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sábado, 26 de fevereiro de 2011

Carl Gustav Jung

    “A psicologia do indivíduo corresponde à psicologia das nações. As nações fazem exatamente o que cada um, agindo individualmente, repercute e se amplia no social; e do modo como o indivíduo age a nação também agirá. Somente com a transformação da atitude do indivíduo é que começará a transformar-se a psicologia da nação. Até hoje, os grandes problemas da humanidade nunca foram resolvidos por decretos coletivos, mas somente pela renovação das atitudes do indivíduo”.
Carl Gustav Jung (1875-1961)





Texto de

Carlos Antonio Fragoso Guimarães

escrito em 08 de janeiro de 1997



Jung e sua obra


  Carl Gustav Jung nasceu a 26 de julho de 1875, em Kresswil, Basiléia, na Suíça, no seio de uma família voltada para a religião. Seu pai e vários outros parentes eram pastores luteranos, o que explica, em parte, desde a mais tenra idade, o interesse do jovem Carl por filosofia e questões espirituais e o pelo papel da religião no processo de maturação psíquica das pessoas, povos e civilizações. Criança bastante sensível e introspectiva, desde cedo o futuro colega de Freud demonstrou uma inteligência e uma sagacidade intelectuais notáves, o que, mesmo assim, não lhe poupou alguns dissabores, como um lar algumas vezes um pouco desestruturado e a inveja dos colegas e a solidão.

Ao entrar para a universidade, Jung havia decidido estudar Medicina, na tentativa de manter um compromisso entre seus interesses por ciências naturais e humanas. Ele queria, de alguma forma, vivenciar na prática os ideais que adotava usando os meios dados pela ciência. Por essa época, também, passou a se interessar mais intensamente pelos fenômenos psíquicos e investigou várias mensagens hipoteticamente recebidas por uma médium local (na verdade, uma prima sua), o que acabou sendo o material de sua tese de graduação, "Psicologia e Patologia dos Assim Chamados Fênomenos Psíquicos".

Em 1900, Jung tornou-se interno na Clínica Psiquiátrica Bugholzli, em Zurique, onde estudou com Pierre Janet, em 1902, e onde, em 1904, montou um laboratório experimental em que criou seu célebre teste de associação de palavras para o diagnóstico psiquiátrico. Neste, uma pessoa é convidada a responder a uma lista padronizada de palavras-estímulo; qualquer demora irregular no tempo médio de resposta ou excitação entre o estímulo e a resposta é muito provavelmente um indicador de tensão emocional relacionada, de alguma forma, com o sentido da palavra-estímulo. Mas tarde este teste foi aperfeiçoado e adaptado por inúmeros psiquiatras e psicólogos, para envolver, além de palavras, imagens, sons, objetos e desenhos. É este o princípio básico usado no detector de mentiras, utilizado pela polícia científica. Estes estudos lhe granjearam alguma reputação, o que o levou, em 1905, aos trinta anos, a assumir a cátedra de professor de psiquiatria na Universidade de Zurique.

Neste ínterim, Jung entra em contato com as obras de Sigmund Freud (1856-1939), e, mesmo conhecendo as fortes críticas que a então incipiente Psicanálise sofria por parte dos meio médicos e acadêmicos na ocasião, ele fez questão de defender as descobertas do mestre vienense, convencido que estava da importância e do avanço dos trabalhos de Freud. Estava tão enstusiasmado com as novas perspectivas abertas pela psicanálise, que decidiu conhecer Freud pessoalmente. O primeiro encontro entre eles transformou-se numa conversa que durou treze horas ininterruptas. A comunhão de idéias e objetivos era tamanha, que eles passaram a se corresponder semanalmente, e Freud chegou a declarar Jung seu mais próximo colaborador e herdeiro lógico, e isso é algo que tem de ser bem frisado, a mútua admiração entre estes dois homens, frequentemente esquecida tanto por freudianos como por junguianos. Porém, tamanha identidade de pensamentos e amizade não conseguia esconder algumas diferenças fundamentais, e nem os confrontos entre os fortes gênios de um e de outro. Jung jamais conseguiu aceitar a insistência de Freud de que as causas dos conflitos psíquicos sempre envolveriam algum trauma de natureza sexual, e Freud não admitia o interesse de Jung pelos fenômenos espirituais como fontes válidas de estudo em si. O rompimento entre eles foi inevitável, ainda que Jung o tenha, de certa forma, precipitado. Ele iria acontecer mais cedo ou mais tarde. O rompimento foi doloroso para ambos. O rompimento turbulento do trabalho mútuo e da amizade acabou por abrir uma profunda mágoa mútua, nunca inteiramente assimilada pelos dois principais gênios da Psicologia do século XX e que ainda, infelizmente, divide partidários de ambos os teóricos.

Aterior mesmo ao período em que estavam juntos, Jung começou a desenvolver uma sistema teórico que chamou, originalmente, de "Psicologia dos Complexos", mais tarde chamando-a de "Psicologia Analítica", como resultado direto de seu contato prático com seus pacientes. O conceito de inconsciente já está bem sedimentado na sólida base psiquiátrica de Jung antes de seu contato pessoal com Freud, mas foi com Freud, real formulador do conceito em termos clínicos, que Jung pôde se basear para aprofundar seus próprios estudos. O contato entre os dois homens foi extremamente rico para ambos, durante o período de parceria entre eles. Aliás, foi Jung quem cunhou o termo e a noção básica de "complexo", que foi adotado por Freud. Por complexo, Jung entendia os vários "grupos de conteúdos psíquicos que, desvinculando-se da consciência, passam para o inconsciente, onde continuam, numa existência relativamente autônoma, a influir osbre a conduta" (G. Zunini). E, embora possa ser frequentemente negativa, essa influência também pode assumir caracterísiticas positivas, quando se torna o estímulo para novas possibilidades criativas.

Jung já havia usado a noção de complexo desde 1904, na diagnose das associações de palavras. A variância no tempo de reação entre palavras demonstrou que as atitudes do sujeito diante de certas palavras-estímulo, quer respondendo de forma exitante, quer de forma apressada, era diferente do tempo de reação de outras palvras que pareciam ter estimulação neutra. As reações não convencionais poderiam indicar (e indicavam de fato) a presença de complexos, dos quais o sujeito não tinha consciência.

Utilizando-se desta técnica e do estudo dos sonhos e de desenhos, Jung passou a se dedicar profundamente aos meios pelos quais se expressa o inconsciente. Os sonhos pessoais de seus pacientes o intrigavam na medida em que os temas de certos sonhos individuais eram muito semelhantes aos grandes temas culturais ou mitológicos universais, ainda mais quando o sujeito nada conhecia de mitos ou mitologias. O mesmo ocorria no caso dos desenhos que seus pacientes faziam, geralmente muito parecidos com os símbolos adotados por várias culturas e tradições religiosas do mundo inteiro. Estas similaridades levaram Jung à sua mais importante descoberta: o "inconsciente coletivo". Assim, Jung descobrira que além do consciente e inconsciente pessoais, já estudados por Freud, exitiria uma zona ou faixa psíquica onde estariam as figuras, símbolos e conteúdos arquetípicos de caráter universal, frequentemente expressos em temas mitológicos. Por exemplo, o mito bíbilico de Adão e Eva comendo do fruto da árvore do Conhecimento do Bem e do Mal e, por isso, sendo expulosos do Paraíso, e o mito grego de Prometeu roubando o fogo do conhecimento dos deuses e dando-o aos homens, pagando com a vida pelo sua presunção são bem parecidos com o moderno mito de Frankenstein, elaborado pela escritora Mary Schelley após um pesadelo, e que toca fundo na mente e nas emoções das pessoas de forma quase "instintiva", como se uma parte de nossas mentes "entendesse" o real significado da história: o homem sempre paga um alto preço pela ousadia de querer ser Deus.

Enquanto o inconsciente pessoal consiste fundamentalmente de material reprimido e de complexos, o inconsciente coletivo é composto fundamentalmente de uma tendência para sensibilizar-se com certas imagens, ou melhor, símbolos que constelam sentimentos profundos de apelo universal, os arquétipos: da mesma forma que animais e homens parecem possuir atitudes inatas, chamadas de instintos, também é provável que em nosso psiquismo exista um material psíquico com alguma analogia com os instintos. Talvez, as imagens arquetípicas sejam algo como que figurações dos próprios insitintos, num nível mais sofisticado, psíquico. Assim, não é mais arriscado admitir a hipótese do inconsciente coletivo, comum a toda a humanidade, do que admitir a existência instintos comuns a todos os seres vivos.

Assim, em resumo, o inconsciente coletivo é uma faixa intrapsíquica e interpsíquica, repleto de material representativo de motivos de forte carga afetiva comum a toda a humanidade, como, por exemplo, a associação do femino com características maternas e, ao mesmo tempo, em seu lado escuro, crueis, ou a forte sensação intuitiva universal da existência de uma transcendência metaforicamente denominada Deus. A mãe boa, por exemplo, é um aspecto do arquétipo do feminino na psique, que pode ter a figura de uma deusa ou de uma fada, da mãe má, ou que pode possuir os traços de uma bruxa; a figura masculina poderá ter uma representação num sábio, que geralmente é representado por um ermitão, etc. As figuras em si, mais ou menos semelhantes em várias culturas, são os arquétipos, que nada mais são que "corpos" que dão forma aos conteúdos que representam: o arquétipo da mãe boa, ou da boa fada, representam a mesma coisa: o lado feminino positivo da natureza humana, acolhedor e carinhoso.
Este mundo inconsciente, onde imperam os arquétipos, que nada mais são que recepientes de conteúdos ainda mais profundos e universais, é pleno de esquemas de reações psíquicas quase "instinitvas", de reações psíquicas comuns a toda a humanidade, como, por exemplo, num sonho de perseguição: todas as pessoas que sonham ou já sonharam sendo perseguidas geralmente descrevem cenas e ações muito semelhanes entre si, senão na forma, ao menos no conteúdo. A angústia de quem é perseguido é sentida concomitantemente ao prazer que sabemos ter o perseguidor no enredo onírico, ou a sua raiva, ou o seu desejo. Estes esquemas de reações "instintivas" (uso esta palavra por analogia, não por equivalência) também se encontram nos mitos de todos os povos e nas tradições religiosas. Por exemplo, no mito de Osires, na história de Krishna e na vida de Buda encontramos similiradades fascinates. Sabemos que mitos encobrem frequentemente a vida de grandes homens, como se pudessem nos dizer algo mais sobre a mensagem que eles nos trouxeram, e quanto mais carismáticos são esses homens, mais a imaginação do povo os encobrem em mitos, e mais esses mitos têm em comum. Estes padrões arquetípicos expressos quer a nível pessoal que a nível mitológico relacionam-se com caracterísiticas e profundos anseios da natureza humana, como o nascimento, a morte, as imagens parterna e materna, e a relação entre os dois sexos.

Outra temática famosa com respeito a Jung é a sua teoria dos "tipos psicológicos". Foi com base na análise da controvérsia entre as personalidades de Freud e um outro seu discípulo famoso, e também dissidente, Alfred Adler, que Jung consegue delinear a tipologia do "introvertido" e do "extrovertido". Freud seria o "extrovertido", Adler, o "introvertido". Para o extrovertido, os acontecimentos externos são da máxima importância, ao nível consciente; em compesação, ao nível insconsciente, a atividade psíquica do extrovertido concentra-se no seu próprio eu. De modo inverso, para o introvertido o que conta é a resposta subjetiva aos acontecimentos externos, ao passo que, a nível insconsciente, o introvertido é compelido para o mundo externo.

Embora não exista um tipo puro, Jung reconhece a extrema utilidade descritiva da distinção entre "introvertido" e "extrovertido". Aliás, ele reconhecia que todos temos ambas as características, e somente a predominância relativa de um deles é que determina o tipo na pessoa. Seu mais famoso livro, Tipos Psicológicos é de 1921. Já nesse período, Jung dedica maior atenção ao estudo da magia, da alquimia,das diversas religiões e das culturas ocidentais pré-cristãs e orientais (Psicologia da Religião Oriental e Ocidental, 1940; Psicologia e Alquimia, 1944; O eu e o inconsciente, 1945).

Analisando o seu trabalho, Jung disse: "Não sou levado por excessivo otimismo nem sou tão amante dos ideais elevados, mas me interesso simplesmente pelo destino do ser humano como indivíduo - aquela unidade infinitesiaml da qual depende o mundo e na qual, se estamos lendo corretamente o signficado da mensagem cristã, também Deus busca seu fim". Ficou célebre a controvertida resposta que Jung deu, em 1959, a um entrevistador da BBC que lhe perguntou: "O senhor acredita em Deus?" A resposta foi: "Não tenho necessidade de crer em Deus. Eu o conheço".

  Eis o que Freud afirmou do sistema de Jung: "Aquilo de que os suíços tinham tanto orgulho nada mais era do que uma modificação da teoria psicanalítica, obtida rejeitando o fator da sexualidade. Confesso que, desde o início, entendi esse 'progresso' como adequação excessiva às exigências da atualidade". Ou seja, para Freud e a maior parte dos seguidores do freudismo, a teoria de Jung é uma corruptela de sua própria teoria, simplificada diante das exigências moralistas da época. Não há nada mais falso. Sabemos que foi Freud quem, algumas vezes, utilizou-se de alguns conceitos de Jung, embora de forma mascarada, como podemos ver em sua interpretação do caso do "Homem dos Lobos", notadamente no conceito de atavismo na lembrança do coito. Já por seu turno, Jung nunca quis negar a importância da sexualidade na vida psíquica, "embora Freud sustente obstinadamente que eu a negue". Ele apenas "procurava estabelecer limites para a desenfreada terminologia sobre o sexo, que vicia todas as discussões sobre o psiquismo humano, e situar então a sexualidade em seu lugar mais adequado. O senso comum voltará sempre ao fato de que a sexualidade humana é apenas uma pulsão ligada aos instintos biofisiológicos e é apenas uma das funções psicofisiológicas, embora, sem dúvida, muitíssimo importante e de grande alcance".

  Carl Gustav Jung morreu a 6 de junho de 1961, aos 86 anos, em sua casa, à beira do lago de Zurique,em Küsnacht após uma longa vida produtiva, que marcou - e tudo leva a crer que ainda marcará mais - a antropologia, a sociologia e a psicologia.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Juiz que concedeu a liminar desmente Prefeito na questão do Aeroclube da Paraíba




Abuso: Juiz desmente prefeito e diz que liminar não autorizava a destruição do patrimônio do Aeroclube

EM FEVEREIRO 24, 2011 ÀS 9:09 AM

EXTRAÍDO DO SITE EXPRESSOPB http://expressopb.com/2011/02/abuso-juiz-desmente-prefeito-e-diz-que-liminar-nao-autorizava-a-destruicao-do-patrimonio-do-aeroclube/


“O Aeroclube é inconveniente e a população não o quer ali”, diz o prefeito Luciano Agra

Enquête do JPB da TV Cabo Branco mostra que 67% da população preferem o clube ao parque.

Se a opinião pública conhecesse o esquema poderosíssimo de empresários que “forçaram” a escolha de Luciano Agra para prefeito da capital não estaria tão estarrecida com a postura adotada pelo urbanista de carreira no exercício do cargo neste episódio de “desapropriação” do Aeroclube.

Luciano foi “escolhido” quando já havia sido confirmado o nome do jornalista Nonato Bandeira para substituir Ricardo Coutinho. No período de uma madrugada, Bandeira levou uma “rasteira” e Agra deve até hoje a esse poderoso lobby empresarial o cargo de prefeito.

Funcionário de carreira da prefeitura lotado na estratégica secretária de Planejamento o engenheiro sempre manteve as melhores relações com o capital imobiliário ao ponto de não hesitar em realizar operações nebulosas como a desapropriação da Fazenda Cuia e agora cometer a violência institucional contra o Aeroclube da Paraíba, uma das mais antigas associações da capital.

A nota que o prefeito distribuiu peca pelas contradições. Nela ele diz que estar tranquilo por ter feito o que fez em obediência a determinação judicial no que é desmentido pelo próprio juiz que concedeu a primeira liminar. Segundo o magistrado, João Batista Vasconcelos, a PMJP não estava autorizada a destruir a pista de pouso e decolagem do Aeroclube e, ao fazê-lo, desobedeceu a Justiça.

O prefeito é desmentido pela segunda vez quando invoca o povo que, em sua opinião quer a retirada do Aeroclube do local. Em enquête promovida pelo JPB da TV Cabo Branco, expressiva maioria da população pessoense (67%) concorda e quer a permanência do Clube no bairro onde está desde 64.

Diante desses fatos, o prefeito precisa explicar com clareza as razões que o levaram travar essa briga com a entidade e a necessidade da instalação de um parque, projeto do qual ninguém tem o menor conhecimento e, pelo visto, só atenderia aos interesses da PMJP e às construtoras, que poderiam lucrar construindo novos espigões na região adjacente à cabeceira da pista destruída.

A desapropriação do Aeroclube da Paraíba foi o assunto do dia na cidade de João Pessoa. Na Câmara Municipal e na Assembléia Legislativa não foi diferente. Vereadores da oposição opinaram sobre a ação da prefeitura classificando-a de “violenta e truculenta”. O prefeito Luciano Agra, por sua vez, se defendeu e disse estar tranquilo da legalidade das ações de sua administração, que estariam respaldadas em determinações judiciais.

- Eu vejo isso com muita tranquilidade. Nós estamos numa fase de demanda judicial e ontem recebemos permissão para posse do Aeroclube e nós fizemos. Ontem, também foi dada uma liminar para parar as obras e nós paramos. Eu acompanhei através de meus auxiliares essa ação minuto a minuto. O que aconteceu na realidade é que algumas pessoas que tiveram seus interesses contrariados fizeram gestos precipitados de tentar parar a ação da prefeitura que estava amparada em uma decisão judicial. Nós tínhamos a imissão de posse nas mãos e iríamos fazê-lo. Foi uma provocação que veio, não por parte da prefeitura, a prefeitura foi pra lá pra cumprir a lei, é tanto que assim que saiu a outra medida nós imediatamente recuamos, mas não vamos nos afastar dos nossos propósitos, vamos a Anac, ao Ministério da Defesa, eu vou em qualquer Fórum para debater esse assunto. O Aeroclube é inconveniente e a população não o quer ali.

O prefeito também declarou que os dias do aeroclube no Bessa estão contados, pois o espaço faz parte de um projeto ambiental da cidade de João Pessoa. O gestor disse que conta com o apoio da população para implantar esse projeto.

- O aeroclube faz parte de uma das políticas publicas que nós pretendemos executar aqui na cidade de João Pessoa, que é dotar a cidade de parques, no mínimo dez, distribuídos em toda a cidade. O aeroclube faz parte desse grande projeto ambiental de João Pessoa. Foram meses de negociações e depois do fracasso dessas negociações com a diretoria que saiu da esfera judicial e entrou na esfera política houve um rompimento nas negociações. Mas eu tenho apoio popular, tenho recebido o apoio necessário e nesse caso, os dias do aeroclube ali no Bessa, ou hoje ou amanhã estão contados. Foram oferecidos terrenos para a construção de um novo aeroclube em João Pessoa, no Conde e o pessoal não aceitou.

Agra falou também sobre o risco que a população corre com uma pista no meio de uma área residencial. E não se mostrou interessado em reformar a pista que foi destruída ontem.

- Quero eliminar a possibilidade de risco, poucos dias atrás tivemos um avião caindo na avenida. A prefeitura fez um deposito razoável na Justiça para a aquisição do aeroclube, então se houver alguma decisão nesse sentido nós faremos, mas o desejo é plantar árvores. A remoção da pista já era para iniciar o plantio das arvores do parque, mas paciência. Vamos lutar até o fim.

O depósito "razoável" a que o prefeito de João Pessoa fez referência importa em R$ 5,1 milhões (o terreno vale 300 milhões). O valor do equipamento, contudo, será determinado após uma perícia solicitada pela Justiça caso o trânsito em julgado da ação seja favorável ao pedido da Prefeitura da capital.

Da Redação

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Prefeitura de João Pessoa vandaliza o Aeroclube da Paraíba



Carlos Antonio Fragoso Guimarães

Foi devido ao poder econômico de grandes construtoras dos edifícios na orla marítima e, muito provavelmente, de empresários de Shoppings que pretendem ainda lucrar rios de dinheiro sob a proteção da Prefeitura de João Pessoa - a mesma que liberou alvarás para construção desordenada de espigões ao redor do Aeroclube da Paraíba, a única escola de aviação civil do Estado em pleno funcionamento, com 70 anos (47 dos quais no atual terreno) -, que vimos no último dia 22 a ocorrência de um dos mais gritantes atos de vandalismo, oficioso e ilegal, por parte do poder executivo de um município: a destruição, na calada da noite, da pista do aeródromo da cidade, pertencente ao Aeroclube da Paraíba.

Tal ação violenta se fez com base em uma liminar provisória, dada por um juiz estadual - portanto, incompetente para judiciar o caso, que já estava entregue à justiça federal - e que dava a posse, sem permitir a destruição do patrimônio, do terreno à prefeitura. Absurda liminar que foi derrubada pelo próprio presidente do Tribunal de Justiça do Estado, horas mais tarde, reforçada com a tutela antecipada dada ao Aeroclube em ação ratificada pela Justiça Federal na manhã seguinte. A violência praticada foi objeto de reportagens de telejornais da Rede Globo e da Rede Bandeirantes, fora as matérias impressas em jornais de todo o Brasil.

O problema

Os alvarás "camaradas" às construtoras que cobiçam a área do Aeroclube foram dadas, nos últimos 30 anos, em troca de certas "regalias" ao poder público local, começando ao tempo que a região era pouquíssimo valorizada e povoada, mas que prometia breve se tornar nobre. Nos últimos nove anos, contudo, a prefeitura licenciou alvarás para espigões com altura superior ao permitida em áreas ao redor de aeródromos e isso levou a justiça a pedir a retirada de um destes edifícios recentemente. Só que as construtoras entraram em um acordo com a prefeitura, inclusive doando dinheiro para a campanha eleitoral de 2010.

Agora, a prefeitura da cidade de João Pessoa, sob o comando de Luciano Agra, um prefeito que está no poder sem ter sido diretamente eleito (assumiu após a saída do titular para ser governador), arquiteto vinculado às construtoras que há anos pensa em assenhorar-se do terreno do Aeroclube, aproveitou-se de despacho da 7ª Vara da Fazenda Pública da comarca da capital – que era provisória e poderia, portanto, ser derrubada, como de fato ocorreu - para invadir a citada instituição e destruir imediatamente a pista de pouso e decolagens, durante a noite, prendendo no local cerca de 40 aeronaves, entre aviões, ultraleves e helicópteros, no último dia 22, inclusive um avião responsável pelo transporte de medicamentos pra cidades do interior. Horas depois, a estranha e, diante dos preparativos anteriores, suspeita liminar que dava a posse do terreno à prefeitura foi caçada pelo presidente do Tribunal da Justiça, determinando o retorno da posse ao Aeroclube, como é de direito. Contudo, a destruição da pista, com prejuízos da ordem de 2 milhões de reais, já havia sido efetuada, o que prova o fato de que, quando há interesses de sedimentar o ganho da especulação imobiliária e enriquecer ainda mais as gananciosas construturas, o dinheiro do contribuinte é utilizado para proveito de poucos.


Tanto é assim que, reiteremos mais uma vez, além da decisão do provisória do juiz ter sido cancelada na mesma noite do vandalismo oficioso da prefeitura - na calada da noite e impedindo a aproximação da imprensa - pelo presidente do Tribunal de Justiça do Estado, também a Juíza Federal da 3ª Vara, Cristina Maria Costa Garcez, deferiu pedido de tutela antecipada formulado em ação de rito ordinário ajuizada pelo Aeroclube da Paraíba, impedindo qualquer ato administrativo e/ou judicial que dê seqüência ao Decreto Municipal Expropriatório, garantindo à direção do aeródromo o funcionamento de suas atividades autorizadas pela ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil -, até o julgamento final da ação que transcorre na Justiça Federal.

A juíza assevera que na localidade supracitada funciona como base operacional para pousos e decolagens de diversas aeronaves comerciais de pequeno e médio portes e de aeronaves de socorro aéreo - as chamadas "UTIs no ar". Expõe que, nesse local, encontra-se uma pista de pouso e decolagem (aeródromo), com uma escola formadora de pilotos e paraquedistas para reserva da força aérea. Realça que esta é a única escola de aviação civil do Estado da Paraíba em pleno funcionamento, utilizando aeronaves cedidas pela ANAC especialmente para a formação de pilotos, possuindo o Aeroclube o certificado federal de "aeronavegabilidade" também expedido pela ANAC.

O Aeroclube da Paraíba é classificado como aeroporto/aeródromo público e, portanto, equiparado a bem público federal. De forma legitima, o problema criado pela própria Prefeitura foi levado pela Direção do Aeroclube para a Justiça Federal bem antes do ataque terrorista do dia 22, por meio da competente ação, já que a Lei reconhece os aeródromos como bens de interesse da União. Portanto, qualquer liminar de outra esfera que não a Federal deveria ser tomada como ineficaz. Mas a prefeitura, em resposta, ajuizou ação de desapropriação imediata não na Justça Federal, mas na Justiça Comum Estadual, requerendo a imediata imissão na posse do aeródromo. O magistrado João Batista Vasconcelos, mesmo cientificado da ação intentada anteriormente na Justiça Federal, achou que mesmo os avisos da ANAC de que a desaprpopriação era inconstitucional não cabiam ao caso, que o juogamento deveria se dar na esfera da Justiça Comum (o que não é o caso) e concedeu a liminar inicial e provisória à favor da Prefeitura. Contudo, segundo o próprio Juíz em entrevistas depois do ato de vandalismo praticado, a liminar não permitia a destruição do patrimônio do Aeroclube.

Os fatos da Violência e Truculência

A estranha liminar provisória (portanto, sujeita à anulação) foi concedida na terça-feira, 22 de fevereiro, por voltadas 17h e 30min, mas bem antes disso, por volta das 15 horas, tratores já estavam estacionados ao lado do Aeroclube, o que aponta para o fato de que a truculência já estava orquestrada.

Assim que a liminar de 1º Instância foi expedida, quase imediatamente oito viaturas da polícia militar, 3 da Guarda Civil e os 7 tratores da prefeitura se dirigiram ao aeródromo, entraram no aeroclube, romperam a cerca e começaram a destruir mais de 1,1Km de pista asfaltada, deixando as aeronaves estacionadas sem possibilidade alguma de decolagem, dentre elas, uma que distribuía remédios para o interior do Estado, e mais as 3 aeronaves de instrução pertencentes a ANAC e uma da UTI no ar. Note-se que aguarda municipal e a PM foram orientadas a deixar os manifestantes e a imprensa longe do evento, que deveria seguir sem testemunhas. Apesar disso, a instrutora de paraquedismo, Andressa Amaral, pôs em risco a prória vida ao ficar em frente a um dos tratores usados novandalismo oficioso da Prefeitura, sob as ordens de Luciano Agra, e as fotos e vídeos de sua ousadia correram o país e o mundo (transmitada pela Rede Globo, pela Rede Bandeirantes e pela Internet).

O lado irônico do caso é que neste aeródromo, cuja pista foi tão covardemente destruida, situa-se o único posto para abastecimento com gasolina aeronáutica do estado. Isso que deixou o avião do Governo do Estado (cujo atual ocupante foi o anterior prefeito que iniciou toda essa celeuma e apoiou Agra nesse terrorismo) também preso no solo, só que no aeroporto Castro Pinto, que o aeroporto oficial da capital, uma vez que não dispõe de combustível suficiente para ir abastecer em Recife ou Natal.

A utilidade pública do Aeroclube

A juíza Federal que anulou a desapropriação pela prefeitura destaca, baseada nos documentos, ser o Aeroclube o único aeródromo alternativo de pouso emergencial de pequenas e médias aeronaves ao fluxo do Aeroporto Castro Pinto, localizado nos municípios vizinhos de Bayeux e Santa Rita.

Destaca que, em várias situações em que o Aeroporto Castro Pinto é fechado para pousos e decolagens de aviões de pequeno e médio porte, a orientação e alternativa utilizada é a indigitada pista do Aeroclube da Paraíba.


Noticia ser o Aeroclube da Paraíba utilizado diariamente como pista de pouso e decolagem para exercícios militares nacionais, também ali funcionando o único posto de combustíveis do Estado da Paraíba que comercializa gasolina (e não querosene) para a aviação civil, denominado AVGAS.

Aduz também a juíza que o Aeroclube autor abriga em suas dependências, gratuitamente, uma Base de Apoio da 4ª Companhia da Polícia Militar da Paraíba. Assenta que, a despeito de tudo o que foi dito, a administração atual do Município demandado tem o Aeroclube da Paraíba como "uma espécie de câncer" para a cidade de João Pessoa, seja porque não concorda com a sua permanência no local há mais de setenta anos de efetivos serviços prestados, seja porque tem pretensões imobiliárias outras mais vantajosas e mais rentáveis para a construção civil nos bairros do Bessa, Jardim Oceania e adjacências.

A hipocrisia por trás da violência

O Aeroclube é uma sociedade civil sem fins lucrativos, aberta ao público - todos podem frequentar e todos podem se associar. A mensalidade de associado é de apenas 70 reais, mas não precisa ser sócio para estar lá. Por várias vezes a direitoria pediu à prefeitura que se construisse pistas de Cooper e mesmo pequenas praças para uma maior integração do Aeroclube com seu entorno social. Nunca foi atendido.

Como reflete Dércio Alcântara, "Luciano disse que tem pressa na construção do Parque Ecológico, pois existe uma meta a cumprir que determina a criação de 10 parques até o final do ano que vem. Mas a pressa dele é só no parque do Bessa. Nesse 'parque' tem coelho e dos grandes."

Ora, se a desculpa é o interesse público, porque não revitalizar o centro histórico de modo efetivo? Se o prefeito quer o bem público, que acelere a recuperação de praças históricas, de escolas, que ponha bondes e minimize o inferno do trânsito na capital paraibana. Se a questão é ambiental, porque a prefeitura não move um dedo sequer para questionar o poderoso dono da Manaíra Shopping que ergueu seu prédio em cima do mangue e continua a expandi-lo em local de proteção ambiental não muito longe do Aeroclube, e cujo sistema elétrico é visto por alguns como altamente perigoso? Se a questão é a urbanização, que o prefeito calce as ruas de bairros pobres, alagadas pelas chuvas e que se tornam criadoras de mosquitos, e não destrua pistas de utilidade pública até mesmo federal. Que tal tapar uma cratera que inferniza os moradores do conjuntos dos Funcionários? Se quer reativar o esporte e o lazer, transforme a Bica no belo parque que um dia já foi, ajude a revitalizar e recuperar o histórico Clube Astréa (que, se ainda ativo, seria o mais antigo do Brasil) e que tanto bem fazia com os “Jogos da Primavera” e seus cursos de volley, futubel e natação. Revitalize-se as construções históricas do Porto do Capim e adjacências, com seus prédios centenários. Até mesmo vizinho ao poderoso Manaíra Shopping a comunidade do Bairro São José pena por falta de infra-estrutura e urbanização. Mas claro, nada disso conta, afinal, políticos são sempre bem financiados por construtoras e empresas de transportes há anos...

Fala-se agora em que o parque terá um teatro para 2.500 pessoas. Bem, levando-se em conta que o querido Teatro Santa Rosa, centenário, está esquecido, o Espaço Cultural, sucateado, a Estação Ciência, subutilizada; a Orquestra Sinfônica, desmantelada e tem ainda um Centro de Convenções no papel para ser construído, não parece estranho esse “teatro” surgir tão repentinamente? E haverá dinheiro suficiente para tal obra faraônica surgida do IPTU de todos, a maioria não moradora do Bessa e que precisa de outros serviços a tenção mais urgente da prefeitura? A utilidade seria mesmo para todos? Afinal, a maior parte da população da capital não mora no Bessa e a maior parte dos moradores do Bessa não estão no entorno do Aeroclube, sendo que dos que existe mesmo uma divisão de opiniões entre os vizinhos do aeródromo sobre a retirada do mesmo. De fato, em uma pesquisa da TV Cabo Branco constatou-se que é uma minoria que deseja a retirada do Aeroclube, e estes quase sempre são usuários de um condomínio fechado, um verdadeiro bairro dentro do bairro, ou de alguns dos edifícios de luxo de políticos e empresários. Melhor, pois, é maquiar o que está por trás dos "altos" interesses com uma roupagem social, mesmo que isso tenha de fazer o retrocesso de retirar um aeródromo de formação de pilotos para a aviação civil, o que é útil aos que pretendem viajar de avião e é de serventia municipal, estadual e federal.

Desde a tarde desta Quarta-feira (23) que o Aeroclube da Paraíba, pelo absurdo ocorrido, já não consta mais nas cartas (mapas) aéreas internacionais e nos GPS’s de todo o mundo. A informação é do presidente do Aeroclube da Paraíba, Rômulo Carvalho, que se encontra em Brasília, onde deve se reunir com o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, nesta quinta-feira (24), para tratar dos problemas envolvendo a desapropriação do aeródromo. Os diretores do Aeroclube informam que

"o aeródromo SNJO (Aeroclube da Paraíba) consta de todas as cartas aeronáuticas, sistemas de vôo das aeronaves e todos os GPS do mundo. A paralisação abrupta de nossa pista de pouso poderia causar acidentes aéreos e uma desorganização no espaço aéreo paraibano, pois se trata de alternativa de pouso do Aeroporto Castro Pinto e único posto de combustível AVGAS do Estado da Paraíba, fazendo paralisar as atividades a aviação de pequeno e médio porte."


O Código Brasileiro de Aeronáutica, Lei n.º 7.565, de 19 de dezembro de 1986, expressamente no Artigo 38 que “os aeroportos constituem universalidades, equiparadas a bens públicos federais, enquanto mantida a sua destinação específica, embora não tenha a União a propriedade de todos os imóveis em que se situam”.

O Artigo 26 do mesmo código, afirma que “aeródromo é toda área destinada a pouso, decolagem e movimentação de aeronaves”, classificados em civis e militares. Os civis podem ser públicos ou privados. Ou seja: O Aeroclube de João Pessoa é protegido pelo Código Brasileiro de Aeronáutica e é considerado propriedade, mesmo que indireta, da União, não podendo os interesses de empresários, empreiteras e construtoras, consubstanciados no lobby sobre vereadores e prefeitos, dispor ao bel prazer da anulação do mesmo.

Isso quer dizer que a competência para qualquer decisão que cause alterações no Aeroclube tem que vir da esfera federal. Só a União pode interferir e não o Governo do Estado, nem Prefeitura de João Pessoa.


E o prefeito que detém o poder sem nunca ter tido mais de um voto da população ainda diz, ditatorialmente, mostrando sua real face: "Os dias do Aeroclube estão contados". Para quem se diz de pensamento socialista - e que não é e não tem, pois é um arquiteto de carreira que participou de projetos de espigões e, na prefeitura, foi ligado a vários gestores neoliberais anteriores, tendo historicamente muito boas relações com as já ditas construtoras -, a prática mostra não apenas uma adulação e abertura à pressão de empreiteras e construtoras de burgueses, como traços de ditador.

Bravo ao ilustre administrador por ter deixado a Paraíba novamente em atenção nacional... por algo tão nocivo à sua imagem, transformando o vandalismo oficioso em motivo de piada nacional.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Cisne Negro: Uma aula cinematográfica de Psicologia Junguiana



Carlos Antonio Fragoso Guimarães


A sombra... elemento fantasmático, região do espaço cuja penumbra é provocada quando a luz é impedida de fluir por um objeto... a sombra possui os contornos do mesmo objeto, sendo sua projeção negativa...

Na psicologia junguiana a sombra é a representação arquetípica de tudo o que temos, potenciais bons e maus, que não reconhecemos como sendo nosso, mas que nos segue onde quer que vamos e que geralmente projetamos em outras pessoas...

O psicanalista suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) criou alguns dos conceitos de psicologia mais populares (apesar da resistência dos freudianos). Conceitos que passaram a ser utilizadas pelas pessoas, como “complexos”, indivíduos “introvertidos” e “extrovertidos”, "sincronicidade" e “inconsciente coletivo” são de sua lavra. Ele também propôs que o comportamento humano possui linhas de reconhecimento universal e que são transcritas, metaforicamente, nos mitos e contos de todo o mundo, independente de tempo e cultura. A tendência polar que todos temos (bem e mal, sapiência e demência, etc.) são expressas em histórias folclóricas, mitos, sagas religiosas e contos de fada.

Na história de “O Lago dos Cisnes”, que foi musicada e, assim, imortalizada pelo compositor russo Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893), vemos essa polaridade na presença de Odette, a ingênua e romântica princesa que é transformada em um cisne branco, e Odile, sua irmã gêmea, a maliciosa, sedutora e malvada rainha dos cisnes, e que é o cisne negro. Uma e outra personagem são metáforas das polaridades internas extremas e dos potenciais que todos possuímos, mas que, aqui, se inserem mais na questão do desenvolvimento da psique feminina. A menina sonhadora que desperta para o desejo, à competitividade, ao processo de enfrentar desafios. Quanto mais conscientemente uma dessas polaridades é hipertrofiada, o mesmo ocorre com a outra, mas de modo inconsciente, o que pode causar um conflito psicológico que, em casos extremos, leva ao surto psicótico. Esta ocorrência, que Jung tão bem estudou, foi transposta para as telas em um dos mais notáveis (e raros, dentro do padrão comercial hollywoodiano) filmes dos últimos tempos: Cisne Negro (Black Swan), de Darren Aronofsky, com a esplêndida Natalie Portman no papel da, inicialmente, frágil bailarina Nina.

No filme, Nina é uma bailarina dominada pela mãe frustrada e que faz de tudo para se destacar no corpo de baile. Assim, quando surge a chance de interpretar as gêmeas opostas de “O Lago dos Cisnes”, Nina se entrega totalmente ao projeto. Super controlada pela mãe, insegura, emocionalmente reprimida e sem amigos, Nina dedica-se exclusivamente ao balé, buscando uma perfeição exagerada que se reflete no controle exacerbado da alimentação e do controle do corpo que ela trata como instrumento – a única forma de contato mais íntimo (e já sintoma neurótico da alienação que se estabeleceu entre o desejo consciente de perfeição e repressão dos sentimentos, que tentam gritar a partir do inconsciente) é a auto-mutilação que ela exerce inconscientemente sobre si mesma, por arranhões.

Pressionada por seu coreógrafo e diretor Thomas (Vincent Cassel), Nina será questionada, mais uma vez, a demonstrar suas capacidades, já que sua fragilidade ingênua - que é perfeita para o papel de Odette - comprometeria a interpretação de protagonista de “O Lago dos Cisnes”, pois Nina também deve desempenhar o papel da Rainha dos Cisnes, Odile. Nina, então, é desafiada pela própria vida, pelo seu próprio mundo, a entrar em um acordo com sua psique polarizada entre a "persona" consciente, o papel de menininha da mamãe, e a sua sombra: a mulher sedutora, violenta, que ela reprimie no inconsciente. Nina é a atualização conteporânea da figura mítica de Perséfone: sua mãe é uma Démeter que tenta controlá-la e ver nela a bailaria que não foi e isso impede o desenvolvimento de Nina. Logo ela terá de enfrentar as forças psíquicas represadas em si, seu próprio Hades: precisa integrar, reconhecer-se em sua própria profunidade, sentir seus elementos aparentemente "negativos" se quiser atingir a perfeição (metáfora da individuação). Ela tem de desempenhar simultaneamente o cisne branco (símbolo da pureza e ingenuidade) e o cisne negro (metáfora para a malícia, sensualidade e maldade). Ou seja, Nina teria de unir, na prática, sua própria psique fraturada entre a “menina” meiga e passiva, cujo quarto é cheio de ursinhos de pelúcia, e a mulher que é/foi reprimida pela mãe e por ela mesma, Nina. O desafio da individuação, contudo, não é isento de perigos.

O cisne Negro é, portanto, o desafio do encontro de Nina com sua própria sombra, ou, seja, segundo Jung, com todos os elementos que possuímos mas que são reprimidos, que não reconhecemos como sendo nossos. A questão da projeção interna no meio externo fica sugerida várias vezes pela presença de espelhos sempre presentes ante Nina. Sua maior rival no corpo de baile, a sensual e desinibida Lily, papel desempenhado pela brilhante atriz Mila Kunis, é ao mesmo tempo seu alter-ego, a pessoa que estimula a eclosão do "Cisne Negro" em Nina. Na verdade, as duas belas bailarinas acabam sendo expressões de Odile o Odette ao nível da disputa real, embora, na mente conturbada de Nina, Lily acabe por apresentar traços mais fortes do que realmente possui.

Está claro que Aronofsky em seu filme discorre sobre a fragilidade e o tênue equilíbrio da mente humana, bem como as forças que se desencadeiam no palco psíquico quando uma perturbadora ambição a move em busca de um sonho, mas o faz de uma maneira ao mesmo tempo cruel e poética, o que mexe com a psique da maioria das pessoas que assistem o filme, atingidas, inconscientemente, pelos elementos expostos e que repercutem na própria sombra, na própria polaridade consciente/inconsciente, na dualidade do bem/mal de cada um.

Na busca pela perfeição e na tentativa de provar a Thomas que é capaz de desempenhar o papel (e, inconscientemente, de integrar e expor seu lado mais selvagem), Nina é conduzida de tal forma pelo enredo e pela busca da perfeição que não consegue perceber que isso está liberando todo o seu mundo de elementos reprimidos, que explode de tal modo que ela já não consegue perceber mais os limites entre sonho e realidade. Aos poucos, seu destino se sobrepõe ao enredo de “O Lago Dos Cisnes”. A música de Tchaikovsky, dramática e bela, é quase como uma expressiva contrapartida de sua metamorfose, elemento sonoro envolvente que "narra" e expressa a tempestade íntima de Nina, o que realça de tal modo os sentimentos da personagem que se torna indispensável à trama.

A sombra de Nina, exemplificado pela essência de sua feminilidade, aflora e toma conta de sua personalidade sem que ela consiga controlá-lo. Dá-se inicio a uma metamorfose que expressa aquilo que acontece com muitas pessoas que sucumbem à emergência do material inconsciente pela psicose. No caso de Nina, vemos que tal emergência conduzirá a protagonista a conflitos que a levam a um destino perturbador e extraordinariamente poético, apesar de trágico, numa interpretação arrebatadora de Natalie Portman.

O Filme “Cisne Negro” é uma aula de psicologia e cinema, de poesia dramática e filosofia, indispensável ao estímulo do pensar sobre a vida.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O novo "Transcendente"


Frei Betto


A história da humanidade é uma história de sujeições. No período pré-moderno, sujeição aos deuses do politeísmo, ao Deus do monoteísmo, ao Rei da monarquia e ao Povo (sujeito abstrato) da República. Havia sempre uma figura do Outro ao qual todos deveriam se reportar.

Esse Grande Outro prescrevia o certo e o errado, o bem e o mal, a graça e o pecado, a lei e o crime. O mundo se configurava de acordo com os preceitos do Grande Outro. As alternativas eram simples: sujeitar-se sob promessa de recompensa ou rebelar-se sob risco de punição.


Na modernidade, o Outro se multiplicou, adquiriu várias faces, descentralizou-se na diversidade de ideologias, sistemas de governo e crenças religiosas. Tanto a antiguidade quanto a modernidade nos remetiam à transcendência, ainda que fundada na razão. Se não era Deus, era o Partido, o líder supremo, as idéias inquestionáveis. Algo ou alguém nos precedia e determinava o nosso comportamento, incutindo-nos gratificação ou culpa.

A pós-modernidade, em cuja porta de entrada nos encontramos, “promete” fazer de nós sujeitos livres de toda sujeição. Seria a volta ao protagonismo exacerbado, em que cada indivíduo é a medida de todas as coisas. Já não se vive em tempos de cosmogonias e cosmologias, teogonias e ideologias. Agora todos os tempos convergem simultaneamente ao espaço reduzido do aqui e agora. Graças às novas tecnologias de comunicação, tempo e espaço ganham dimensão holográfica: cabem em cada pequeno detalhe do aqui e agora.

Será que, de fato, a pós-modernidade nos emancipa do transcendente e da transcendência? Introduz-nos no “desencantamento do mundo” apontado por Max Weber?

A resposta é não.


Há um novo Grande Outro que nos é imposto como paradigma inquestionável: o Mercado. As sedutoras imagens deste deus implacável são disseminadas por seu principal oráculo: a publicidade.

À semelhança de seu homólogo de Delfos, nos adverte: “Dize-me o que consomes, o que compras, o valor do seu gasto, e eu te direi quem és”.

O grande teólogo desse novo deus foi Adam Smith. Inspirado na física de Newton, em “A riqueza das nações” e “A teoria dos sentimentos morais”, Smith aplicou à economia a metáfora religiosa do Grande Relojoeiro que preside o Universo.

O relógio funciona graças à precisão mecânica fabricada por alguém fora dele e invisível a quem o porta: o relojoeiro. Assim, na opinião de Newton, seria o Universo. Na de Smith, a vida social regida por interesses econômicos. A diferença é que o Deus Relojoeiro de Newton é chamado de Mão Invisível por Smith. Segundo este, o egoísmo de cada um, guiado pela Mão Invisível, promoveria o bem de todos...

É exatamente o que afirma Milton Friedman, líder da Escola de Chicago e um dos pais do neoliberalismo: “Os preços que emergem das transações voluntárias entre compradores e vendedores são capazes de coordenar a atividade de milhões de pessoas, sendo que cada uma conhece apenas o próprio interesse.”

Esse o fundamento do pensamento liberal e do sistema capitalista. É o principio do laisser faire, deixar (o deus mercado) fazer. O que, traduzido em termos políticos, significa desregulamentar, não apenas as esferas econômicas e políticas, mas também a moral. Abaixo a ética de princípios e viva a ética de resultados! Nesse protagonismo pós-moderno, cada ego é a medida de todas as coisas. O que imprime ao sujeito (no sentido latino de sujeição, submissão) a impressão de autonomia e liberdade.

O resultado do novo paradigma centrado no deus Mercado todos conhecemos: degradação ambiental; guerras; gastos exorbitantes em armas, sistemas de defesa e segurança; narcotráfico e dependência química; esgarçamento dos vínculos familiares; depressão, frustração e infelicidade.

Ainda é tempo de professarmos o mais radical ateísmo frente ao deus Mercado e, iconoclastas, apelarmos à ética para introduzir, como paradigma, a generosidade, a partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho, a felicidade centrada nas condições dignas de vida e no aprofundamento espiritual da subjetividade.

Isso, contudo, só será possível se não ficarmos restritos à esfera da auto-ajuda, das terapias tranquilizadoras da alma para suportarmos o estresse da competitividade, e nos mobilizarmos comunitariamente para organizar a esperança em novo projeto político fundado na globalização da solidariedade.

Eis o desafio ético que, como assinalou José Martí, será capaz de articular emancipação política e emancipação espiritual.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

O Mercado da Fé



Frei Betto

(publicado no site Agencia Latinoamericana de Información)


Como os supermercados, as Igrejas disputam clientela. A diferença é que eles oferecem produtos mais baratos e, elas, prometem alívio ao sofrimento, paz espiritual, prosperidade e salvação.

Por enquanto, não há confronto nessa competição. Há, sim, preconceitos explícitos em relação a outras tradições religiosas, em especial às de raízes africanas - como o candomblé e a macumba - e ao espiritismo nascido na europa.

Se não cuidarmos agora, essa demonização de expressões religiosas distintas da nossa pode resultar, no futuro, em atitudes fundamentalistas, como a “síndrome de cruzada”, a convicção de que, em nome de Deus, o outro precisa ser desmoralizado e destruído.

Quem mais se sente incomodada com a nova geografia da fé é a Igreja Católica. Quem foi rainha nunca perde a majestade... Nos últimos anos, o número de católicos no Brasil decresceu 20% (IBGE, 2003). Hoje, somos 73.8% da população. E nada indica que haveremos de recuperar terreno em futuro próximo.

Paquiderme numa avenida de trânsito acelerado, a Igreja Católica não consegue se modernizar. Sua estrutura piramidal faz com que tudo gire em torno das figuras de bispos e padres. O resto são coadjuvantes. Aos leigos não é dada formação, exceto a do catecismo infantil. Compare-se o catecismo católico à escola dominical das Igrejas protestantes históricas (luteranas, anglicanas, metodistas, etc.) e se verá a diferença de qualidade.

Crianças e jovens católicos têm, em geral, quase nenhuma formação bíblica e teológica. Por isso, não raro encontramos adultos que mantêm uma concepção infantil da fé. Seus vínculos com Deus se estreitam mais pela culpa que pela relação amorosa.

Considere-se a estrutura predominante na Igreja Católica: a paróquia. Encontrar um padre disponível às três da tarde é quase um milagre. No entanto, há igrejas evangélicas onde pastores e obreiros fazem plantão toda a madrugada.

Não insinuo assoberbar ainda mais os padres. A questão é outra: por que a Igreja Católica tem tão poucos pastores? Todos sabemos a razão: ao contrário das demais Igrejas, ela exige de seus pastores virtudes heróicas, como o celibato. E exclui as mulheres do acesso ao sacerdócio. Tal clericalismo trava a irradiação evangelizadora.

O argumento de que assim deve continuar porque o Evangelho o exige não se sustenta à luz do próprio texto bíblico. O principal apóstolo de Jesus, Pedro, era casado (Marcos 1, 29-31); e a primeira apóstola era uma mulher, a samaritana (João 4, 28-29).

Enquanto não se puser um ponto final à desconstrução do Concílio Vaticano II, realizado para renovar a Igreja Católica, os leigos continuarão como fiéis de segunda classe. Muitos não têm vocação ao celibato, mas sim ao sacerdócio, como acontece nas Igrejas anglicana e luterana.

Ainda que Roma insista em fortalecer o clericalismo e o celibato (malgrado os escândalos frequentes), quem conhece uma paróquia efervescente? Elas existem, mas, infelizmente, são raras. Em geral, os templos católicos ficam fechados de segunda à sexta (por que não aproveitar o espaço para cursos ou atividades comunitárias?); as missas são desinteressantes; os sermões, vazios de conteúdo. Onde os cursos bíblicos, os grupos de jovens, a formação de leigos adultos, o exercício de meditação, os trabalhos voluntários?

Em que paróquia de bairro de classe média os pobres se sentem em casa? Não é o caso das Igrejas evangélicas, basta entrar numa delas, mesmo em bairros nobres, para constatar quanta gente simples ali se encontra.

Aliás, as Igrejas evangélicas sabem lidar com os meios de comunicação, inclusive a TV aberta. Pode-se discutir o conteúdo de sua programação e os métodos de atrair fiel. Mas sabem falar uma linguagem que o povo entende e, por isso, alcançam tanta audiência.

A Igreja Católica tenta correr atrás com as suas showmissas, os padres aeróbicos ou cantores, os movimentos espiritualistas importados do contexto europeu. É a espetacularização do sagrado; fala-se aos sentimentos, à emoção, e não à razão. É a semente em terreno pedregoso (Mateus 13, 20-21).

Não quero correr o risco de ser duro com a minha própria Igreja. Não é verdade que ela não tenha encontrado novos caminhos. Encontrou-os, como as Comunidades Eclesiais de Base. Infelizmente não são suficientemente valorizadas por ameaçarem o clericalismo.

Aliás, as CEBs realizarão seu 12º encontro intereclesial de 21 a 25 de julho deste ano, em Porto Velho (RO). O tema, “Ecologia e Missão”; o lema, “Do ventre da Terra, o grito que vem da Amazônia”. São esperados mais de 3 mil representantes de CEBs de todo o Brasil.

Bom seria ver o papa Bento XVI participar desse evento profundamente pentecostal.

- Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Leonardo Boff, de “Mística e Espiritualidade” (Garamond), entre outros livros

O Encontro da Consciência Cristã é mesmo exemplo de uma Consciência Cristã?



Carlos Antonio Fragoso Guimarães

 Todos os anos, no período do Carnaval, desde 1992, a cidade de Campina Grande, no interior da Paraíba, apresentava-se como uma cidade de vanguarda, aberta ao diálogo transdisciplinar e transrreligioso, ao ser palco de um dos mais tolerantes e democráticos eventos filosófico-humanistas do planeta: O Encontro para a Nova Consciência - O Pensamento da Cultura Emergente, atualmente chamado de "Encontro da Nova Consciência".

O Encontro para a Nova Consciência foi desde o início pensado para ser um espaço de encontro de partilha e trocas de idéias e vivências. Não se permitiu ser uma miscelânea ou cadinho de misturas caótica de ideias e tradições, mas sim de diálogo e compreensão, pois a diferença é rica e enriquecedora.

Interdisciplinar, democrático e inter-religioso, verdadeiro exercício de um encontro encumênico, lá é o palco onde se discutem e vivenciam os temas filosóficos mais caros ao ser humano: o sentimento de fraternidade, partilha, troca de idéias e vivencias de contato humano e espiritual a partir de exposições e diálogos de diferentes tradições e filosofias (houve mesmo uma extensa reportagem exibida pelo programa Fantástico, da Rede Globo, sobre o evento, que foi ao ar no dia 09/03/2003).

"Se pudermos olhar para o outro como nosso irmão e fraternal e solidariamente darmos a mão e caminharmos juntos, esse é o ideal, e foi pra isso que Deus nos fez. É a prática do exercício do amor que gera a paz. Essa é a propsta maior da nova consciência", nos fala sabiamente o saudoso Pastor Nehemias Marien, participante e trabalhador assíduo do Encontro desde sua primeira edição, em 1992


O evento da Nova Consciência foi proposto como um espaço de encontro e livre diálogo (e não -como querem fazer crer os que, desconhecendo-o, não obstante pretensiosamente pensam tudo conhecer - de mistura e muito menos de proselitismo) entre a ciência, a filosofia e as diferentes tradições religiosas, como o catolicismo, o espiritismo, alguns representantes protestantes mais equilibrados e mais atrelados à madura e respeitável mensagem original de Lutero, o budismo, o islamismo, as religiões afro-indígenas, etc.

O paradoxal, contudo, é que esta preciosidade rara logo incomodou quem não tolera o convívio com a alteridade e tem sido alvo de ataques de segmentos religiosos de cunho fundamentalista "cristão" desde o primeiro encontro, embora sua agressividade tenha se institucionalizado mais recentemente.

Estes ataques foram aumentando até que se se tornaram oficiais em um evento paralelo, imitando de forma caricata, o Encontro da Nova Consciência, mas que é em tudo o exato contrário, na teoria e prática, deste: Trata-se do chamado "Encontro para Consciência 'Cristã' ", que, veremos pelos atos da mesma, na prática, de Cristã - no sentido ético de amor, tolerância e compreensão - parece ter bem pouco, senão seu oposto, já que demonstram grande dificuldade em aceitação da diversidade de pensamento, embora, em teoria, digam seguir o grande Mestre, maior mártir da fraternidade universal, que ensinou que seus discípulos seriam reconhecidos por muito amarem (não só ao próximo, mas mesmo os "inimigos").

Certas seitas neopentecostais de cunho fundamentalista, capitalista e conservador, em uma amostra clara de pequenez espiritual e falta de tolerância, já desde a primeira edição do Encontro para a Nova Consciência demonstram seu temor ao livre-pensar, ao contato de diferenças e ao ecumenismo, fazendo-se presentes como fator de perturbação do encontro. Assim, estas, além de frequentemente ficarem à porta do Teatro Municipal Severino Cabral de Campina Grande, onde se realizam as palestras mais importantes do Encontro da Nova Consciência, palestrando ou distribuindo panfletos mal escritos e muitas vezes pueris contra o Encontro, chegaram ao cúmulo de até mesmo, em 2007, de se apresentarem em frente ao Teatro Municipal vestidos de preto, queimando pneus e apresentando-se com tochas ao estilo ameaçador das seitas protestantes que formam a Ku Klux Klan norte-americana. Sobre a estupidez dessa ameaça patética e de extrema intolerância dos evangélicos contra o pacífico Encontro para a Nova Consciência, veja-se o artigo de Ricardo Kelmer publicado na Revista Planeta, com o título "Salve o Bloco da Nova Consciência!".

Na verdade, a prática de modealgem doutrinaría que desemboca nesta tática semi-terrorista por intolerantes seitas fundamentalistas de cunho pentencostal foi recentemente tema de um documentário chocante feito sobre a forma de como é feito a modelagem do comportamento de crianças para se tornarem futuros pastores e agressivos missionários para converter, quase que à força, todos os que não rezarem pela mesma cartilha, no impressionante filme Jesus Camp, de 2006, dirigido por Heidi Ewing e Rachel Grady. E essa mesma prática, adaptada à realidade brasileira, visando à expansão proselitista objetivando o poder de manipulação com viezes políticos é mesmo denunciada por lúcidos pastores protestantes mais coerentes com os evangelhos e mais equlibratados, como podemos ver nas lúcidas colocações do Pastor Ed René Kivtiz sobre o fundamentalismo que acaba por denegrir os evangélicos autênticos que querem vivenciar o amor e fraternidade reais a partir dos ensinos de Cristo. Veja-se aqui seu escrito sobre "O Evangelho dos Evangélicos".

Desde 1998 (ou seja, sete anos depois do primeiro Encontro para a Nova Consciência), a ala evangélica fundamentalista promove uma paródia reacionária cristalizada em um agressivo evento paralelo , chamado - em uma arrogante pressuposição exclusivista (já que se julgam a si próprios como os representantes únicos e reais da mensagem de Cristo, e uma repetição de 500 anos de atraso do pretenso exclusivismo dos tempos inquisitoriais) - de Encontro para a Consciência "Cristã". Este último é, claro, amplamente apoiado pela ala evangélica conservadora da política local, que vem impedindo ou dificultando, tanto na Câmara Munipal de Campina Grande, quanto na Assembléia Legislativa do Estado, ajuda oficial ao Encontro da Nova Consciência, que eles anseiam claramente em acabar, também pressionado a imprensa a não mais divulgá-lo, ao menos com o espaço antes ocupado.


Outra manifestação flagrante de intolerância dos participantes da tal consciência " 'Cristã' " - também no mesmo ano de 2007 - foi feita quando alguns dos membros mais fanáticos se vestiram de palhaço e fazerem um apitaço durante a caminhada ecumênica em prol da Paz realizada sempre nos domingos de Carnaval pelos participantes do Encontro da Nova Consciência (que, como sabemos, incluem e congregam, de forma harmoniosa, católicos, evangélicos, islamitas, judeus e até mesmo ateus) - mas desta vez, ao menos, os "evangélicos" da tal consciência "Cristã" assumiram os próprios traços, agindo assim agressivamente por medo ao diferente. Deve-se destacar, como demonstram estudos sociológicos, que o movimento fundamentalista encontra solo fértil entre populações menos abastadas, mais sofridas ou com maiores dificuldades de emprego, com pouco estudo e, consequentemente, menos bagagem intelctual que permita um desenvolvimento do senso crítico e do pensamento resistente às seduções das promessas imediatistas próprias do pentecostalismo.

Vê-se, pois, o grau de coerência no comportamento de quem se diz "Cristão" a partir de atos como estes. "Por que vês o cisco no olho de teu irmão e não vez a trave no teu olho?" (Mt. 7,3)

Portanto, explicitaram os próprios temores e inseguranças de suas dúvidas religiosas exclusivistas, dúvidas reprimidas mas não extintas, que e evento ecumênico estiumula e traz à tona, o que provoca questionamentos que são, para eles, uma ameaça. Assim, projetam no Encontro para a Nova Consciência, em um mecanismo de defesa da representação neurótica da ameaça que, na verdade, estão neles próprios.

O encontro "evangélico" tem o óbvio intuito - como dá a entender o título plagiado e manipulado - de concorrer e, segundo eles, de refutar o Encontro para a Nova Consciência, que eles consideram, no imaginário infantil próprio deles, vetor de "forças malignas" trazidas à Campina Grande no Carnaval.

Estas tais, para eles, "forças malignas" seriam transportadas pelos estudantes, professores universitários, cientistas, escritores, padres, pastores mais lúcidos, antropólogos, filósofos, enfim, gente instruída que, vindo de todo Brasil e de outros países para o Encontro para a Nova Consciência, têm o pecado imperdoável de pensar diferentemente deles, os grandes missionários salvadores do mundo.

Para se ter uma idéia da anti-democrática e bushiana agressividade dos líderes do tal Encontro para a Consciência "Cristã", oposto ao equilibrado e Democrático e tolerante Encontro para a Nova Consciência, vejamos o trecho deste "artigo" do Pastor Ridalvo Alves da Silva no site do movimento-seita Consciência "Cristã":

É verdade que o evento emerge dentro do contexto do Nordeste do Brasil, especificamente na cidade de Campina Grande, no momento em que se realizava o VIII Encontro Esotérico intitulado Encontro para a Nova Consciência - Uma Cultura Emergente, como os organizadores a denominaram. Houve nesta conjuntura uma grande preocupação relacionada ao destino da Igreja Cristã Evangélica, pois ninguém havia se levantado até aquele momento para refutar e comparar em nível de reflexão teológica e apologética cristã os ensinos perniciosos que submergia a comunidade campinense como um todo atingindo já naquela época 48 eventos paralelos.

A perplexidade e angústia já haviam chegado ao coração de muitas pessoas reivindicando da Igreja Evangélica de Campina Grande uma tomada de posição firme quanto à invasão esotérica em nossa cidade. A princípio não se sabia como fazer para criar uma estratégia eficaz, não somente para combater os ensinos distorcidos da Nova Era, como também trazer diretrizes seguras para a comunidade quanto aos ensinos de uma Teologia Cristã sadia. Aconteceu somente em fevereiro de 1999 o I Encontro Para
a Consciência Cristã quando os alunos do Instituto Teológico Superior de Missões - ITESMI, sob a nossa direção, que dirigíamos pela orientação e urgência do Espírito Santo de Deus, aceitaram o desafio de enfrentar não somente as dificuldades de recursos financeiros, mas também de recursos humanos.

No início houve crítica, falta de compreensão e de ajuda por parte de muitos, porém, não era hora de olhar para as circunstâncias e sim exercer a fé em Deus que opera nas coisas impossíveis. Aí entra a disponibilidade do homem. Por isso, quero destacar a pessoa do pastor Euder Faber Guedes Ferreira, que nos instantes decisivos, acreditou plenamente na visão de Deus, que estava brotando, e largou seu emprego secular para se dedicar integralmente à grande causa prioritária do Reino de Deus. Quero trazer à memória de nossos caros leitores que foi muito difícil para implantarmos o I Encontro Para a Consciência Cristã, no entanto, o milagre aconteceu.

Não obstante, a razão do Encontro Para a Consciência Cristã não somente abrange a cidade de Campina Grande em seu contexto esotérico de evento anual, mas prepara a igreja contra os falsos ensinos que se alastram em nosso território nacional e também em outras regiões do mundo ocidental e oriental. O pluralismo religioso será certamente o maior desafio da Igreja Cristã neste novo milênio. Não temos dúvidas que por trás de tudo isto está o Império da religião ecumênica liderada pelo seu grande mentor, o Anticristo.


Vê-se, pois, o quanto salta aos olhos a construção lógica e o grau de civilidade e de maturidade intelectual dos mentores do tal Encontro da Consciência "Cristã", não apenas na falta de adesão ao mandamento de Cristo de "Amar ao próximo", como na total falta de respeito com quem não partilha de suas idéias, em uma quase paranóia que abarca a proteção de um "mercado religioso" altamente lucrativo, baseado na cobrança de dízimos. Estronho ainda é essa expliticidade em se auto-denomiar de cristãos reais e agirem como egoístas mesquinhos. Outras vertentes cristãos também têm seus encontros ao lado do Encontro da Nova Consciência, como o dos católicos e o MIEP, Movimento de Integração do Espírita Paraíbano (o primeiro evento deste tipo em Campina Grande e que serviu de modelo ao Encontro para a Nova Consciência), possuindo ambos muito boas relações e mesmo participação no Encontro da Nova Consciência, de modo fraterno e amistoso, portão, verdadeiramente cristão.

Engraçado é que os evangélicos da "Consciência Cristã" exigem, em um país constitucionalmente Laico, que os governos (municipal e estadual) financiem quase que em sua totalidade o encontro evangélico - cabendo salientar que o dinheiros dos impostos é pago em sua maioria por pessoas que não são evangélicas, enquanto fazem Lobby para que o Encontro da Nova Consciência morra à míngua (e este último encontro não pode ser considerado confessional, já que sua proposta é o de debate de idéias e de tolerância, com fortes aspectos sociológicos e antropológicos. Sua proposta é da de encontro sadio de diferentes filosofias, de divugação de estudos científicos e de encontro entre espiritualidade, ciência e arte). O denheiro público, por eles coneguido por meio de manobras políticas, é aplicado para um show de luzes, sons, cores espetaculosa. No final, agem como os fariseus de sempre "que gostam de orar de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas para serem vistos pelos homens" (Mt. 6,5).

Ora, oficialmente o Brasil, que tanto sofreu no obscurantismo regressivo da Ditadura Militar, é um país laico. E um Estado laico tem como dever defender e promover a mais aguda e absoluta separação entre o Estado e as comunidades religiosas, bem como a saudabilíssima neutralidade do Estado em matéria religiosa.

 O encontro da Nova Consciência é laico e social, por não incentivar qualquer igreja ou religião, mas possibilitar um espaço social para um evento de interessa da coletividade mais madura. Já o tal encontro da "consciência" cristã é não só confessional (evangélico), como intolerante e fomentador de desavenças, portanto, é estranho o poder da bancada evangélica em canalizar recursos para este último evento. Zelar pela liberdade de consciência, pela paz e harmonia e pela igualdade entre cidadãos é dever do Estado, ainda que se mantenha neutro em matéria religiosa. Ora, o que se vê aqui? Uma manifestação político-empresarial intolerante com qualquer outro pensamento que não seja espelho de suas "doutrinas de salvação".
"Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas: porque rodeais o mar e a terra para fazer um fiel! E depois de o terdes feito, o fazeis em dobro mais digno de inferno do que vós. (...) Ai de vós escribas e fariseus hipócritas, que pagais o dízimo da hortelã,
do endro e do cominho, e haveis deixado as coisas que são mais importantes da lei, da justiça e da fé! Estas coisas eram as que vós devieis praticar, sem que omitesses as outras. Condutores de cegos, que coais um mosquito e engulis um camelo!"
(Mt. 23, 15-16 e 23-24).

Sentindo-se, parece, enviados do próprio Deus - que, aliás, apresenta uma tolerância para eles pouco aceitável, por fazer o sol brilhar igualmente para os "Injustos" - arvoraram-se no pressuposto de novos "gurreiros da fé" a empunharem a espada para destruir o que receim ser um perigo ... talvez de medo de perda do espaço deles no lucrativo mercado religioso... portanto deve-se combater o que inclui ideais como democracia, respeito ás diferenças, pularismo de idéias, liberdade religiosa e ecumenismo.

Para tais "defensores da 'verdadeira fé',", de modo bem parecido aos fundamentalistas pró-Bush, quem luta por tais idéias de ecumenismo, tolerância, dialogicidade segue um mítico Anticristo - que, na verdade, acaba servindo de axiliar para os acusadores ao estabelecer parte do reino de suas igrejas por meio de ameças e do medo gritado por pastores - e precisa ser dizimado. Talvez achem que o Deus que dizem acreditar seja por demais fraco para ter uma glória própria independemente da ajuda deles. Mas então Deus é tão pequeno a ponto de precisar de dízimo e da briga de intolerantes?Veja-se, sobre isso, o excelente artigo de Gabriel Perissé com o tema "o fanatismo religioso é um ateísmo".

E não apenas os participantes do Encontro para a Nova Consciência são considerados "demoníacos", como mesmo outras Igrejas Cristãs são publicamente atacadas pelos "(in)conscientes 'Cristãos' ",o que inclui mesmo outras denomiaçõs evengélicas. Sobre a gravidade do mister pentencostal fundamentalista de demonizar todas as religiões não evangélicas, veja o artigo escrito pela pesquisadora Mariel Marra, intitulado "Demonização e Intolerância Religiosa".

Este tipo de atitude tacanha, egoísta e infantil está tomando proporções graves em todo o Brasil, a tal ponto que vários setores da sociedade, preocupados com o avanço da agressividade fundamentalista, formou a chamada Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, ligada à Secretaria de Defesa dos Direitos Humanos, e que busca promover a liberdade e diálogo inter- religioso e a proteção contra abusos contra a vivência democrática de credos e filosofias várias. De fato, a agressividade dos fundamentalistas, compiando as táticas de demoninização e insulto das Igreja pentecostais fundamentalistas norte-americanas (do qual a Igreja Universal é um exemplo), acabou por levar a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa a levar a escalada de intolerância dos evangélicos pentecostalistas ao conhecimento da própria ONU, como podemos ver em um artigo publicado pela Folha de São Paulo, clicando aqui.

"Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, porque sóis semelhantes aos sepulcros caiados, que parecem por foras formosos aos homens, e por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda asquerosidade". Assim também vocês se mostram por fora aparentais ser justos aos homens, mas por dentro estás cheios de hipocrisias e iniquidade" (Mt. 23, 27-28).


Deplorando a diversidade de pensamento - para eles uma ameaça ao processo de doutrinação de sua única "verdade" que é, claro, altamente favorável a eles - sustentam - como fazia a Igreja
Católica na época da "Idade das Trevas" - que só pode haver uma única forma de verdade cristã e uma única "Igreja do Povo de Deus" fora da qual só existe perdição e inferno, sem possibilidade de salvação. Índios, árabes, "pretensos cristãos que não conhecem o verdadeiro Deus Vivo", asiáticos, budistas, ateus, etc., por melhores pessoas que sejam em obras, por não aceitarem adesisticamente o "Cristo" deles como salvador pessoal já estão condenados - como se Cristo já não fosse amado e seguido por milhões de pessoas não evangélicas sem precisar de engolir essa verborragia infantil.

Quem desafia de alguma forma este modo de pensar é, além de herético, um mal a ser expulso e, se possível destruído. E é assim que se recomeça a tragédia e farsa de uma história já conhecida - mas não aprendida - de intolerência, agressividade e fogueiras...

"Todo fundamentalista é, a ferro e fogo, um “altruísta”. Está tão convencido de que só ele enxerga a verdade que trata de forçar os demais a aceitar o seu ponto de vista... para o bem deles! Há muitos fundamentalismos em voga, desde o religioso, que confessionaliza a política, ao líder político que se considera revestido de missão divina. Eles geram fanáticos e intolerantes."

Frei Betto

Outro caso de provocação e estreiteza moral ocorreu durante o VII Encontro da Consciência Evangélica "Cristã" feito em 2005. Numa atitude de insulto gratuito explícito, um pastor da Igreja Batista de São Paulo, chamado Joaquim de Andrade, afirmou na imprensa que não se arrependia das polêmicas declarações antiharmônicas que deu em Campina Grande, durante o Encontro Para a Consciência "Cristã", sobre as aparições populares atribuídas a Maria de Nazaré. Ele afirmou que tais aparições marianas são coisas do demônio, manifestações demoníacas a serem combatidas pelos evangélicos. Segundo o jornal Correio da Paraíba, de 10/02/2005,

"O prefeito Veneziano Vital do Rêgo posicionou-se contrário à declaração do pastor, a qual classificou de infeliz. Ele disse que, ao conversar com o vice-prefeito José Luís Júnior, que é evangélico, e com outros pastores, chegou à conclusão que nem todos têm o mesmo pensamento do pastor Joaquim Andrade. O prefeito pediu para que o pastor Joaquim revisse o que disse. O pastor Joaquim de Andrade, da Igreja Batista de São Paulo, disse que não se arrepende das declarações que deu em Campina Grande, durante o Encontro Para a Consciência Cristã, sobre as aparições de Nossa Senhora e que a despeito do desagravo que será realizado pela comunidade católica, ele não precisa da misericórdia de Maria". 

E o que dizer do que eles falam dos espíritas, budistas, ateus?

Diante desta explícita manifestação de desafio ao pensamento diferente, especialmente aos Católicos e aos participantes do XIV Encontro para a Nova Consciência, cabe aqui a resposta do filósofo F. Pereira Nóbrega ao dito Pastor Joaquim Andrade e a seus pares, como o pastor Fáber, etc.:


Aparições F. Pereira Nóbrega Jornal Correio da Paraíba, 12/02/2005

Apareceu em Campina Grande um movimento chamado Encontro para a Nova Consciência que veio para ficar. Pretende mais somar que diminuir. Procura entre várias tendências do pensamento atual o denominador comum dos que prezam a humanidade e querem fazer algo por ela. Está no espírito da Nova Consciência ressaltar esse denominador comum, esquecer e superar divergências que haja. Dentro e fora, há sentimentos diferentes, que temos por sagrados, como os de pátria, família, religião. Mãe alheia só o mal educado xinga. Zombar de sentimentos diferentes, isso fica para encontros internos dos que pensam do mesmo modo. Todo homem tem direito a amar sua mãe, sua fé, e nisso ser respeitado. Os que, publicamente, combatem a fé que está no outro, combatem o homem universal que está sem si. Pois também apareceu em Campina Grande um encontro contraa Nova Consciência e, com ele, um pastor, esquecido do espírito do Encontro, repetindo o velho diante da Consciência que se apresenta Nova. Voltou ao tempo das guerras de religião. Dos primeiros cristãos se dizia: vede como eles se amam. Ao tempo das guerras religiosas, se poderia dizer: vede como eles se odeiam. A esse tempo quis voltar o pastor. Ainda hoje, são encontráveis dos dois lados os que pregam amor com sotaque de ódio. Frequentemente eles se encontram em cultos que se dizem ecumênicos, por fora de ritos, por dentro de nada. Apareceu aquele pastor, de público zombando de aparições de Maria.
  Houvesse mais diálogo entre denominações cristãs, saberia ele quanto a Igreja é prudente, quase cética, sobre esses relatos de aparições. Aprenderia quão raríssimos são os casos convincentes, diante da multidão dos que se propalam. Saberia ainda que a Igreja, a rigor, não obriga em consciência nenhum católico a inserir uma aparição no seu credo de fé. Se mais diálogo houvesse entre nós, eu ousaria dialogar em termos de Teologia. E diria que me confunde mais se crer nas manifestações do demônio do que nas de Maria. Quando aparece um fato paranormal, daqueles ditos de “espírito brincalhão”, sempre aparece algum pastor dizendo que aquilo é o diabo. É má Teologia. A História não é uma queda de braços entre Deus e o Diabo que, de há muito, já foi vencido. Enquanto o mundo volta ao paganismo, cristãos se apedrejam. Acordemos a tempo. Há muito mais o que nos une, muito menos o que nos separa.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Em vez do espírito que vivifica, a letra que mata...


O Evangelho dos Evangélicos

Ed René Kivitz

“Nem todo aquele que me diz Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus.” [Jesus Cristo]

Estou convencido de que um é o evangelho dos evangélicos, outro é o evangelho do reino de Deus. Registro que uso o termo “evangélico” para me referir à face hegemônica da chamada igreja evangélica, como se apresenta na mídia radiofônica e televisiva.

O evangelho dos evangélicos é estratificado. Tem a base e tem a cúpula. Precisamos falar com muito cuidado da base, o povo simples, fiel e crédulo. Mas precisamos igualmente discernir e denunciar a cúpula. A base é movida pela ingenuidade e singeleza da fé; a cúpula, muita vez é oportunista, mal intencionada, e age de má fé. A base transita livremente entre o catolicismo, o protestantismo e as religiões afro. A base vai à missa no domingo, faz cirurgia em centro espírita, leva a filha em benzedeira, e pede oração para a tia que é evangélica. Assim é o povo crédulo e religioso. Uma das palavras chave desta estratificação é “clericalismo”: os do palco manipulando os da platéia, os auto-instituídos guias espirituais tirando vantagem do povo simples, interesseiro, ignorante e crédulo.

A cúpula é pragmática, e aproveita esse imaginário religioso como fator de crescimento da pessoa jurídica, e enriquecimento da pessoa física. Outra palavra chave é “sincretismo”. A medir por sua cúpula, a igreja evangélica virou uma mistura de macumba, protestantismo e catolicismo. Tem igreja que se diz evangélica promovendo “marcha do sal”: você atravessa um tapete de sal grosso, sob a bênção dos pastores, e se livra de mal olhado, dívida, e tudo que é tipo de doença. Já vi igreja que se diz evangélica distribuir cajado com água do Jordão (i.é, um canudo de bic com água de pia), para quem desejasse ungir o seu negócio, isto é, o seu business. Lembro de assistir a um programa de TV onde o apresentador prometia que Deus liberaria a unção da casa própria para quem se tornasse um mantenedor financeiro de sua igreja.

O povo religioso é supersticioso e cheio de crendices. Assim como o Brasil. Somos filhos de portugueses, índios, africanos, e muitos imigrantes de todo canto do planeta. Falar em espíritos na cultura brasileira é normal. Crescemos cheios de crendices: não se pode passar por baixo de escada; gato preto dá azar; caiu a colher, vem visita mulher, caiu garfo, vem visita homem; e outras tantas idéias sem fundamento. Somos assim, o povo religioso é assim. Tem professor de universidade federal dando aula com cristal na mão para se energizar enquanto fala de filosofia.

E a cúpula evangélica aproveita a onda e pratica um estelionato religioso: oferece uma proposta ritualística que aprisiona, promove a culpa e, principalmente, ilude, porque promete o que não entrega. Aliás, os jornais começam a noticiar que os fiéis estão reivindicando indenizações e processando igrejas por propaganda enganosa.

O evangelho dos evangélicos é estratificado. A base é movida pela ingenuidade e singeleza da fé, e a cúpula é oportunista. A base transita entre o catolicismo, o protestantismo e as religiões-afro, e a cúpula é pragmática. A base é cheia de crendices e a cúpula pratica o estelionato religioso.

O evangelho dos evangélicos é mercantilista, de lógica neoliberal. Nasce a partir dos pressupostos capitalistas, como, por exemplo, a supremacia do lucro, a tirania das relações custo-benefício, a ênfase no enriquecimento pessoal, a meritocracia – quem não tem competência não se estabelece. Palavra chave: prosperidade. Desenvolve-se no terreno do egocentrismo, disfarçado no respeito às liberdades individuais. Palavra chave: egoísmo. Promove a desconsideração de toda e qualquer autoridade reguladora dos investimentos privados, onde tudo o que interessa é o lucro e a prosperidade do empreendedor ou investidor. Palavra chave: individualismo. Expande-se a partir da mentalidade de mercado. Tanto dos líderes quanto dos fiéis. Os líderes entram com as técnicas de vendas, as franquias, as pirâmides, o planejamento de faturamento, comissões, marketing, tudo em favor da construção de impérios religiosos. Enquanto os fiéis entram com a busca de produtos e serviços religiosos, estando dispostos inclusive a pagar financeiramente pela sua satisfação. Em síntese, a religião na versão evangélica hegemônica é um negócio.

O sujeito abre sua micro-empresa religiosa, navega no sincretismo popular, promete mundos e fundos, cria mecanismos de vinculação e amarração simbólicas, utiliza leis da sociologia e da psicologia, e encontra um povo desesperado, que está disposto a pagar caro pelo alívio do seu sofrimento ou pela recompensa da sua ganância.

Em terceiro lugar, o evangelho dos evangélicos é mágico. Promove a infantilização em detrimento da maturidade, a dependência em detrimento da emancipação, e a acomodação em detrimento do trabalho.

Pra ser evangélico você não precisa amadurecer, não precisa assumir responsabilidades, não precisa agir. Não precisa agregar virtudes ao seu caráter ou ao processo de sua vida. Primeiro porque Deus resolve. Segundo porque se Deus não resolver, o bispo ou o apóstolo resolvem. Observe a expressão: “Estou liberando a unção”. Pensando como isso pode funcionar, imaginei que seria algo como o apóstolo ou bispo dizendo ao Espírito Santo: “Não faça nada por enquanto, eles não contribuíram ainda, e eu não vou liberar a unção”.

Existe, por exemplo, a unção da superação da crise doméstica. Como isso pode acontecer? A pessoa passa trinta anos arrebentando com o seu casamento, e basta se colocar sob as mãos ungidas do apóstolo, que libera a unção, e o casamento se resolve. Quem não quer isso? Mágica pura.

O sujeito é mau-caráter, incompetente para gerenciar o seu negócio, e não gosta de trabalhar. Mas basta ir ao culto, dar uma boa oferta financeira, e levar para casa um vidrinho de óleo de cozinha para ungir a empresa e resolver todos os problemas financeiros.

Essa postura de não assumir responsabilidades, de não agir com caráter, e esperar que Deus resolva, ou que o apóstolo ou bispo liberem a unção tem mais a ver com pensamento mágico do que com fé.

Em quarto lugar, o evangelho dos evangélicos tem espírito fundamentalista. Peço licença para citar Frei Beto: “O fundamentalismo interpreta e aplica literalmente os textos religiosos, não sabe que a linguagem simbólica da Bíblia, rica em metáforas, recorre a lendas e mitos para traduzir o ensinamento religioso.” O espírito fundamentalista é literalista, e o mais grave é que o espírito fundamentalista se julga o portador da verdade, não admite críticas, considerações ou contribuições de outras correntes religiosas ou científicas.

Quem tem o espírito fundamentalista não dialoga, pois considera infiéis, heréticos, ou, na melhor das hipóteses, equivocados sinceros, todos os que não concordam com seus postulados, que não são do mesmo time, e não têm a mesma etiqueta. Quem tem o espírito fundamentalista se considera paradigma universal. Dialoga por gentileza, não por interesse em aprender. Ouve para munir-se de mais argumentos contra o interlocutor. Finge-se de tolerante para reforçar sua convicção de que o outro merece ser queimado nas fogueiras da inquisição. Está convencido de que só sua verdade há de prevalecer.

Mais uma vez Frei Beto: “o fundamentalista desconhece que o amor consiste em não fazer da diferença, divergência”. Por causa do espírito fundamentalista, o evangelho dos evangélicos é sectário, intolerante, altamente desconectado da realidade. O evangelho dos que têm o espírito do fundamentalismo é dogmático, hermético, fechado a influências, e, portanto, é burro e incoerente.

Em quinto lugar, o evangelho dos evangélicos é um simulacro. Simulacro é a fotografia mais bonita que o sanduíche. Não me iludo, o evangelho dos evangélicos é mais bonito na televisão do que na vida. As promessas dos líderes espirituais são mais garantidas pela sua prepotência do que pela sua fé. Temos muitos profetas na igreja evangélica, mas acredito que tenhamos muito mais falsos-profetas. Os testemunhos dos abençoados são mais espetaculares do que a realidade dos cristãos comuns. De vez em quando (isso faz parte da dimensão masoquista da minha personalidade) fico assistindo estes programas, e penso que é jogada de marketing, testemunho falso. Mas o fato é que podem ser testemunhos por amostragem. Isto é, entre os muitos que faliram, há sempre dois ou três que deram certo. O testemunho é vendido como regra, mas na verdade é apenas exceção.

A aparência de integridade dos líderes espirituais é mais convincente na TV e no rádio do que na realidade de suas negociatas. A igreja evangélica esta envolvida nos boatos com tráficos de armas, lavagem de dinheiro, acordos políticos, vendas de igrejas e rebanhos, imoralidade sexual, falsificação de testemunho, inadimplência, calotes, corrupção, venda de votos.

A integridade do palco é mais atraente do que a integridade na vida. A fé expressa no palco, e nas celebrações coletivas é mais triunfante, do que a fé vivida no dia a dia. Os ideais éticos, e os princípios de vida são mais vivos nos nossos guias de estudos bíblicos e sermões do que nas experiências cotidianas dos nossos fiéis. Os gabinetes pastorais que o digam: no ambiente reservado do aconselhamento espiritual a verdade mostra sua cara.


Estratificado, mágico, mercantilista, fundamentalista, e simulacro. Eis o evangelho dos “evangélicos”.

Publicado originalmente em [url]www.outraespiritualidade.blogspot.com[/url]


• Ed René Kivitz é teólogo, com mestrado em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, e pastor presidente da Igreja Batista de Água Branca, SP.