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domingo, 24 de agosto de 2014

Aos seguidores de Rodrigo Constantino, adoradores do Neoliberalismo e assíduos leitores da Veja

Extraído do site da revista Carta Maior e do site Esquerda.net:

   Política de Austeridade é um “completo fracasso” em toda a Europa, afirma o Prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz



Stiglitz sublinha que "agora vemos o enorme preço que a Europa está a pagar"

Austeridade é um “completo fracasso” em toda a Europa, afirma Stiglitz.

Joseph Stiglitz, prémio Nobel da Economia em 2001, afirma que as políticas de austeridade  neoliberal são boas para alguns bancos, mas um “completo fracasso” em toda a Europa. Alertando que se a estratégia não for alterada radicalmente a situação vai-se agravar, o economista refere que a Europa está a “ir pelo mesmo caminho” que o Japão e aponta que alguns países estão em depressão.


Stiglitz sublinha que "agora vemos o enorme preço que a Europa está a pagar".

Joseph Stiglitz esteve esta semana numa conferência na cidade de Lindau, no Sul da Alemanha. O prémio Nobel falou então à agência Bloomberg e a sua intervenção também foi destacada pelo jornal Financial Times.

Sob o título “O espectro de uma década perdida assombra a Europa”, o Financial Times salienta que Stiglitz disse que a Europa está a “ir pelo mesmo caminho” que o Japão, numa referência à depressão - recessão e queda dos preços em simultâneo - prolongada neste país, e frisou que “a única forma de descrever o que se está a passar em alguns países europeus é depressão”.

O Nobel apontou também: "A Europa tem muitas pessoas talentosas e [se] país após outro não está a funcionar, tem que ser um problema sistémico. O problema básico é que não é uma área monetária ótima." O economista acrescentou que “a combinação de estruturas falhadas com políticas falhadas tem sido devastadora".

Nas declarações à Bloomberg, Stiglitz afirma que as políticas de austeridade seguidas por toda a Europa são um “completo fracasso”, salienta que o elevado desemprego e o fraco crescimento indicam o fracasso das políticas seguidas e sublinha que "agora vemos o enorme preço que a Europa está a pagar".

Joseph Stiglitz diz também que a união bancária está a andar muito lentamente, que a zona euro precisa de união fiscal e aponta, referindo-se à intervenção Banco Central Europeu (BCE), que “a política monetária não pode realmente ser um substituto” da união fiscal.

"Todos concordam que a união bancária é uma coisa boa, mas está a avançar muito lentamente", disse o economista, considerando que são necessárias resoluções bancárias rápidas que "garantam os depósitos", ou "o dinheiro vai voar dos países fracos para os países fortes e os fracos só vão ficar mais fracos".

O prémio Nobel da Economia defende ainda que a zona euro precisa da mutualização das dívidas, realçando que com os eurobonds os Estados poderiam conseguir "empréstimos com a força do todo", o que levaria as taxas de juro para valores idênticos aos dos Estados Unidos.

sábado, 23 de agosto de 2014

A análise do Prêmio Nobel de economi, Paul Krugman, sobre o Brasil desmente o terrorismo de economistas de programa e mídia tendenciosa, como Miriam Leitão, Carlos Alberto Sardenberg ou Rodrigo Constantino




A análise de Paul Krugman sobre o Brasil



Luis Nassif

A economia brasileira  não enfrenta problemas graves. A opinião é de Paul Krugman, Prêmio Nobel da Economia, em palestra proferida no evento Diálogos Capitais, da revista Carta Capital.

Periodicamente, os mercados se apaixonaram por alguns grupos de países em desenvolvimento. Depois, desapaixonam.

Foi assim com os países da América Latina no final dos anos 70, com o México no início dos anos 90, com o sudeste da Ásia e a Argentina no final dos anos 90.

A boa notícia, segundo Krugman, é que o Brasil não é mais vulnerável há muito tempo.

Hoje em dia, é menor a exposição em relação ao câmbio, há uma estabilidade inflacionária consolidada e uma política fiscal mais responsável.

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O problema maior é o crescimento persistentemente fraco da economia mundial.

O mundo atravessou o segundo maior desastre da história da economia. O primeiro foi a Grande Depressão, de 1929. Comparando ambos os períodos,  Krugman observou que a que, nos primeiros anos, a queda do PIB per capita foi mais aguda na crise de 1929. A partir do quinto ano, no entanto, proporcionalmente o PIB per capita estava mais alto em 1929 do que em 2007. É certo que nos anos 30 houve a influência do armamentismo da Alemanha e da Itália.

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A maneira otimista com que as autoridades europeias e norte-americanas veem o mundo é paradoxal.

No inverno de 2012, a Europa parecia à beira de um colapso total. O próprio Krugman previu o caos. Ele não veio, graças à firme disposição do Banco Central Europeu de comprar títulos da dívida em qualquer circunstância. Esse comprometimento da União Europeia com a moeda única evitou o caos.

Se evitaram o caos, os bancos não demonstraram dispor de funding parta financiar a recuperação econômica geral.

Agora, a Comissão Europeia está triunfante, diz Krugman, acreditando que a Espanha irá crescer o dobro das previsões iniciais: em vez de 0,5%, um crescimento de 1%. Este é o sucesso, diz Krugman, obtido com custos sociais tremendos.

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A União Europeia anda de lado. Os Estados Unidos, um pouco melhor. O Japão tentando algo inovador, mas não se sabe ainda qual será o resultado.

Não se tem a fórmula do crescimento. Políticas monetárias heterodoxas não lograram trazer de volta o crescimento. Necessitariam da complementação de políticas fiscais, mas  esbarram em dificuldades enormes, na intransigência da Alemanha, na resistência das oposições, como o Partido Republicano nos Estados Unidos.

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E aí se entra na dúvida central.

Segundo Lawrence Summers, nos últimos vinte anos os Estados Unidos enfrentaram as duas maiores bolhas da história: a da tecnologia nos anos 90 e a das hipotecas. No auge das bolhas, havia pleno emprego e inflação controlada. Entre as duas bolhas, prosperidade mediana e, depois, estagnação.

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Na atual fase, as inovações tecnológicas não demandam nem muito emprego nem muito investimento. Quando Steve Jobs morreu, falou-se no grande criador de empregos. Mas ele empregava pouquíssimas pessoas, e nos Estados Unidos ninguém em chão de fábrica.

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Krugman recomenda ao Brasil tirar os olhos do FED e focá-los na China. No caso da Europa e Estados Unidos, acabaram os pesadelos de fim de mundo. Se houver alguma crise em alta velocidade, será na China.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Breve rascunho crítico-epistemológico do professor Wellington Pereira, da UFPB, e de Marcos Coimbra, presidente do Vox Popoli, sobre a Globo, William Bonner e a chamada "grande mídia" em geral



  Segue breve reflexão do professor de comunicação e sociologia da UFPB, Dr. Wellington Pereira, sobre a atitude política da mídia brasileira, em especial da Rede Globo, diante do show de arrogância do Jornal Nacional ontem com a presidente Dilma Roussef que, apesar das tentativas de intimidação - inclusive explíticas, com o dedo em riste de Patrícia Poeta - e influenciação eleitoral, não se deixou enredar pelas teias da Globo e se saiu bem dentro do tempo que lhe permitiram falar (quase todo tomado por Bonner). Logo após, um importante artigo de Marcos Coimbra, presidente do Vox Popoli, sobre a grande imprensa e sua atual parcialidade política:

Rascunho epistemológico.

Bonner, essa não cola.
Bonner, com essa voz de locutor de parque de diversão, desconhece a história de sua empresa na negação das manifestações das lutas pelas Eleições Diretas, do apoio à ditadura militar, na criminosa edição do debate entre Lula versus Collor, em 1989. Não precisamos ser eleitores de Dilma para entender o desserviços prestados à sociedade brasileira pela emissora do sr. Bonner. O brasileiro começa a entender que a vida não se resume a telenovelas ou big brother's em enlatados norte-americanos.

O Sr. Bonner decretou, ao entrevistar a Presidente Dilma, a falência do telejornalismo brasileiro. Em primeiro lugar, por não usar pronomes de tratamento adequados quando se entrevista autoridades. Em segundo lugar, ao confundir a Ética da convicção com a da responsabilidade. Se alguém considera que esse modelo de jornalismo é paradigmático, vamos retirar o Jornalismo do rol das Ciências Humanas - o que os alemães nunca fizeram - e colocá-lo - com todo respeito aos açougueiros - no ramo de quem abate animais para comercializar carnes.

Rascunho epistemológico II

Por que tanto ódio contra os pobres?

( o Deus-WiFi e o Apocalypse Privado)


Se faz necessário ter coragem para odiar. Os covardes não pegam na rodilha do ódio, porque não querem a responsabilidade do pote.

Odiar os programas sociais de assistência aos mais necessitados economicamente é fácil. Mas por que não odiar o juros altos das montadoras de automóveis na hora de trocar o carro? Por que não odiar as prestações mensais das faculdades carimbadoras de diploma? Por que não protestar e esmurrar o balcão dos planos, atravessadores, de saúde que oferecem muito pouco aos doentes privilegiados? Como explicar -sem ódio, mas com bom humor - que certo antigo servidor público, cujo teto salarial é pouco mais de 20 mil reais (isso dentro da lei) tem casa de praia, fazenda, gado, etc? 

Por que tanto ódio contra homens, mulheres e criança, cuja cor da pele incomoda sobre o Sol? Por que odiar alguém que nunca sentou à mesa de finas estampas, mas foi capaz de reordenar economicamente um país? Por que odiar àqueles que não aceitam mais o tratamento de vassalo, e por isso são chamados de preguiçosos? Por quê? Por quê? 

Será que essa gente que possui um Deus-WiFi - dona de um título do Apocalypse Privado- cuja proteção guarda na senha secreta de sua ambição, esconde grandes verdades? Vamos odiar, mas com coragem.

Wellington Pereira


As eleições e a mídia


Marcos Coimbra,

Fonte: CartaCapital

Na próxima terça 19, com o início da propaganda eleitoral na televisão e no rádio, entraremos na etapa final da mais longa eleição de nossa história. Começou em 2011 e nossa vida política gira em torno dela desde então.

A batalha da sucessão de Dilma Rousseff foi iniciada quando cessou o curto período de lua de mel com as oposições, no primeiro ano de governo. Talvez em razão do vexame protagonizado por José Serra na campanha, o antipetismo andava em baixa.

Durou pouco. Na entrada de 2012, o clima político deteriorou-se. As oposições perceberam que, se não fizessem nada, marchariam para nova derrota na eleição deste ano. Ao analisar as pesquisas de avaliação do governo e notar que Dilma batia recordes de popularidade a cada mês, notaram ser elevadas as possibilidades de o PT chegar aos 16 anos no poder. E particularmente odiosa. Serem derrotadas outra vez por Dilma doía mais do que perder para Lula.

Ela era “apenas” uma gestora petista, sem a aura mitológica do ex-presidente. Sua primeira eleição podia ser creditada, quase integralmente, à força do mito. Mas a segunda, se viesse, seria a vitória de uma candidatura “normal”. Quantas outras poderiam se seguir?

A perspectiva era inaceitável para os adversários do PT. Na sociedade, no sistema político e no empresariado, seus expoentes arregaçaram as mangas para evitá-la. A ponta de lança da reação foi a mídia hegemônica, em especial a Rede Globo.

Recordar é viver. Muitos se esqueceram, outros nem souberam, mas a realidade é que a “grande imprensa” formulou com clareza um projeto de intervenção na vida política nacional.

Não é teoria conspiratória. Quem disse que os “meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste País, já que a oposição está profundamente fragilizada”, foi a Associação Nacional de Jornais, por meio de sua presidenta, uma das principais executivas do Grupo Folha. Enunciada em 2010, a frase nunca foi tão verdadeira quanto de 2012 para cá.

Como resultado da atuação da vanguarda midiática oposicionista, estamos há três anos imersos na eleição de 2014. A derrota de Dilma é buscada de todas as formas. O “mensalão”? Joaquim Barbosa? A “festa cívica” do “povo nas ruas”? O “vexame” da Copa do Mundo? A “compra da refinaria”? O “fim do Plano Real”? A “volta da inflação”? O “apagão” na energia? A “crise na economia”? A “desindustrialização”? O “desemprego”?

Nada disso nunca teve verdadeira importância. Tudo foi e continua a ser parte do esforço para diminuir a chance de reeleição da presidenta.

Ou alguém acha que os analistas e comentaristas dessa mídia acreditam, de fato, na cantilena que apregoam quando se vestem de verde-amarelo e se dizem preocupados com a moral pública, os empregos dos trabalhadores ou a renda dos pobres? Ou que queiram fazer “bom jornalismo”?

Temos agora uma ferramenta para elucidar o papel da mídia na eleição. Por iniciativa do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, está no ar o manchetômetro (http://www.manchetometro.com.br), um site que acompanha a cobertura diária da eleição na “grande imprensa”: os jornais Folha de S.Paulo, O Globo e O Estado de S. Paulo, além do Jornal Nacional da Globo (como se percebe, os organizadores do projeto julgaram desnecessário analisar o “jornalismo” do Grupo Abril).

Lá, vê-se que os três principais candidatos a presidente foram objeto, nesses veículos, de 275 reportagens de capa desde o início de 2014. Aécio Neves, de 38, com 19 favoráveis e 19 desfavoráveis. Tamanha neutralidade equidistante cessa com Dilma: ela foi tratada em 210 textos de capa. Do total, 15 são favoráveis e 195 desfavoráveis. Em outras palavras: 93% de abordagens negativas.

É assim que a população brasileira tem sido servida de informações desde quando começou o ano eleitoral. É isso que faz a mídia para exercer o papel autoassumido de ser a “oposição de fato”.

O pior é que a influência dessas empresas ultrapassa o noticiário. Elas contratam as pesquisas eleitorais que desejam e as divulgam quando e como querem. E organizam os debates entre candidatos.

Está mais que na hora de discutir a interferência dessa mídia no processo eleitoral e, por extensão, na democracia brasileira.

domingo, 17 de agosto de 2014

Cordel sobre o velório de um grande homem e que se transformou em sensacionalista espetáculo midiático e manipulação eleitoreira



 Compartilhando a mensagem de um grande poeta paraibano - Merlanio Maia - sobre o sensacionalismo em cima de um velório em que a dor da perda de um ser humano foi encoberta pela eleitoreira manipulação e atitudes, como a de tirar sefies, e outras manifestações de gente sem conteúdo ou de parca educação:

Esse mundo tá perdido
O povo não tem noção
Não respeitam um velório,
Um defunto no caixão
Armado de celular
Deseja-se registrar
A desgraça e o egoísmo
É selfie pra todo lado
Controle o vício danado
Largue o sensacionalismo!!!


No enterro do Candidato
Que morreu de acidente
De nome Eduardo Campos
O que se via de gente
Na pose e na posição
Bem na beira do caixão
Até Marina posou
Já na campanha em ação
Rindo à beira do caixão
Marininha exagerou!

Vamos parar com esse vício
Pior que fumar maconha
Nem respeito tem do morto
Isso é falta de vergonha
Esperemos o momento
Que não haja este tormento
Respeitemos a emoção
Mais devagar com o andor
Pra acabar com tanto horror
Que é falta de educação!

Merlânio Maia

sábado, 16 de agosto de 2014

O engodo midiático do "Criança Esperança", segundo o WikiLeaks




Extraído do R7 notícias:

Globo diz desconhecer informações do WikiLeaks sobre investigação envolvendo o Criança Esperança 

Material cita o pagamento de taxa de 10% do valor arrecadado para a Unesco; Globo garante que todo dinheiro vai direto para as contas da instituição   


Um suposto documento publicado pelo site WikiLeaks, famoso por divulgar materiais e informações confidenciais de governos e empresas, registra uma investigação sobre o recebimento de verbas da campanha Criança Esperança da Rede Globo pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). 


O documento, de 15 de setembro de 2006, revela um telegrama que teria sido enviado do escritório da Unesco em Paris, na França, para Washington, capital dos EUA. O material relata uma solicitação de reunião do então embaixador brasileiro na capital francesa, Luiz Filipe de Macedo Soares, com lideranças da entidade da ONU para discutir irregularidades ocorridas no escritório da Unesco em Brasília.
Um dos problemas a serem discutidos, mencionados no documento, seria a manipulação do dinheiro movimentado pela campanha Criança Esperança, que já teria levantado US$ 40 milhões (cerca de R$ 94,8 milhões) desde 1986. Segundo o texto, teriam sido repassados à Unesco 10% desse total, por conta de uma “taxa de serviço”. O documento não faz referência sobre o destino dos 90% do montante arrecadado, mas informa que um terço do orçamento dos fundos extraorçamentais da Unesco (cerca de US$ 124 milhões, ou R$ 291,4 milhões) tem origem do escritório de campo do Brasil . No site oficial da campanha, a Rede Globo informa que “todo o dinheiro arrecadado pela campanha é depositado diretamente na conta da Unesco”.


Material, de 2006, menciona o então embaixador do Brasil na França, que teria informado diretoria da Unesco sobre irregularidades no escritório brasileiro da entidadeReprodução/Wikileaks
Em uma nota divulgada no dia 8 de junho de 2011 para esclarecer rumores sobre possíveis benefícios fiscais que a emissora teria com a campanha, a Rede Globo informou que nenhuma doação do Criança Esperança passa pela emissora. De acordo com dados da própria emissora, já foram arrecadados mais de R$ 270 milhões até a última campanha.


Procurada pelo R7, a emissora carioca respondeu, em nota, que “desconhece os documentos citados [do WikiLeaks]”, e informa que a parceria com a Unesco, que não traz nenhuma cláusula referente a pagamento de “taxa de serviço”, teve início apenas em 2004.
Leia mais no R7 noticias

domingo, 10 de agosto de 2014

O poder da Globo, a tendenciosidade de seus "experts" e o "escândalo-fraude" da Wikipédia




Seguem, para reflexão, artigos de Wilson Ferreira, extraído do Luis Nassif Onlne, e de Renato Rovai, extraído de seu blog.

O "escândalo da Wikipédia" e a autofagia da TV Globo, por Wilson Ferreira



O “escândalo da fraude da Wikipédia” é a confirmação de que nada mais resta para a grande mídia do que a bomba semiótica da não-noticia. Em nova “denúncia” jornalistas Miriam Leitão e Carlos Sardenberg tiveram seus perfis na enciclopédia virtual Wikipédia “fraudados” com a inserção de difamações e críticas. E tudo teria partido do endereço virtual “da presidência”... ou teria sido “do Palácio do Planalto”... ou, então, “de um rede pública de wi fi?”. A ambiguidade dá pernas à não-notícia que revela um insólito desdobramento de um jornalismo cuja fonte primária (a Wikipédia) nega a si própria como fonte confiável de investigação. Abre uma surreal possibilidade de um tipo de jornalismo que se basearia exclusivamente em fontes onde o próprio repórter pode criá-las para turbinar a sua pauta. E de quebra revela o momento autofágico da TV Globo que oferece suas próprias estrelas jornalísticas em sacrifício no seu desespero de ter que lutar em duas frentes simultâneas: a política e a audiência.
Com o “escândalo Wikipédia” e a perspectiva de uma hilária “CPI do wi fi” está se confirmando que na atual batalha semiótica pela opinião pública a única arma que restou para a grande mídia é a da não-notícia – sobre esse conceito clique aqui.
O jornal O Globo deu a manchete (“Planalto altera perfil de jornalistas com críticas e mentiras”) e a TV Globo repercutiu nos seus telejornais durante todo o dia a “notícia” de que os perfis dos jornalistas Carlos Alberto Sardenberg e Miriam Leitão na enciclopédia virtual foram alterados com o objetivo de criticá-los. E o IP (endereço virtual) de onde partiram as alterações era da rede do Palácio do Planalto.
As supostas “críticas” inseridas no perfil dos jornalistas qualificam as análises e previsões econômicas de Miriam Leitão como “desastrosas” e de ter defendido “apaixonadamente” os ex-banqueiro Daniel Dantas quando foi preso pela Polícia Federal em escândalo de crimes contra o patrimônio público. E o jornalista Sardenberg de ser crítico à política econômico do governo por ter um irmão economista da Febraban que tem interesse em manter os juros altos no Brasil.
Jimmy Walles: Wikipédia não é apropriada
como fonte primária
Três características chamam a atenção nessa segunda detonação seguida de uma bomba semiótica da não-notícia (a anterior foi a tentativa de transformar a existência do media trainning na Petrobrás em escândalo político): a irrelevância, o timming e o tautismo.
Wikipédia é relevante?
Como a própria Wikipédia já admitiu, a enciclopédia não deve ser utilizada como fonte primária de investigação (“Wikipedia Reasearching With Wikipedia”). Jimmy Walles, co-fundador da Wikipedia, afirmou que “enciclopédias de qualquer tipo não são apropriadas como fontes primárias, e não devem ser invocadas como autoridades”.
Pelo seu caráter colaborativo onde qualquer usuário pode alterar o conteúdo dos verbetes, o uso da Wikipédia não é aceito em escolas e universidades. No máximo é utilizada como indicadora para fontes externas. Mas repentinamente para a grande mídia a Wikipédia passou a ter uma surpreendente relevância como documento primário de investigação.
Como “dar pernas” à não-notícia?
Estamos na típica situação jornalística em que se tenta “dar pernas” para a notícia que, em si, não possui relevância. A melhor forma de dar algum gás à não-notícia é por meio da retórica da ambiguidade.
A matéria do jornal O Globo ora fala que o IP era da “Presidência da República”, ora do “Palácio do Planalto”, ou também de “computadores do Palácio” e “IP da Presidência” para no final diluir tudo no “endereço geral do servidor da rede sem fio do Palácio do Planalto”. Naturalmente o teaser é dado pela manchete e primeiro parágrafo que tentam aproximar ao máximo o fato (irrelevante em si mesmo) da figura da presidente da República. Se o leitor persistir a leitura até o final da matéria, perceberá a diluição do próprio impacto noticioso.
Qual a matéria-prima dessa suposta notícia? De um lado a própria enciclopédia virtual que é até cautelosa consigo mesma e do outro uma rede wi fi pública. Com isso se projeta a possibilidade de que se alguém alterar o perfil do governador Geraldo Alckimin em rede wi fi pública instalada pela prefeitura de São Paulo, o gabinete do prefeito seria responsabilizado... A matéria abre uma surreal possibilidade de um tipo de jornalismo que se basearia exclusivamente em fontes primárias de investigação onde o próprio repórter pode criar para turbinar a sua pauta.
O timming do escândalo
Outra coisa que chama a atenção é o timming da detonação dessa bomba semiótica. Supostamente o “fato” teria ocorrido nos dias 10 e 13 de maio e somente agora é “revelado”. Desde então, os perfis da Wikipédia encontravam-se alterados, sem haver qualquer tipo de escandalização – o que demonstra a “relevância” da enciclopédia virtual. Nesse momento, outras bombas semióticas estavam em andamento na Operação Anti-Copa (manifestações de rua, Black blocs etc.). A não-notícia foi guardada no paiol de armas semióticas da grande mídia, aguardando o momento propício para a detonação, que acabou sendo na sequência da suposta fraude da CPI da Petrobrás.
Enquanto havia manifestações anti-Copa
as não-notícias não eram necessárias
E para turbinar a não-notícia dos “perfis fraudados” da Wikipédia (como pode haver “fraude” se a enciclopédia é colaborativa?), a manjada estratégia da chamada agenda setting que até aqui o Governo federal mantêm-se inacreditavelmente refém: a não-notícia é repercutida pela imprensa ao “noticiar” que políticos de oposição pedem que a Procuradoria Geral da República apure a “denúncia”; ou divulgando a “preocupação” de órgãos como Associação  Brasileira de Imprensa, Associação Nacional de Jornais e Federação Nacional dos Jornalistas.
O que exige uma resposta institucional da Secretaria de Comunicação do Governo, dando legitimidade e combustível à não-notícia da “fraude da Wikipédia”.
Estrelas do jornalismo global
entregues ao sacrifício?
Um escândalo tautista
Outra característica dessa não-notícia é que ela revela não só o desespero da grande mídia em ter que continuamente rebocar um oposição política inepta como também o próprio tautismo da Organizações Globo. Por tautismo nos referíamos em postagem anterior a um momento de crise que a Globo enfrenta revelada por uma combinação de tautologia com autismo, por meio do conteúdo da sua programação cada vez mais autorreferencial e metalinguístico – sobre isso, clique aqui.
Quando a emissora oferece as própria estrelas do seu jornalismo como supostas vítimas no script de uma não-notícia (repare na matéria do Jornal Nacionalcomo o depoimento de Miriam Leitão foi feito com a câmera pegando-a de cima para baixo para reforçar a ideia de vitimização e fragilidade), é que estamos diante de uma situação análoga ao caso de um indivíduo que, sob condições extremas de fome ou de alteração do metabolismo basal, o corpo começa a entrar em processo catabólico (processo de degradação onde o corpo começa a consumir seu próprio tecido muscular).

Essa autofagia da TV Globo pode ser percebida nessas seguintes características que tornam a não-notícia da “fraude da Wikipédia” num exemplar caso de tautismo global:

(a) ao colocar seus próprios jornalistas como vítimas de uma armação cibernética, a Globo insere essa não-notícia na sua tradicional linha editorial de criminalização da Internet. Em geral nos seus telejornais a Internet é pautada em seus aspectos negativos e difamatórios (crimes, vício, fraude etc.). Afinal, a mídia digital é o grande vilão da crise de audiência da TV aberta e concorrente direto da mídia tradicional.

(b) A insólita edição do Jornal Nacional do dia 08/08, onde um repórter entrevista outro jornalista da própria emissora, acaba revelando uma situação comum na cobertura de eventos extensivos como Copa do Mundo e Olimpíadas: na falta de assunto, jornalistas entrevistam-se entre si. No atual cenário eleitoral, com uma frágil oposição política, a grande mídia começa a consumir a si mesma ao oferecer seus próprios integrantes como matéria-prima das bombas semióticas.

(c) Essa não-notícia revela também ser nostálgica: reviver os antigos fantasmas da censura, do controle da Imprensa por governos autoritários e toda a mitologia da extinta Guerra Fria – as supostas ditaduras comunistas como a cubana onde não haveria liberdade de imprensa e os jornalistas críticos seriam cruelmente perseguidos.

(d) O episódio guarda uma impagável ironia com a jornalista Miriam Leitão. No meio jornalístico ela é conhecida como “urubóloga” por suas apocalípticas previsões para o País que nunca acontecem e pela forma como gagueja e engole seco quando é obrigada a dar notícias econômicas positivas nos telejornais da TV Globo. A “fraude” do verbete “Miriam Leitão” revela essa fina ironia autorrealizadora: numa suprema metalinguagem, a emissora brinca com a própria notoriedade pública da sua jornalista.


O escândalo da Wikipédia parece uma piada mal contada

Por Renato Rovai


O mundo midiático do factóide no Brasil é algo mais fantástico do que o gênero literário. Cortazar, Borges e Garcia Marques ficariam de queixos caídos se aportassem por aqui e abrissem os jornais e revistas. Ou se tivessem contato com o noticiário de TVs e rádios.

A wikipédia é uma enciclopédia colaborativa. Uma das criações mais interessantes da era da internet, principalmente porque não é uma corporação que busca vampirizar o meio. Não é um Facebook e nem um Google. Não é uma Microsoft e nem uma Apple. É uma Fundação que organiza um projeto colaborativo e que precisa que as pessoas participem para existir.

Recordo-me do dia em Jimmy Wales, o criador do Wikipedia veio ao Brasil para lançar o Wikimedia. Fui um dos convidados para bater um papo com ele no evento de lançamento, realizado no Centro Cultural. Antes ele havia ido ao Roda Viva e lá tinha sido questionado por um dos entrevistadores sobre um erro no seu perfil em língua portuguesa.

O atento entrevistador achou que tinha armado uma cilada para Wales. Se até o perfil do criador da enciclopédia tinha um erro era porque ela não valia de nada. Certo? Não, errado. Wales só disse o seguinte ao intrépido repórter. Se estava errado, não estará mais depois de você ter alertado para isso. Neste momento alguém já deve estar corrigindo-o.

Na Wikipédia é assim. Se alguém escreve uma baboseira, alguém está sempre a postos para buscar corrigir o erro. Ele não fica esperando o próximo ano ou a próxima edição do produto.

Nestes dias de “escândalos” sobre perfis na wikipédia, tem gente que que ataca o governo dizendo é um crime alguém a partir do Palácio do Planalto mexer num perfil de jornalista. Coisa mais boba impossível. Jornalistas podem ser queridos ou não, como todos os seres humanos. Se um direitopata fosse escrever o verbete da Fórum, provavelmente ele seria muito pior do que é. Mas certamente apareceria alguém para melhorá-lo.

E foi deste jeito, sendo atualizada por milhões de pessoas pelo mundo, utilizando-se da inteligência colaborativa, distribuída e conectada digitalmente que a wikipédia derrotou, por exemplo, a Enciclopédia Britânica.

Por isso é também bastante incômodo ver gente no afã de defender o governo dizendo que a wikipédia é uma porcaria e que não deveria ser levada em consideração. Ou que é “fonte não relevante”. Fonte não relevante são os jornais brasileiros. Fonte não relevante é a Veja e a TV Globo. E não é incomum ver pessoas da acadêmia usando esses veículos como fontes em artigos. E não é incomum ver políticos e jornalistas citando esses veículos como se fossem de fato sérios.

Bobagem pura

A wikipédia tem um papel muito relevante e democratizante. Ela permite que muitos que não teriam acesso a certas informações cheguem a ela, como também populariza a verbetização. Ou alguém acha que Mirian Leitão e Sardenberg seriam verbetes da Barsa ou da Enciclopédia Britânica?

Isso tudo não significa que seja moralmente defensável que alguém usando computador de governos, seja ele qual for, fique mexendo em perfil de adversários ou aliados. Mas certamente não é só gente do Palácio do Planalto que faz este tipo de coisa. Em muitos outros governos e de outras esferas certamente sempre haverá um bobão pra querer ser mais realista que o rei. Pra fazer papel de estafeta do chefe e ficar misturando seu posicionamento como servidor público e cidadão.

Mas isso deveria fazer a apresentadora do Jornal Nacional ficar com cara de velório e o apresentador realizar a locução como se tivesse narrando a tragédia do World Trade Center? Óbvio que não. Aí que entra o show de factóides. Veja, por exemplo, fez recentemente quatro páginas falando de quadrilha digital e colocou duas imagens do site da Fórum para ilustrar o caso. É um absurdo evidente, mas esse editor não fez cara de choro e nem saiu por aí se dizendo vítima de um conluio. Há Justiça pra resolver o caso. E acho que Miriam Leitão e Sardenberg deveriam ir pelo mesmo caminho. E parar com o chororô.

Mas eles têm outros objetivos. Querem misturar isso com regulamentação da comunicação no Brasil para fazer agrado ao patrão. Como se não houvesse nada mais ditatorial do que o poder das Organizações Globo no Brasil. E mesmo assim há quem chame aquilo de jornalismo independente.

Que jornalismo independente é esse que se tornou o que é na ditadura militar escondendo torturas e assassinatos? Que jornalismo independente é esse que manipulou debates em eleições presidenciais? Que jornalismo independente é esse que não deu um pio nem para abrir o debate sobre as privatizações no país? Que jornalismo independente é esse que não abre espaço para o contraditório em uma série de questões de interesse público?

Enfim, não temos que nos preocupar com o helicóptero com quase 500 quilos de cocaína da família Perrella, não temos que nos preocupar com os aeroportos do Aécio, não temos que nos preocupar com a falta de água em São Paulo e nem com a corrupção no metrô, que levou um grão-tucano a ser afastado do Tribunal de Contas. Nada disso merece destaque no noticiário. O que importa é falar de dois verbetes na wikipédia. Então tá.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Sabedoria e espiritualidade na psicologia de Carl Gustav Jung



Segue um vídeo, com a participação de Leonardo Boff, sobre a sabedoria de Carl Gustav Jung (1875-1961) e a importância do resgate da voz do coração, do sentimento, em um mundo desencantado e instrumentalizado por uma razão produtivista e reducionista em um sistema capitalista insano.





quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Rubem Alves entrevista Karl Marx

Segue texto de Rubem Alves refletindo sobre a atualidade e importância do pensamento de Marx e, ao mesmo tempo, critica a estreiteza de visão de pseudo-marxistas e também as falácias dos economistas do deus "mercado" capitalista. As falas de a Marx foram retiradas por Rubem Alves de várias das obras do filósofo-sociólogo-economista alemão, em especial, os Manuscritos Econômico-Filosóficos.


Rubem Alves encontra Karl Marx


  Pensei, inicialmente, que uma variação sobre o prazer, a ser composta por economistas, banqueiros e homens de negócios, deveria ser executada tendo como instrumento musical as caixas registradoras, das antigas e das modernas. As antigas, por seus sons metálicos e suas teclas que nos fazem lembrar de órgãos, cravos e pianos. Também as manivelas, que um lutier habilidoso poderia transformar numa “viela de roda”, instrumento medieval que não mais se usa, mas que pode ser visto em museus e em telas de Brueghel. As caixas registradoras modernas e seus sons eletrônicos fariam inusitados duetos com as vielas medievais, atestando assim o fato de que o dinheiro possui os atributos da divindade: ignora o tempo, é eterno. Tudo isso acompanhado por pandeiros, cujos sons fazem lembrar o tilintar do dinheiro… E os ritmos seriam sincopados e rápidos, como contraponto às extra-sístoles e taquicardias que marcam o mundo das bolsas de valores.

  Pensei que isso estaria em harmonia com a estética dos economistas. A maioria, de fato, concordou comigo. Mas houve um que protestou: era um velho de cabeleira e barba imensas, que fazia lembrar Walt Whitman. Encontrei-o, por acaso, assentado sozinho à mesa de um bar que eu freqüentava. Bebia cerveja e fumava charuto. O fato de estar sozinho sugeria que se tratava, provavelmente, de um intelectual decadente ou aposentado. Assentei-me à sua mesa. Ele começou a falar.

  Contou-me que seus discípulos o haviam abandonado. É comum que os filhos venham a se envergonhar dos pais. Isso acontece quando os pais, com o passar dos anos, vão ficando velhos. Com a velhice vem a verdade: com o enfraquecimento dos mecanismos de censura os pais, outrora recatados e pudicos, começam a revelar um erotismo jamais imaginado, para vergonha dos filhos. Velhos não devem ter erotismo. Os filhos, então, não mais querem saber da sua companhia.

  Às vezes acontece o contrário: os filhos se envergonham daquilo que os pais já foram, e tratam de separar o seu presente respeitável do seu passado duvidoso. Alguns chegam ao extremo de queimar arquivos fotográficos.

  "– Você está enganado sobre a economia”, ele me disse em voz baixa. Parecia temer que alguém o ouvisse, como se estivesse dizendo uma heresia. ” A economia não é a ciência das caixas registradoras, do dinheiro. Sei que, para muitos, é isso que ela é. Mas para mim é uma outra coisa: é a ciência do prazer. Dizer que a economia é a ciência do dinheiro é o mesmo que dizer que a culinária é a ciência das panelas. Alguns pensam que sou um economista como os outros porque dediquei grande parte da minha vida ao estudo do maior jogo de dinheiro jamais havido na história. Mas, se eu o fiz, foi porque eu queria decifrar os descaminhos do prazer. Estudei a panela para saber o que estava acontecendo de errado com a comida. Eu acho que o objetivo da vida é o prazer. Isto está inscrito em nossos próprios corpos. Nossos corpos não são máquinas produtivas – não pertencem inteiros a "Feira das Utilidades”. Sim, é claro, trabalhamos, produzimos. Mas somos diferentes dos animais. “Os animais constroem somente de acordo com as padrões e necessidades da espécie. Os homens constroem também de acordo com as leis da beleza" (Marx’s concept of man, Erich Fromm, New York, Frederick Ungar Publishing Co., 1964, “Manuscritos econômicos e filosóficos”, p. 102 ).

  Gostamos dos livros, mesmo quando não derivamos de sua leitura nenhum resultado prático. O corpo contém uma certa exigência de “prazer inútil” na ótica capitalista, ou seja, sem valor econômico. Desde jovem sonhei com uma condição em que o trabalho, à semelhança daquilo que acontece com os artistas, pudesse ser um motivo de prazer. O trabalho não apenas como meio de vida, mas o trabalho como brinquedo. As crianças brincam por puro prazer. Imaginava uma situação em que os homens, ao terminar o seu trabalho, sorririam de felicidade, e veriam o seu próprio rosto refletido em sua obra, da mesma forma como Narciso via o seu rosto refletido na água da fonte. ( Ibid. p.102 )

  Veja, por exemplo, os sentidos! Que prazeres extraordinários eles nos dão! É verdade que em sua condição bruta os sentidos somente atendem às necessidades elementares da sobrevivência. Um homem faminto não é capaz de fazer distinções sutis entre gostos refinados: angu ou lagosta – é tudo a mesma coisa. Saindo dessa condição bruta de existência, entretanto, os sentidos se refinam, desenvolvem-se, tornam-se sensíveis a prazeres que até então lhes eram desconhecidos. O grande trabalho da história, até agora, tem sido a educação dos sentidos. A história impulsiona o corpo humano na direção de uma exuberância dos sentidos cada vez maior. A história conspira para que os homens sejam cada vez mais felizes. “O cultivo dos cinco sentido é o trabalho de toda a história passada” . ( Ibid. p. 134 )

  Eu entendo que a economia é a ciência dos meios necessários à realização erótica dos homens. Como tal, ela pertence à “Feira das Utilidades”. A economia é um instrumento para que os homens cheguem à ” Feira da Fruição”.

  O que atormenta o meu pensamento”, ele continuou, “ é uma contradição: a economia explica a riqueza das nações. Mas ela não consegue dar uma explicação aceitável para a miséria e a pobreza dos homens.

  Meu pensamento oscilava: num momento eu sonhava os sonhos mais loucos e utópicos: eram esses sonhos que eu queria ver realizados. Imaginava que os homens, um dia, conseguiriam arrebentar as correntes que os prendiam, e que podereiam então colher a flor viva da vida, , tão próxima das suas mãos. (Que ninguém nos ouça: eu procurava o caminho de volta ao Paraiso. Como poderia eu me esquecer do grande mito com que a Torah, livro sagrado do meu povo, se inicia?)

  Num outro momento meu pensamento deixava de sonhar e se voltava para as condições materiais da produção da história. Não que eu me esquecesse dos meus sonhos. Eu procurava a ciência como meio para a sua realização. Estudava as panelas e o fogo por amor à moqueca… Voltei-me para a história por acreditar que, sendo nela que a pobreza e a miséria dos homens era produzida, seria nela que elas seriam superadas. Se os problemas dos homens são criados na história, teria de ser nela que eles seriam resolvidos. Para se desfazer o nó é preciso saber como ele foi produzido. A atividade dos homens para produzir a sua vida – a isso eu dei o nome de praxis. Dei-me conta de que a teologia e as religiões, ao pregar que a história acontece pela atividade de Deus, impedia que os homens a compreendessem como resultado de sua própria atividade. As religiões, assim, têm um duplo efeito. O primeiro é a paralisia da inteligência dos homens. Se tudo acontece pela vontade de Deus então é inútil tentar entender a história como produto das ações dos homens. O segundo é a paralisia moral. Se tudo acontece pela vontade de Deus, tudo é sagrado. E eu via os miseráveis operários sacralizando a sua miséria com o dito conformado: “ Deus quis…”

  A história não se faz só com sonhos. Quem sonha com um banquete há de dominar a ciência das panelas e dos fogos. Tornei-me inimigo dos sonhadores ingênuos que pensavam que bastaria que os homens mudassem as suas idéias para que o mundo mudasse também. Moquecas não se fazem só com idéias e intenções. Quem quer mudar o mundo tem de ser um especialista no uso do fogo. Na história, esse uso do fogo tem o nome de política…

  Não estranhe o meu uso das imagens culinárias. Só me atrevo a fazer uso delas longe dos intelectuais, nessa mesa de bar… Em um contexto acadêmico eles diriam que eu devo estar bêbado ou senil. Aqui eu posso me dar ao luxo de falar como um poeta. Aprendi muito com eles. Durante um certo tempo, inclusive, eu convivi com um intelectual maldito ( ah! como os malditos são maravilhosos!). Sua filosofia tinha a beleza da poesia. Lê-lo era um deleite. O insólito dos seus conceitos se misturava com a beleza das suas imagens. Foi ele que chamou a minha atenção para a importância dos sentidos. O seu nome já tinha algo de culinário, fogo, “Ribeiro de Fogo”, Feuer / bach. E culinária também era a sua metafísica, pois que se comprazia em dizer que ” somos o que comemos”. Na minha juventude fui seu discípulo, e sob a sua influência escrevi textos saborosos… O que, para os intelectuais, é sempre um pecado. Eles pensam que a verdade deve ser insípida.

  Essa relação, depois que envelheci, passou a ser um motivo de embaraço para os meus seguidores. Causava-lhes mal-estar imaginar que eu havia sido influenciado por ele. Trataram, então, de queimar o arquivo. Desqualificaram os textos que eu escrevera, sob a alegação de que, ao escrevê-los, eu era jovem demais, imaturo, ainda não descobrira o caminho da ciência, e falava com as palavras imprecisas da filosofia. Espalharam, então, que tal fase perturbada havia terminado com uma tal “cesura epistemológica” expressão que, traduzida, quer dizer: de repente, como uma cigarra que passa por uma metamorfose e deixa a casca, ele deixou a sua casca filosófica em algum lugar e se pôs a voar com as asas da ciência. Era de um jeito, ficou de outro. Falava sobre os homens, passou a falar sobre estruturas. Era humanista, virou estruturalista. E chegaram mesmo a dizer que, para ler os meus escritos, era preciso ter sempre em mente um rigoroso anti-humanismo metodológico. Estruturalista! Sim, é verdade que o capital funciona como uma estrutura. Como se fosse uma máquina, com suas leis próprias. Mas se eu assim o estudei, é porque eu queria desvendar o segredo dessa cozinha perversa onde os cozinheiros ficavam sempre com fome.

  Com essas palavras ele bebeu o que restava na caneca, enxugou a espuma do bigode, pediu outra cerveja, reacendeu o charuto que se apagara, enfiou a mão no bolso do paletó zurrado, tirou de lá um livrinho e me deu com estas palavras: ” A alegria é a prova dos nove. Esse livrinho fala sobre isso… “ Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844: esse era o título. Autor: Karl Marx.

  Fez-se silêncio. Comecei a lê-lo. À medida que virava as páginas eu não conseguia evitar as traduções culinárias que o texto me sugeria. Era como se a conversa não tivesse acabado, como se ele ainda continuasse ali, ao meu lado, falando.

  Primeiro manuscrito: ” O Trabalho Alienado”: ” Mas que história é esta? O trabalhador faz a comida e é um outro que come tudo, só lhe sobrando a raspa da panela?”

  Segundo manuscrito: “Propriedade Privada”: ” Mas claro! Tem de ser assim. O operário come a raspa porque ele não é o dono da panela. Quem é dono come a comida. Quem não é dono come o que sobra.”

  Terceiro manuscrito: “Que perversa transformação esta cozinha opera sobre os que comem da sua comida! Os homens são roubados dos seus sentidos, perdem a capacidade de sentir prazer!”

  Perguntem à Babette qual é o fim da culinária… Ela responderá: ” O prazer, a alegria!” E, para dar prazer e alegria ela gastou tudo o que tinha. Ficou mais pobre de dinheiro. Ficou mais rica humanamente!

  Perguntem ao dono do restaurante qual é o fim da culinária. Ele responderá: ” O lucro”. Claro que mesmo nos restaurantes capitalistas se serve o prazer dos sentidos. Mas a mola propulsora do “negócio” não é o prazer da comida; é o prazer da caixa registradora. Ah! Como é maravilhosa aos ouvidos do proprietário a sua música! Vá a um banco, vá a uma bolsa de valores! Lá, por acaso se fala sobre os prazeres gastronômicos? De forma alguma. Lá se fala sobre o prazer que se tem num jogo abstrato que se joga sobre a lógica do verbo “ter”.

  Aí ele interrompeu a minha leitura e continuou.

 "Veja: eu não estou dizendo que os indivíduos não mais sintam prazer. Há, no capitalismo, prazeres refinados, e muitos. Estou dizendo outra coisa: que dentro da sua lógica, dentro da “razão capitalista”, os prazeres não contam. Eles não são tomados em consideração, não são pensados como ponto de chegada da viagem. Para o capitalismo o objetivo da viagem é um só: o lucro. E, assim, dentro da lógica do sistema, os restaurantes e as fábricas de armas estão no mesmo nível, são peões do mesmo jogo de xadrez. Ninguém, no pregão da bolsa de valores, se pergunta sobre quais ações estão ligadas às empresas que dão mais prazer. Quem fizer isso logo ficará pobre. A lógica do jogo do dinheiro exige que os prazeres dos sentidos sejam desconsiderados. Esse jogo perverso nos tornou ” tão estúpidos e parciais que somente consideramos nosso um objeto quando o possuimos, quando ele é utilizado de alguma forma. Assim, todos os sentidos físicos e espirituais são substituidos pela simples alienação de todos esses sentidos, ou seja, pelo sentido da posse(…) Quanto menos você comer, beber, comprar livros, for ao teatro, aos bailes, às boates, quanto menos você pensar, amar, teorizar, cantar, pintar, tanto mais você será capaz de economizar e tanto maior será o seu tesouro. Quanto menos você for, tanto mais você terá…” ( Ibid. p. 132 ).

  O capitalismo só conhece as coisas passíveis de serem transformadas em mercadorias, isto é, coisas que podem ser fabricadas, vendidas e compradas. Mas o prazer não é dado automaticamente pelo ter. Posso ter o mais fantástico aparelho de som e a maior coleção de CDs. O prazer dependerá de uma qualidade espiritual minha, do meu ser, uma sensibilidade para a música, que não pode ser comprada por dinheiro. É preciso que os sentidos sejam educados! O prazer e a alegria crescem de uma relação erótica com o objeto, isso que se chama amor. E essa relação não pode ser comprada. Cresce de dentro.

 
O espírito do capitalismo dominou de tal forma a cabeça das pessoas que até mesmo aqueles que se dizem meus discípulos foram enganados. Veja o caso da educação. Os professores de “esquerda” têm medo dessa palavra “amor”, e a julgam babaquice romântica. De fato, “amor” é coisa que a ciência não consegue pensar. Preferem, os professores, considerar-se “trabalhadores” que ganham pelas “mercadorias intelectuais” que produzem de forma competente, sob a forma de um saber. Como professor produzo tal mercadoria que vale tanto. Ignoram que isso é o que sempre detestei! Ao assim pensarem o ensino, eles o inserem na perversa lógica dos “valores de troca”. Valor de troca é uma “quantidade abstrata” que mora tanto num revolver quanto num jantar, e que permite essa equação horrenda, base de todo o jogo econômico: “X” jantares = “Y” revólveres. O prazer e a morte são a mesma coisa…

  E em qual escola se gasta tempo na educação dos sentidos? Bobagem. Isso é coisa da ” Feira da Fruição” – não circula no sistema. O que importa é a ” Feira das Utilidades” – seus saberes úteis, transformáveis em mercadoria, passíveis de circular no mercado de trabalho. Por que gastar tempo no desenvolvimento das inúteis potencialidades do ser, na educação dos sentidos para os prazeres inúteis, insignificante do ponto de vista econômico, se os corpos podem ser transformados em unidades de produção. O que é um profissional? É um corpo, outrora portador de sentidos, que se transformou em ferramenta, utilidade. ” Quanto menos você for, mais você terá…”

  Mas o que me entristece é que meus discípulos não entenderam nada do que eu disse. Acharam que prazer é coisa burguesa – como se os trabalhadores não gostassem de comida boa, de cerveja e de transar. Droga! Ficaram mais próximos do papa do que de mim. Meus discípulos ficaram com medo de que eu fosse considerado um babaca romântico. Transformaram-me num rigoroso economista. Um economista, de fato, vale muito mais como “mercadoria” que um poeta romântico. Num “curriculum vitae” se pode escrever: “Profissão: economista”. Mas só um louco colocaria ” poeta romântico”. Românticos não são mercadorias, não arranjam empregos… Estudei a panela por causa da moqueca. Estudei o violão por causa da música. Estudei o trabalho por causa da felicidade. Estudei o capitalismo por causa do prazer.

  Aquela sua idéia de tocar a economia com caixas registradoras e pandeiro, música tocada em movimentos rápidos e ritmos sincopados, a performance acontecendo em bancos e bolsas de valores: isso não tem nada a ver comigo. O dinheiro tem de ser subordinado ao prazer, a utilidade tem de estar a serviço da alegria. Será que isso é possível? Ou será só um sonho? Bem sei que os experimentos fracassaram. E nem poderia ser de outra forma. Os novos cozinheiros não me entenderam: só trocaram o formato das panelas e o livro de receitas, substituindo o poder abstrato do dinheiro pelo poder sem face da burocracia. Minha esperanca era de que nesse caldeirão chamado história, fervente ao fogo da dialética, se consumasse o preparo do prato escatológico do prazer: a educação dos sentidos e a produção do banquete, para todos.

  O sonho não morreu. Ele continuará, para sempre. Pensei que ele morasse no coração da história. Pensei que a história tivesse coração. Talvez eu tivesse me enganado. Os sonhos só moram no coração dos homens. Somos incuravelmente românticos. Os homens haverão sempre de sonhar com o prazer e a felicidade.

  Por isso, eu preferiria que a “variação” que me cabe fosse tocada suavemente, ao violino, como fundo para um jantar à luz das velas, onde o amor e o prazer são servidos gratuitamente, e o corpo, embriagado de alegria, se pusesse a sonhar… Os membros do partido e as esquerdas vão me reprovar, e dizer que isso não combina com minha conhecida solidariedade operária. Eles não entendem. Pensam que ser solidário com pobre é gostar de pobreza. Ser solidário com pobre é sofrer a pobreza deles e sonhar sonhos de prazer e riqueza. Os sonhos são sempre a subversão da realidade. Trabalhador não sonha com angú e feijão – não é preciso sonhar, para isto basta abrir os olhos. Trabalhador sonha é com coisas bonitas e gostosas. Bem que gostariam de comer o que comem os patrões, e não só a raspa da panela. Está lá dito pelo Vinícius, no “Operário em Construção”. Porque, como disse muito bem o Joãozinho Trinta, “quem gosta de pobreza é intelectual. Pobre mesmo, gosta é de riqueza…”

  Ditas essas palavras ele esvaziou a caneca de cerveja, apagou o charuto fedorento no cinzeiro, e se foi.