro “Reinventando o capitalismo na era digital”, Stephen Denning disseca bem o que é este capitalismo de resultados, interessado apenas em tirar o máximo possível das empresas nop curto prazo.

Diz ele sobre o estilo Maximizar o Valor do Acionistas (sigla MSV):

“MSV não só gerou desigualdade. Ironicamente, também teve o efeito oposto do que era pretendido. MSV sistematicamente destruiu valor de longo prazo para acionistas, em vez de aumentá-lo. Os principais expoentes corporativos de MSV estão, em sua maioria, com desempenho abaixo da média das empresas do S&P 500. Assim, a crescente desigualdade é apenas uma das consequências negativas do capitalismo de acionistas.

Maximizar o valor do acionista (MSV) conforme refletido no preço atual das ações não era apenas uma prática financeira esotérica: refletia um vasto movimento político, inicialmente personificado pelo presidente Ronald Reagan nos Estados Unidos e pela primeira-ministra Margaret Thatcher no Reino Unido, e mais recentemente com os cortes de impostos corporativos introduzidos pelo presidente Trump. O movimento político vive em ficções como “os cortes de impostos corporativos pagam por si mesmos”.

O MSV não apenas gerou desigualdade. Ironicamente, também teve o efeito oposto do que era pretendido. O MSV sistematicamente destruiu o valor do acionista de longo prazo, em vez de aumentá-lo. Os principais expoentes corporativos do MSV estão, em sua maioria, com desempenho abaixo da média das empresas do S&P 500. Portanto, a crescente desigualdade é apenas uma das consequências negativas do capitalismo do acionista.

Durante o último meio século, grandes empresas, particularmente nos Estados Unidos, adotaram o MSV. Embora essa narrativa semelhante a um vírus tenha sido chamada mais tarde de “a ideia mais idiota do mundo” por um de seus expoentes mais famosos, Jack Welch, o ex-CEO da GE, a narrativa se tornou a política oficial dos negócios americanos, com a declaração de 1997 da Business Roundtable.

Enquanto isso, as evidências mostraram que maximizar o valor do acionista encorajou o curto prazo e destruiu o valor do acionista de longo prazo. Também encorajou a ganância corporativa, deprimiu injustamente a remuneração dos trabalhadores, estimulou a remuneração grotesca dos executivos e exigiu a continuidade da burocracia hierárquica”.

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