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terça-feira, 19 de novembro de 2019

Polarização Política: A necessidade da Democracia contra Racismo, Misoginia, Homofobia e Fascismo, por Fernando Nogueira da Costa



Acabou a Era do Direito Masculino Inquestionável e Incontestável. Este livro de Kimmel é sobre aqueles homens ainda não cientes disso ou aqueles capazes de sentirem “a mudança no vento”, mas determinados a “conter a maré”.

Polarização Política: Democracia contra Racismo, Misoginia, Homofobia e Fascismo

por Fernando Nogueira da Costa

GGN.- Política é a ação coletiva para reivindicar direitos da cidadania: civis, políticos, sociais, econômicos, de minorias, etc. Segundo os diagnósticos apresentados nos livros lançados recentemente, estamos vivendo Era do Fim do Machismo, Era da Morte ou Fim das Democracias, Era do Populismo de Direita, Era do Neofascismo, Era da Mente Americana Mimada, Era da Pós-Verdade (Morte da Verdade) e/ou a Era Pós-Políticas Identitárias.
Michael Kimmel, no livro “Angry White Men: American Masculinity At The End Of An Era” (2013), indica: os acusados de defesa da Supremacia Branca com raiva doentia colocam a culpa do mal-estar sentido por eles em corporações gananciosas, legislaturas impassíveis, governos locais e estaduais complacentes. Há mudanças culturais capazes de enfurecerem os autodenominados nativos norte-americanos, isto é, os descendentes dos WASP responsáveis pelo genocídio dos nativos indígenas.  Furiosos denunciam:
  1. as mulheres estão mais seguras hoje em comparação a qualquer outra época de nossa sociedade, 
  2. os LGBT são mais aceitos e livres para amar quem amam, e 
  3. as minorias raciais e étnicas enfrentam menos obstáculos em seus esforços para se integrarem plenamente na sociedade americana.
Acabou a Era do Direito Masculino Inquestionável e Incontestável. Este livro de Kimmel é sobre aqueles homens ainda não cientes disso ou aqueles capazes de sentirem “a mudança no vento”, mas determinados a “conter a maré”.
A questão-chave para Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, no livro “Como a democracias morrem” (2018), é outra: democracias tradicionais entram em colapso? Respondem: democracias ainda morrem, mas por meios diferentes. Desde o final da Guerra Fria, a maior parte dos colapsos democráticos não foi causada por generais e soldados, mas pelos próprios governos eleitos. 
Líderes eleitos subverteram as instituições democráticas em países como Geórgia, Hungria, Filipinas, Polônia, Rússia, Sri Lanka, Turquia, Ucrânia, Nicarágua, Peru, Venezuela, Bolívia. O Brasil assumiu esse risco a partir da eleição em 2018 sem debate público de um programa governamental e posterior anúncio de um programa ultraliberal dos Chicago’s Oldies. A recessão democrática hoje começa nas urnas.
São quatro principais indicadores de comportamento autoritário:
  1. Compromisso débil com as regras democráticas do jogo: sugerem a necessidade de medidas antidemocráticas, como cancelar eleições, emendar, violar ou suspender a Constituição, proibir certas organizações ou restringir direitos civis ou políticos básicos; 
  2. Negação da legitimidade dos oponentes políticos: acusa seus rivais constituírem uma ameaça, seja à segurança nacional, seja ao modo de vida predominante;
  3. Tolerância ou encorajamento à violência: laços com gangues armadas, forças paramilitares, milícias, guerrilhas ou outras organizações envolvidas em violência ilícita;
  4. Propensão a restringir liberdades civis de oponentes, inclusive a mídia: leis para impor restrições aos protestos e às críticas ao governo em partidos rivais, na sociedade civil ou na mídia.
David Runciman, no livro “Como a democracia chega ao fim” (2018), alerta para os três maiores riscos vivenciados atualmente:
  1. o risco de golpes de Estado: tomada das instituições democráticas pela via armada ainda é hipótese realista.
  2. o risco de uma catástrofe: a democracia entrará em colapso se todo o resto desmoronar por guerra atômica, mudança climática calamitosa, bioterrorismo, surgimento de inteligência artificial e desemprego tecnológico, provocado por robôs, qualquer um desses fatores pode acabar com a política democrática.
  3. a ameaça da tecnologia: robôs inteligentes ainda estão longe de existir, mas máquinas semi-inteligentes, encarregadas de minerar dados ou influenciar a tomada decisões em nosso nome, aos poucos estão se infiltrando em boa parte das nossas vidas, indo contra a privacidade e manipulando a opinião de segmentos sociais pela investigação de seus comportamentos habituais – em uma privacidade hackeadapara interferir em eleição.
Jan-Werner Muller se pergunta: “O que é o populismo?” (2016). O termo “populista” tem sido usado regularmente como sinônimo de “antiestablishment”, de maneira independente de qualquer ideia política. Os populistas se apresentam como “zangados” ou “raivosos” para atrair eleitores “frustrados” ou sofrendo de “ressentimento”. Todo político eleito, especialmente em democracias dirigidas por pesquisas de opinião, apela para falar em nome de “o povo”, isto é, a eventual maioria eleitoral em uma circunstância política ou comportamental ultrapassada.
É possível reconhecer e lidar com o populismo de três maneiras:
  1. o populista é crítico às elites, não só as econômicas, mas as intelectuais, incentivando o anti-intelectualismo;
  2. os populistas são sempre contra as minorias, desafiando: “Somos o povo. Quem é você?!”
  3. o populismo tende a representar um perigo para a democracia, porque esta requer o pluralismo e o reconhecimento de precisarmos tolerar termos justos de vida juntos como cidadãos livres, iguais, mas também irredutivelmente diversos.
Yascha Mounk, no livro “O Povo Contra A Democracia” (2018), afirma: o que define o populismo é a reivindicação de representação exclusiva do povo — e a relutância em 
tolerar a oposição ou respeitar a necessidade de instituições independentes.  Por isso, com tamanha frequência ela põe os populistas em rota de colisão direta com a democracia liberal. A probabilidade de um populista causar um estrago duradouro à democracia é quatro vezes maior em lugar de outros tipos de governantes eleitos. Porém, em muitos casos, uma oposição disciplinada e atuante tem conseguido fazer frente às tentativas do governo de expandir seus poderes além das leis.
A experiência de outros países sugere três lições principais:
  1. a oposição sempre subestima o populistadeixando de enxergar a astúcia sob suas bravatas: com frequência, esse desdém pela figura de proa do populismo vem acompanhado de arrogante depreciação de seus partidários.
  2. os opositores dos populistas muitas vezes deixam de trabalhar unidos até se verem juntos na impotência: aflitos e apavorados, os adversários do populista começam a fazer o jogo político da pureza, impondo testes ainda mais decisivos a seus potenciais parceiros e recusando-se a abraçar antigos aliados hoje dissidentes do populista.
  3. os oponentes dos populistas muitas vezes deixam de planejar uma perspectiva positiva para um país melhor: em vez de tentar convencer seus colegas cidadãos de eles poderem oferecer benefícios tangíveis, concentram-se apenas em denunciar as falhas de seu inimigo – e os eleitores anti-establishment pouco importam com os maus hábitos de quem elegeram.
A oposição necessita aprender a lidar com os socialmente ressentidos. A maioria dos partidários dos populistas tem plena consciência de seu líder mentir, disseminar mensagens de ódio e não passar de um bronco. Mas, convencidos de os políticos tradicionais nada terem a lhes oferecer, é precisamente essa postura antissistema o atraente nele, por exemplo, o capitão de modo toscos contra a inteligência. 
Sempre existe a chance, dizem a si mesmos, de o populista realizar uma fração de suas promessas irreais. Pelo menos, o populista vai poupá-los da hipocrisia envaidecida da velha-guarda. Jovens desqualificados pelo mercado de trabalho exigente de preparação mais adequada à atual revolução tecnológica se tornam anti-establishment.
Madeleine Albright, ex-Secretária do Estado no governo Clinton, no livro “Fascismo: Um alerta” (2018), relembra uma experiência vivenciada. O fascismo ganhou vida no início do século XX, quando o nacionalismo ressurgiu, somando-se à ampla decepção com o fracasso da democracia representativa em manter-se no compasso de uma revolução industrial impulsionada pela tecnologia. Muitas pessoas não conseguiam achar trabalho. Com a aristocracia desacreditada, a religião sob escrutínio e velhas estruturas políticas se dividindo, a doutrina de autodeterminação nacional dava esperança.
A doutrina fascista é vinculada a um nacionalismo populista fanático e à reversão do contrato social: em vez de cidadãos darem poder ao Estado em troca da proteção de seus direitos, o poder emana do líder e as pessoas não têm direitos. Sob o fascismo, a missão dos cidadãos é servir; o trabalho dos governantes, ditar as regras; e o de milícias paramilitares, atacar com poder de fogo.
Em próximo post, continuaremos com essas breves sinopses de livros políticos recentes para reflexão sobre a atual Zeitgeist. Significa espírito de época, espírito do tempo ou sinal dos tempos.
Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Autor de “Métodos de Análise Econômica” (Editora Contexto; 2018).http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: fernandonogueiracosta@gmail.com

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