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domingo, 25 de dezembro de 2011

Mídia constrangida pela Privataria Tucana tenta defender o PSDB e continuar a ser o Quarto Poder


Carlos Antonio Fragoso Guimarães

"No Brasil, a blogosfera e as redes sociais ajudaram a quebrar o silêncio. Para a velha mídia, o livro “A Privataria Tucana” não existia. Depois, passou a existir, em matérias feitas para defender Serra e seus amigos. Os documentos e informações a mostrar o caminho suspeito do dinheiro por paraísos fiscais caribenhos não despertou interesse dos jornais e TVs brasileiros",  escreveu o analista Rodrigo Viana em seu blog "O Escrivinhador".

  Mas este arremedo de operação abafa feito pela mídia pró-tucanagem não atingiu a Argentina, onde o livro A Privataria Tucana foi capa do jornal "Página 12". Lá, em manchete, estava escrito:

El jueves 15, el diario Folha de Sao Paulo, ligado a Serra, publicó una nota sobre el tema, destacando las declaraciones de los acusados que buscan descalificar al periodista y sus denuncias”. 
  Esta mesma fórmula, apontada pelo jornal argentino, de tentar desqualificar o trabalho documentado do autor e jornalista Amaury Ribeiro Júnior foi seguido com maior virulência por todos os periódicos paulistas ligados ao PSDB, como a Veja (como era de se esperar) e a Revista Época e a rádio CBN (ambas da Globo). A mesma mídia que estava a todo tempo buscando indícios para atacar Dilma através de seus ministros, no entanto, demorou a mostar as garras no evento do lançamento do livro A Privataria Tucana e quando o fez, o fez timidamente em um tom de desprezo e sarcasmo.

 O tom clientelista de dois pesos e duas medidas da mídia paulista na questão do livro A Privataria Tucana não passou desapercebido ao histoiriador Túlio Muniz. Em um artigo, composto em Portugal para o Observatório da Imprensa, em certa altura ele escreve:

Fora do foco das redes e TV e dos jornalões, o lançamento e consequente repercussão do livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr, provavelmente o maior fenômeno editoral do ano (80 mil exemplares tirados e praticamente vendidos em uma semana), é também símbolo da importância de veículos credíveis de imprensa (Carta Capital e Record). Sobretudo, é prova da irreversível penetração da internet na sociedade, legando ao vexame público jornais e jornalistas ávidos por escândalos, desde que não contrariem os interesses de seus patrões e/ou de patrocinadores de iniciativas e de suas publicações e projetos pessoais.
A imprensa europeia não é imune ao controle por parte do mercado, mas não zomba da inteligência do público, tampouco prescinde da presença de intelectuais em suas páginas – diariamente, e não a conta-gotas semanais, prescrição comum no Brasil (mesmo em certo jornalismo universitário), cuja imprensa é inimiga do pensamento.

A Privataria Tucana e sua desconsideração evidenciam a estratégia orquestrada de poder dos grupos privados de comunicação de massa. O silêncio para com o “concorrente” (aspas, pois aqui não se trata de concorrência, e sim, de aliado cartelista) ocorre para não promover o hipotético adversário de mercado, mas para também, e sobretudo, legitimar o próprio silêncio em torno de assunto que contrarie os interesses do cartel (não confundir com “máfia”, apesar das semelhanças).
 Grosseiramente invisibilizado pela mídia convencional, A Privataria Tucana demonstra como o cartel foi assimilado pela grande(?) mídia nacional não só em termos de disputa mercado, mas também de negação de um imaginário já consolidado entre a população, que lhe presta assistência e audiência mas não mais se deixa guiar acriticamente como há duas décadas. Lembremos da reeleição de Lula em 2006: sob massacre e bombardeio da mídia cartelista, ele não só venceu o segundo turno como seu adversário (Geraldo Alckmin) teve menos votos que obtivera no primeiro. Portanto, o caso de A Privataria Tucana não é o primeiro. Será o último?

Reproduzo, agora, trecho de um artigo de Inês Nassif publicado na revista Carta Capital sobre o assunto:


  Mais sorte que arte, a (próxima) reforma ministerial começa no momento em que a grande mídia, que derrubou um a um sete ministros de Dilma, se meteu na enrascada de lidar com muito pouca arte no episódio do livro “A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Passou recibo numa denúncia fundamentada e grave. Envolve venda (ou doação) do patrimônio público, lavagem de dinheiro – e, na prática, a arrogância de um projeto político que, fundamentado na ideia de redução do Estado, incorporou como estratégia a “construção” de uma “burguesia moderna”, escolhida a dedo por uma elite iluminada, e tecida especialmente para redimir o país da velha oligarquia, mas em aliança com ela própria. Os beneficiários foram os salvadores liberais, príncipes da nova era. O livro “Cabeças de Planilha”, de Luís Nassif, e o de Amaury, são complementares. O ciclo brasileiro do neoliberalismo tucano é desvendado em dois volumes “malditos” pela grande imprensa e provado por muitas novas fortunas. Na teoria. Na prática, isso é apenas a ponta do iceberg, como disse Ribeiro Jr. no debate de ontem (20), realizado pelo Centro de Estudos Barão de Itararé, no Sindicato dos Bancários: se o “Privataria” virar CPI, José Serra, família e amigos serão apenas o começo.


  A “Privataria” tem muito a ver com a conjuntura e com o esporte preferido da imprensa este ano, o “ministro no alvo”. Até a edição do livro, a imprensa mantinha o seu poder de agendamento e derrubava ministros por quilo; Dilma fingia indiferença e dava a cabeça do escolhido. A grande mídia exultou de poder: depois de derrubar um presidente, nos anos 90, passou a definir gabinetes, em 2011, sem ter sido eleito e sem participar do governo de coalizão da mandatária do país. A ideologia conservadora segundo a qual a política é intrinsicamente suja, e a democracia uma obra de ignorantes, resolveu o fato de que a popularidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizimou a oposição institucional, em 2010, e a criação do PSD jogou as cinzas fora, terceirizando a política: a mídia assumiu, sem constrangimentos, o papel de partido político. No ano de 2011, a única oposição do país foi a mídia tradicional. As pequenas legendas de esquerda sequer fizeram barulho, por falta de condições, inclusive internas (parece que o P-SOL levou do PT apenas uma vocação atávica para dissidências internas; e o PT, ao institucionalizar-se, livrou-se um pouco dela – aliás, nem tanto, vide o último capítulo do livro do Amaury Ribeiro Jr.).


  Quando a presidenta Dilma Rousseff começar a escolher seus novos ministros, e se fizer isso logo, a grande mídia ainda estará sob o impacto do contrangimento. Dilma ganhou, sem imaginar, um presente de Papai Noel. A imprensa estará muito menos disposta a comprar uma briga durante a CPI da Privataria – quer porque ela começa questionando a lisura de aliados sólidos da mídia hegemônica em 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010, quer porque esse tema é uma caixinha de surpresas.

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