"Ninguém assiste ao mesmo filme duas vezes. Rever nos dias de hoje o primeiro depoimento de Lula a Sergio Moro evoca um misto de sentimentos. Catarse, revelação (para quem ainda tinha dúvidas) e revolta, tudo ao mesmo tempo. Era maio de 2017 e logo de cara Moro exigiu que os aparelhos celulares dos advogados ficassem do lado de fora da sala de audiência. O juiz proibiu que a defesa fizesse gravações, alegou que o material captado poderia ser usado “não com finalidades privadas ou com propósitos compatíveis com os admitidos pelo processo, mas com fins político-partidários”. Relembrar isso hoje, à luz dos fatos, é repugnante."
Do Justificando:
Segunda-feira, 17 de junho de 2019
Moro e a Lava Jato irão pagar pelo massacre midiático que vitimou Dona Marisa?
Ninguém assiste ao mesmo filme duas vezes. Rever nos dias de hoje o primeiro depoimento de Lula a Sergio Moro evoca um misto de sentimentos. Catarse, revelação (para quem ainda tinha dúvidas) e revolta, tudo ao mesmo tempo. Era maio de 2017 e logo de cara Moro exigiu que os aparelhos celulares dos advogados ficassem do lado de fora da sala de audiência. O juiz proibiu que a defesa fizesse gravações, alegou que o material captado poderia ser usado “não com finalidades privadas ou com propósitos compatíveis com os admitidos pelo processo, mas com fins político-partidários”. Relembrar isso hoje, à luz dos fatos, é repugnante.
Naquele dia Lula demonstrou forte indignação com a falta de provas, com os vazamentos seletivos e o massacre que a mídia parceira de Moro estava cometendo. O ex-presidente enumerou para o juiz. Sim, ao contrário do Ministério Público, Lula provava o que estava dizendo. Foram 25 capas na IstoÉ, 19 capas na Veja, 11 na Época. Foram 298 matérias na Folha, no jornal O Globo (‘o mais amigo’) foram 530 e 318 no Estadão (‘que é mais amigo ainda’), todas “demonizando Lula, tudo com informações da polícia ou do Ministério Público”. Só no Jornal Nacional foram 18 horas e 15 minutos. “Sabe o que significam 18 horas falando mal de um cidadão? São 12 partidas de futebol”, disse Lula a um Moro que só fazia “hum hum” em tom de deboche.
A certa altura do depoimento, Lula externou “profunda mágoa” por tudo o que aquilo havia causado em sua família, mais especialmente em Dona Marisa. “Doutor Moro, todos temos que tomar cuidado com as declarações. O senhor sabe a mágoa profunda que tenho do vazamento das minhas conversas com minha esposa e das dela com os filhos. Profunda minha mágoa.”
Dona Marisa tinha morrido há pouco mais de três meses, depois de um AVC provocado pelo rompimento de um aneurisma. A “galega” tinha somente 66 anos. Era casada com Lula desde 1974. Era público e notório que a devassa sofrida em sua vida com momentos sórdidos como ver as casas dos filhos invadidas de forma brutal, os tablets dos netos sendo levados e conversas dela com familiares gravadas e divulgadas haviam lhe provocado uma corrosão emocional.
As conversas nada tinham de incriminadoras nem traziam qualquer relação com o processo. Moro então, do alto de seu cinismo, desatou sua catilinária e afirmou nada ter a ver com os vazamentos: “O senhor tem essas reclamações da imprensa, eu compreendo, mas esse não é o foro próprio para o senhor reclamar contra o tratamento da imprensa. O juiz não tem nenhuma relação com o que a imprensa publica ou não publica”, declarou ele.
Tomou uma das maiores invertidas de todos os tempos:
“O vazamento das conversas dela com meus filhos foi o senhor que autorizou. Não tinha o direito de ter minha casa molestada sem que eu tivesse sido intimado para uma audiência, doutor. Ninguém nunca me convidou, e de repente eu vejo um pelotão da Polícia Federal levantando o colchão da minha casa achando que tinha dinheiro. Então eu espero que essa nação nunca abdique de acreditar na justiça. Agora eu queria lhe avisar uma coisa: esses mesmos que me atacam hoje, se tiverem siais de que eu serei absolvido, prepare-se, porque os ataques ao senhor vão ser muito mais fortes.”
Categórico, esse trecho do depoimento viralizou nas redes sociais no último final de semana. Todo o depoimento é um desfile de desmentidos por parte de Lula e um punhado de demonstrações de ocorrência de grande injustiça.
“Pelo amor de deus, apresentem uma prova! A acusação tem que ser séria e não especulativa. Hoje a acusação é feita mais pelas capas dos jornais do que pelos dados concretos das perguntas que vocês me fizeram (…) Quando o juiz e os acusadores se submetem à imprensa para poder prender as pessoas, aí tudo mais é possível, doutor”, disse o ex-presidente.
“De que forma o juiz teria se submetido à imprensa, senhor ex-presidente?”, retrucou Moro. Demorou, mas a série de reportagens do The Intercept respondeu ao juiz e a todo mundo.
“O JN (Jornal Nacional) vai explorar isso amanhã”, escreveu Deltan Dallagnol para Moro, em diálogo revelado pelo site Glenn Greenwald. Como ele sabia? Precisa mais?
Dona Marisa morreu de tristeza, de desgosto, vítima de perseguição feroz e acusações injustas praticadas pela república de Curitiba. “Vamos esperar, o tempo se encarrega de contar a história”, desabafou sabiamente Lula naquele dia.
A história está aí. Ficará tudo por isso mesmo?
Mauro Donato é jornalista, escritor e fotógrafo nascido em São Paulo.
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