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quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Tereza Cruvinel sobre a denúncia, ainda que tardia, de Janot sobre as "coações" e "intimidações" em proveito próprio de Cunha e o voto desconcertante de Fachin a favor de suas manobras

   "Se antes de o procurador-geral Rodrigo Janot pedir o afastamento de Eduardo Cunha do mandato de deputado federal e da presidência da Câmara, eram fortes as previsões de que a maioria dos ministros seguiria o voto do relator, a nova variável pode influenciar hoje a continuidade do julgamento, pelo menos em alguns pontos relacionados com os procedimentos ditados por Cunha." - Tereza Cruvinel

Texto de Tereza Cruvinel, retirado de seu blog:

José Cruz/Agência Brasil: <p>Brasília - Ministro Edson Fachin, durante sessão do Supremo Tribunal Federal para julgar como deve ser o rito de tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso (José Cruz/Agência Brasil)</p>

Quando pensamos que a crise política chegou atingiu seu clímax, ela consegue se agravar mais. Agora, ela vai mesmo testar os limites da democracia brasileira. A quarta-feira foi boa para oposição, que pode ter o processo de impeachment legitimado e ainda se livrar de Eduardo Cunha. Foi ruim para o governo, que perdeu toda as apostas jurídicas no STF. E foi péssima para o Brasil, que sofreu mais um rebaixamento de rating e tem um ministro da Fazenda que parece estar no cargo apenas para não piorar as coisas.

O voto proferido pelo ministro Luiz Fachin sobre as regras do processo de impeachment deixou a oposição eufórica e os governistas perplexos. Afinal, se o ministro achava que estava tudo certo no rito imposto por Eduardo Cunha, nem precisava ter concedido a liminar que suspendeu a instalação da comissão especial. Só há uma explicação, como disse o cientista político Fernando Abrucio, para seu voto desconcertante em algumas questões: “acredito que no fundo a preocupação dele foi reduzir a ingerência do Supremo para garantir a independência entre os poderes”.

A convalidação da votação secreta para a escolha dos integrantes da comissão especial foi o que mais chocou os políticos, especialmente os senadores, como disse ao 247 o senador Otto Alencar (PSD-BA): “O ministro Luiz Edson Fachin, no caso da votação do Senado para relaxar ou manter a prisão do senador Delcídio do Amaral, decidiu por votação aberta. Agora, ao manifestar o seu voto, na ação que questiona as regras para processar a presidente Dilma Rousseff, decidiu pela votação secreta. No meu ponto de vista são situações praticamente idênticas mas as decisões foram diferentes”.

Pode mesmo o ministro ter adotado posições distintas e contraditórias, neste caso, movido pela preocupação com os limites do sistema. Mas, se antes de o procurador-geral Rodrigo Janot pedir o afastamento de Eduardo Cunha do mandato de deputado federal e da presidência da Câmara, eram fortes as previsões de que a maioria dos ministros seguiria o voto do relator, a nova variável pode influenciar hoje a continuidade do julgamento, pelo menos em alguns pontos relacionados com os procedimentos ditados por Cunha.

Ainda esta semana, segundo fontes do STF, o plenário do tribunal examinará o pedido de Janot, sobre o qual o ministro Teori, relator da Lava Jato, não decidirá sozinho. O caso é grave demais e cria um precedente nunca havido de intervenção do Judiciário no Legislativo, apesar da força dos argumentos apresentados por Janot em seu pedido de medida cautelar ao STF.

E hoje, os mesmos ministros que em breve vão decidir pelo afastamento ou não de Cunha, que representaria um perigo para a ordem pública e as investigações em curso, dirão se consideram corretas, como Fachin, todas as medidas ditada por ele no processo de impeachment. Mais objetivamente, como sancionar os ritos de Cunha e depois afastá-lo da Câmara por abuso do mandato e do cargo em interesse próprio, ao ponto de acolher o pedido de impeachment em retaliação ao PT por ter anunciado que votaria contra ele no Conselho de Ética? Por mais cartesianos que sejam, os ministros do STF têm pela frente este dilema. Se ele não é jurídico, é pelo menos moral.

Ao decidirem sobre Eduardo Cunha, os ministros pensarão na independência entre os poderes mas vão se lembrar também de que, caso o TSE venha a cassar a chapa Dilma-Temer, uma possibilidade que também existe, o sucessor será justamente Eduardo Cunha, se continuar sendo presidente da Câmara. Esta não é uma consideração jurídica mas deve ser política e moral.

Ao final da longa quarta-feira em que aconteceu tudo isso - o novo rebaixamento do Brasil (após mais uma trapalhada orçamentária do Governo), o voto desconcertante de Fachin e o tardio pedido de afastamento de Eduardo Cunha por Janot – o presidente do Senado Renan Calheiros informou que haverá recesso sim. Alegou que é preciso “baixar a temperatura política”, embora alguns tenham visto nisso uma primeira reação à Operação Catilinária da Lava Jato, que o poupou mas atingiu seu entorno. O Governo não consegue poupar nem Lula mas os peemedebista estão sempre achando ou fingindo achar que são perseguidos por ordem palaciana. Como se o Planalto tivesse algum poder sobre a República dos juízes, procuradores e delegados de Curitiba, que de fato regem a dinâmica da crise. Fato é que haverá haverá recesso e isso significa que tudo ficará para fevereiro. O Congresso fechará as postas, o STF também e ficaremos todos entregues às reações do mercado a este nó político que não se desata. Termino com a mesma previsão de ontem. Vem aí o verão da incerteza. E não só o verão pois nada indica um desfecho antes de março/abril.

Leia Também: Críticas ao voto do Fachin (Paulo Henrique Amorim)

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