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terça-feira, 3 de novembro de 2020

Tem certos dias em que penso em minha gente, crônica escrita por Luis Nassif

 

 "Nos palácios brasilienses, há regabofes memoráveis, juntando o Presidente, Ministros do Supremo, do Tribunal de Contas, da Procuradoria Geral da República. Há muito a ser destruído, para que tenham tempo de pensar que, lá dos cafundós de Minas, havia um velho senhor, um homem manso, que trabalhou a vida inteira, e cujo maior consolo, na hora da passagem, seria ver a família amparada."


A Andrea perdeu o pai. É moça trabalhadora, inteligente, sacudida como se dizia antigamente, que dá expediente em duas casas, se preocupa com os irmãos e tem um discernimento que a habilitaria a qualquer empresa, tivesse tido a oportunidade do estudo e a prerrogativa da cor.

Foi para o interior de Minas, onde reside a família, e recebeu a graça de testemunhar a despedida do pai.

Trabalhou a vida inteira, não deu estudos aos filhos, mas incutiu-lhe valores, aquelas bússolas morais que conduzem as pessoas pela vida e as impedem de se perder nos desvios, os ricos, pelos excessos, os pobres, pelas carências.

Na hora da despedida, o senhor manso juntou esposa e filhos e perguntou de cada um, se a mais velha tinha conseguido, enfim,  a aposentadoria, se a Andrea estava zelando pelos demais irmãos, se o filho conseguira um outro emprego.

Despediu-se carinhosamente da esposa. Pediu desculpas pela vida dura, por não ter lhe dado vida melhor, mas disse-lhe que sempre a amou, que foi a mulher da sua vida.  E declarou-se com a alma dos poetas e as palavras, como um Cartola caboclo.  Pediu aos filhos que conversassem com o defensor público, para ter a tranquilidade de que a esposa receberia a pensão.

Bem informada, Andrea não quis preocupá-lo com os boatos que vêm de Brasilia, dando conta de que um tropel de bárbaros invadiu a República e ameaça destruir todos os pontos de tranquilidade dos mais vulneráveis.

Nos palácios brasilienses, há regabofes memoráveis, juntando o Presidente, Ministros do Supremo, do Tribunal de Contas, da Procuradoria Geral da República. Há muito a ser destruído, para que tenham tempo de pensar que, lá dos cafundós de Minas, havia um velho senhor, um homem manso, que trabalhou a vida inteira, e cujo maior consolo, na hora da passagem, seria ver a família amparada.

Por Andrea e por seu pai, pelos órfãos do Estado, pelos que ajudaram na construção do país que não sai dos jornais, da solidariedade, do trabalho, da humildade altiva, por todos aqueles que assimilaram a humanidade a partir do seu canto, que entenderam os valores universais, a partir da convivência com os vizinhos, lhes digo sem pretender ser profeta: OS BÁRBAROS  NÃO PASSARÃO!

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