Digamos que Cristo represente no quadro de Bosch a democracia.
Ele carrega a cruz que lhe foi posta nos ombros pelos que não suportam seu ideal de amor e justiça social para com os pobres, as mulheres, os excluídos em geral. Então ele vai ser crucificado porque assim decidiram esses homens da lei acima representados. Na imagem, os donos do poder fazem pensar no nosso momento brasileiro: deputados, juízes, jornalistas que respondem como sacerdotes da igreja midiática na grande missa negra que se tornou o jornal nacional e outros rituais de extermínio televisivo que incitam ao ódio como demônios disfarçados de gente de bem.
Perdoem-me se a interpretação soa forte demais, mas minha intenção é apenas fazer pensar. Nossos deputados, juízes e jornalistas parecem, no momento, “eunucos pelo reino de Deus”: poder e capital.
A cruz é o autoritarismo, a covardia, o estado de exceção, a maldade, a perversão política, a crueldade do poder que quer se perpetuar a qualquer custo. Nesse momento às custas da democracia. Esse poder é eunuco, mas também estuprador político de nossa presidenta – mulher – e também, por isso, estamos estarrecidos.
Em dias como hoje todos os que confiam na democracia, mesmo aqueles que são ateus, sentem-se meio Cristos carregando essa cruz.
Ao redor, esses homens que não representam ninguém, somente sua própria feiura, nos fazem pensar. Enquanto isso, manipulam a cruz, pensando que ninguém perceberá seu peso.
Os nomes dos personagens na imagem acima poderiam ser marcados como em uma foto de facebook. Mas não precisamos dizê-los.
Dizem que quando você pronuncia o nome do diabo ele aparece. E não seria bom ter companhias ainda piores nesse momento em que devemos nos fortalecer para enfrentar 180 dias no deserto.
Lutemos pela ressurreição do corpo democrático. Quebremos essa cruz do golpe fortalecendo a democracia com amor, com esperança, com as redes socias e com as ruas.
O reino da democracia precisa ser construído por cada um junto com os mais próximos. Movimentos sociais são um bom lugar para estar nesse momento.
Texto de Marcia TIburi, extraído da Revista Cult
Marcia Tiburi é filósofa
Marcia Tiburi é graduada em filosofia e artes e mestre e doutora em filosofia. Publicou diversos livros de filosofia, entre eles “As Mulheres e a Filosofia” (Ed. Unisinos, 2002), Filosofia Cinza – a melancolia e o corpo nas dobras da escrita (Escritos, 2004); “Mulheres, Filosofia ou Coisas do Gênero” (EDUNISC, 2008), “Filosofia em Comum” (Ed. Record, 2008), “Filosofia Brincante” (Record, 2010), “Olho de Vidro” (Record 2011), “Filosofia Pop” (Ed. Bregantini, 2011) e Sociedade Fissurada (Record, 2013). Publicou também romances: Magnólia (2005), A Mulher de Costas (2006) e O Manto (2009), Era meu esse Rosto (Record, 2012). É autora ainda dos livros Diálogo/desenho, Diálogo/dança, Diálogo/Fotografia e Diálogo/Cinema (ed. SENAC-SP).
É professora do programa de pós-graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Mackenzie e colunista da revista Cult.
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