"A informação, mesmo aquela obtida de maneira ilegal, o jornalista não só tem o direito, mas a obrigação de publicar, porque isso não é um crime, e ninguém acredita que é um crime", teve que explicar Glenn Greenwald
Jornal GGN – A entrevista de Glenn Greenwald no Roda Viva, nesta segunda-feira (02), impactou as redes sociais não somente pelas respostas envolvendo diretamente os vazamentos das mensagens da Lava Jato, como pelas lições que o advogado e jornalista norte-americano teve que dar sobre ética, obrigações e garantias da profissão para a bancada de seis entrevistadores de jornais tradicionais.
Como no formato original, o programa da TV Cultura teve mais de uma hora de duração, desta vez com a participação do fundador do The Intercept Brasil, o jornalista que ficou reconhecido internacionalmente pelas denúncias sobre o programa de espionagem da NSA repassadas por Edward Snowden, e atualmente o que recebeu as mensagens da chamada VazaJato, entre investigadores e o ex-juiz Sergio Moro, que revelam como eles atuaram para incriminar e condenar os investigados.
Após Greenwald usar boa parte do primeiro e segundo blocos do programa para explicar à plateia de jornalistas que o rodeavam as garantias inclusive da Constituição brasileira ao jornalista, como proteção à fonte, e que os fins para se chegar ou prender investigados não podem justificar os meios, cometendo os próprios investigadores também ilegalidades, a repórter Lilian Tahan, do portal Metrópoles, fez a pergunta nos últimos minutos que resumiu a tentativa dos demais entrevistadores durante todo o programa de tentar incriminar o jornalista.
As intervenções de diversos entrevistadores foram na mesma linha para o questionar se ele iria paralisar as reportagens caso a polícia descobrisse que o hacker que obteve as mensagens e as repassou recebeu dinheiro para isso, cometendo crime. O jornalista norte-americano disse que não, uma vez que ele não cometeu crime por estar fazendo seu papel de jornalista.
Tahan então perguntou: “não seira mais fácil demitir repórteres e contratar meia dúzia de hackers?”. “Desculpa?”, perguntou o convidado, visivelmente perplexo. De maneira óbvia, Greenwald explicou à entrevistadora que “jornalistas não têm o direito de quebrar a lei” e que caso o façam devem ser responsabilizados, mas que ele não cometeu nenhum crime em atuar como jornalista.
O segundo e terceiro blocos tiveram como foco o mesmo tom de questionamento, principalmente enfatizando se as consequências das reportagens do The Intercept e jornais parceiros com a VazaJato poderiam anular as condenações de centenas de presos dos processos. “Você defende a anulação sumaria de todos os processos e condenações da Lava Jato?”, perguntou, em determinado momento, o editor do Globo, Gabriel Mascarenhas.
O editor do The Intercept afirmou que não é juiz e não integra o Supremo Tribunal Federal para responder a essa pergunta. Em seguida, outros questionamentos insistiam na mesma linha, como por exemplo, o da âncora Daniela Lima, que perguntou como ele se sentiria, se teria “peso na consciência” caso o ex-deputado Eduardo Cunha ou Geddes Vieira Lima fosse solto graças às reportagens.
Até que Glenn teve que responder, novamente de maneira lógica, que pessoas que cometeram crime devem ser responsabilizadas efetivamente, mas seguindo o devido processo legal, o que não permite que investigadores ou juízes cometam outras ilegalidades para isso. Em outras palavras, que os fins não justificam os meios. “A informação, mesmo aquela obtida de maneira ilegal, o jornalista não só tem o direito, mas a obrigação de publicar, porque isso não é um crime”, respondeu, e completou em tom de alerta contra a censura ou estado democrático à bancada de entrevistadores: “e ninguém acredita que é um crime”.
“O jornalismo mais importante, mais influente, mais premiado muitas vezes vem de fonte que cometeu crimes para obter essa informação, e isso não é o papel dos jornalistas”, enfatizou.
Foram poucos os momentos em que os jornalistas ali presentes perguntaram a Greenwald se ele tinha mais informações importantes a revelar sobre as mensagens. As duas vezes em que esse tema foi levantado pelos entrevistados, era para saber se ministros da Suprema Corte seriam arrolados em reportagens futuras. O jornalista respondeu que não havia documentos de peso envolvendo ministro do STF e que as mensagens pessoais destas figuras não seriam divulgadas, por critérios de ética da profissão.
Os entrevistadores, contudo, não quiseram saber se havia mais mensagens sobre ilegalidades cometidas pelo coordenador da força-tarefa de Curitiba, Deltan Dallagnol, e pelo ex-juiz e atual ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, Sergio Moro. Tampouco houve interesse sobre o impacto e desdobramentos de um dos maiores furos de reportagem da história recente do país.
Assista ao programa completo, abaixo:
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