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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Leonardo Boff, O bóson de Higgins e a a compreensão humana de Deus

Questões para além da física: partícula Deus ou partícula de Deus?

Fonte:  http://leonardoboff.wordpress.com/2013/10/11/questoes-para-alem-da-fisica-particula-deus-ou-particula-de-deus/http://leonardoboff.wordpress.com/2013/10/11/questoes-para-alem-da-fisica-particula-deus-ou-particula-de-deus/


Só para recordar: em janeiro deste ano de 2013 publiquei aqui neste blog um artigo escrito para o Jornal do Brasil on-line sobre a famosa “particula Deus” ou “partícula de Deus”, fruto da pesquisa sobre as partículas elementares no Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) em busca de um “bóson” (energia em forma  de onda, enquanto a energia em forma de partícula material se chama “férmion”), responsável por conferir massa às partículas e assim possibilitar o surgimento da matéria da qual todos nós surgimos. Por estar na raiz de todo o universo a presumida descoberta deste bóson passou a ser chamado de ”partícula Deus”. Como agora em outubro, os dois cientistas que estavam à frente desta pesquisa, François Englert e Peter Higgs ganharam o prêmio Nobel de física, seria interessante revisitar esse tema, de forma crítica, pois aí estão envolvidas questões que transcendem a física e penetram  no campo da filosofia e da teologia. Dai a razão para republicarmos o artigo que, ademais, teve boa acolhida nas várias traduções que conheceu por este mundo afora. Lonardo Boff


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Desde os anos 60 do século passado, físicos teóricos se punham a questão: como podem as partículas elementares sem  massa que surgiram com o big bang, ganharem massa, após trilhonéssimas fracções de segundo? Qual foi a partícula ou o campo energético que conferiu massa às partículas virtuais e assim fez irromper a matéria que compõe todo o universo?

            Sabemos e, o faço de forma extremamente pedestre, que a matéria (segundo Einstein é energia altamente condensada) é composta por partículas elementares: topquarks e léptons. Quando estes se unem dão origem aos prótons e aos nêutrons. Esses, por sua vez, se unem e formam o núcleo atômico. Léptons, de carga negativa, são atraídos pelo núcleo atômico, com carga positiva e juntos formam os átomos. De átomos se compõem todos os seres existentes.

            Portanto, topquarks e léptons são os tijolinhos básicos com os quais todo o universo e nós mesmos somos  construídos. Junto com estas partículas elementares agem as quatro forças originárias que ordenam todo o universo, cuja natureza, a ciência não conseguiu ainda decifrar. Elas atuam conjuntamente e respondem pela expansão, ordenação e complexificação de todo o processo cosmogênico: a força gravitacional, a eletromagnética, a nuclear fraca e forte.

            Peter Higgs (*1929) um tranquilo pesquisador de física teórica da universidade de Edinburgo na Inglaterra, sugeriu que deveria existir uma partícula, um bóson ou um campo energético, responsável pela massa de todas as partículas. O físico Leon Lederman (Nobel de Física) chamou-a de partícula de Deus. Outros a denominaram de partícula Deus, porque ela é a criadora de toda a matéria do universo.

            Que seria esse bóson Higgs ou campo Higgs? Os físicos o imaginam como um fluido viscoso finíssimo que enche todo o universo, à semelhança do éter de Aristóteles e da física clássica. Quando as partículas elementares sem massa, puramente virtuais, tocam esse bóson ou interagem com o campo Higgs sofrem resistência, são freadas, pressionadas e consolidadas e destarte ganham massa e peso.

            No dia 4 de julho de 2012 no Grande Colisor de Hádrions entre a Suíça e a França, após acelerar partículas que colidiam, quase à velocidade da luz, os cientistas do Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) identificaram uma partícula que preenche as características atribuídas ao bóson de Higgs. Supõe-se que seja ele ou outra partícula similar, mas que efetivamente confere massa às partículas elementares.

            Esta verificação confirma o modelo standard do universo originado pelo big bang; daí a sua importância.

            Mas como entra Deus nisso tudo? Se dissermos que esta partícula é Deus, seguramente a teologia não o  aceitaria, pois faria de Deus uma parte do universo. Ele é mais. É aquela Energia de Fundo, aquele Abismo possibilitador e sustentador do universo, que antecede ao big bang. Ele estaria além do “muro de Planck”, o limite intransponível, anterior ao tempo zero a partir do qual  em 10 na potência 43 de segundos após o big bang teria surgido a matéria do universo. Atrás deste muro se esconde aquela Energia poderosa e amorosa que origina tudo, inalcançável  pela física mas acessível pela mística.

            Se dissermos que o bóson de Higgs é a partícula de Deus podemos teologicamente aceitá-lo; seria o meio pelo qual Deus traria à existência as partículas materiais e assim todo o universo: um ato exclusivamente divino. Essa é a ontologia originária de Deus. A partícula de Deus nos mostra como se cria tudo o que nos é dado ver. Filosófica e teologicamente diria: ela nos revela como  Deus fez surgir o mundo. E esse ato não se encontra no passado, mas se realiza em cada momento e em todas as partes do universo e também em nós que estamos à mercê desta partícula de Deus. Caso contrário tudo deixaria de ser, voltaria ao nada.



O livro O Tao da Libertação: explorando a ecologia da transformação de M.Hathway e L.Boff foi premiado nos USA em 2010 com a medalha de ouro em Ciência e Cosmologia. Está em português pela Vozes 2012.

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