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sábado, 25 de fevereiro de 2012

Poesia e lirismo no filme A Invenção de Hugo Cabret, de Martin Scorsese

 


Carlos Antonio Fragoso Guimarães

   Martin Scorsese ganhou fama de competente diretor de filmes densos, quase sempre centrados em conflitos sociais urbanos. Mas sempre primou por uma fotografia de grande beleza e roteiros bem delineados recheados de ecos filosóficos, especialmente existencialistas. Contudo, seu mais recente filme, Hugo (no Brasil, A Invenção de Hugo Cabret) se apresenta como uma pedrinha preciosa em um formato aparentemete atípico na produção deste diretor.

  O filme, o primeiro feito por Scorsese no formato 3D (nos cinemas), se apresenta como uma história aparentemente infantil, mas na verdade é dirigida a todos, num desenrolar repleto de lirismo e beleza do começo ao fim. Não bastasse isso,  possui também uma mensagem filosófica muito bonita de crítica social e a um intelectualismo mecanicista que vêm desencantado a tudo e a todos, em uma sociedade em que as pessoas são canalizadas a se transformarem em especialistas "autômatos". Segue, bem de perto, a própria magia do livro em que se inspira, A Invenção de Hugo Cabert, do escritor americano Brian Selznick. 

  A principal mensagem do filme é: A técnica e a tecnologia devem e podem servir ao ser humano, a todas as pessoas, e não o contrário. Se for utilizada para servir e ajudar o homem, ela pode despertar a magia da poesia (no caso, da poesia cinematográfica). Mensagem esta muitíssimo necessária nestes tempos de crise do capitalismo mecanicista, desumano e pretensamente racional, que faz a maioria esquecer que as pessoas, todas e cada um de nós, é que fazemos a História, e não o inverso.

  O filme também critica instituições parasitas, baseadas em preconceitos de classe social, que tentam modelar e impor padrões de comportamentos fixos e frios, portanto mecânicos, representadas no filme pela perseguição do herói, um menino de seus dez anos, por um guarda com a perna ferida apoiada por uma estrutura mecânica - mais uma metáfora dos males do mecanicismo tomado como representação da realidade e não como elemento auxiliar instrumental - e altamente alienado e frustrado, personagem muito bem representado por Sacha Baron Cohen, o comediante britânico que ficou famoso no papel do jornalista ingênuo Borat.

  Outros elementos que apontam para uma crítica do paradigma mecanicista em vigor e sua característica destrutiva quando usado sem o uso do coração do homem que os produzem se vêem em quase todas as cenas do filme, desde o autômato psicógrafo que só funciona quando se acha uma chave com formato de coração, até aos dizeres de que os filmes poéticos dos primórdios do cinema deixaram de ser procurados e vistos pelos soldados que experimentaram os horrores genocidas da I Guerra Mundial e seu uso intensivo de novas máquinas destrutivas, como tanques e canhões de grosso calibre. 

   O personagem central do filme, Hugo Cabret, é um menino que se tornou órfão (representado perfeitamente pelo notável Asa Buttrerfield, que já impressionou anteriormente no filme "O Menino de Pijama Listrado") quando o carinhoso e dedicado pai (Jude Law, de "Gattaca" e "Sherlock Holmes"), um relojoeiro talentoso, morre repentinamente em um incêndio dentro de um museu. Hugo passa, então, a viver com um tio beberrão que era responsável pela manutenção dos grandes relógios da central de trem de Paris, em fins dos anos 1920. Só que o tio, irresponsável, deixa tal trabalho nas mãos do sobrinho para se dedicar integralmente ao seu vício. Hugo passa a viver entre as paredes e corredores ocultos fazendo a manutenção dos relógios de forma anônima, saindo de vez em quando para conseguir comida e algumas peças mecânicas na loja de brinquedos de um misterioso senhor, de aparência severa, na estação central. Mal sabe Hugo e este senhor (um antigo mágico e, surpreendemente, um importante personagem da história do cinema, representado pelo "Gandhi" Ben Kingsley) que o encontro entre os dois, mediados pela esperta e carinhosa garota Isabelle (Chloë Grace Moretz, de "Deixe-me entrar"), em meio a aventuras e descobertas, mudará suas percepções de mundo para sempre.... E mexerá com a percepção de muitos dos que forem assistir a este filme com o coração de criança e olhos de adultos....

   A Invençãode Hugo Cabret é um daqueles filmes mágicos para todos os que sabem que, como diz o psicanalista suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), no coração de quase todo adulto "ainda espreita uma criança - uma criança eterna, que está sempre vindo a ser, que nunca está completa e que solicita cuidado, atenção e educação incessantes. A melhor parte da personalidade humana, que quer desenvolver-se sempre"  

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