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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A modelagem da opinião pública pelo massacre midiático

Texto de Guilherme Bulos, extraído do Observatório da Imprensa:




Massacre Midiático


A opinião pública, outrora mais comedida, aderiu de forma radical ao antipetismo. PT virou sinônimo de bandalheira e seus eleitores são ignorantes que parasitam em torno dos programas sociais. Opinião pública, já disse Millôr Fernandes, nada mais é do que aquilo que se publica.

Antes de tornar-se um discurso amplamente difundido –em especial no Sudeste, Sul e Centro-Oeste do país– o antipetismo foi cuidadosamente fermentado por um grupo bem mais seleto, o daqueles que publicam. Os 30 Berlusconi brasileiros na definição da organização europeia Repórteres Sem Fronteiras.

Agora que se apresentam chances reais de o PSDB retomar a presidência da República, o que era desgaste progressivo tornou-se massacre aberto. A guerra de baixa intensidade virou um bombardeio indiscriminado.

A página Manchetômetro (manchetometro.com.br) realizou levantamento das notícias positivas e negativas aos candidatos nestas eleições. O resultado revela muito sobre a imparcialidade do jornalismo brasileiro. Dentre os três principais jornais impressos do país, as chamadas de capa positivas para Dilma foram quatro. Para Aécio Neves, 32. Já as negativas, foram 176 para Dilma e 31 para Aécio.

No principal telejornal do Brasil, o “Jornal Nacional”, da TV Globo, a cobertura com notícias favoráveis para Dilma foi de quatro minutos e 14 segundos. Para Aécio foi de nove minutos e 52 segundos. No caso das notícias desfavoráveis, para Dilma o tempo foi de 53 minutos e para Aécio foi de sete minutos e seis segundos.

Onda conservadora

Não estamos falando apenas de parcialidade. Este limite já foi ultrapassado. Trata-se de bombardeio midiático contra a candidata do PT. Bombardeio agora intensificado com denúncias seletivamente vazadas de um inquérito supostamente sigiloso sobre a corrupção na Petrobras.

Que houve e há corrupção na Petrobrás parece certo. Que a imprensa tenha o papel de divulgá-la é algo inquestionável. Mas o mesmo critério deveria ser aplicado para o caso do aeroporto de Cláudio (MG) ou para o cartel fraudulento do metrô de São Paulo. Com o mesmo tempo, o mesmo tom acusatório e as mesmas proporções. Os números do Manchetômetro mostram outra coisa.

Mas, convenhamos, ao PT agora não adianta chorar. Teve 12 anos para levantar o debate da democratização das comunicações no Brasil e não o fez. Faltou coragem e sobrou soberba. Acreditou que o pacto social era uma mágica que duraria para sempre. Tornou-se neste caso –como em muitos outros– vítima da sua falta de ousadia para mudanças estruturais.

O monopólio das comunicações no Brasil é escandaloso. O relatório dos Repórteres Sem Fronteiras, publicado no ano passado, apenas diz o que é sabido desde muito tempo acerca da propriedade dos meios de comunicação no país. “As características do mecanismo geral de funcionamento da mídia estorvam a livre circulação da informação e impedem o pluralismo. Dez grandes grupos econômicos, correspondentes a outras tantas famílias, dividem entre si o mercado da comunicação de massas”, constata o relatório. Estas famílias são os 30 Berlusconi brasileiros.

Qualquer tentativa de debater criticamente essa estrutura é tachada como censura, numa jogada desses grupos para manter seus privilégios. São grupos econômicos bastante lucrativos, inclusive por meio de contratos de publicidade oficial. E não sejamos ingênuos, seus controladores têm posição política e classe social. Liberdade de comunicação é precisamente o que essa estrutura monopolista impede. O poder de informar a sociedade não pode ser propriedade de 30 famílias.

Mas, se o PT sequer questionou essa estrutura de privilégios, por que tanto ódio ao petismo? Eis a questão. Algo leva a crer que seja pelos mesmos motivos que, mesmo com lucros recordes dos bancos, a Bolsa sobe quando Dilma cai.

A elite brasileira, nas finanças ou na mídia, não aceita concessões. Por menores que sejam. São intolerantes mesmo às mudanças de menor impacto e menos ofensivas a seus interesses. Resta algo do espírito da casa grande: ódio aos pobres, aos nordestinos, aos negros. Não suportam ascensão social, mesmo quando isso reforça sua posição no topo. Querem exclusividade no aeroporto, na universidade e no poder político.

E, não menos importante, querem Armínio Fraga como ministro da Fazenda. Compreensível. Fosse eu banqueiro ou magnata também iria querer.

Por isso encaram a derrota do PT como a sua vitória. E naturalmente, tendo os meios de comunicação nas mãos, conseguiram produzir um sentimento que abarca também os de baixo. A corrupção caiu como uma luva na massificação do argumento.

O massacre que estamos vendo e veremos até o dia 26 revela a adesão em bloco da elite à candidatura de Aécio e sua aposta na polarização. Se ganharem, poderão consolidar uma onda conservadora no Brasil e na América Latina. Se perderem, podem ter que pagar pelo exagero da dose, já que polarização não é algo que possa se desmontar com a mesma facilidade com que se cria.

***

Guilherme Boulos, 32, é formado em filosofia pela USP, professor de psicanálise e membro da coordenação nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto).

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