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segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Bozo nazifascista. Nosso crime é não sermos violentos como eles, por Armando Coelho Neto, jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

 

Fato: os grupos neonazistas proclamaram incondicional apoio ao ex-presidente, cujo estafe reafirmou o tempo todo a recíproca



Bozo nazifascista. Nosso crime é não sermos como eles

por Armando Coelho Neto

O genocídio dos Yanomamis é um dos capítulos não apenas da tentativa de golpe, frustrada no dia 8 de janeiro último, mas também tentativa de implantação do nazifascismo no Brasil, com os já conhecidos patrocinadores e incentivadores, inclusive dentro de instituições como membros das Forças Armadas. Nazifascismo, note-se, é símbolo de discriminação, supressão de direitos, extermínio de diferentes.

O trato desse tema sob essa perspectiva nesse GGN é fruto da perda da antropóloga Adriana Dias, pesquisadora que encontrou uma carta do ex-presidente foragido, dirigida a neonazistas. O Brasil perdeu ontem uma das maiores autoridades do Brasil sobre neonazismo, a qual não perdia oportunidade de não só denunciar páginas do gênero, mas também “printar” para instruir seu trabalho de alta relevância.

Nesse espaço, um esforço para resumir entrevista concedida ao jornalista Vinicius Souza (MediaQuatro), antes das eleições, onde afirma ter iniciado suas pesquisas há 20 anos, tendo como pressuposto honrar vítimas do nazifascismo. Um trabalho inicialmente voltado para a comunidade judaica, LGTBQI+, e logo constatou que atos, fatos e símbolos de anos atrás estavam se repetindo.

Adriana começou entrevistando vítimas do holocausto numa comunidade judaica a qual integrava, no bairro do Bom Retiro (São Paulo). Ao fazê-lo, um universo de horror se abriu. “O nazifascismo suspende a noção de racionalidade”, diz, ressaltando ser esse o erro da esquerda, que busca racionalidade onde simplesmente não há. Vige a supressão do sentido e a intolerância à diversidade.

A visão nazista, afirma, é a de que o progresso (em sentido amplo) vem por meio do homem branco. Sobretudo o homem, macho, branco, sem deficiência, de origem europeia. Mas, “é a diversidade que constrói a civilização humana”. Já o nazismo quer o uno – excluindo negros, judeus, homossexuais, migrantes e uniões inter-raciais. Eis o paradoxo: o ser humano é plural por excelência, destaca.

Culto ao machismo, estupro e pedofilia são ingredientes do que a antropóloga chama de cultura do ressentimento. Uma cultura onde se professa meritocracia, desprezando qualquer ideia de que as pessoas se originam de experiências diferentes. Uma criança que nasce no Nordeste é diferente das que nascem no Sudeste, as de bairros ricos diferem das que nascem nas periferias. Elementar, não?

Na entrevista, as comparações entre o ex-presidente e Hitler são inevitáveis. Ambos trabalhavam com ressentimentos, ódio, discurso contra a corrupção, além da eleição de culpados “por tudo isso que está ai”. Entre os culpados, surgem o comunismo, a comunidade LGBTQI+, uma combinação estranha no processo de destruição da destruição da democracia (que é plural), rumo ao discurso do estado totalitário.

Trata-se de processo no qual igreja, empresas e poder sanitário se fazem presentes. Empresas para dar sustentação financeira, igrejas pelo simbólico papel na difusão do medo, enquanto os médicos para ter o controle dos corpos das pessoas. Nesse ponto, ela lembra de Hitler, que selecionou empresas que interessavam ao regime e os empregados obrigados a votar no partido. Havan?

As igrejas se encarregam da pauta moral, com certa reminiscência a um passado supostamente bom (que nunca existiu) ao qual é preciso voltar. Eis um elemento fundamental tentar dar atestado de idoneidade aos propósitos nazistas. Se no Brasil usaram os evangélicos, Hitler usou luteranos e católicos, sob o slogan Pátria, Família, Nação. Viram de onde vem o Brasil acima de tudo e Deus acima de todos?

Outro elemento importante são os médicos, os quais, por meio da Ciência, útil na eugenia – espécie de racismo disfarçado de Ciência. O que dizer do genocídio de Yanomamis? O que dizer das quase 700 mil vítimas da pandemia da Covid 19, na qual, os órgãos de classe da medicina nada fizeram, fato que estabelece estreita relação entre médicos e o projeto fascista nacional, destaca a pesquisadora.

Consolidado no poder, o passo seguinte seria o controle de leis e de vidas, e a consequente perda de cidadania. O site Apocalipse Suásticas sugere que um dos primeiros a perder cidadania seria a comunidade LGBTQIA+. Para tanto, eliminar o Poder Judiciário seria dado fundamental. Aqui, urge lembrar o cabo e o soldado citado pelo filho do ex-presidente, e os sucessivos ataques à Supremo Corte.

Controle de consciências por meio do terror, representado por um conjunto de medos, que pode ir do simples assalto na rua ao medo de perder o emprego. Sem contar os monstros representados pelos pedófilos, comunistas. Nesse conjunto de medos, por que não lembrar as imagens aterrorizantes criadas pela ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do desgoverno findo?

A mestra dá conta do inequívoco renascimento do antissemitismo, posto que, inclusive, já se cogita de formas para se alcançar novamente os judeus. No submundo da net, diz ela, consta até que a culpa do crescimento da comunidade LGBTQIA+ é responsabilidade dos judeus. Irônica, diz, se antes, na Alemanha de Hitler os judeus haviam criado o comunismo, agora a desculpa é outra.

Fato: os grupos neonazistas proclamaram incondicional apoio ao ex-presidente, cujo estafe reafirmou o tempo todo a recíproca – seja por meio de símbolos, gestos, ingestão de leite em público, recriação de cenários Joseph Goebbels, motociatas, cortes de cabelo, palavras de ordem, intolerância, apitos para cachorro. Como disse a antropóloga Adriana Dias, o nosso crime é não sermos como eles…

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

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