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quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Para uma Reflexão de Ano Novo, John Lennon cantando Imagine ao vivo, em 18 de abril de 1978.... Para nos fazer ver que houve um tempo em que havia pensamento, poesia e maior profundidade nas canções...



Vídeo raro onde o ex-Beatle John Lennon (1940-1980) canta uma das mais belas obras poéticas contra a exclusão, o preconceito, o ódio de classe e a alienação e à favor da fraternidade, igualdade, irmandade e reconhecimento de nossa raça humana comum.... Para uma reflexão de Ano Novo....



Imagine
Imagine there's no heaven
It's easy if you try
No hell below us
Above us only sky

Imagine all the people
Living for today

Imagine there's no countries
It isn't hard to do
Nothing to kill or die for
And no religion too

Imagine all the people
Living life in peace

You may say, I'm a dreamer
But I'm not the only one
I hope someday you'll join us
And the world will be as one

Imagine no possessions
I wonder if you can
No need for greed or hunger
A Brotherhood of man

Imagine all the people
Sharing all the world

You may say, I'm a dreamer
But I'm not the only one
I hope someday you'll join us
And the world will live as one
Imagine
Imagine não haver o paraíso
É fácil se você tentar
Nenhum Inferno abaixo de nós
Acima de nós, só o céu

Imagine todas as pessoas
Vivendo o presente

Imagine que não há nenhum país
Não é difícil imaginar
Nenhum motivo para matar ou morrer
E nem religião, também

Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz

Você pode dizer que eu sou um sonhador
Mas eu não sou o único
Espero que um dia você junte-se a nós
E o mundo será como um só

Imagine que não ha posses
Eu me pergunto se você pode
Sem a necessidade de ganância ou fome
Uma irmandade dos homens

Imagine todas as pessoas
Partilhando todo o mundo

Você pode dizer que eu sou um sonhador
Mas eu não sou o único
Espero que um dia você junte-se a nós
E o mundo viverá como um só



Quando capitalismo não rima com democracia, por Michael Lowy




Para pensamento político tradicional, dois conceitos são complementares. Mas Europa demonstra algo que Max Weber já intuia: liberdade não pode florescer sob leis de mercado
Por Michael Löwy | Tradução: Gabriela Leite  Fonte: Outras Palavras
Vamos começar com uma citação de um ensaio sobre a democracia burguesa na Rússia, escrita em 1906, após a derrota da primeira revolução, de 1905:
“É profundamente ridículo acreditar que existe uma afinidade eletiva entre o grande capitalismo, da maneira como atualmente é importado para a Rússia, e bem estabelecido nos Estados Unidos (…), e a ‘democracia’ ou ‘liberdade’ (em todos os significados possíveis da palavra); a questão verdadeira deveria ser: como essas coisas podem ser mesmo ‘possíveis’, a longo prazo, sob a dominação capitalista?” [1]
Quem é o autor deste comentário perspicaz? Lenin, Trotsky ou, talvez, Plekhanov? Na verdade, ele foi feito por Max Weber, o conhecido sociólogo burguês. Apesar de Weber nunca ter desenvolvido essa ideia, ele está sugerindo aqui que existe uma contradição intrínseca entre o capitalismo e a democracia.
A historia do século XX parece confirmar essa opinião: em muitos momentos, quando o poder da classe dominante pareceu ameaçado pelo povo, a democracia foi jogada de lado como um luxo que não pode ser mantido, e substituída pelo fascismo — na Europa, nos anos 1920 e 1930 — ou por ditaduras militares, como na América Latina, entre os anos 1960 e 1970.
Por sorte, esse não é o caso da Europa atual, mas temos, particularmente nas últimas décadas, com o triunfo do neoliberalismo, uma democracia de baixa intensidade, sem conteúdo social, que se reduziu a uma concha vazia. É claro que ainda temos eleições, mas elas parecem ser de apenas um partido, o PMU, Partido do Mercado Unido, com duas variantes que apresentam diferenças limitadas: a versão de direita neoliberal e a de centro-esquerda social liberal.
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O declínio da democracia é particularmente visível no funcionamento oligárquico da União Europeia, onde o Parlamento Europeu tem muito pouca influência, enquanto o poder está firmemente nas mãos de corpos não eleitos, como a Comissão Europeia ou o Banco Central Europeu. De acordo com Giandomenico Majone, professor do Instituto Europeu de Florença, e um dos teóricos semioficiais da UE, a Europa precisa de “instituições não-majoritárias”. Ou seja, “instituições públicas que, propositalmente, não sejam responsáveis nem diante dos eleitores, nem de seus representantes eleitos”: essa é a única maneira de nos proteger contra “a tirania da maioria”. Em tais instituições, “qualidades tais quais expertise, discrição profissional e coerência (…) são muito mais importantes que a responsabilidade democrática e direta” [2]. Seria difícil imaginar uma desculpa mais descarada da natureza oligárquica e antidemocrática da UE.
Com a crise atual, a democracia decaiu a seus níveis mais baixos. Em um recente editorial, o jornal francês Le Figaro escreveu que a situação é excepcional, e explica por que os procedimentos democráticos não podem ser sempre respeitados; apenas quando voltarmos aos tempos normais, poderemos restabelecer sua legitimidade. Temos, então, um tipo de “estado de exceção” econômico/político, no sentido que descreveu Carl Schmitt. Mas quem é o soberano que tem o direito de proclamar, de acordo com Schmitt, o estado de exceção?
Por algum tempo, entre 1789 e a proclamação da República Francesa, em 1792, o rei teve o direito constitucional de veto. Não importavam as resoluções da Assembleia Nacional, ou quaisquer que fossem os desejos e aspirações do povo francês: a última palavra pertencia a Sua Majestade.
Na Europa de hoje, o rei não é um Bourbon ou Habsburgo: o rei é o Capital Financeiro. Todos os atuais governos europeus — com a exceção do grego! — são funcionários deste monarca absolutista, intolerante e anti-democrático. Quer sejam de direita, “extremo-centro” ou pseudoesquerda, quer sejam conservadores, democratas cristãos ou social-democratas, eles servem fanaticamente ao poder de veto de Sua Majestade.
O soberano absoluto e total hoje, na Europa, é, no entanto, o mercado financeiro global. Os mercados financeiros ditam a cada país os salários e aposentadorias, os cortes em despesas sociais, as privatizações, a taxa de desemprego. Há algum tempo, eles nomeavam diretamente os chefes de governo (Lucas Papademos na Grécia e Mario Monti na Itália), escolhendo os chamados “experts”, que eram servos fiéis.
Vamos olhar mais atentamente a alguns desses tais todos-poderosos “experts”. De onde eles vêm? Mario Draghi, chefe do Banco Central Europeu, é um antigo administrador do banco internacional de investimentos Goldman Sachs; Mario Monti, ex Comissário Europeu, também é um antigo conselheiro da Goldman Sachs. Monti e Papademos são membros da Comissão Trilateral, um clube muito seleto de políticos e banqueiros que discutem estratégias internacionais. O presidente desta comissão é Peter Sutherland, antigo Comissário Europeu, e antigo administrador no Goldman Sachs; o vice-presidente, Vladimir Dlouhr, antigo Ministro da Economia tcheco, é agora conselheiro na Goldman Sachs para a Europa Oriental. Em outras palavras, os “experts” que comandam a “salvação” da Europa da crise foram funcionários de um dos bancos diretamente responsáveis pela crise financeira iniciada nos Estados Unidos, em 2008. Isso não significa que existe uma conspiração para entregar a Europa à Goldman Sachs: apenas ilustra a natureza oligárquica dos “experts” de elite que comandam a UE.
Os governos da Europa estão indiferentes aos protestos públicos, greves e manifestações maciças. Não se importam com a opinião ou os sentimentos da população; estão apenas atentos — extremamente atentos — à opinião e sentimentos dos mercados financeiros e seus funcionários, as agências de avaliação de risco. Na pseudodemocracia europeia, consultar o povo em um referendo é uma heresia perigosa, ou pior, um crime contra o Deus Mercado. O governo grego, liderado pelo Syriza, a Coalizão da Esquerda Radical, foi o único que teve coragem para organizar tal consulta popular.
O referendo grego não tinha apenas a ver com questões fundamentais econômicas e sociais, foi também e acima de tudo sobre democracia. Os 61,3% de gregos que disseram não são uma tentativa de desafiar o veto real das finanças. Esse poderia ter sido o primeiro passo em direção à transformação da Europa, de monarquia capitalista a república democrática. Mas as atuais instituições da oligarquia europeia têm pouca tolerância à democracia. Imediatamente puniram o povo grego por sua tentativa insolente de recusar a austeridade. A “catastroika” está de volta à Grécia com uma vingança, impondo um programa brutal de medidas economicamente recessivas, socialmente injustas e humanamente insustentáveis. A direita alemã fabricou este monstro, e forçou ao povo grego com a cumplicidade de falsos “amigos” da Grécia (entre outros, o presidente francês, François Hollande, e o primeiro-ministro da Itália Matteo Renzi).
* * *
Enquanto a crise agrava-se, e o ultraje público cresce, existe uma crescente tentação, por parte de muitos governos, de distrair a atenção pública para um bode expiatório: os imigrantes. Deste modo, estrangeiros sem documentos, imigrantes de países não-europeus, muçulmanos e ciganos estão sendo apresentados como a principal ameaça aos países. Isso abre, é claro, enormes oportunidades para partidos racistas, xenófobos, semi ou completamente fascistas, que estão crescendo, e já são, em muitos países, parte do governo — uma ameaça muito séria à democracia europeia.
A única esperança é a crescente aspiração por uma outra Europa, que vá além das políticas de competição selvagem e austeridade brutal, e das dívidas eternas a serem pagas. Outra Europa é possível — um continente democrático, ecológico e social. Mas não será alcançado sem uma luta comum das populações europeias, que ultrapasse as barreiras étnicas e os limites estreitos do Estado-nação. Em outras palavras, nossa esperança para o futuro é a indignação popular, e os movimentos sociais, que estão em ascensão, particularmente entre os jovens e mulheres, em muitos países. Para os movimentos sociais, está ficando cada vez mais óbvio que a luta pela democracia é contra o neoliberalismo e, em última análise, contra o próprio capitalismo, um sistema antidemocrático por natureza, como Max Weber já apontou, cem anos atrás.
[1] Max Weber, «Zur Lage der bürgerlichen Demokratie in Russland»,Archiv für Sozialwissenschaft und Sozialpolitik,     Band 22, 1906, Beiheft, p. 353.
[2] Citado in Perry Anderson, Le Nouveau Vieux Monde, Marseile, Agone, 2011, pp. 154,158.

As duas maneiras de ler a Operação Lava Jato, para além do que indica o vazamento seletivo de informações... por Luis Nassif



Texto de Luís Nassif

Encontrado no Jornal GGN e no Contexto Livre

Há duas maneiras de ler a Lava Jato: pelas manchetes e pelas entrelinhas.

Já que as manchetes são óbvias, vamos a uma releitura através das entrelinhas do que saiu publicado nos últimos dias.

* * *

O repórter policial da Folha, Frederico Vasconcellos, divulgou trechos de um trabalho de Ségio Moro de 2004, sobre a Operação Mãos Limpas, da Itália. Já havia sido divulgado e analisado no Blog há tempos. Como é repórter policial, restringiu-se aos abusos para-legais analisados por Moro na Mãos Limpas, e vistas por ele como imprescindíveis para a Lava Jato. Tipo, em linguagem policial: tem que manter o suspeito na prisão o máximo de tempo possível afim de que ele abra o bico.

* * *

Mais sofisticado, o colunista Mário Sérgio Conti aborda outros ângulos do trabalho, exaustivamente discutidos no Blog. Um deles, o uso desabusado da imprensa, através do vazamento de notícias visando comandar a pauta.

Aborda também os aspectos geopolíticos da cooperação internacional — a rede internacional de autoridades de vários países, montada inicialmente para o combate à narcotráfico e ao terrorismo e, depois, estendida para outras atividades ilícitas, sob controle estrito das autoridades norte-americanas.

* * *

Aqui, mostramos claramente que a cooperação internacional tornou-se uma peça da geopolítica norte-americana, visando impedir concorrência desleal de empresas de outros países contra as americanas.

Conti faz uma baita ginástica para a conclusão óbvia: na cooperação internacional, os Estados Unidos entram com motivação econômica. O óbulo: "Para os toscos,  é um garrote vil do imperialismo norte-americano". Para ele, que é sofisticado, "a corrupção beneficia as burguesias locais, mormente (sic) de países periféricos, em detrimento da classe dominante do Império". E justifica como um gesto de auto-defesa dos EUA — aquele país cujas ferramentas de espionagem não pouparam sequer presidentes de nações amigas.

* * *

Pelo conteúdo, o artigo foi montado em cima de entrevistas com membros da Lava Jato, que admitem o jogo. Segundo eles, "admite-se que a motivação americana (e não apenas ela) tem boa dose de mercantilismo". Mas, no frigir dos ovos, acreditam que seja benigna, pois "ajuda o Brasil a resolver seus problemas".

A maneira como as corporações norte-americanas instrumentalizam suas instituições torna o Brasil um peixe fácil. É para ajudar o Brasil a resolver seus problemas que a Lava Jato tratou de criminalizar financiamentos à exportação de serviços, que o MPF tenta a todo custo envolver o BNDES e espalhar suspeitas sobre ações diplomáticas na África.

Nem se culpe juiz, procuradores e delegados. Eles apenas se valem de forma oportunista da fragilidade institucional brasileira, da visão rala de interesse nacional, de uma presidente politicamente inerte e de um Ministro da Justiça abúlico para ocupar espaços.

* * *

A manipulação da mídia ficou clara em um episódio ocorrido ontem. Nos depoimentos, qualquer menção a Lula é vazado no mesmo dia.

Ontem, o repórter Rubens Valente, da Folha — que não pertence ao circuito mídia-Lava Jato — levantou o depoimento de um delator apontando propinas a Aécio Neves. É de junho passado. Passou seis meses inédito.

No período da tarde, a Lava Jato tratava de vazar correndo outro depoimento, indicando pagamento de propinas ao presidente do Senado Renan Calheiros, a um senador da Rede, Randolfo Rodrigues.

* * *

Todo dia o procurador Deltan Dallagnol aparece em sua campanha pelos 10 pontos a serem alterados na lei para combate à corrupção.

Se fosse uma campanha efetivamente isenta, o 11º ponto seria a obrigação do Procurador Geral da República e do Supremo Tribunal Federal (STF) de abrir os dados em relação a todo pedido de vista ou todo inquérito engavetado. E de se criar formas que impeçam o uso político do vazamento seletivo de inquéritos.

No STF, o ex-Ministro Ayres Britto engavetou por dez anos, sem nenhuma explicação, o inquérito sobre o mensalão mineiro. Tinha que apresentar em uma sessão, foi tomar um café no intervalo, e na volta simplesmente deixou de falar sobre o inquérito.

Do mesmo modo, desde 2010 dorme na gaveta do PGR um inquérito contra Aécio Neves, acusado de ter conta no paraíso fiscal de Liechtenstein em nome de uma offshore. Como o próprio Procurador Geral observou, na denúncia contra Eduardo Cunha, o uso de offshores visa esconder a verdadeira identidade dos titulares da conta. E se visa esconder, é porque o dinheiro é de procedência duvidosa.

* * *

De fato, o país precisa ser passado a limpo. E a Lava Jato tem feito um trabalho completo de desvendar as maracutaias de um lado. Mas esconde e blinda os malfeitos do outro lado.

Se ataca só um lado — a ponto de deixar por um fio o mandato de uma presidente inerte — e poupa o outro, é evidente que instrumentaliza o combate à corrupção em favor de interesses corporativos e políticos.

Essa hipocrisia não pode perdurar muito, ainda mais em um ambiente de redes sociais.


quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Leonardo Boff: O ano nefasto de 2015 não invalida a esperança de um novo ano propício




"Ocorreram várias calamidades nesta nesta ano de 2015. A primeira delas é o Dia da Sobrecarga ou da Ultrapassagem da Terra (Earth Overshoot Day) ocorrido no dia 13 de setembro. Isto significa: neste dia a Terra revelou que seu estoque de suprimentos para manter sistema-vida o sistema-Terra ultrapassou os limites. Ela perdeu sua biocapacidade. A Terra é o pressuposto de todos os nossos projetos. Como a Terra é um Super-ente vivo, os sinais que nos envia de que não aguenta mais, são as secas, as enchentes, os tufões e o aumento da violência no mundo. Tudo está ligado a tudo, como nos repete insistentemente o Papa Francisco em sua encíclica" - Leonardo Boff


O Annus nefastus de 2015 não invalida a esperança de um annus propicius



texto de Leonardo Boff


O ano que acaba de 2015 merece esta qualificação latina: annus nefastus. Outros o chamam de annus horribilis. Ocorreram tantas calamidades que além de espanto nos causam preocupações.Nâo obstante tudo isso esperamos pelo irromper do annus propicius.
A primeira delas é o Dia da Sobrecarga ou da Ultrapassagem da Terra (Earth Overshoot Day) ocorrido no dia 13 de setembro. Isto significa: neste dia a Terra revelou que seu estoque de suprimentos para manter sistema-vida o sistema-Terra ultrapassou os limites. Ela perdeu sua biocapacidade. A Terra é o pressuposto de todos os nossos projetos. Como a Terra é um Super-ente vivo, os sinais que nos envia de que não aguenta mais, são as secas, as enchentes, os tufões e o aumento da violência no mundo. Tudo está ligado a tudo, como nos repete insistentemente o Papa Francisco em sua encíclica.
Associado a este fato, é ilusório o consenso alcançado no dia 12 de dezembro com a COP21 em Paris: o aquecimento deveria ficar abaixo de 2º Celsius rumando para 1,5º até o fim do século. Isso implica uma troca de paradigma de civilização não mais baseado em combustíveis fósseis, sabendo que todas as energias alternativas juntas não chegam a 30% do que precisamos. Essa conversão, as grandes  petroleiras e os fornecedores de gás e carvão não têm condições de fazer, nem a querem. A ideia é retórica e a promessa vazia.
O terceiro evento nefasto é a violência terrorista na Europa, na África, os milhares de refugiados e a guerra que as potências militaristas, todas juntas, movem contra o Estado Islâmico e contra outros grupos armados na Síria. Os médio-orientais as interpretam como prolongamento das antigas cruzadas. Fontes seguras nos atestam a vitimação de milhares de civis inocentes.
Outro evento nefasto é a transformação dos EUA, depois dos atentados contra as Torres Gêmeas, num estado terrorista. Com suas 800 bases militares distribuídas no mundo inteiro, intervém, direta ou indiretamente, lá onde percebem seus interesses imperiais ameaçados. Internamente, o “ato patriótico”não foi abolido e representa a suspensão de direitos fundamentais. Não é sem razão que a polícia americana matou em 2015 cerca de mil pessoas desarmadas, 60% das quais eram negros ou latinos.
Outro fato horribilis é a corrupção na Petrobrás em altíssimo nível e em conseqüência o surgimento de uma onda de ódio, de raiva e de decepção especialmente depois das eleições presidenciais de 2014. Não é de se admirar, pois o Brasil é cheio de contrastes, como o viu bem Roger Bastide (Brésil, terre des contrastes, Hachette 1957) mas antes dele Gilberto Freyre que escreveu:”considerado em seu conjunto, a formação brasileira foi um processo de equilíbrio entre antagonismos”.
Esse antagonismo, quase sempre mantido sob o manto ideológico do “homem cordial”, saiu do armário agora e se mostra claramente de modo particular pela mídia social. A expressão “homem cordial” que Sergio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil, 21. Ed., 1989,p.101-112) tomou emprestado do escritor Ribeiro Couto, é geralmente muito mal compreendida. Não tem nada a ver com a civilidade e polidez. Tem a ver sim com a nossa aversão aos ritos sociais e aos salameleques; somos pela informalidade e a proximidade.
Trata-se de um comportamento brasileiro que se rege antes pelo coração do que pela razão. Ora, do coração nasce a gentileza e a hospitalidade. Mas como bem acentua Buarque de Holanda:”a inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade nisto que uma e outra nascem do coração”(nota de rodapé 157 da p. 106-107).
Esse equilíbrio frágil se perdeu em 2015 e irrompeu a cordialidade negativa como ódio, preconceito e raiva contra militantes do PT, contra nordestinos e negros. Nem as figuras constitucionalmente respeitáveis como a Presidenta Dilma Rousseff foi poupada. A internet abriu as portas do inferno da injúria, do palavrão, da ofensa direta das pessoas, umas contra as outras.
Tais expressões apenas revelam nosso atraso educacional, a ausência de cultura democrática, a intolerância e a luta de classes. Não se pode negar que se verificou, em certos setores, raiva contra os pobres e contra os que ascenderam socialmente, graças às politicas sociais compensatórias (mas pouco emancipatórias) do governo do PT. Os antagonismos brasileiros se mostraram claramente, não harmonizados e agora de rédeas soltas, uns contra os outros, em verdadeira luta (chamem de classes, de interesses, de poder, não importa). Mas há uma ruptura social no Brasil que nos custará muito para costurá-la. No meu entendimento, só a partir de uma real democracia participativa que vá além da atual delegatícia e farsesca, pois representa antes os interesses dos grupos beneficiados do que os do povo como um todo.
O que nos vale é a nossa superabundância de esperança que supera o annus nefastus na direção de umannus propicius. Que Deus nos ouça.
Leonardo Boff é articulista do JB on line e escritor

A conscientização sobre a pobreza e a mudança climática, finalmente

Do El País:

Este ano deverá ser lembrado como o ponto de inflexão histórico na luta contra esses dois grandes males 




Desenvolvimento urbanístico junto ao deserto, em Cathedral City, Califórnia, em plena seca.  NYT
Este ano será lembrado pelos importantes avanços que foram obtidos mediante a cooperação internacional para o enfrentamento de dois desafios basilares de nossa geração: a erradicação dapobreza e a luta contra a mudança climática.



Em julho, países ricos e pobres se reuniram em Adis Abeba (Etiópia) para a Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento do Desenvolvimento. Os representantes governamentais admitiram que muito se avançou desde a primeira conferência, realizada em Monterrey (México) em 2002, mas que continuam existindo enormes desafios em muitos lugares do mundo, especialmente na África subsaariana.
Foi muito decepcionante que muitos países ricos não tenham respeitado o compromisso assumido em Monterrey de investir 0,7% de seu Produto Interno Bruto na ajuda internacional aos países pobres. Muito poucos países alcançaram este objetivo, e isso deveria provocar uma grande vergonha aos Governos que não cumpriram a promessa feita aos povos mais pobres do mundo.
Mas no encontro de Adis Abeba tomou-se consciência da escala dos esforços necessários para atingir o objetivo de erradicar a pobreza e a fome, e para se obter um desenvolvimento sustentável mediante o fomento do crescimento econômico inclusivo, da proteção ao meio ambiente e do aumento da inclusão social.
A conscientização coletiva sobre este desafio e o compromisso dos países ricos no sentido de incrementar a ajuda internacional assentaram as bases do acordo alcançado em setembro na Assembleia Geral das Nações Unidas. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030, e um conjunto de 169 propósitos relacionados a eles, pretendem lutar contra a desigualdade, o consumo e as formas de produção insustentáveis, a infraestrutura deficiente e a falta de trabalho digno em todos os países do mundo.


Foi decepcionante que muitos países ricos não tenham respeitado o compromisso assumido em Monterrey de investir 0,7 % de seu PIB na ajuda internacional aos países pobres

Enquanto os diferentes países trabalham duro na elaboração do novo plano de desenvolvimento sustentável, também levam adiante as iniciativas para enfrentar os enormes perigos da mudança climática, completando um processo iniciado há quatro anos em Durban (África do Sul).
Em dezembro de 2011, os Governos concordaram, na reunião anual das Nações Unidas sobre a mudança climática, em trabalhar para alcançar um novo pacto em 2015. Até o fim de 2014, tinham sido produzido avanços lentos, mas este ano era necessário acelerar o processo. Por sorte, alguns acontecimentos contribuíram para que as negociações internacionais chegassem a bom porto.
Em novembro de 2014, o presidente Xi Jinping e o presidente Barack Obama, dirigentes da China e Estados Unidos, respectivamente, que são os maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo, assinaram uma declaração conjunta que propunha novos compromissos para reduzir e limitar as emissões anuais a partir de 2020. Isso persuadiu mais de 180 países a se comprometer também, com vistas à reunião das Nações Unidas sobre mudança climática, prevista para dezembro deste ano em Paris.
As negociações entre os diferentes países se aceleraram em maio deste ano, quando o papa Francisco publicou o Laudato Si, sua encíclica sobre o meio ambiente e a ecologia humana. O papa combinava sua avaliação dos aspectos científicos e econômicos com um poderoso argumento moral a favor da luta contra a mudança climática, o que contribuiu para convencer muitos católicos, e sem dúvida a população em geral, sobre a necessidade de tomar medidas urgentes.
Quando chegou o momento de mais de 190 Governos se reunirem na COP21 em Paris, tinha sido gerado um impulso que propiciou um acordo verdadeiramente histórico, adotado em 12 de dezembro, para limitar o aquecimento do planeta muito abaixo dos 2 graus centígrados da temperatura pré-industrial.


Espero que este ano seja lembrado como um ponto de inflexão na história humana, quando se obteve uma vitória crucial na batalha contra a pobreza e a mudança climática

Uma das razões cruciais pelas quais o Acordo de Paris foi possível é que cada vez mais países se deram conta de que, para lutar contra a mudança climática, não é preciso sacrificar o crescimento econômico e o desenvolvimento. A transição para um nível baixo de emissões de carbono nos leva para um caminho de incrementar a qualidade de vida e erradicar a pobreza, que é mais atraente e emocionante que seu predecessor muito daninho, o das elevadas emissões de carbono.
Acredito e espero que este ano seja lembrado no futuro como um ponto de inflexão importante na história humana, quando se conseguiu uma vitória crucial na batalha contra a pobreza e a mudança climática, que trouxe mais prosperidade e bem-estar não só a nós, mas também a nossos filhos, netos e gerações futuras.
Nicholas Sterné presidente do Instituto Grantham de Pesquisa sobre Mudança Climática e Meio Ambiente, da Escola de Ciências Econômicas e Políticas de Londres, e presidente da Academia Britânica.

Mário Magalhães, jornalista e escritor, reflete a história da ação da Elite brasileira



Comentário de Dóris Stein a esta colocação de Mário Magalhães, via facebook: Vemos agora que não somos cordiais. Nunca fomos cordiais. Pelo menos a elite brasileira não é e tem dado mostras de que pode partir para violência para manter o status quo.

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

No Photoshop de “Veja” fabricam-se messianismos e oráculos. Texto de Alberto Dines, do Observatório da Imprensa



“Ele salvou o Ano!” — as quatro palavras acrescidas do eufórico ponto de exclamação servem para um goleiro ou goleador, campeão de natação ou maratonista, protagonista de telenovela, fotonovela ou graphic-novel (“Veja”, edição 2458).  


IMPRENSA EM QUESTÃO > A MARCHA DO TEMPO

No Photoshop de “Veja” fabricam-se messianismos e oráculos

Por Alberto Dines em 29/12/2015 na edição 883 do Observatório da Imprensa

“Ele salvou o Ano!” — as quatro palavras acrescidas do eufórico ponto de exclamação servem para um goleiro ou goleador, campeão de natação ou maratonista, protagonista de telenovela, fotonovela ou graphic-novel (“Veja”, edição 2458).
Mesmo sem óculos ele exibe algo do cândido e imbatível Clark Kent. Ao descobrir que o dono deste rosto desenhado por ângulos retos, talhado em criptonita e dono de uma índole inquebrantável atende pelo nome de Sergio Moro então desvenda-se que o Salvador da Pátria de 2015 é muito mais do que isso: será o Redentor, o Esperado, o sereno e sábio Messias que nos livrará das humilhações e acabará com nossas desgraças.
Indiscutível boa-pinta, 43 anos, o juiz paranaense foi submetido a um tratamento, digamos “idealizador”, pelo operador de Photoshop da “Veja” (Janos), que da foto original de Lalson Santos representando um jovem, despojado e atlético juiz  nasceu um colosso mitológico, monumental, saído do cinzel de Michelangelo.
É possível que o leitor/leitora de “Veja” tenha adorado a máscara resultante e a máscula confiança nela contida. Mas a intervenção cosmética desagradou a muitos — certamente a começar pelo próprio Moro, familiares, companheiros da Força-Tarefa, alunos, amigos e simpatizantes.
A promessa de resgatar o ânimo do país não pode estar inscrita num rosto — glamoroso ou magnético — claramente simplificado.  As instituições brasileiras exigem mais do que feições e fisionomias carismáticas para serem devidamente reabilitadas.
Mesmo que o ilustre retratado esteja imunizado contra a idolatria que  é capaz de suscitar não é impossível que segmentos periféricos da Operação Lava-Jato sejam contaminados pela onipotência advinda dos triunfos das investigações e cometam indignidades incompatíveis com a sua missão saneadora. E isto não é hipótese.
Convém lembrar que o nefando “Mein Kampf” (Minha Luta), escrito por Adolf Hitler em 1925-1926 e liberado para tradução e impressão, lido ou relido nos dias que correm talvez pareça desconexo, irracional, tacanho, mas no fim daquela década até meados da seguinte, o demoníaco manual levou uma das sociedades mais instruídas e disciplinadas da Europa e entregar-se ao mesmo desvario e fanatismo que grassa em ambientes mais primitivos.
A foto da capa de “Veja” combinada às da retrospectiva de 2015 (pp.48-69) não parecem editadas por jornalistas, mas por consumados semiólogos e psicolinguistas a serviço de uma narrativa balizada por símbolos subliminais. Em seguida à figura intrépida e mansa de Moro, o Anjo do Bem, seguem-se uma Dilma Rousseff agachada para entrar no helicóptero, Eduardo Cunha fazendo enorme careta e a coleção dos ex-poderosos presos pela Lava-Jato conduzidos pelo onipresente “japonês” (o agente federal Newton Ishii).
O culto à personalidade tem um incrível poder de irradiação, as venerações íntimas, pessoais – muito mais do que as vociferadas, ideológicas — são capazes de criar dinâmicas incontroláveis. As catástrofes do século passado foram produzidas pelo mesmo tipo de intoxicação – a devoção irrestrita a figuras totêmicas como Mussolini, Hitler e Stalin.  Não careciam do Photoshop (ainda não inventado), bastava-lhes a truculência.



Alexandre Garcia, o "Sexy Symbol" da Ditadura Militar, continua um golpista hoje, mostrando sua invejosa mediocridade





Rascunho epistemológico
O Sex Symbol da Ditadura Militar


texto de Wellington Pereira

Alexandre Garcia, jornalista da Rede Globo, agora resolveu atacar Chico Buarque usando sua moral peremptória. Mas esse senhor já teve seus dias de glória. Primeiro foi assessor (ou porta-voz) do Ditador Militar General Figueiredo, aquele que disse preferir o cheiro dos cavalos ao povo brasileiro.Não satisfeito com o papel de colaboracionista da Ditadura Militar, Garcia resolveu pousar para uma revista de nus masculinos e femininos, Ele & Ela ( ainda não existia a G Magazine). O Sex Symbol da Ditadura Miliar agora se diz - nas redes sociais - vítima de ataques políticos capitaneados pelo artista Chico Buarque. Ora, o corpo já não serve para a exposição, a mente só para a difusão de informações empasteladas pela Rede Globo.

(foto 1 - retrato do assessor quando jovem- Sex Symbol da Ditadura Militar), foto 2 (o arauto da moral midiática)

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Gregório Duvivier sobre os Playboys Ignorantes do Leblon




         "Quando vejo as agressões ao Chico — e não estou falando do bate-boca na calçada, mas da campanha difamatória da qual os ignorantes do Leblon são meros leitores —, para mim é como se chutassem uma santa ou rasgassem a Torá. Como sou a favor da liberdade total de expressão, inclusive quando ela fere o sagrado dos outros, limito-me a torcer para que passem a eternidade ouvindo Lobão e Fábio Jr., intercalados com discursos do Alexandre Frota e Cunha tocando bateria. Uma coisa é certa: a oposição e sua trilha sonora se merecem."