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quinta-feira, 24 de novembro de 2022

A esquizofrenia da extrema-direita bolsonarista, por Fabiano Coelho Horimoto, médico psiquiatra

 

O que fazer com essa turma inconformada que vive uma realidade paralela? Debater, informar, convencer? Não.


A esquizofrenia da extrema-direita

por Fabiano Coelho Horimoto

Classicamente em Psicologia o conceito de dissonância cognitiva prevê uma contradição entre o que o indivíduo acredita e a realidade fática. Uma forma de reduzir o conflito é ter uma relação consonante, ou seja, conseguir novas informações ou crenças que irão reforçar sua consonância, reduzindo a angústia.

Chegamos ao Brasil pós-eleições presidenciais: o professor titular de Literatura Comparada da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, João Cezar de Castro Rocha, autor do livro “Guerra Cultural e retórica do ódio”, atribui à extrema-direita brasileira, em consonância com seus pares transnacionais, o método clássico de capturar corações e mentes de parte da população suscetível a esse discurso. Faz-se através da construção de uma narrativa onde há necessidade de se criarem inimigos imaginários, mobilizando medo e repulsa, para formatar um pensamento quase delirante, unificando esse grupo.

 Neste ambiente de coesão interna não há possibilidade de checar a realidade  nas fontes tradicionais de mídia. Muito pelo contrário, são rechaçadas, rotuladas de parciais, compradas, subvertidas e a única fonte de informação provém da própria mídia radical, impulsionada pelas milícias digitais, propagando uma profusão de fake news e teorias da conspiração, numa espiral de retroalimentação infinita.

Então faz todo sentido Jair Bolsonaro e seus radicais, amparados no seu exército digital, elegerem sucessivamente vários inimigos a serem combatidos ou eliminados em defesa da pátria: comunistas, a ONU, o Supremo Tribunal Federal, a China e por aí vai…

Com sua derrota, não houve desmobilização deste grupo extremista, que bloqueou rodovias, acampou na frente das organizações militares, se enrolou na bandeira e foi bater bumbo exigindo “Intervenção Federal” ou, no português claro, golpe militar. Esses radicais, num movimento que se assemelha à histeria coletiva, vibram e se regozijam a cada fake que chega ao celular: Alexandre de Moraes foi preso! Lula está gravemente doente, internado às pressas! O general irá apresentar o relatório das urnas, constatar fraude eleitoral e decretar uma intervenção militar! Nem é preciso aprofundar na psicanálise: Freud explicou há um século esses fenômenos que vicejam em ambientes de fanatismo, seja religioso ou político.

O que fazer com essa turma inconformada que vive uma realidade paralela? Debater, informar, convencer? Não. A convicção nessas crenças desamparadas da realidade impede que voltem a habitar o mundo normal. A cada fato que nega sua crença, a tática é cavar a próxima trincheira e pular dentro dela.

O remédio para toda essa animosidade e fanatismo desenfreado que capturou parte do eleitorado brasileiro, foi aplicado na forma de uma vacina no dia 30 de outubro e chama-se democracia. Como toda vacina, leva um tempo para surtir o efeito desejado, porém o peso brutal da realidade em breve cairá sobre as cabeças desses indivíduos como uma bigorna, levando uma normalização à força de seu comportamento. Vão continuar existindo, porém de uma forma latente como já ocorria antes do bolsonarismo.

Jair Bolsonaro apenas agiu como catalisador do radicalismo da extrema-direita, que se disfarçava de conservadora, mas na verdade era antidemocrática. E saiu do campo político para adentrar a Psiquiatria, tornando-se esquizofrênica.

Dr. Fabiano Coelho Horimoto, médico-psiquiatra, professor universitário e escritor.


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