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domingo, 27 de janeiro de 2013

A tragédia de Santa Maria, os verdadeiros heróis e o sensacionalismo midiático



Carlos Antonio Fragoso Guimarães
O sensacionalismo, no Brasil dos Macedos, dos Soares, dos Malafaias, dos Marinho, o midiático sensacionalismo, enfim, vale mais que a informação e a solidariedade... Vale mais do que a dor das famílias dos jovens mortos na trágica madrugada e, sem se importar com os demais que passam por situações semelhantes, fazem fragoroso silêncio e descaso pelos milhares que morrem de sede e fome no Nordeste do mesmo país....
Ávidos por imporem sua visão de mundo - e em especial, por manipular politicamente as informações de acordo com seus interesses -, de forma artificial e apressada, a mídia sequer espera a análise técnica das causas por quem é competente para tanto, ja seguem a "sugerir" culpados para o ocorrido,  transformando a dor em espetáculo e pouco falando do heroísmo e bravura a quem de direito, dos bombeiros e médicos às pessoas comuns que fazem de tudo para ajudar ou dar algum conforto aos sobreviventes e familiares da tragédia, coisa que os "Brotheres", os "craques", os cantores gospel e as modelos não fazem, nunca farão, pois sua função está ligada à alienação pública de acordo com os interesses da própria mídia....

Precisamos de mais humanismo sensível e menos tecnicismo frio



Precisamos de mais verde e menos corporações;
 mais qualidade de vida e menos estatísticas; 
mais espaços de recreação coletiva e menos prédios e shoppings; 
mais vida e menos mecanicismo, 
mais solidariedade e menos competitividade... 
 Precisamos perceber que somos parte da natureza e não seres à parte desta!

Carlos Antonio Fragoso Guimarães

domingo, 20 de janeiro de 2013

Platão




texto de

Carlos Antonio Fragoso Guimarães

Platão e a descoberta da Metafísica


Platão, cujo verdadeiro nome era Aristócles, nasceu em Atenas, em 428/427 a.C., e lá morreu em 347 a.C. Platão é um nome que, segundo alguns, derivou de seu vigor físico e da largueza de seus ombros (platos significa largueza). Ele era filho de uma abastada família, aparentada com famosos políticos importantes, por isso não espanta que a primeira paixão de Platão tenha sido a política.


Inicialmente, Platão parece ter sido discípulo de Crátilo, seguidor de Heráclito, um dos grandes filósofos pré-Socráticos. Posteriormente, Platão entra em contato com Sócrates, tornando-se seu discípulo, com aproximadamente vinte anos de idade e com o objetivo de se preparar melhor para a vida política. Mas os acontecimentos acabariam por orientar sua vida para a filosofia como a finalidade de sua vida. 

Platão tinha cerca de vinte e nove anos quando Sócrates foi condenado à beber o cálice de cicuta (veneno fortíssimo). Ele havia acompanhado de perto o processo de seu mestre, e o relata na Apologia de Sócrates. O fato de Atenas, a mais iluminada das cidades-estados gregas, ter condenado à morte "o mais sábio e o mais justo dos homens" - como falara mediunicamente o oráculo de Apolo, em Delfos - lhe deixou marcas profundas que determinariam as linhas mestras de toda a sua atividade de filósofo. 

Acredita-se que toda - ou uma boa parte - a obra de Platão nos chegou inteira. Além de cartas e da Apologia de Sócrates, Platão escreveu cerca de trinta Diálogos que têm sempre invariavelmente Sócrates como protagonista. Nestas obras excepcionais, Platão tenta reproduzir a magia do diálogo socrático, imitando o jogo de perguntas e respostas, com todos os meandros da dúvida, com as fugazes e imprevistas revelações que impulsionam para a verdade, sem, contudo, revela-la de modo direto. O motivo pelo qual sua obra nos chegou praticamente intácta reside no fato de Platão ter fundado uma escola que se tornou famosa, e que era dedicada ao herói Academos. Daí o nome Academia.



Represetação de Platão, com os traços da face de Leonardo Davinci, tal como feito por Rafael Sanzio em seu célebre afresco A Escola de Atenas, Vaticano.

Platão foi o responsável pela formulação de uma nova ciência, ou, para ser mais exato, de uma nova maneira de pensar e perceber o mundo. Este ponto fundamental consiste na descoberta de uma realidade causal supra-sensível, não material, antes apenas esboçada e não muito bem delineada por alguns filósofos, embora tenha sido um pouco mais burilada por Sócrates. Antes de Sócrates, era comum tentar-se explicar os fenômenos naturais a partir de causas físicas e mecânicas. 

 Platão observa que Anaxágoras, um dos pré-socráticos, tinha atinado para a necessidade de introduzir uma Inteligência universal para conseguir explicar o porquê das coisas, mas não soube levar muito adiante esta sua intuição, continuando a atribuir peso preponderante às causas físicas. Entretanto, se perguntava Platão, será que as causas de caráter físico e mecânico representam as "verdadeiras causas" ou, ao contrário, representam simples "co-causas", ou seja, causas a serviço de causas mais elevadas? Não seria o visível fruto de algo mais sutil?


Para encontrar a resposta às suas dúvidas, Platão empreendeu aquilo que chamou simbolicamente de "a segunda navegação". A primeira navegação seria o percurso da filosofia naturalista. A segunda navegação seria a orientação metafísica de uma filosofia espiritualista, do inteligível. O sentido do que seja essa segunda navegação fica claro nos exemplos dados pelo próprio Platão.

Se se deseja explicar por que uma coisa é bela, um materialista diria que os elementos físicos como o volume, a cor e o recorte podem ser bem proporcionais e causam sensações prazerosas e agradáveis aos sentidos. Já Platão diria que tudo isso seria apenas qualidades que evocariam uma lembrança de algo ainda mais belo, vista pela alma no plano espirtiual, mas que não está acessível ao plano físico. O objeto seria apenas uma cópia imperfeita, por ser material, de uma "Idéia" ou forma pura do belo em si.


Vejamos um outro exemplo:

Sócrates está preso, aguardando a sua condenação. Por que está preso? A explicação mecanicista diria que é porque Sócrates possui um corpo corpulento, composto de ossos e nervos, etc, que lhes possibilitam e lhe permitiram locomover-se e se deslocar por toda a vida, até que, por ter cometido algum erro, tenha-se dirigido à prisão, onde lhe sejam postas as amarras. Ora, qualuer pessoa sabe a simplificação desse tipo de argumento, mas é justamente assim que falam o materialistas-mecanicistas até os dias de hoje. Mas este tipo de explicação não oferece o verdadeiro "porquê", a razão pela qual Sócrates está preso, explicando apenas o meio pelo qual pode uma pessoa ser posta num cárcere devido ao seu corpo. Explica o ato, descrevendo-o, e não suas causas.

 A verdadeira causa pela qual Sócrates foi preso não é de ordem mecânica e material, mas de ordem superior, da mesma forma que um computador não executa um complexo cálculo matemático pela ação de seus componentes em si, mas devido a algo de ordem superior e mais abstrato: o seu programa, o software. Sócrates foi condenado devido a um julgamento de valor moral usado a pretexto de justiça para encobrir ressentimentos e manobras políticas das pessoas que o odiavam. Ele, Sócrates, decidiu acatar o veredicto dos juízes e submeter-se à lei de Atenas, por acreditar que isso era o correto e o conveniente, pois ele era cidadão de Atenas, mesmo ciente da injustiça de sua condenação. E, em conseqüência disto, dessa escolha de ordem moral e espritual, ele, em seguida, moveu os músculos e as pernas e se dirigiu ao cárcere, onde se deixou ficar prisioneiro.


A segunda navegação, portanto, leva ao conhecimento de dois níveis ou planos do ser: um, fenomênico, sensorial e visível (a nível do hardware, como diríamos metaforicamente, em linguagem de computação); outro, invisível e metafenomênico, (a nível do software, numa metaforicamente, claro), inteligível e compreensível pela razão e pela intuição. 

Podemos afirmar, como falam Reale & Antiseri, que a segunda navegação platônica constitui uma conquista e assinala, ao mesmo tempo, a fundação e a etapa mais importante da história da metafísica. Todo o pensamento ocidental seria condicionado defintiviamente por essa "distinção" entre o físico (o hardware) e o causal (o software, a ordem implicada que causa a ordem explicada), tanto na medida da sua aceitação quanto de sua não aceitação através da história. Se ela não é aceita, a pessoa que não a aceita terá de justificar a sua não aceitação, gerando uma polêmica que continuará dialeticamente a ser condicionada ao fato de que existe - ao menos filosoficamente - algo que se chama metafísica.


Só após a "segunda navegação" platônica é que se pode falar de material e espiritual. E é à luz dessas categorias que os físicos anteriores a Sócrates, e muitos físicos modernos, podem ser tachados e materialistas, mas agora a natureza não pode mais ser vista como a totalidade das coisas que existem, mas como a totalidade das coisas que aparecem. Como diria o Físico David Bohm, a ordem explícita é apenas conseqüência de uma ordem implícita, superior e invisível. O "verdadeiro" ser é constituído pela "realidade inteligente" e "inteligível" que lhe é transcendente.

O Mito da Caverna

É o próprio Platão quem nos dá uma ideia magnifica sobre a questão da ordem implícita e explícita no seu célebre "Mito da Caverna" que se encontra no centro do Diálogo A República. Vejamos o que nos diz Platão, através da boca de Sócrates:

Imaginemos homens que vivam numa caverna cuja entrada se abre para a luz em toda a sua largura, com um amplo saguão de acesso. Imaginemos que esta caverna seja habitada, e seus habitantes tenham as pernas e o pescoço amarrados de tal modo que não possam mudar de posição e tenham de olhar apenas para o fundo da caverna, onde há uma parede. Imaginemos ainda que, bem em frente da entrada da caverna, exista um pequeno muro da altura de um homem e que, por trás desse muro, se movam homens carregando sobre os ombros estátuas trabalhadas em pedra e madeira, representando os mais diversos tipos de coisas. Imaginemos também que, por lá, no alto, brilhe o sol. Finalmente, imaginemos que a caverna produza ecos e que os homens que passam por trás do muro estejam falando de modo que suas vozes ecoem no fundo da caverna.


Se fosse assim, certamente os habitantes da caverna nada poderiam ver além das sombras das pequenas estátuas projetadas no fundo da caverna e ouviriam apenas o eco das vozes. Entretanto, por nunca terem visto outra coisa, eles acreditariam que aquelas sombras, que eram cópias imperfeitas de objetos reais, eram a única e verdadeira realidade e que o eco das vozes seriam o som real das vozes emitidas pelas sombras. Suponhamos, agora, que um daqueles habitantes consiga se soltar das correntes que o prendem. Com muita dificuldade e sentindo-se frequentemente tonto, ele se voltaria para a luz e começaria a subir até a entrada da caverna.

 Com muita dificuldade e sentindo-se perdido, ele começaria a se habituar à nova visão com a qual se deparava. Habituando os olhos e os ouvidos, ele veria as estatuetas moverem-se por sobre o muro e, após formular inúmera hipóteses, por fim compreenderia que elas possuem mais detalhes e são muito mais belas que as sombras que antes via na caverna, e que agora lhes parece algo irreal ou limitado. Suponhamos que alguém o traga para o outro lado do muro. Primeiramente ele ficaria ofuscado e amedrontado pelo excesso de luz; depois, habituando-se, veria as várias coisas em si mesmas; e, por último, veria a própria luz do sol refletida em todas as coisas. 

Compreenderia, então, que estas e somente estas coisas seriam a realidade e que o sol seria a causa de todas as outras coisas. Mas ele se entristeceria se seus companheiros da caverna ficassem ainda em sua obscura ignorância acerca das causas últimas das coisas. Assim, ele, por amor, voltaria à caverna a fim de libertar seus irmãos do julgo da ignorância e dos grilhões que os prendiam. Mas, quando volta, ele é recebido como um louco que não reconhece ou não mais se adpata à realidade que eles pensam ser a verdadeira: a realidade das sombras. E, então, eles o desprezariam.... Qualquer semelhança com a vida dos grandes gênios e reformadores de todas as áreas da humanidade não é mera coincidência.


Bibliografia 
Sugerida Reale, Giovanni; Antiseri, Dario. - "História da Filosofia", vol. I, Ed. Paulus, São Paulo, 1990 
 Platão, Coleção Os Pensadores, Nova Cultural, 1988. 
  O Espiritualismo Ocidental retorno ao índice













terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Vídeo documentário: Como a Mídia brasileira sufoca e manipula a liberdade de expressão


Um video especialmente esclarecedor sobre o poder da Mídia, em especial, da Televisão e do Rádio, em prol dos interesses de uma minoria de famílias detentoras da "concessão pública" de radiodifusão...


O trabalho como deveria ser em uma sociedade humanista




Em uma sociedade realmente humana, o correto e o normal seria que trabalhássemos para viver e não que vivêssemos para trabalhar, sempre mais e sempre mais alienadamente.

Carlos Antonio Fragoso Guimarães

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Bach.... Música sublime para elevar a alma


  É ouvindo a música elevada como a nós doada por Johann Sebastian Bach (1685-1750) que se tem a sensação intuitiva de que existe muito mais coisas a sustentar a vida que a matéria...

  No vídeo abaixo, um arranjo da famosa ária da terceira suíte para orquestra, e que recebeu, nesta versão, o nome de "Solo Amore"...



sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O Mandamento que deveria constar no decálogo



Esse foi o mandamento que Deus esqueceu: Serás parte da Natureza. Obedecerás a Natureza da qual fazes parte.” 

Eduardo Galeano

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Filosofia, Drama, Ação, Existencialismo e Religião no filme “As Aventuras de Pi”



Carlos Antonio Fragoso Guimarães

Um filme muito profundo que não perde no quesito ação e beleza

                O menino Piscine Molitor Patel é filho de um casal de classe média da Índia. Nascido em um momento de transição política, vê sua região, antes dominada por franceses, ser novamente anexada à Índia, ocasião em que seu pai resolve criar um Zoológico a partir do terreno pertencente à prefeitura local. Seu nome estranho, Piscine Molitor, foi fruto da loucura de seu tio por piscinas, uma das quais, a Piscine Molitor, o encantou tanto que seus pais resolveram dar ao filho o nome da própria. Tal atitude acabaria por fazer o pobre menino, de início, ser alvo de bulling entre os colegas da escola, o que o faz querer superar tal vexame adotando o nome da 16 letra do alfabeto grego, Pi, que também constitui um número irracional, razão da circunferência pelo diâmetro de um círculo. Ele decora o máximo de números possíveis constituintes das casas decimais de PI após o 3,14... e acaba se tornando uma espécie de celebridade infantil. Este começo aparentemente simples é apenas a abertura de um dos filmes mais profundos e encantadores já feitos pelo cinema e que chegou às telas brasileiras como o nome “As Aventuras de Pi”, cujo título original é "The Life of Pi", dirigido por Ang Lee.

                O pequeno Pi, filho de pai agnóstico e de mãe hindu, ver-se imerso no universo religioso de seu pais mas acaba por conhecer o cristianismo e, neste, a figura de Jesus acaba por o encantar. Ele agradece a Visnhnu, uma das manifestações da divindade, ter tido a oportunidade de ter conhecido Cristo. Pouco depois, também se encanta com a forma poética do árabe ao citar os trechos do Alcorão e o filme todo, entre outras coisas, representa uma espécie de busca por Deus, incluindo a questão do porque do sofrimento. Aliás, é a história dramática e ao mesmo tempo iniciática de PI que leva um escritor canadense a procura-lo para que aquele conte sua história. Ele, de início, rir-se da possibilidade de que saber de sua aventura o levaria a aceitar a existência de Deus, coisa que, no fim da narrativa, uma única colocação de PI, após ter contado toda a sua aventura, parece ter conseguido.

                Um dos animais mais exuberantes do zoológico de seu pai era um tigre de bengala que possuía o exótico nome de Richard Parker. De início fascinado pelo animal, PI logo aprendeu, com ele, que a vida, em suas mais diversas expressões, não é só beleza: um tigre precisa matar outros animais para sobreviver. O choque desta “descoberta” o faz ficar mais cético quanto às questões da espiritualidade. Estes questionamentos e o choque inicial do “desencantamento do mundo” o acompanham na adolescência até que, na mesma época que se apaixona pela primeira vez, vê os pais tomarem a decisão de venderem os animais e se mudarem para o Canadá, buscando escapar de uma crise econômica que se abateu sobre o país natal. E é exatamente no percurso de navio entre a índia e o Japão que o navio naufraga e PI é levado a se autoconhecer através da tragédia, da dor, da descoberta da natureza e da possibilidade de integrar em si os lados racionais e instintivos, já que terá de tentar sobreviver com a companhia nada mais nada menos que de Richard Parker, o tigre de bengala, no mesmo barco salva vidas em que está.

                O diretor Ang Lee realmente consegue construir uma parábola poética, plena de imagens, de ação e de poesia durante o drama de sobrevivência de Pi e Richard.  
    Durante os mais de duzentos dias em que fica à deriva, PI é levado a pensar e reavaliar profundamente sua visão de mundo, sua visão de si mesmo e, a todo o momento, suas dúvidas sobre Deus e até onde o homem pode se tornar um animal e um animal apresentar traços humanos, e isso em cada um dos dramáticos acontecimentos que o cercam, da mais extrema violência e necessidade física ao mais belo amanhecer ou luar que se possa imaginar. O próprio perigo mais próximo, o tigre Richard, é exatamente o ser que o mantém vivo e entre os dois, Pi e Richard, acaba por surgir um vínculo que serve de metáfora para a necessária junção ou união dos opostos: o consciente-inconsciente, o racional e o instintivo, o bem e o mal... 

   Na Verdade, a  apresentação de dualidades em todo o filme é uma indicação de sua profundidade, pois é a metáfora  da unidade polar em tudo, a “Coincidentia Oppositurm” de Nicolau de Cusa e que, modernamente, Carl Gustav Jung tão bem adaptou como sendo o processo de autoconhecimento e diferenciação contínua do ser humano, chamado por ele de individuação, como manifestação, no aspecto psíquico, da busca da integração do consciente e inconsciente (o grande oceano misterioso e seus desafios, no filme - e nos contos e mitos -, também representa o encontro de PI com seus próprios fantasmas e capacidades inconscientes), em um âmbito íntimo que é expressão da própria realidade que parece paradoxal, mas que, na verdade, são características complementares de uma mesma realidade que se tona de fato Una e transcendental apenas em Deus, o Absoluto, que está para além dos conceitos, das metáforas, mas que é apreendido mais intuitivamente que pela razão. E no final do filme, ainda outra surpresa paradoxal-dual... que não irei revelar aqui para que o leitor que ainda não assistiu esta obra-prima possa ter sua própria experiência de descoberta.

                Qualquer que seja a concepção intelectual que fique após ver este filme, é provável que poucos sejam os que não sairão do cinema sem ter sido “mexido” de alguma forma com o que foi visto. Quer se seja crente ou ateu, racional ou emotivo, pragmático ou idealista, alguma coisa do que se vê e do que se é levado a pensar toca a fundo nosso eu mais profundo ao ver... as aventuras de Richard e Pi.


Trailler do filme:



Dados técnicos do filme:

Título original: Life of Pi
Direção: Ang Lee

Gênero: Aventura
Orçamento: US$ 120 milhões
Elenco: Gérard Depardieu, Irrfan Khan, Tabu, Suraj Sharma, Adil Hussain, Ayush Tandon, Tobey Maguire.

Sócrates


texto de
Carlos Antonio Fragoso Guimarães
escrito em 1996

Sócrates e a descoberta de que o homem é a sua psyché 

  Sócrates nasceu em Atenas em 470/469 a. C. e morreu na mesma cidade em 399 a.C., condenado devido a uma acusação de "impiedade": ele foi acusado de ateísmo e de corromper os jovens com a sua filosofia, mas, na realidade, estas acusações encobriam ressentimentos profundos contra Sócrates por parte dos poderosos da época. Ele era filho de um escultor, chamado Sofronisco, e de uma parteira chamada Fenarete. Desde a juventude, Sócrates tinha o hábito de debater e dialogar com as pessoas de sua cidade. Ao contrário de seus predecessores, Sócrates não fundou uma escola, preferindo também realizar seu trabalho em locais públicos (principalmente nas praças públicas e ginásios), agindo de forma descontraída e descompromissada (pelo menos na aparência), dialogando com todas as pessoas, o que fascinava jovens, mulheres e políticos de sua época.

Segundo Reale & Antiseri (1990), depois de algum tempo seguindo os ensinos dos naturalistas, Sócrates passou a sentir uma crescente insatisfação com o legado desses filósofos, e passou a se concentrar na questão do que é o homem - ou seja, do grau de conhecimento que o homem pode ter sobre o próprio homem.


Enquanto os filósofos pré-Socráticos, chamados de naturalistas, procuravam responder à questões do tipo: "O que é a natureza ou o fundamento último das coisas?" Sócrates, por sua vez, procurava responder à questão: "O que é a natureza ou a realidade última do homem?"

A resposta a que Sócrates chegou é a de que o homem é a sua alma - psyché, por quanto é a sua alma que o distingue de qualquer outra coisa, dando-lhe, em virtude de sua história, uma personalidade única. E por psyché Sócrates entende nossa sede racional, inteligente e eticamente operante, ou ainda,a consciência e a personalidade intelectual e moral. Esta colocação de Sócrates acabou por exercer uma influência profunda em toda a tradição européia posterior, até hoje.

Ensinar o homem a cuidar de sua própria alma seria a principal tarefa a ser desempenhada por ele, Sócrates, e por todos os filósofos autênticos. Sócrates acreditava vivamente ter recebido essa tarefa por Deus, como podemos ler na Apologia de Sócrates, de Platão: "(...) é a ordem de Deus. E estou persuadido de que não há para vós maior bem na cidade que esta minha obediência a Deus. Na verdade, não é outra coisa o que faço nestas minhas andanças a não ser persuadir a vós, jovens e velhos, de que não deveis cuidar só do corpo, nem exclusivamente das riquezas, e nem de qualquer outra coisa antes e mais fortemente que da alma, de modo que ela se aperfeiçoe sempre, pois não é do acúmulo de riquezas que nasce a virtude, mas do aperfeiçoamento da alma é que nascem as riquezas e tudo o que mais importa ao homem e ao Estado."

Segundo Reale & Antiseri (1990), um dos raciocínios fundamentais feitos por Sócrates para provar essa tese é o seguinte: uma coisa é o instrumento que se usa e a outra é o sujeito que usa o instrumento. Ora, o homem usa o seu corpo como instrumento, o que significa que a essência humana utiliza o instrumento, que é o corpo, não sendo, pois, o próprio corpo. Assim, à pergunta "o que é o homem?", não seria lógico reponder que é o seu corpo, mas sim que é "aquilo que se serve do corpo", que é a psyché, a alma. Esta mesma alma seria imortal e fadada a reencarnar tantas vezes fosse necessárias até a alma se aperfeiçoar de tal forma que não precisasse mais voltar a este planeta.


O "daimonion" socrático


Entre as acusações contra Sócrates estava a de que ele estava introduzindo novos daimonions, novas entidades divinas. Em sua Apologia, Sócrates diz: "A razão (...) são aquelas acusações que muitas vezes e em diversas circunstâncias ouvistes dizer, ou seja, que em mim se verifica algo de divino ou demoníaco (...) uma voz que se faz ouvir dentro de mim desde que eu era menino e que, quando se faz ouvir, sempre me detém de fazer aquilo que é perigoso e que estou a ponto de fazer, mas que nunca me exortou a fazer nada". Ou seja, o daimonion socrático era "uma voz" que lhe vetava determinadas coisas, o que o salvou várias vezes de perigos e experiências negativas (Reale & Antiseri, 1990, p. 95). Ela não lhe revelava nada, apenas vetava algumas coisas que lhe eram perigosas.

O daimonion socrático é algo muito específico que diz respeito muito particularmente à excepcional personalidade de Sócrates, colocando-se no mesmo plano de um tipo de mediunismo que se fazia presente em certos momentos de concentração muito intensa e em momentos de reflexão bastante próximos aos arrebatamentos de êxtase em que Sócrates (assim como ocorria com Buda, Plotino, Joana D'Arc, etc) mergulhava algumas vezes e que duravam longamente, coisa da qual tanto Platão quanto Xenofonte falam expressamente.
Sócrates em seus momentos finais, junto aos seus discípulos, segundo a célebre pintura de David

Jostein Gaarder em seu "O Mundo de Sofia" fala que as pessoas ainda hoje se perguntam por que Sócrates teve de morrer. Então ele faz um paralelo entre Jesus e Sócrates: ambos eram pessoas carismáticas e eram consideradas pessoas enigmáticas ainda em vida. Nenhum dos dois deixou qualquer escrito, e precisamos confiar na imagem e impressões que eles deixaram em seus discípulos e conteporâneos. Ambos eram mestres da retórica e tinham tanta autoconfiança no que falavam que podiam tanto arrebatar quanto irritar seus ouvintes. E ambos acreditavam falar em nome de uma coisa que era maior do que eles mesmos. Ambos desafiavam agudamente os que detinham o poder na sociedade, apontando sem piedade as hipocrisias e falsos fundamentos em que se assentavam para cometer toda sorte de abusos e injustiças. Foi isto que, no fim, lhes custou a vida. Afinal, os que questionam são sempre perigosos para os poderosos e pseudo-sábios de todas as épocas. Ainda assim, o pragmatismo individualista dos tempos modernos fazem certos pseud-intelectuais acreditarem que Sócrates provocou a própria morte no sentido de que não teria dado outra opção aos seus acusadores. Isso não procede. Seus julgadores poderiam simplesmente terem banido o velho homem de mais de setenta anos, ou terem imposto uma penalidade socialmente humilhante sem chegarem ao extremo do assassinato com vestes de legalidade... O mesmo poderia ter sido feito a Cristo, a Giordano Bruno, à Joana D'Arca, mas sabemos que haviam outros interesses bem mais mesquinhos por trás destes julotamentos...

A maneira como Sócrates fazia as pessoas conhecerem-se a si mesmas também estava ligada à sua descoberta de que o homem, em sua essência, é a sua psyché. Em seu método, chamado de maiêutica, ele tendia a despojar a pessoa da sua falsa ilusão do saber, fragilizando a sua vaidade e permitindo, assim, que a pessoa estivesse mais livre de falsas crenças e mais susceptível à extrair a verdade lógica que também estava dentro de si. Sendo filho de uma parteira, Sócrates costumava comparar a sua atividade com a de trazer ao mundo a verdade que há dentro de cada um

Ele nada ensinava expositivamente, apenas ajudava as pessoas a tirarem de si mesmas opiniões próprias e limpas de falsos valores, pois o verdadeiro conhecimento tem de vir de dentro, de acordo com a consciência, e que não se pode obter expremendo-se os outros. Até mesmo na atividade de aprender uma disciplina qualquer, o professor nada mais pode fazer que orientar e esclarecer dúvidas, como um lapidador tira o excesso de entulho do diamante, não fazendo o próprio diamante. 

O processo de aprender é um processo interno de apreensão, compreensão, assimilação e comparação e tanto mais eficaz quanto maior for o interesse de aprender. Só o conhecimento que vem de dentro é capaz de revelar o verdadeiro discernimento. Em certo sentido, dizemos que quando uma pessoa "toma juízo", ela simplesmente traz à consciência algo muito claro que já estava "dentro" de si. Assim, as finalidades do diálogo socrático são a catarse e a educação para o autoconhecimento. Dialogar com Sócrates era se submeter a uma "lavagem da alma" e a uma prestação de contas da própria vida. Como disse Platão: "quem quer que esteja próximo a Sócrates e, em contato com ele, põe-se a raciocinar, qualquer que seja o assunto tratado, é arrastado pelas espirais do diálogo e inevitavelmente é forçado a seguir adiante, até que, surpreendentemente, ver-se a prestar contas de si mesmo e do modo como vive, pensa e viveu".

Em seu método, ao iniciar uma conversa, Sócrates sempre adotava a posição de uma pessoa ignorante, que apenas "sabe que nada sabe". E justamente por usar esta afirmativa, ele forçava as pessoas a usarem a razão. Ele entrava de tal forma na conversa, e de tal forma a dominava, que era capaz de aparentar uma maior ignorância ou de mostrar-se mais tolo do que realmente era. Seus discípulos mais fieis já sabiam que quando o opositor caia nesta jogada, logo logo levaria um tombo tremendo quando o quadro se invertesse. E esta era a principal técnica do método de Sócrates: usar a ironia. Foi assim que le expos muito das fraquezas do pensamento ateniense. Um encontro com Sócrates podia signifcar o risco de expor-se ao ridículo. Mas as pessoas que passaram por isto e conseguiram superar o choque do orgulho ferido, indo até o fim no processo cartático, acabavam por extrair de si mesmo a resposta em tudo lógica e compatível com os problemas expostos, dando-lhe a solução. O resultado é que o indivíduo sentia uma verdadeira sensação de iluminação, de descoberta, de der dado à luz algo de valioso que havia dentro de si, mas de que não tinha a mínima consciência. Foi assim que Sócrates conquistou fervorosos discípulos. Mas se a pessoa entregava-se ao orgulho ferido, tornava-se um inimigo feroz. E esta foi a razão que lhe custou a vida.

Bibliografia sugerida:





  • "Sócrates" - Coleção Os Pensadores, Editora Abril, São Paulo, 1987.
  • "Platão" - Coleção Os Pensadores, Editora Abril, São Paulo, 1988.
  • Gaarder, Jostein. - "O Mundo de Sofia", Companhia das Letras, São Paulo, 1995.
  • Reale, Giovanni & Antiseri, Dario. - "História da Filosofia", Vol. I, Ed. Paulus, São Paulo, 1990. 
  • terça-feira, 1 de janeiro de 2013

    Um clipe para a alta classe média


    Clip especialmente dedicado aos leitoras da Veja e do Reinaldo Azevedo,  assíduos votantes do PSDB e representantes do penamento egocêntrico, utilitarista e excludente: