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quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Retrocesso civilizatório e uma minoria cada vez mais rica e poderosa... Por quem os sinos dobram? Crônica de Izaías Almada

 

O atual estágio do capitalismo, em sua prática de sobrevivência a qualquer custo, já não quer permitir sequer a possibilidade de que possamos discutir alternativas a essa mesma e malfadada sobrevivência.

Jornal GGN:

Por quem os sinos dobram?

por Izaías Almada

Ao mergulharmos num mundo onde as transformações, quaisquer sejam elas, se dão de maneira rápida e vêm para ficar, é preciso um redobrado esforço para não cairmos na tentação de substituir a realidade pelos nossos desejos ou convicções.

Em outras palavras e usando um exemplo simplório: se estamos a tomar sol numa praia e ele está muito forte e a queimar nossa pele, não adianta tapá-lo com uma peneira.

Ao arriscar essa filosofia digna de uma ou mais caipirinhas no bar da esquina, arrisco-me a algumas reflexões sobre o resultado do primeiro turno das eleições municipais brasileiras e também a dar um pitaco sobre a já sociopática resistência de Trump ao resultado das eleições em seu país.

O atual estágio do capitalismo, em sua prática de sobrevivência a qualquer custo, já não quer permitir sequer a possibilidade de que possamos discutir alternativas a essa mesma e malfadada sobrevivência. Basta disparar as “fake news”…

Por inúmeras e concretas razões, como o jornalismo sem vergonha dos grandes conglomerados midiáticos espalhados pelo mundo, aprendemos a ler a história econômica dos séculos XIX e XX identificando o capitalismo com regimes democráticos e o socialismo e/ou comunismo como sendo regimes ditatoriais.

A essa falsa dicotomia contrapõe-se o desconhecimento quase que generalizado das premissas e ideias a sustentar um sistema que vive do acumulo de capital e da exploração do trabalho assalariado a outro que propõe que os meios de produção pertençam ao estado e os bens produzidos sejam distribuídos igualitariamente entre os que produzem a riqueza. Teorias e conceitos superados, dirão os mais afoitos.

Só que essa mesma “superada” e falsa dicotomia, ao conseguir fazer sofisticada lavagem cerebral em bilhões de seres humanos, se espalhou por entre os não sei quantos partidos políticos existentes no Brasil (chamo a atenção para o fato de que os partidos políticos no Brasil se tornaram cabides de emprego), envenenando as disputas eleitorais, gerando confusão de ideias, discursos ambíguos e – o mais grave – a certeza da impunidade e o uso da justiça em favor dos mais ricos. Na luta pelo poder vale tudo, dirão os maquiavélicos.

Qual é a novidade então? A novidade é que a luta de classes continua firme queiram ou não os profetas dos novos tempos.

Com os primeiros resultados já no domingo à noite, apesar dos atrasos da Justiça Eleitoral, começou a surgir ainda que timidamente o discurso da possível recuperação da esquerda após o golpe de 2016 e a eleição do Jair.

Na segunda feira o discurso de muitos analistas subiu de tom e o Jair não conseguiu emplacar a maior parte dos candidatos que apoiou e um de seus filhos, apesar de reeleito no Rio de Janeiro, teve menos votos que na eleição anterior. O fascismo caboclo foi derrotado nas urnas… Será?

Mas que esquerda é essa que está se recuperando? O balaio de gatos em que se transformou o nosso quadro partidário não permite, no meu modo de ver, arriscar previsões nesse sentido.

E mais: a vitória de Biden nos EUA mudará alguma coisa em relação ao Brasil? Ou pelo menos em relação ao Jair? Quem nos garante? Trump já entregou os pontos ou está se preparando para alguma surpresa de final de ano?

Não devemos nos esquecer de que a obsessão antipetista e antiesquerdista levou o Brasil a uma falha trágica: eleger para o comando da nação uma pessoa despreparada em todos os sentidos para o exercício da presidência, mas perfeitamente em sintonia com o que de mais desonroso se pode encontrar num ser humano: o desprezo pela solidariedade, pela cultura, pela natureza, pela justiça social.

Veio à tona o Brasil machista, misógino, preconceituoso, praticante do fundamentalismo religioso e outros desvios de personalidade e caráter e não vai largar o osso assim, sem essa mais aquela…  O terreno para o fascismo ainda é fértil. E mesmo que não fosse, de qual esquerda estamos falando? O que a caracteriza como tal?

Mudanças repentinas na política burguesa – o Brasil ainda não ultrapassou esse estágio – costumam decepcionar, sejam elas à esquerda ou à direita.

Afinal, por quem os sinos dobram?

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