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terça-feira, 7 de maio de 2019

Ingerência neofascista no MEC pode parar Hospitais Universitários e comprometer vidas, por Ergon Cugler



Enquanto a ingerência toma conta do Governo Federal e a Sociedade do Espetáculo alimenta o populismo do presidente, resta apenas a mobilização ampla da sociedade



Famílias sofrem com falta de leitos no Hospital Universitário de Campo Grande Foto: Reprodução TV Morena

Ingerência no MEC pode parar Hospitais Universitários e comprometer vidas

por Ergon Cugler

Após a saga anunciada pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, no fim de abril (26) com objetivo de “honrar o investimento do contribuinte através do retorno imediato”, foram apresentadas propostas como a de descentralizar recursos dos cursos de Filosofia e Sociologia, contingenciar verbas para universidades que promoverem “balbúrdia” (30) e mesmo congelar 30% dos recursos de todas Universidades Federais do país, já em maio (03).

Desmonte da educação

Na contramão do discurso de remanejar recursos do ensino superior para a educação básica, o levantamento da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil (ANDIFES) mostra que todos setores sofreram bruscos cortes do Ministério da Educação (MEC), mas a própria educação básica teve a maior perda, com 39,68% de seus recursos bloqueados, representando quase R$ 2.5 bilhões a menos para a manutenção de escolas e insumos básicos [ Estadão ].
Apesar do evidente desmonte da educação básica, os Institutos Federais e as Universidades Federais não escaparam do contingenciamento de Weintraub, as quais tiveram, respectivamente, 34,54% e 25,38% de recursos bloqueados, totalizando uma redução de R$ 11,97 bilhões para apenas R$ 8,66 bilhões aos campus pelo país.
O levantamento da ANDIFES ainda aponta [ Estadão ] o congelamento de recursos defendidos pelo próprio presidente Jair Bolsonaro (PSL) durante sua campanha, tal como o ensino técnico e a educação a distância, todo o recurso previsto para o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico (Pronatec), R$ 100,45 milhões, está bloqueado. O Mediotec, ação para que alunos façam ao mesmo tempo o ensino médio e técnico, tem retidos R$ 144 milhões de R$ 148 milhões.
A cruzada do MEC contra o inimigo imaginário do aparelhamento ideológico de doutrinação marxista na educação ainda colocou em xeque o Programa de Financiamento Estudantil (FIES), que garante o acesso às universidades privadas, reduzindo seus recursos em mais de 20% e bloqueando R$ 1.12 bilhões dos R$ 12,96 bilhões necessários para a manutenção do programa e mesmo a CAPES, responsável por financiar grande parte da pesquisa científica do país, a qual sofreu um corte de quase 14% de seu orçamento, com menos R$ 813,34 milhões dos 3.89 bilhões atuais.

Ingerência que compromete vidas

Os impactos da polarização da eleição constituíram um presidente que se sustenta através de distribuição de agrados à sua base eleitoral – a tornando fiel e enraizando a radicalização – onde, mesmo sabendo que os 10.000 estudantes atualmente matriculados em Filosofia e Sociologia não impactam em 2% do orçamento global da educação, expô-los na mídia traz maior fidelização da mesma base que o sustenta.
Ocorre que, diante de toda urgência e contingenciamento de recursos, os impactos dos agrados de Bolsonaro à sua base eleitoral ao combater o inimigo imaginário podem ainda comprometer vidas ao limitar a atuação dos Hospitais Universitários ligados à Universidades Federais, referências internacionais de média e alta complexidade através do Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo a Reitora Sandra Regina Goulart Almeida, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), “[…] não há eficiência administrativa que supere um corte de tamanho monte, principalmente diante das sucessivas restrições orçamentárias dos últimos anos” [ El País ].
Atualmente, as 50 unidades de Hospitais Universitários vinculadas a 35 universidades [ MEC ] já atuam com desfalque orçamentário e demandas por equipamentos desde 2018 [ G1 ], tamanha crise e preocupação se evidenciam através de depoimentos de reitores em todas regiões do país. Somam-se ao discurso, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade de Brasília (UNB), a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) [ El País ], que já manifestaram grande preocupação acerca da manutenção de seus programas de extensão universitária e principalmente do funcionamento do Hospital Universitário.
Luís Antonio Pasquetti, presidente da Associação dos Docentes da UnB (ADUnB), destaca a preocupação que a asfixia orçamentária gera para o funcionamento da universidade como um todo,“[…] laboratórios vão ficar sem material, pesquisas podem ser paralisadas. E a UnB tem um hospital veterinário, tem o HUB (Hospital Universitário de Brasília), tem uma série de serviços pra sociedade […]”, diz.
Enquanto a ingerência toma conta do Governo Federal e a Sociedade do Espetáculoalimenta o populismo do presidente, resta apenas a mobilização ampla da sociedade que ultrapasse as paredes da universidade e garanta diálogo com usuários dos Hospitais Universitários, familiares de estudantes beneficiados por programas de financiamento e permanência estudantil, moradores que se relacionam com projetos de extensão nos mais diversos cenários das universidades brasileiras e de quem minimamente compreenda a importância da educação para se transformar a realidade.
Torna-se central popularizar e romper o esteriótipo da ciência e do ensino superior, trazendo a disputa para este campo ao agarrar-se no que é material e concreto no dia a dia das pessoas, pois somente tornando ambos próximos da realidade do povo que então o povo irá encampar sua defesa – seja contra a cobrança de mensalidade nas universidades públicas, na valorização da ciência e pesquisa nacional, ou mesmo da não-perseguição à profissão dos professores.
Tamanha irresponsabilidade imantada pela capa de combate à doutrinação marxistaultrapassa a disputa de narrativa e o estabelecimento da correlação de forças entre personagens da política e passa a comprometer vidas, ao reduzir leitos e equipamentos necessários para a preservação da vida. Contraditoriamente, o combate à ideologia que Bolsonaro se orgulha em pregar enraizou-se enquanto ideologia que carregará a mancha de vidas que serão perdidas por ingerência e populismo.

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